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X Coloquio Internacional de Geocrítica

DIEZ AÑOS DE CAMBIOS EN EL MUNDO, EN LA GEOGRAFÍA Y EN LAS CIENCIAS SOCIALES, 1999-2008

Barcelona, 26 - 30 de mayo de 2008
Universidad de Barcelona

MANEJO SUSTENTÁVEL DE RECURSOS NATURAIS: O PROGRAMA DE MICROBACIAS
HIDROGRÁFICAS NA REGIÃO DE PRESIDENTE PRUDENTE - SÃO PAULO - BRASIL
[1]

Antonio Nivaldo Hespanhol
Docente da FCT-UNESP  Presidente Prudente
 nivaldo@fct.unesp.br


Manejo sustentável de recursos naturais: O programa de microbacias hidrográficas na região de Presidente Prudente - São Paulo – Brasil (Resumo)

A ocupação predatória, o uso indiscriminado de insumos químicos e o manejo inadequado dos solos e das águas resultaram na degradação dos recursos naturais do Estado de São Paulo. Com o intuito de reverter o quadro de degradação do meio ambiente, o governo do Estado de São Paulo, no ano de 1994, solicitou recursos para financiar o Programa de Microbacias Hidrográficas e deu início às suas ações no ano de 1997. A aprovação do financiamento ao referido programa pelo Banco Mundial ocorreu somente em 1999 e os recursos foram liberados a partir de 2000, sendo que a primeira edição do programa foi concluída em novembro de 2007. O programa de microbacias apresentou bons resultados ambientais e sociais, apesar dos problemas decorrentes da falta de familiaridade dos técnicos extensionistas com o programa, do excesso de burocracia e da baixa consciência ambiental de parte expressiva dos produtores rurais.

Palavras-chave: Programa de Microbacias Hidrográficas, Desenvolvimento Rural Sustentável, Recursos Naturais, Agricultores.


Maintainable handle of natural resources: hydrographic microbassins program in the region of Presidente Prudente - São Paulo – Brazil (Abstract)

The predatory occupation, the indiscriminate use of chemical inputs and the soil and the water inadequate handling resulted in the natural resources degradation in São Paulo State. In 1994 the government of São Paulo State, with the intention of changing the picture of the environment degradation, requested resources to finance the Hydrographic microbasins Program which started acting in 1997. The approval of the financing to this program for World Bank only happened in 1999 and the resources were liberated starting from 2000, but the first edition of the program was concluded in November of 2007. The microbasins program presented good environmental and social results, in spite of the current problems of the extensionists’ lack of familiarity with the program; the excess of bureaucracy and the little environmental conscience of a meaningful part of the rural producers.

Key words: Hydrographic Basins Program, Maintainable Rural Development, Natural resources, Farming.


A pesquisa teve como objetivo principal analisar o papel do Programa Estadual de Microbacias Hidrográficas na promoção do manejo sustentável dos recursos naturais no Estado de São Paulo, com ênfase na área de jurisdição do Escritório Regional de Desenvolvimento de Presidente Prudente, que é constituído por 21 municípios.

A análise foi empreendida com base em dados e informações obtidos por meio de levantamento documental e bibliográfico, bem como da realização de entrevistas com dirigentes do Escritório de Desenvolvimento Rural (EDR) de Presidente Prudente e com técnicos executores de projetos de microbacias hidrográficas nos municípios de Santo Anastácio, Álvares Machado, Regente Feijó e Martinópolis.

O manejo dos recursos naturais em São Paulo: da ocupação predatória à revolução verde

A ocupação predatória e a adoção de sistemas de produção agrícolas rudimentares provocaram a devastação de florestas, a erosão dos solos e a perda de potencial hídrico em praticamente todo o território paulista.

Na porção oeste do Estado de São Paulo, inclusive na Região de Presidente Prudente, onde predominam solos arenosos e topografia levemente ondulada, a combinação destas duas características com a progressiva substituição da vegetação natural pelas lavouras temporárias comprometeu a qualidade dos solos e da água, em decorrência da intensificação dos processos erosivos e do assoreamento de cursos d´água.

Monbeig (1984, p. 302), ao escrever sobre o Oeste Paulista na década de 1940, observa que “destruir floresta virgem para, em seu lugar, instalar campos artificiais, eis o traço mais original e mais recente do movimento pioneiro nos planaltos ocidentais de São Paulo.”

Monbeig (1984) enfatiza que

Se se tentar estabelecer o balanço da marcha pioneira, nos planaltos ocidentais de São Paulo e do norte do Paraná ressaltará a obra destruidora dos pioneiros: destruição da mata e, com isso, destruição da terra. A mola propulsora da marcha para o oeste reside no tenaz desejo do ganho. Para satisfazê-lo, são necessárias abundantes colheitas de produtos que se exportam e se vendem no ultramar. Impôs a economia do mundo pioneiro uma técnica agrícola devastadora àqueles homens por demais apressados (Monbeig, 1984, p. 390).

Nos anos 1960, as alterações na base técnica da agropecuária paulista e brasileira ganharam expressividade por meio da incorporação do padrão tecnológico veiculado pela chamada Revolução Verde. Muitas indústrias vinculadas à agropecuária se implantaram no país ao longo dos anos 1960 e 1970, principalmente em São Paulo e nos estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, em razão dos estímulos oferecidos pelo poder público.

O grande volume de recursos públicos alocado no fomento à modernização da agricultura, ao mesmo tempo em que propiciou alterações na sua base técnica, provocou a ampliação do nível de concentração fundiária, a liberação de mão-de-obra do campo e a intensificação do êxodo rural, além de agravar os problemas ambientais.

O modelo de modernização da agricultura consubstanciado no estímulo à expansão de técnicas veiculadas pelo pacote tecnológico da “revolução verde” foi duramente atingido nos anos 1980, em decorrência da crise fiscal do Estado brasileiro. Os recursos destinados ao financiamento da produção agropecuária, às agroindústrias e às cooperativas foram reduzidos e a correção monetária passou a incidir sobre os empréstimos, o que provocou a elevação nas taxas de juros sobre o crédito rural oficial.

Simultaneamente à crise econômica dos anos 1980, ampliou-se no país o nível de conscientização relativos aos graves problemas ambientais provocados pela agricultura moderna. A intensificação dos processos erosivos, o assoreamento de cursos d´água, a redução da biodiversidade, a grande dependência da aplicação de fertilizantes químicos nas lavouras e a contaminação de mananciais, alimentos e pessoas em decorrência do uso indiscriminado de agrotóxicos, passaram a suscitar questionamentos sobre a chamada agricultura moderna (Ehlers, 1999).

A partir do início dos anos 1980 foram instituídas ações, em alguns estados da federação, com o intuito de combater os graves problemas ambientais gerados e/ou agravados pela agricultura moderna. Tais ações passaram a ser implementadas nas áreas em que a erosão dos solos, a perda do potencial hídrico e a contaminação das pessoas, do solo e da água, atingiram patamares preocupantes, comprometendo a capacidade produtiva dos solos, com repercussões negativas nos níveis de produtividade das lavouras e, conseqüentemente, sobre a renda dos agricultores.

O Estado do Paraná foi o pioneiro no combate à degradação dos recursos naturais, passando a empregar sistemas agrícolas menos impactantes do que aqueles derivados da “Revolução Verde”, por meio da instituição do Programa de Microbacias Hidrográficas. Os Estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul lançaram os seus programas de microbacias hidrográficas com o mesmo intuito. Tais iniciativas foram tomadas nos três estados sulinos, bem antes do que no Estado de São Paulo, conforme salienta Abramovay (2004).

Princípios gerais e estratégias de ação dos programas de microbacias hidrográficas

As microbacias hidrográficas compreendem superfícies que variam de 700 a 10 mil hectares. São áreas situadas entre os fundos de vale e os espigões divisores de água. A microbacia é

(...) uma área geográfica de captação de água, composta por pequenos canais de confluência e delimitada por divisores naturais, considerando-se a menor unidade territorial capaz de enfocar as variáveis ambientais de forma sistêmica (Sabanés, 2003, p. 79).

Para Bragagnolo e Pan (2001, p. 184), “quando se trabalha nesta escala os resultados são mais rápidos e evidentes, pois há maior visualização dos problemas e participação da comunidade e do município na solução e equacionamento das questões ambientais”.

O programa de microbacias hidrográficas paranaense foi pioneiro e tem sido apontado como a experiência mais bem sucedida no país (Freisfresser, 1999).

Bragagnolo e Pan (2001), ao analisarem o caso do Estado do Paraná, enfatizam que a erosão hídrica e a poluição dos mananciais têm como causas principais a ocupação fundiária, o uso e o preparo inadequados dos solos. A ocupação predatória e sem planejamento adequado, deu origem a lotes estreitos, distribuídos no sentido da pendente, os quais possuem linhas divisórias rígidas que desconsideram o comportamento hídrico e não permitem a realização de operações agrícolas em nível (Bragagnolo; Pan, 2001).

De acordo com os mesmos autores, a locação das estradas rurais normalmente foi feita sem considerar o comportamento hídrico, transformando-as em canais escoadouros de águas e de sedimentos, o que tem agravado os problemas erosivos e provocado o assoreamento de córregos e rios.

A ocupação fundiária sem os devidos cuidados técnicos e o manejo inadequado dos recursos naturais ocorreu, com maior ou menor intensidade, em praticamente todo o país, inclusive no Estado de São Paulo.

Nas estratégias técnicas dos programas de microbacias hidrográficas, além da execução de terraços, da recomposição de matas ciliares e do cercamento das áreas de preservação permanentes (APPs), se procura aumentar a cobertura vegetal dos solos, ampliar a infiltração de água no perfil do solo, diminuir o escorrimento superficial e controlar a poluição das águas e dos solos (Bragagnolo; Pan, 2001)

O planejamento é feito no âmbito da microbacia hidrográfica e da propriedade rural, respeitando-se a dinâmica da natureza. Para tanto, as divisas entre propriedades rurais, estradas e cercas não podem impedir a execução dos trabalhos (Bragagnolo; Pan, 2001).

Normalmente é elaborado um plano da microbacia como um todo e planos individuais referentes a cada uma das propriedades rurais da microbacia.

Os problemas, diretrizes, estratégias e planos de ação dos diferentes programas de microbacias são parecidos. A forma, o ritmo e a operacionalização das ações dependem da estrutura, da dimensão, do perfil dos recursos humanos disponíveis e do envolvimento dos beneficiários diretos, ou seja, dos produtores rurais e de suas organizações.

O Programa de microbacias hidrográficas no Estado de São Paulo

A Microbacia Hidrográfica foi instituída como unidade de planejamento e intervenção no Estado de São Paulo, por meio do Decreto nº 27.329 datado de 03 de setembro de 1987, sendo, no mesmo ano, instituído o Programa de Microbacias Hidrográficas com o objetivo de conservar os recursos naturais e promover a organização dos produtores rurais.

Entre os anos de 1987 e 1999 o programa foi executado com recursos do Governo Estadual e as suas ações se restringiram à conservação dos solos por meio da construção de terraços e a adequação de estradas rurais. Tais ações foram realizadas pela Companhia de Desenvolvimento Agrícola do Estado de São Paulo (CODASP).

No ano de 1994, a Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (CATI) solicitou recursos ao Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD) para o financiamento do programa de microbacias. No ano de 1998 as ações do programa foram intensificadas, sendo para tanto alocados recursos do orçamento do Estado de São Paulo para a “capacitação do público operacional e à discussão, com os municípios, das questões relacionadas à pobreza e degradação ambiental no meio rural” (Fontes, 2006, p. 209).

O processo de solicitação de recursos ao BIRD para o financiamento do Programa de Microbacias Hidrográficas paulista tramitou durante cinco anos e, após reformulações, a liberação dos recursos foi aprovada no final do ano de 1999, para a sua aplicação no período compreendido entre os anos de 2000 e 2006.

A gestão do programa em âmbito estadual ficou a cargo da CATI em Campinas e dos seus quarenta Escritórios de Desenvolvimento Rural (EDRs) distribuídos em todo o território paulista. A execução dos projetos de microbacias hidrográficas foi realizada em parceria com os municípios.

No Estado de São Paulo, a área média das microbacias é de 3.000 hectares, abrangendo, em média, 60 propriedades rurais. Primeiramente é elaborado o Plano da Microbacia Hidrográfica e, posteriormente, são elaborados os Projetos Individuais de Propriedade (PIPs). No Plano da Microbacia são definidas as ações necessárias para o conjunto da sua área de abrangência e nos PIPs são indicadas as ações a serem implementadas em cada uma das propriedades localizadas na microbacia.

A CATI estabeleceu como metas abranger 4,5 milhões de hectares, executar 1.500 projetos de microbacias e atender  90.000 produtores rurais (30 por cento do total do estado) entre os anos de 2000 e 2006, período de vigência do financiamento concedido pelo BIRD. O orçamento do programa para o referido período foi de US$ 124.740.200,00, dos quais US$ 69.392.000,00 foram financiados pelo BIRD e US$ 55.392.000,00 se constituíram contrapartida do governo estadual.

As regiões agrícolas do Estado de São Paulo foram classificadas em três níveis de prioridade para a implementação do programa, considerando-se a susceptibilidade à erosão, a proporção de pequenos produtores rurais e o índice de pobreza dos municípios com base em dados fornecidos pelo Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA) (World Bank, 1997).

Foram estabelecidos os seguintes objetivos para o programa de microbacias hidrográficas paulista:

(...) amenizar e reverter o quadro de degradação do meio ambiente, promovendo técnicas preservacionistas e metodologias que produzam menor impacto sobre os nossos recursos naturais. Ao mesmo tempo, o programa objetiva organizar as comunidades de pequenos produtores, desenvolvendo estratégias que promovam a melhoria do padrão de vida e amenizem o quadro de indigência e marginalização em que convivem atualmente. (Cati, 2000, p. 1)

Os produtores rurais das microbacias hidrográficas, contemplados pelo programa, foram classificados, de acordo com os seguintes critérios:

a) Pequeno (PP) –  área total explorada até 50 ha. e 70 por cento ou mais da renda familiar proveniente da agropecuária e residir na propriedade ou no município onde está localizada a propriedade ou em município vizinho;

b) Médio (MP) – área total explorada maior que 50 ha. até 200 ha. ou área total explorada menor ou igual a 50 ha. e que não atende aos critérios de fonte de renda e/ou local de residência, necessários para a classificação como pequeno produtor;

c) Grande (GP) – área explorada maior que 200 ha. (SEAB – Resolução SAA nº 17 de 11 de julho de 2005, p. 3).

Os níveis de subvenção concedidos aos produtores rurais para a execução de serviços nas suas propriedades, implantação de benfeitorias e aquisição de equipamentos coletivos foram estabelecidos considerando a referida classificação dos produtores. As subvenções foram concedidas com o intuito de adaptar os sistemas de agrícolas aos princípios do programa, sendo exigida menor contrapartida financeira dos pequenos proprietários do que dos médios e grandes.

Por meio do programa, os produtores rurais das microbacias selecionadas puderam pleitear, até o limite de US$ 3.000,00, os seguintes benefícios: aquisição de semente para adubação verde; compra de materiais para a construção de cercas destinadas à proteção de APPs e ao isolamento de voçorocas; pagamento de mão-de-obra para o cercamento de mananciais; controle de erosão; aquisição de calcário e de sistemas de divisão de pastagens (kit para cerca elétrica e bebedouro); e,  construção de fossas sépticas biodigestoras.

Para cada tipo de benefício foi estabelecido um teto máximo e um valor de referência, bem como um limite máximo para a concessão do apoio financeiro, sendo definida a proporção a ser ressarcida ao agricultor pelo programa.

Além dos incentivos limitados a US$ 3.000,00 por beneficiário e com ressarcimento de 80 a 90 por cento aos pequenos produtores e entre 60 e 90 por cento aos médios produtores, cada propriedade incluída no programa foi credenciada a receber até 5.000 mil mudas de árvores para o plantio nas áreas de APPs e o produtor, após um ano, foi remunerado em US$ 0,17 por muda desenvolvida, considerando o limite de 10.000 mudas.

O programa de microbacias também concedeu incentivos financeiros para a construção de abastecedouros comunitários, a aquisição de escarificador, subsolador, distribuidor de calcário, roçadeira e semeadeira de plantio direto por grupos informais de no mínimo três ou de cinco agricultores das microbacias selecionadas, dependendo do equipamento. O ressarcimento do valor aplicado, considerando o teto máximo estabelecido foi de 80 por cento aos grupos com mais de 60 por cento de pequenos produtores e de 60 por cento aos grupos com menos de 60 por cento de pequenos produtores (CATI, 2005).

No âmbito das microbacias, ou seja, nas áreas comuns (públicas), foram realizadas a adaptação de estradas rurais e o controle de voçorocas e às associações de produtores rurais foram doados equipamentos de informática com recursos do programa.

Em razão de inúmeros problemas operacionais e de empecilhos burocráticos, houve atraso na execução do programa e o cronograma de desembolso dos recursos do BIRD para o programa foi protelado inicialmente até o mês de julho de 2007 e, posteriormente, até novembro de 2007, quando foi efetivamente fechada a fase parcialmente financiada pela referida instituição.

A Cati, nos primeiros anos de vigência do financiamento concedido pelo BIRD, ainda não havia adaptado a sua cultura institucional para gerir um programa desta envergadura e natureza, o que acabou retardando a execução das ações do programa. A excessiva burocracia exigida pela própria natureza do programa também retardou a sua implantação.

Até o ano de 2005 poucos investimentos foram realizados no âmbito do programa de microbacias e os produtores rurais enfrentaram muitas dificuldades para terem acesso aos incentivos nele previstos, o que comprometeu a sua credibilidade frente aos agricultores, autoridades municipais e aos próprios técnicos executores.

Até 31 de dezembro de 2005, apenas 31,77 por cento dos US$ 124.740.200,00 previstos para o programa tinham sido gastos, e até 31 de dezembro de 2004 apenas 17,50 por cento haviam sido consumidos. (Raschiatore; Moreira, 2006, p. 522-523).

Além da reduzida aplicação dos recursos disponíveis, outro problema enfrentado pelo programa esteve associado à valorização da moeda nacional (real) frente a moeda americana (dólar). Com isso, os valores de referência estabelecidos para o programa não eram suficientes para cobrir as despesas com produtos e serviços por ele incentivados, o que desencorajava os produtores rurais a fazerem uso dos recursos.

No mês de agosto de 2007 foi elevado em 25 por cento o valor, em dólar, referente ao limite máximo que poderia ser destinado a cada produtor rural das microbacias. O referido valor passou de US$ 3.000,00 para US$ 3.750,00. Os demais valores de referência dos produtos e serviços também foram reajustados em 25 por cento, com o intuito de aproximar a tabela do programa da realidade do mercado e, assim, encorajar os produtores rurais das microbacias a usufruírem dos benefícios financeiros disponibilizados pelo programa.

A Secretaria de Estado da Agricultura e do Abastecimento do Estado de São Paulo por intermédio da CATI aprovou 961 planos de ação em microbacias hidrográficas distribuídos em 518 municípios paulistas, atingindo 3.288.863 hectares e 69.620 famílias. Verifica-se, assim, que as metas estabelecidas para o período de vigência do financiamento do BIRD não foram plenamente atingidas em termos de número de microbacias, de área de cobertura e de número de produtores atendidos.

De acordo com o gerente estadual do programa de microbacias, Engenheiro Agrônomo José Luiz Fontes, o programa de microbacias estimulou a criação de cerca de 400 associações de agricultores; recuperou 1.232 quilômetros de estradas; distribuiu e plantou 3,2 milhões de mudas de árvores nativas em 1,3 mil hectares. Além disso, o programa incentivou o controle da erosão do solo, a calagem, a construção de cercas para proteção de mananciais, a aquisição de equipamentos por grupos de produtores, a cessão às associações de produtores rurais de equipamentos para plantio direto, a construção de abastecedouros comunitários e de fossas sépticas biodigestoras.

O programa de microbacias hidrográficas na região agrícola de Presidente Prudente

A Região Agrícola de Presidente Prudente, constituída por 21 municípios, foi classificada como zona prioritária 1 para a implantação do Programa de Microbacias Hidrográficas, juntamente com outras 20 regiões situadas no Oeste e Sudoeste do Estado de São Paulo. Tal classificação se deu em razão da elevada susceptibilidade à erosão, do intenso nível de degradação dos recursos naturais e dos elevados índices de pobreza da população rural.

Na Região de Presidente Prudente, até o mês de novembro de 2007, quando se encerrou o financiamento do BIRD, foram implantados 57 projetos de microbacias hidrográficas, os quais foram desigualmente distribuídos entre os municípios da área de jurisdição do respectivo EDR. Dentre os 21 municípios, apenas cinco implantaram quatro projetos de microbacias (Álvares Machado, Pirapozinho, Presidente Prudente, Rancharia e Santo Expedito), seis implantaram três projetos (Alfredo Marcondes, Anhumas, Indiana, Martinópolis, Narandiba e Regente Feijó), nove implantaram dois projetos (Caiabu, Emilianópolis, Estrela do Norte, Iepê, João Ramalho, Nantes, Presidente Bernardes, Sandovalina e Tarabai) e no município de Taciba foi implantado apenas um projeto, de acordo com os dados levantados no EDR de Presidente Prudente.

Na referida região foram elaborados 2.154 Projetos Individuais de Propriedade (PIPs) entre as 3.891 propriedades abrangidas pelos 57 projetos de microbacias, o que representa apenas 55,4 por cento. Na verdade, muitos projetos ainda estão em fase de implementação, apesar do financiamento do BIRD ter se encerrado no mês de novembro de 2007. A CATI, no entanto, vem dando continuidade aos projetos com recursos do governo do Estado de São Paulo e não pretende paralisar as ações do programa.

A receptividade aos projetos de microbacias na Região Agrícola de Presidente Prudente tem sido bastante diferenciada e está associada ao perfil das comunidades atendidas e ao envolvimento, compromisso e condições de trabalho dos técnicos executores dos projetos. Os técnicos executores têm sido contratados pelas prefeituras municipais por período não superior a dois anos, o que tem gerado problemas relacionados à elevada rotatividade dos referidos profissionais e a conseqüente quebra de vínculo entre os técnicos executores e produtores rurais das microbacias.

De acordo com os técnicos executores entrevistados nos municípios de Álvares Machado, Regente Feijó, Martinópolis e Santo Anastácio, os agricultores têm dificuldades para entender plenamente os princípios e objetivos do programa de microbacias, tendendo a considerá-lo somente na perspectiva da obtenção dos incentivos financeiros, não reconhecendo a sua importância na recuperação da qualidade ambiental e estabelecimento de técnicas adequadas de manejo dos recursos naturais. De certa forma, alguns técnicos ao enfatizarem as possibilidades de acesso dos agricultores aos recursos financeiros do programa acabam induzindo-os a terem apenas esta percepção do programa. Apesar dos treinamentos dados pela CATI, alguns técnicos têm dificuldades para trabalhar dentro da lógica participativa do programa e acabam, eles próprios, não tendo uma visão ampla do programa.

O cercamento de APPs que se constitui numa das primeiras ações do programa, representa para muitos pequenos agricultores a perda da possibilidade de cultivar numa das áreas mais férteis das propriedades, o que tem causado o seu descontentamento, pois muitos não consideram justo terem que arcar com o ônus financeiro causado pela preservação ambiental, pois ela favorece a sociedade como um todo.

Na Região de Presidente Prudente apenas 270 beneficiários do programa utilizaram incentivos para a implantação de cerca nas APPs e somente 149 plantaram mudas de vegetação nativa nas referidas áreas, o que representa menos de 10 por cento do número de propriedades abrangidas pelos projetos de microbacias.

A burocracia para a concessão dos incentivos, que é própria de órgãos públicos, causou e ainda tem causado descrédito e desânimo dos beneficiários. Mesmo assim na Região de Presidente Prudente 183 proprietários rurais receberam incentivos para efetuar o controle de erosão, 18 adquiriram o kit pastagem, 38 adquiriram calcário e foram construídas fossas sépticas em 45 propriedades rurais.

Foram constituídos grupos informais de produtores rurais para a aquisição de máquinas em 10 municípios (Álvares Machado, Iepê, João Ramalho, Martinópolis, Nantes, Rancharia, Regente Feijó, Pirapozinho, Sandovalina e Santo Expedito), sendo adquiridos, no total, 335 máquinas e implementos.

Por meio do programa foram doados 48 equipamentos de informática para associações de produtores rurais situadas em 10 municípios da região agrícola de Presidente Prudente (Alfredo Marcondes, Álvares Machado, Caiabu, Indiana, Martinópolis, Narandiba, Pirapozinho, Rancharia, Regente Feijó e Santo Expedito), 13 estradas rurais foram adaptadas, totalizando 40,82 quilômetros e efetuado o controle de 87 voçorocas.

A adaptação de estradas rurais se constitui num dos aspectos que mais contribui para que os municípios se interessem pela execução dos projetos de microbacias hidrográficas, de acordo com Freischfresser (1999), Bragagnolo; Pan (2001) e Navarro (2001). Após a adaptação das estradas, elas requererem menos manutenção, tarefa que, normalmente, é de incumbência das administrações municipais e implica em elevados custos financeiros, além de provocar grandes desgastes políticos.

No caso do Estado de São Paulo, a adaptação de estradas rurais tem sido feita no âmbito dos projetos de microbacias e também por meio do Programa Melhor Caminho que é executado pela CODASP, a partir de convênio celebrado entre o governo estadual e os municípios.

Avanços e problemas enfrentados pelo programa de microbacias hidrográfica

Os resultados das ações do programa de microbacias hidrográficas têm sido muito variáveis em todo o Estado de São Paulo e, mesmo em cada uma das regiões agrícolas, sendo que o maior ou menor êxito dependeu basicamente do interesse e empenho das autoridades municipais, da atuação dos técnicos executores e do envolvimento e nível de organização dos produtores rurais.

A municipalização da agricultura paulista desencadeada nos anos 1990 provocou o esvaziamento da estrutura anteriormente existente nos Escritórios Regionais de Desenvolvimento Rural (EDRs) vinculados à CATI. Assim, a execução do programa de microbacias ficou na dependência dos técnicos contratados temporariamente pelos municípios. Tais técnicos, muitas vezes, além do trabalho nas microbacias, são incumbidos de outras atividades, o que gerou e Ainda tem gerado, porém em menor proporção, sérios problemas na execução dos projetos, em razão da descontinuidade das ações.

Outro elemento importante para o bom andamento dos projetos de microbacias é a sua gestão participativa, tanto dos beneficiários diretos, quanto das associações e conselhos municipais e regionais de desenvolvimento rural.

Neste aspecto reside um dos maiores problemas do programa e isto não se deve À falta de canais ou de estímulo da CATI para que haja a participação, mas sim à falta de interesse geral e, em conseqüência, a fraqueza e inoperância especialmente dos Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural (CMDRs) e dos Conselhos Regionais de Desenvolvimento Rural (CRDRs).

Embora os CMDRs e CRDRs estejam constituídos, sendo esta uma das exigências para a aprovação dos projetos de microbacias hidrográficas nos municípios interessados, a existência dos mesmos, em muitos casos é apenas formal (Hespanhol e Hespanhol, 2004).

Os conselhos se constituem em instâncias e, em geral, não participam da escolha e da gestão dos projetos, apenas dão o seu aval quando a burocracia do programa requer.

Outro elemento que tem dificultado a execução dos projetos de microbacias é a falta de confiança dos beneficiários no poder público. A lentidão das ações na esfera pública, diante da urgência e da gravidade dos problemas ambientais, também faz com que os produtores rurais tenham resistências ao programa, pois muitos não o conhecem e não confiam na seriedade com que é executado.

O programa de microbacias, apesar das suas limitações, teve êxitos apreciáveis e suas ações têm sido muito positivas, especialmente no que diz respeito à adaptação de estradas rurais, reconstituição de mata ciliar e cercamento de APPs, controle da erosão e ao estímulo para a constituição e fortalecimento das associações de produtores rurais.

Considerações finais

O Programa de Microbacias Hidrográficas do Estado de São Paulo demorou em deslanchar por causa da cultura institucional da CATI e do excesso de burocracia. O programa propiciou o acumulo de conhecimento da realidade pelos técnicos da CATI e provocou significativas mudanças qualitativas na extensão rural no Estado de São Paulo.

Os preceitos técnicos do programa no que diz respeito ao manejo de recursos naturais, especialmente dos solos e das águas, são muito avançados e adequados, apesar de dispendiosos, dado o elevado grau de degradação provocado pela ocupação predatória e exploração agrícola com emprego de técnicas inapropriadas e imediatistas.

No Estado de São Paulo, inclusive na região de Presidente Prudente, o Programa de Microbacias Hidrográficas tem atuado principalmente em áreas em que predominam pequenas propriedades rurais, nas quais tem procurado proteger e plantar mudas de árvores nas áreas de preservação permanente (APPs), combater erosões e estimular a adoção de sistemas de produção compatíveis com os recursos naturais, humanos e econômicos disponíveis.

Apesar das suas limitações, especialmente no que concerne à agilidade da operacionalização das ações do programa e à participação qualificada dos atores sociais, especialmente dos CMDRs e CRDRs, o programa tem avançado e trazido benefícios ambientais, contribuído para ampliar o nível de organização social e econômica das comunidades rurais e resgatado a auto-estima dos pequenos produtores.

Na Região Agrícola de Presidente Prudente, onde predominam solos desgastados e a erosão e o assoreamentos dos cursos d´água atingem vastas áreas, o programa tem apresentado bons resultados, embora eles pudessem ser melhores se realmente houvesse interesse das autoridades municipais em fortalecer a parceria com a CATI para ampliar suas ações no âmbito regional.

O governo paulista está em negociação com o BIRD para o financiamento do Programa de Microbacias no período 2008 a 2012 (Programa de Desenvolvimento Rural Sustentável - PEMH II) e para tanto tem centrado o foco sobre a necessidade de promover a geração de renda nas pequenas propriedades rurais a partir da ação do programa.

O governo do Estado de São Paulo, por meio do Secretário da Agricultura, tem demonstrado interesse em dar prosseguimento ao programa de microbacias hidrográficas, tanto que mesmo com a conclusão da fase parcialmente financiada pelo BIRD em novembro de 2007, deu continuidade aos projetos com recursos do próprio tesouro estadual.

Na Região Agrícola de Presidente Prudente, o programa de microbacias hidrográficas é de extrema importância para a recuperação da qualidade ambiental, para o resgate da cidadania e para a orientação dos pequenos produtores rurais na exploração dos recursos naturais disponíveis.

Os problemas vão sendo superados e, com o tempo, técnicos, políticos e agricultores, na medida em que conhecem os bons resultados do programa começam a entendê-lo, a valorizá-lo e, em conseqüência, a fortalecê-lo.

 

Notas

[1] A pesquisa vem sendo financiada pelo Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq). A Fundação para o Desenvolvimento da UNESP (FUNDUNESP) concedeu recursos para a participação no X Colóquio Internacional de Geocrítica.

 

Referéncias

ABRAMOVAY Ricardo. Organização rural e capacitação dos atores. Nota técnica – Relatório Final, CATI, São Paulo, 2004.

BRAGAGNOLO, Nestor; Pan, Waldir. A experiência de programas de manejo e conservação dos recursos naturais em microbacias hidrográficas: uma contribuição para o gerenciamento dos recursos hídricos, Curitiba: IPARDES, 2001.

COORDENADORIA DE ASSISTÊNCIA TÉCNICA INTEGRAL (CATI). Programa Estadual de Microbacias Hidrográficas. CATI: São Paulo, 2000.

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Referencia bibliográfica:

HESPANHOL, Antonio Nivaldo. Manejo sustentável de recursos naturais: O programa de microbacias hidrográficas na região de Presidente Prudente - São Paulo – Brasil . Diez años de cambios en el Mundo, en la Geografía y en las Ciencias Sociales, 1999-2008. Actas del X Coloquio Internacional de Geocrítica, Universidad de Barcelona, 26-30 de mayo de 2008.<http://www.ub.es/geocrit/-xcol/223.htm>

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