Número 28 - Mayo 2013

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Distorções acerca do testamento vital no Brasil (ou o porquê é necessário falar sobre uma declaração prévia de vontade do paciente terminal)

Distortion on living will in Brazil (or why it is necessary to talk about a prior declaration of will of terminal patient)

Luciana Dadalto
Advogada. Professora Universitária. Mestre em Direito Privado pela PUC-Minas. Doutoranda em Ciências da Saúde pela Faculdade de Medicina da UFMG. lucianadadalto[at]uol.com.br


Sumário

1. Considerações iniciais

2. Declaração de vontade do paciente terminal

3. Por que é importante falar sobre o tema?

4. A validade da declaração prévia de vontade do paciente terminal no Brasil

5. Declaração prévia de vontade do paciente terminal aplica-se à situações de terminalidade

6. O problema do estado vegetativo persistente

7. Considerações finais

8. Referências


Resumo

O presente artigo tem como objetivo analisar o panorama brasileiro de discussão acerca do testamento vital, enfocando os pontos controversos e, muitas vezes divergentes sobre a temática. Primeiramente, enfoca a questão terminológica, demonstrando porque é necessário renomear o instituto para declaração prévia de vontade do paciente terminal, para depois trabalhar especificamente questões acerca do conteúdo deste documento, das impropriedades que tem acontecido acerca deste e, por fim, trabalhar a diferença entre terminalidade e estado vegetativo persistente e as implicações dessa diferença na feitura da declaração.

Palavras-chave: testamento vital, paciente terminal, cuidados paliativos, direitos dos pacientes.


Abstract

This article aims to analyze the panorama of the Brazilian discussion concerning to the living will, focusing at the controversial issues, and the very often divergent views about the subject. First, it focuses at the question of terminality, demonstrating why it has to rename the institute for prior declaration of will of the terminal patient, and then working  specifically the issues about the content of this document, the improprieties that have happened on it and, finally, to work the difference between terminality and persistent vegetative state and the implications of this difference at making the statement.

Key words: living will, terminal patient, paliative cares, patient´s rights.


1. Considerações iniciais

O instituto que comumente é denominado ¨testamento vital¨ no Brasil é espécie do gênero diretivas antecipadas, que são, segundo Sanchéz1, um termo general que se refere a instruções feitas por uma pessoa sobre futuros cuidados médicos que ela receberá quando esteja incapaz de expressar sua vontade.

Esta divisão foi feita, pela primeira vez, em 1990, pela Patient Self-Determination Act (PSDA), uma lei norteamericana considera a primeira lei do mundo a tratar sobre diretivas antecipadas. Nesta, fica claro que o testamento vital é uma espécie de diretiva antecipada utilizada quando a incapacidade do paciente for resultado de uma doença fora de possibilidades terapêuticas (também nominado de doença terminal). Em contrapartida, o mandato duradouro, outro tipo de diretiva antecipada previsto na PSDA, é utilizado em caso de incapacidade permanente ou temporária, e refere-se à nomeação de um procurador de saúde, que decidirá em nome do paciente, no caso de incapacidade deste.

O estudo detalhado deste instituto provoca o questionamento da tradução literal de “living will”, pois o dicionário Oxford2 apresenta como traduções de will três substantivos, quais sejam, vontade, desejo e testamento. Por outro lado, a tradução de living pode ser o substantivo sustento, o adjetivo vivo ou o verbo vivendo. Assim, é possível perquirir se a tradução literal mais adequada seria “desejos de vida”, ou ainda “disposição de vontade de vida”, expressão que, também designa testamento – vez que este nada mais é do que uma disposição de vontade. Posto isso, torna-se questionável se, originalmente, este instituto foi realmente equiparado a um testamento ou se tal confusão foi provocada por um erro de tradução para outro idioma, que foi perpetuado.

Entretanto, testamento vital – nome pelo qual esta diretiva antecipada é conhecida no Brasil – não é a melhor denominação, vez que remete ao instituto do testamento, negócio jurídico unilateral de eficácia causa mortis, o que, de todo, não é adequado.

Testamento, na definição de Pontes de Miranda3 é o ato pelo qual a vontade de alguém é declarada para o caso de morte, com eficácia de reconhecer, transmitir ou extinguir direitos. Segundo Caio Mário da Silva Pereira4, o testamento é um negócio jurídico, unilateral, personalíssimo, gratuito, solene, revogável, com disposições patrimoniais e extrapatrimoniais e que produz efeitos post mortem.

O testamento vital se assemelha ao testamento, pois também é um negócio jurídico, ou seja, uma declaração de vontade privada destinada a produzir efeitos que o agente pretende e o direito reconhece5.Também é unilateral, personalíssimo, gratuito e revogável, todavia, distancia-se do testamento em duas características essenciais deste instituto, a produção de efeitos post mortem e a solenidade.

Assim, resta clara a inadequação da nomenclatura “testamento vital” para designar uma declaração de vontade de uma pessoa com discernimento acerca dos tratamentos aos quais não deseja ser submetida quando estiver em estado de terminalidade da vida e impossibilitada de manifestar sua vontade, por esta razão, em trabalho anterior6 propusemos que o testamento vital passe a ser denominado no Brasil de ¨declaração prévia de vontade do paciente terminal¨, proposta que vem sendo aceita pelos bioeticistas7 .

2. Declaração de vontade do paciente terminal

A declaração prévia de vontade do paciente terminal é um documento escrito por uma pessoa capaz, no pleno exercício de suas capacidades, com a finalidade de manifestar previamente sua vontade, acerca dos tratamentos e não tratamentos a que deseja ser submetido quando estiver impossibilitado de manifestar sua vontade, diante de uma situação de terminalidade.8 Apesar das legislações estrangeiras aplicarem o testamento vital a qualquer paciente, independente de situação de terminalidade, é exatamente quanto a esta situação que o documento se refere desde sua criação nos Estados Unidos. Isto porque, para a recusa de tratamentos sem que o paciente estivesse em situação de fim de vida já era possível na maior parte dos ordenamento jurídicos ocidentais através de uma simples manifestação de vontade. A problemática em torno do testamento vital é exatamente sobre a recusa de tratamentos que visam prolongar a vida, razão pela qual entendemos ser este o conceito mais correto de testamento vital.

Este documento enquadra-se no modelo denominado por Beuchamp e Childress9 de modelo da pura autonomia, vez que neste há expressa manifestação de vontade do paciente, feita enquanto capaz.

Impinge verificar que o paciente terminal deve ser tratado de modo digno, recebendo cuidados paliativos para amenizar o sofrimento, para assegurar-lhe qualidade de vida, pois o ser humano tem outras dimensões que não somente a biológica. Assim, a aceitar o critério da qualidade de vida significa estar a serviço não só da vida, mas também da pessoa10, razão pela qual alguns doutrinhadores11 afirmam que o paciente pode apenas recusar os tratamentos extraordinários, que visam apenas prolongar a vida, corroborado pelo Conselho Federal de Medicina na edição do novo CEM.

Percebe-se assim, que os dois principais objetivos da declaração prévia de vontade do paciente terminal é garantir ao paciente que seus desejos serão atendidos no momento de terminalidade da vida e proporcionar ao médico um respaldo legal para a tomada de decisões em situações conflitivas.

A declaração prévia de vontade do paciente terminal, em regra, produz efeitos erga omnes, vinculando médicos, parentes do paciente, e eventual procurador de saúde. O caráter vinculante das diretivas parece ser necessário para evitar uma perigosa ‘jurisdicionalização’ do morrer, que inevitavelmente ocorreria quando o médico se recusasse a executar as diretivas antecipadas, decisão que precluiria uma impugnação da sua decisão pelo fiduciário ou pelos familiares12.

Entretanto, a manifestação de vontade do paciente encontra limites na objeção de consciência do médico, na proibição de disposições contrárias ao ordenamento jurídico e disposições que já estejam superadas pela medicina.

3. Por que é importante falar sobre o tema?

Não há no Brasil legislação específica sobre o tema e nem uma resolução do Conselho Federal de Medicina para orientar médicos que trabalham com pacientes em situação de terminalidade. Ou seja, não obstante o novo Código de Ética Médica ter sido um grande avanço ao reconhecimento da importância da vontade do paciente para a suspensão de tratamentos fúteis, não foi suficiente para introduzir a utilização do testamento vital na prática da relação médico-paciente.

Note-se que o tema é historicamente recente no mundo, pois surgiu nos Estados Unidos em 1967, segundo Emanuel15, como uma proposta da Sociedade Americana para a Eutanásia, de um documento de cuidados antecipados, pelo qual o indivíduo poderia registrar seu desejo de interromper as invenções médicas de manutenção da vida. A Espanha legislou sobre o tema em 200216. Alemanha e Argentina legislaram sobre o tema em 2009. Em Portugal17, a lei que regulamenta as diretivas antecipadas de vontade entrou em vigor em 21 de agosto do presente ano. A Itália está em fase de forte discussão legislativa e bioética sobre a temática, contudo, frise-se que as discussões sobre o tema no Brasil são insipientes.

Não há no Brasil nenhuma associação civil que lute para implementar a declaração prévia de vontade do paciente terminal, não há nenhum projeto de lei específico sobre as diretivas antecipadas em trâmite no Congresso Nacional, o primeiro livro –e único- publicado sobre o tema no Brasil é de 2010, não existem muitos artigos científicos sobre a temática, a maior parte dos profissionais de saúde desconhece o que seja a declaração prévia de vontade do paciente terminal, a maior parte dos cartórios de notas desconhece o documento, o primeiro site especializado no assunto entrou em funcionamento em abril de 2012 e tais fatos, geram distorções sobre o tema, que necessitam ser verificadas e, posteriormente, recompostas e é isso que o presente artigo se propõe fazer. Todavia, ressalte-se que o objetivo não é esgotar o assunto, até porque, como se verá, ainda existem questões que necessitam ser estudadas com profundidade, entretanto, para que seja possível a realização destes estudos é necessário a fixação de premissas.

4. A validade da declaração prévia de vontade do paciente terminal no Brasil

Já foi dito que não existe norma específica acerca da declaração prévia de vontade do paciente terminal no Brasil, contudo, tal afirmação não gera, e não pode gerar o entendimento de que este documento seja inválido no Brasil. Isto porque uma interpretação integrativa das normas constitucionais e infraconstitucionais concede aparato para a defesa da validade da declaração prévia de vontade do paciente terminal no ordenamento jurídico brasileiro.

Os princípios constitucionais da Dignidade da Pessoa Humana (art. 1º, III) e da Autonomia (princípio implícito no art. 5º), bem como a proibição de tratamento desumano (art. 5º, III) são arcabouços suficientes para validar este documento no âmbito do direito brasileiro, vez que o objetivo deste é possibilitar ao indivíduo dispor sobre a aceitação ou recusa de tratamentos extraordinários em caso de terminalidade da vida. Por isso, se faz essencial que o direito fundamental à liberdade seja exercido da forma mais genuína possível, sem atitudes paternalistas, seja da família, do governo, de médicos ou de qualquer outra entidade intermediária. E para que isto ocorra, é necessário que se investigue a existência de um espaço exclusivo para decisões pessoais, tutelado pela Constituição Federal, imune a interferências externas políticas ou normatizável18.

Ora, a declaração prévia de vontade do paciente terminal é exatamente o exercício do direito fundamental à liberdade de forma genuína, vez que este documento nada mais é do que um espaço que o indivíduo tem para tomar decisões pessoais, personalíssimas, que são – e devem continuar a ser – imunes a interferências externas, sejam elas dos médicos, das famílias, da família ou de qualquer pessoa e/ou instituição que pretenda impor sua própria vontade, ou conforme a teoria habermasiana, seu próprio conceito de ¨vida boa¨. Em uma sociedade plural e democrática não concebe-se mais a imposição de vontades individuais vez que o papel do Estado é possibilitar a co-existência dos diferentes projetos individuais de vida.

Além da Constituição Federal, o artigo 15 do Código Civil preceitua que ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou intervenção cirúrgica e, este artigo deve ser lido à luz da Constituição, leitura esta que, segundo Ribeiro19, deve ser, [...] ninguém, nem com risco de vida, será constrangido a tratamento ou a intervenção cirúrgica, em respeito à sua autonomia, um destacado direito desta Era dos Direitos que não concebeu, contudo, um direito fundamental à imortalidade.

Assim, a declaração prévia de vontade do paciente terminal é instrumento garantidor deste dispositivo legal, vez que evita o constrangimento do paciente ser submetido a tratamentos médicos fúteis, que apenas potencializam o risco de vida, e os procedimentos médico-hospitalares sempre representam risco.

5. Testamento vital aplica-se à situações de terminalidade

Uma pesquisa recente feita pela jornalista Renata Mariz, do jornal Correio Braziliense trouxe um dado que, apesar de vago, merece ser discutido. Nesta reportagem, afirma-se que o 26o cartório de notas da cidade de São Paulo já tem 406 testamentos vitais registrados, dispondo acerca de desde o tipo de tratamento ou suporte por máquinas a ser rejeitado, no caso de doenças incuráveis em fase terminal, ao local da morte e opção de cremação20.

Todavia, esta afirmação não está tecnicamente verdadeira. Isto porque o testamento vital, ou com melhor nominamos, a declaração prévia de vontade do paciente terminal, é documento pelo qual uma pessoa dispõe acerca dos tratamentos e não tratamentos extraordinários a que deseja ser submetida caso seja diagnosticado com uma doença fora de possibilidades terapêuticas, conforme entendimento já esposado.

Declarações de vontade que dispõe sobre cremação, lugar do velório e nomeação de um procurador para cuidados de saúde não se equivalem a declaração prévia de vontade do paciente terminal. As duas primeiras são simples declaração de vontade que, nada tem a ver com situação de terminalidade, podendo ser feitas em cartório de notas21 a última, já trabalhada aqui, é a segunda espécie de diretivas antecipadas, chamada no Brasil de mandato duradouro, que, inclusive, pode fazer parte da declaração de vontade do paciente terminal e, neste caso trata-se de uma nomeação de alguém exclusivamente para decidir em casos de terminalidade do paciente.

Igualar declarações de vontade que não tratem especificamente de aceitação ou recusa de tratamentos diante de um diagnóstico de terminalidade é desnaturar o instituto. Ressalte-se, contudo, que a doutrina estrangeira admite que a declaração prévia de vontade do paciente terminal possa conter disposição de acerca de doação de órgãos. Aqui é preciso entender que cada país possui legislação própria acerca deste tema e estas se diferem da legislação brasileira pois nos países que já legislaram sobre diretivas antecipadas a doação de órgãos é uma decisão personalíssima, que independe da vontade da família, realidade diferente da brasileira.

Assim, no Brasil, a inserção de disposições sobre doação de órgãos no testamento vital desnaturam o instituto até porque a declaração prévia de vontade do paciente terminal é, por essência, negócio jurídico, com efeito, inter vivos, cujo principal objeto é garantir a autonomia do sujeito quanto aos tratamentos a que este será submetido em caso de terminalidade da vida.

6. O problema do estado vegetativo persistente

A análise histórica da declaração prévia de vontade do paciente terminal demonstra que o instituto é aplicado apenas em caso de terminalidade, o que afasta a aplicação para os casos de estado vegetativo persistente (EVP).

Paciente terminal é aquele cuja condição é irreversível, independente de ser tratado ou não, e que apresenta uma alta probabilidade de morrer num período relativamente curto de tempo22, enquanto o EVP é aquele em que os pacientes mantém suas funções cardiovasculares, respiratórias, renais, termorreguladoras e endócrinas, assim como alternam sono e vigília, mas não mostram nenhum contato com o meio externo e nenhuma atividade voluntária23. Ou seja, no EVP o paciente é mantido vivo por suporte vital considerado como toda intervenção medica, técnica, procedimento ou medicação que se administra a um paciente para atrasar o momento da morte, esteja ou não dito tratamento dirigido à enfermidade de base ou ao processo biológico causal24.

Percebe-se que, enquanto na terminalidade a divisão entre cuidados paliativos e tratamentos extraordinários é bem demarcada, no EVP tal afirmativa não prospera. É consenso a necessidade de se aferir in concreto quando determinado tratamento torna-se fútil, a doutrina estudada aponta a internação em Unidades de Tratamento Intensivo (UTI), a traqueostomia, a ventilação mecânica, a oxigenação extracorpórea, técnicas de circulação assistida, tratamentos medicamentosos com drogas vasoativas, antibióticos, diuréticas, derivados sanguíneos, etc, como tratamentos que, via de regra, são considerados fúteis em pacientes terminais.

Entretanto, a possibilidade de a declaração previa de vontade do paciente terminal conter disposições que se referem à suspensão de hidratação e nutrição artificiais ainda são consenso na doutrina estrangeira. Isto porque a suspensão destes suportes, tidos como vitais, são vistos por muitos, como Pessini25, por seu ¨significado simbólico¨, o que significa dizer que, apesar de haver estudos que comprovam que, em determinados quadros clínicos determinados quadros clínicos o paciente não absorve de forma satisfatória a hidratação e a nutrição, o caráter simbólico refere-se ao cuidado com a família, cuidado este que faz parte da filosofia dos cuidados paliativos, que, muitas vezes diante da suspensão destes recursos vitais sofre por achar que seu ente querido morreu de fome e sede.

Saliente-se que esse problema é muito mais claro quando se fala em pacientes em EVP, pois neste caso, o paciente já não é submetido a nenhum tratamento extraordinário, mas continua em EVP, portanto, a única solução para abreviar a morte é a suspensão de hidratação e alimentação artificiais, situação que para muitos é classificada de eutanásia, prática proibida pelo ordenamento jurídico brasileiro. Penalva e Teixeira26 afirmam que neste ponto, o jurídico se mistura com o bioético, pois, em virtude da filosofia dos cuidados paliativos, que visa o bem estar do paciente e de suas famílias, a suspensão destes suportes vitais ainda encontra grande resistência entre os profissionais de saúde. Significa dizer que, com base nestes cuidados, o testamento vital seria inócuo para os casos de EVP, pois não se admite a suspensão dos únicos tratamentos que mantém o paciente vivo.

Verifica-se assim, a necessidade de maiores estudos acerca da classificação da suspensão dos suportes vitais como cuidados paliativos ou tratamentos fúteis, vez que tal classificação é a pedra de torque nas discussões acerca da declaração prévia de vontade do paciente terminal. Parece, a priori, que a solução para o problema é relativizar o entendimento de que os suportes vitais são, sempre, classificados como cuidados paliativos, contudo, frise-se que este entendimento é apriorístico, sendo necessários estudos sobre o tema, preferencialmente estudos quantitativos.

7. Considerações finais

O novo Código de Ética Médica brasileiro deixou claro que o médico deve respeitar a vontade expressa do paciente, vontade esta que deve ser instrumentalizada através de um documento chamado declaração prévia de vontade do paciente terminal, também conhecido, erroneamente, por testamento vital. Contudo, até o presente momento não existe qualquer regulamentação sobre o tema no Brasil, seja no âmbito jurídico, seja no âmbito do Conselho Federal de Medicina e esta falta de regulamentação gera uma insegurança aos indivíduos que querem deixar sua vontade expressa e aos médicos que, diante de um caso concreto, veem-se diante de um conflito entre a vontade de diferentes familiares, por exemplo.

Em verdade, a relação médico-paciente, diante de situações de terminalidade está carente de proteção. É necessário garantir ao paciente que seus desejos, expressão máxima do direito à liberdade, serão seguidos em um momento em que ele não mais puder exprimi-los com discernimento e é necessário garantir ao médico que ele não sofrerá qualquer retaliação, seja no âmbito de sua entidade de classe, seja no âmbito jurídico, ao seguir expressamente a vontade do paciente. Para tanto, torna-se imperioso que as discussões acerca da declaração prévia de vontade do paciente terminal ocorram de forma efetiva, criteriosa e científica. Deve-se tomar cuidado para que a confusão conceitual que existe hoje no Brasil, em muito decorrente da pouca bibliografia brasileira sobre o tema, não esvazie a seriedade do assunto e mais, para que a instrumentalização da vontade do paciente não se torne um contrato de adesão como a maioria dos termos de consentimento informado se tornaram após a legalização.

Isto posto, é imperioso que a discussão avance, especificamente, acerca da necessidade de que o paciente seja auxiliado por um médico na feitura do documento, vez que o paciente, como leigo, não possui condições técnicas de redigir de forma pormenorizada acerca da recusa de tratamentos. Ademais, é preciso que este documento seja registrado em cartório de notas, para garantir a segurança jurídica. E, afim de garantir que o paciente o os profissionais de saúde tenham acesso ao testamento vital, impõe-se a necessidade de um registro nacional de testamentos vitais, nos moldes do que aconteceu na Espanha e em Portugal.

No que tange à aplicação do testamento vital aos paciente em EVP, torna-se necessário o entendimento de que a cessação de suportes vitais para estes não configura prática de eutanásia, contudo, como já foi afirmado, este entendimento é apriorístico, sendo necessários estudos médicos contundentes que comprovem essa situação.


Referências

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Fecha de recepción: 8 de mayo de 2012

Fecha de aceptación: 15 de enero de 2013