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X Coloquio Internacional de Geocrítica

DIEZ AÑOS DE CAMBIOS EN EL MUNDO, EN LA GEOGRAFÍA Y EN LAS CIENCIAS SOCIALES, 1999-2008

Barcelona, 26 - 30 de mayo de 2008
Universidad de Barcelona


IMPACTOS DA AGRICULTURA TECNIFICADA EM ÁREAS DE CERRADO DO BRASIL CENTRAL: ANÁLISE DO USO DA TERRA, DO GRAU DE VULNERABILIDADE DOS SOLOS E DO DESMATAMENTO

Dinalva Donizete RIBEIRO
Profa. Dra. Adjunto II na Universidade Federal de Goiás, Campus Jataí, Departamento de Geografia – Goiás/Brasil
dinalvadr@gmail.com

Jacob BINSZTOK
Prof. Dr. Titular na Universidade Federal Fluminense, Departamento de Geografia – Rio de Janeiro/ Brasil
jacob.binsztok@terra.com.br


Impactos da agricultura tecnificada em áreas de cerrado do Brasil Central: análise do uso da terra, do grau de vulnerabilidade dos solos e do desmatamento (Resumo)

A fim de apresentar os desgastes sócio-ambientais gerados pela intensificação da monocultura no Cerrado, foram feitas análises do uso da terra, do grau de vulnerabilidade dos solos e do desmatamento da Microrregião Sudoeste de Goiás, que está situada em área de Cerrado do Brasil Central e é considerada sinônimo da agricultura tecnificada, com capacidade produtiva reconhecida nacional e internacionalmente. Por meio dos mapas pode-se verificar que a Microrregião apresenta pouca remanescência da vegetação nativa, que em alguns municípios foi extinta quase por completo. O mapa de uso da terra evidencia a predominância dos cultivos temporários. O mapa de desmatamento demonstra que a área de vegetação nativa tem sido comprometida a fim da instalação de novos cultivos temporários. Resultante desse processo vem à tona a contaminação das águas, o assoreamento dos leitos e drenagens, a poluição do ar, o comprometimento da biodiversidade, a lixiviação dos solos e o surgimento de erosões e voçorocas, problemas estes que recaem sobre o conjunto da sociedade.           

Palavras-chave: agricultura tecnificada, agricultura e paisagem, insustentabilidade


Impacts of technically developed agriculture in the cerrado areas of middle Brazil: Land use analysis, degree of soil vulnerability and deforestation (Abstract)

With the goal to present the social and environmental abrasion generated by the intensification of monoculture in the Cerrado, there were made analysis of land use, of  soil vulnerability degree and of deforestation of the micro-region from Southwest of Goias State, which is situated in the Cerrado area of middle Brazil and is considered  a synonym of technically developed agriculture, with a productive ability nationally and internationally recognized. Across the maps it is possible to verify that the region presents a little permanency of native vegetation, that in some municipalities it was almost completely extinguished. The map of the land use evidences the predominance of temporary crops. The map of deforestation demonstrates that the native vegetation area has been pledged with the goal to establish new temporary crops. Resultant of that process appears the water contamination, the destruction of the rivers and drainage, the air pollution, the destruction of the biodiversity, the soil lixiviation and the arising of the erosion, problems which fall back over the whole society.

Key-words: technically developed agriculture; agriculture and landscape; unsustainability


A microrregião Sudoeste de Goiás é a parcela do território goiano que mais recebeu fixos, fluxos e investimentos financeiros para a tecnificação da agricultura. A região recebeu incentivos diretos do POLOCENTRO, por meio da constituição do pólo Rio Verde – Jataí, sendo preparada, a partir disso, para os objetos tecnificados disponíveis no pacote tecnológico da revolução verde. A partir de então, a MRH é tida como sinônimo da agricultura no seu estágio melhor elaborado, tendo sua capacidade produtiva reconhecida nacional e internacionalmente.

Diante dessa realidade, a agricultura contemporânea desenvolvida no Sudoeste de Goiás pode ser identificada e analisada a partir de dois matizes: um que reconhece a importância e justifica este modelo de exploração, tendo em vista o bônus econômico que  gera; outro que percebe os problemas e prejuízos, sociais e ambientais, decorrentes da mesma.

Aqui a investigação caminha no sentido de analisar e avaliar o uso que a agricultura da região tem feito da natureza. Análises do uso da terra, do grau de vulnerabilidade dos solos e do desmatamento foram levantadas no intuito de trazer à pauta de discussão os prejuízos ambientais gerados com a intensificação da monocultura na região.

Estas variáveis foram investigadas com o intento de fazer rever a noção (que é quase um decreto) que prevê a intensificação da exploração agrícola por meio das lavouras, sobretudo de soja, no Sudoeste de Goiás. A coleta de dados e a elaboração gráfica do material se deram por meio de imagens de satélite obtidas pelo Laboratório de Geoprocessamento da Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (SEMARH-GO).


O Uso da Terra no Sudoeste de Goiás e a Vulnerabilidade Ambiental

A análise do uso da terra, bem como da vulnerabilidade ambiental dos solos utilizados, nos parece ser um importante mecanismo de averiguação do uso agrícola que se tem impingido ao Sudoeste de Goiás.

Ao investigar a figura 1 pode-se verificar que a maior parte das terras do Sudoeste de Goiás é utilizada a fim de instalar lavouras temporárias (cultivos anuais). Nota-se que, ao lado dos cultivos anuais, a pastagem ainda hoje ocupa grandes extensões de terra, porém em áreas mais descontínuas, o que indica que naquele espaço a pecuária divide a área com a monocultura, gozando de importância no cenário econômico regional, porém numa escala menor do que a da soja, já que esta funciona como commoditie no mercado internacional de alimentos.

No que tange à vegetação nativa, a área ocupada por florestas estacionais, cerrado denso, cerradão, campo limpo úmido, cerrado ralo e veredas compõe parte muito pequena em relação ao total da área da microrregião, estando a vegetação mais, ou menos, presente em alguns municípios, dependendo do uso agrícola específico dos solos de cada um. Os municípios de Rio Verde, Montividiu e Chapadão do Céu possuem quase a totalidade de suas áreas destinadas a lavouras temporárias. Neste último não há registro de vegetação reservada, exceto umas poucas manchas margeando os cursos d’água que funcionam como limite com os municípios de Serranópolis e Aporé.

Numa análise dos cursos d’água que cruzam a microrregião em destaque, pode-se observar que em áreas circundantes de diversos leitos não há vegetação, o que, de acordo com a legislação ambiental vigente, é expressamente proibido. As margens do rio Claro, na altura dos municípios de Jataí e Aparecida do Rio Doce, e as do rio Corrente, na altura dos municípios de Chapadão do Céu e Aporé, são elucidativas deste evento. De acordo com a figura 2 (mapa de vulnerabilidade ambiental), tais áreas, cuja vegetação nativa foi retirada, estão classificadas como sendo de grau vulnerável, ou seja, são áreas que obrigatoriamente e legalmente, deveriam estar preservadas devido à sua vulnerabilidade, mas estão antropizadas, expostas ao comprometimento, com possibilidades reais de rápido desgaste e degradação. 

Observa-se que a existência de culturas que demandam irrigação por meio de pivô central está concentrada, sobretudo, no município de Rio Verde, onde podem ser encontrados aproximadamente 20 aparelhos.

Quanto ao uso dos solos para fins de lavoura temporária, pode-se averiguar ainda, com auxílio da figura 3 (mapa de desmatamento), a intensificação de tal uso e a ampliação da área a ser cultivada nos municípios de Jataí, Mineiros e, sobretudo, no município de Caiapônia, onde foram identificados 14 pontos de desmatamento no último ano.

Figura 1
Uso do Solo e Unidades Fisionômicas no Sudoeste de Goiás

Julgamos importante considerar que toda a área intensivamente antropizada e explorada para fins agropecuários no Sudoeste de Goiás possui considerável grau de vulnerabilidade, sendo classificada como moderadamente vulnerável, medianamente estável/vulnerável e vulnerável, conforme pode ser conferido na figura 2. Nas regiões nas quais têm sido promovidos desmatamentos em níveis mais expressivos, tais como nos municípios de Caiapônia, Jataí e Mineiros, o grau de vulnerabilidade é mais acentuado, são áreas consideradas vulneráveis.

Disso decorre a preocupação com a qualidade ambiental, gerada a partir da anexação de novas áreas à monocultura na região, em prol do crescimento horizontal do processo produtivo em curso.

Figura 2
Vulnerabilidade Ambiental dos Solos do Sudoeste de Goiás


Desmatamento e Perda de Biomassa

No Sudoeste de Goiás o desmatamento tem se acentuado. A figura 3 indica o número e a localização dos desmatamentos na região. De acordo com a Secretaria do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos de Goiás (SEMARH, 2005), a detecção e o mapeamento efetuados para a confecção do mapa de desmatamento basearam-se fundamentalmente na comparação consecutiva de imagens obtidas pelo sensor MOD13Q1 (imagens NDVI – índices de vegetação, com resolução espacial de 250 m). Esta comparação entre as imagens, realizada pixel a pixel, se deu em função de um determinado limiar de mudança (10%) na imagem NDVI, verificado pela redução de biomassa verde. O sistema utilizado para detecção (Sistema Integrado de Alerta de Desmatamentos/SIAD–GO) foi ajustado para detectar desmatamentos acima de 25 ha.

Ainda segundo a SEMARH (2005), uma das principais bases de dados para o SIAD - Goiás é composta por imagens de satélite obtidas, diariamente, pelo sensor MODIS (Moderate Resolution Imaging Spectroradiometer). Este sistema de “imageamento” é o carro-chefe de um programa institucional da NASA (Agência Espacial Americana) que, a bordo das plataformas orbitais TERRA e AQUA, está voltado, desde 1999, para o monitoramento global da Terra, incluindo os ambientes terrestres, aquáticos e atmosféricos. O sensor MODIS opera com 36 bandas espectrais, as quais propiciam recobrimento global e contínuo a cada dois dias, com resoluções espaciais de 250, 500 e 1000 metros (resoluções identificadas pelos códigos Q1, A1 e A2, respectivamente). Entre os vários produtos MODIS, destaca-se o MOD13Q1 (250 metros), contendo, entre outras informações, os índices de vegetação Normalized Difference Vegetation Index (NDVI) (SEMARH, 2005).

Pode-se notar, por meio da figura (mapa), a ocorrência de 48 pontos de desmatamento no Sudoeste de Goiás no intervalo de 2004 a 2005; os municípios de Caiapônia, Jataí e Mineiros são os que apresentam as maiores incidências. De acordo com dados da SEMARH (2005), o menor desmatamento possui área de aproximadamente 27 ha e o maior, área de aproximadamente 306 ha. No total o desmatamento neste período destruiu uma área de aproximadamente 2.700 ha na microrregião.  

Figura 03
Focos de Desmatamento na MRH Sudoeste de Goiás (2004 – 2005)

O desmatamento acentuado e acelerado no Sudoeste de Goiás pode ser corroborado pelas inúmeras carvoarias na região, cada uma delas com dezenas de fornos, onde se faz carvão a partir das árvores derrubadas. Os caminhões carregados com sacas de carvão vegetal podem ser vistos diariamente nas rodovias.  Estes caminhões, na sua maioria, possuem placas de registro de Bom Despacho (MG) e de Pitangui (MG), como de outras localidades próximas à região metropolitana de Belo Horizonte. O carvão produzido é levado às siderúrgicas mineiras, para abastecimento das caldeiras.

Pode-se contabilizar, por meio da figura 4, aproximadamente, 50 fornos que, de acordo com os vestígios da fumaça, estão em pleno funcionamento. Não tivemos permissão para entrar na propriedade sede da carvoaria. Sendo a propriedade de dimensão bastante elevada, a imagem foi captada a uma distância média de 10Km, por isso a qualidade da mesma não nos permite identificar com precisão os detalhes do processo de funcionamento da carvoaria.

A área que aparece em primeiro plano já é tradicional de lavoura e a que aparece ao fundo está sendo desmatada para ampliar, a partir da próxima safra, a área plantada.

O proprietário de terras empreita o cerrado para o carvoeiro limpar. Ele recolhe as árvores, depois de derrubadas, usualmente por correntão, e produz o carvão em fornos construídos para esta finalidade, conforme pode ser verificado na figura 04.

A prática do “correntão” é a mais agressiva utilizada no desmatamento do Cerrado. Uma corrente grande e resistente tem suas extremidades presas a dois tratores, um em cada extremidade, que quando colocados em movimento arrastam a corrente derrubando todas as plantas encontradas no percurso. A resistência da corrente faz com que nenhuma planta resista, não permanecendo nenhum exemplar de qualquer espécie onde tal método é aplicado. Por sua agressividade, tal método de desmatamento é proibido por lei, porém continua sendo utilizado em larga escala no Cerrado.

Figura 04
Instalações de Carvoaria com Fornos em Funcionamento (Jataí-GO) 
 
                  

Fonte: Ribeiro, 2005

Segundo relatório do Estudo Integrado de Bacias Hidrográficas do Sudoeste Goiano (EIBH, 2005), o extrativismo vegetal é uma importante atividade comercial nos municípios da região. O Estudo Integrado foi realizado para as Bacias dos rios Aporé, Corrente, Verde, Alegre e Claro e contempla os municípios de Aparecida do Rio Doce, Aporé, Caiapônia, Chapadão do Céu, Jataí, Mineiros, Perolândia, Portelândia, Rio Verde e Serranópolis, na microrregião Sudoeste de Goiás, além de outros municípios vizinhos a estes, pertencentes à microrregião de Quirinópolis. Segundo tal relatório,

em função da expansão das áreas de pastagens e agricultura é comum a presença de carvoarias por toda a região, conforme constatado em sobrevôo realizado nas Bacias em janeiro de 2005. O produto do desmatamento é comercializado na forma de madeira em tora, lenha e carvão vegetal (EIBH, 2005, p.67).

No quadro 1 pode-se observar o quão rentável tem sido o desmatamento para alguns municípios sudoestinos. Além de abrir a área para pastagem e/ou lavoura, as árvores são utilizadas enquanto matérias-primas variadas.

Quadro 1
Valor da Produção Extrativa Vegetal (
em mil R$) por Tipo de Produto

Município

Carvão vegetal

Lenha

Madeira/ Tora

Produtos/ Lenha

Aparecida do Rio Doce

60

01

00

00

Aporé

00

05

00

00

Caiapônia

132

123

118

00

Chapadão do Céu

00

00

00

00

Jataí

340

213

90

00

Mineiros

290

144

29

00

Perolândia

00

06

215

00

Portelândia

00

46

26

00

Rio Verde

08

32

01

609

Serranópolis

00

36

10

00

Fonte: EIBH, 2005. Adaptação: Ribeiro, 2005.

O fato de Aporé e Serranópolis não apresentarem produção significativa registrada não significa que os mesmos possuam baixos níveis de desmatamento. Nestes municípios torna-se difícil avaliar a quantidade de carvão e de lenha produzidos e exportados, devido ao escoamento ilegal efetuado pelas estradas do Mato Grosso do Sul. “Esta informação de escoamento ilegal de carvão, com documentação do estado vizinho, foi prestada e confirmada por vários carvoeiros da região” (EIBH, 2005, p.69).

Nota-se que apenas Rio Verde possui algum processamento de madeira. De acordo com relatório do EIBH (2005), a maioria da matéria-prima, na forma de lenha ou carvão vegetal, é vendida para usinas e destilarias, para alimentação de caldeiras.


Desmatamento: Comprometimento da Biodiversidade, das Águas e Problema de Saúde Pública

O relatório do EIBH (2005) mostra ainda o crescimento do desmatamento no entorno do Parque Nacional das Emas (que pode ser verificado, também, na figura 3):

As carvoarias presentes nos trechos a montante das Bacias dos Rios Aporé, Corrente e Verde são bastante numerosas. O desmatamento das áreas ainda preservadas de mata nativa no entorno do Parque Nacional das Emas vem sendo realizado agressivamente, fato que pôde ser constatado nos dois sobrevôos efetuados na região: o primeiro, em meados de 2003, voltado para os trabalhos do Estudo da Bacia do Rio Verde, realizado para a complementação do EIA/Rima dos empreendimentos Salto e Salto do Rio Verdinho e o segundo, em janeiro de 2005, objetivando fornecer subsídios para o diagnóstico do EIBH. Comparando-se as imagens destes dois sobrevôos, registradas em filmagens, pode-se constatar que as áreas desmatadas e a presença de carvoarias aumentaram significativamente (EIBH, 2005, p. 68).

A retirada da vegetação do entorno do Parque Nacional das Emas, embora esteja além dos limites deste, compromete a vida e o equilíbrio ecossistêmico do mesmo, já que impede a formação dos corredores de biodiversidade. Dessa forma, o Parque se torna uma área descontínua e, por isso, não consegue cumprir seu objetivo de elemento preservador dos Cerrados.

Da área remanescente de Cerrado do Sudoeste de Goiás a maior parte já passou por alterações, o que significa que esta não é mais a ideal para a conservação da biodiversidade. Isso compromete a mais rica savana do planeta, caso prossiga a sua exploração para fins de monocultura na escala em que está se dando atualmente.

O fato de a vegetação do Cerrado não ser caracterizada por densas florestas tropicais, como as Floresta Amazônica e Mata Atlântica, faz com que, de forma ignorante, os empresários, os proprietários de terra, os produtores e o poder público defendam o desmatamento com o objetivo da instalação de lavouras monocultoras.

Além de graves prejuízos para a biodiversidade e sobrevivência de milhares de espécies, a destruição do Cerrado compromete as principais bacias hidrográficas da América do Sul, já que nele estão as nascentes de importantes bacias como a Platina, a do São Francisco e a Amazônica. A exploração indiscriminada desencadeia o assoreamento dos cursos d’água, provoca erosões e processos de contaminação no que é considerado o berço das águas.

Diante dessa situação, Machado (2004) alerta para a necessidade urgente de frear este processo de degradação. A sugestão feita pela International Conservation (CI – Brasil), no ano de 2004, foi de que o Governo Federal destinasse parte dos recursos previstos para financiar a safra de 2005 para a constituição de um fundo, cujas verbas seriam utilizadas para a manutenção de unidades de conservação, para a recuperação de áreas degradadas e para a proteção de mananciais hídricos.

No entanto, tal sugestão não foi aceita, evidenciando que as políticas de produção não são conjugadas com as políticas ambientais.

Quanto aos prejuízos acarretados pelo desmatamento intensivo, o EIBH (2005) afirma que o aumento de casos da enfermidade leishmaniose, em alguns municípios, possui relação direta com a redução da vegetação nativa, pois os intensos desmatamentos e a conseqüente perda de habitat do seu transmissor gera um desequilíbrio fazendo com que tal enfermidade se manifeste nas áreas urbanas.

Entre 2001 e 2004 os casos de leishmaniose aumentaram em vários municípios sudoestinos. No período foram registrados os seguintes números da doença: Mineiros, 64 casos; Jataí, 50 casos; Caiapônia, 44 casos; Rio Verde, 35 casos; Serranópolis, 07 casos; Portelândia, 07 casos; Chapadão do Céu, 04 casos; e Aparecida do Rio Doce, Aporé e Perolândia, 01 caso cada um.

Nota-se que há uma correspondência entre os municípios alvo do desmatamento e os que apresentam os maiores índices da doença. Os municípios de Caiapônia, Jataí, Mineiros e Rio Verde, mais afetados pela doença, são os que apresentam mais focos de desmatamento (conforme figura 3).


Considerações Finais

Desde o desenvolvimento das tecnologias contidas no pacote da revolução verde, a agricultura vem sendo aprimorada para se aumentar constantemente a produtividade dos solos e do trabalho e, portanto, aumentar lucros e rentabilidade. Porém, tal tecnologia, se utilizada de forma inadequada, pode se transformar, conforme Cunha (1994), numa verdadeira “caixa de Pandora”, trazendo à tona problemas incalculáveis, tanto quanto incontroláveis.

No Sudoeste de Goiás as tecnologias avançadas são aplicadas em busca da sustentabilidade econômica, que para ocorrer exige que a atividade agrícola se mantenha em condições de competitividade. Os problemas de degradação e de comprometimento dos estoques de recursos naturais ocorrem como conseqüência desta busca constante, que exige cada vez mais a exploração intensiva.

Mediante a tecnologia disponível, a produtividade elevada é manifesta rapidamente, contrariamente aos problemas, que só vêm num prazo mais longo, e só aí poder-se-á dizer se a produção é, realmente, sustentável econômica e ambientalmente.

É comum citarmos os problemas que atingem os solos, as águas, a biodiversidade, enquanto exemplos de degradação. Estes são os chamados “problemas de primeira geração”, diretamente causados pela prática agrícola em si, como o uso intenso de agrotóxicos, a redução da diversidade biológica e os desequilíbrios ecológicos. Existem, também, os “problemas de segunda geração”, que surgem como desdobramento dos primeiros ou em conseqüência da tentativa de solucioná-los. A ocorrência da segunda geração de problemas traduz a gravidade dos impactos gerados, que se manifestam não apenas local e momentaneamente e dão a real dimensão do comprometimento ambiental gerado por práticas de exploração inadequadas. Os problemas se desdobram e alcançam elementos, espaços e indivíduos que, aparentemente e espacialmente, não estão envolvidos com a exploração agrícola.

Por fim conclui-se, por meio dos mapas apresentados, que o uso da terra na MRH apresenta pouca remanescência da vegetação nativa, que em alguns municípios foi extinta quase por completo, como é o caso de Chapadão do Céu, que possui quase a totalidade de sua área destinada a lavouras temporárias. Neste município não há registro de vegetação reservada, exceto umas poucas manchas margeando os cursos d’água que funcionam como limite com os municípios de Serranópolis e Aporé. O mapa de uso da terra evidencia, também, a predominância dos cultivos temporários e, numa escala um pouco menor, as pastagens plantadas. A gravidade do problema é reafirmada quando se analisa os dados sobre desmatamento, pois se vê que a área de vegetação nativa tem sido comprometida a fim da instalação de novos cultivos temporários, ao passo que as árvores derrubadas viram carvão, destinado, geralmente, às siderúrgicas mineiras. O uso inadequado dos recursos naturais e a anexação ao cultivo de áreas de preservação promovem desequilíbrios, tais quais a contaminação das águas, o assoreamento dos leitos e drenagens, a poluição do ar, o comprometimento da biodiversidade, a lixiviação dos solos e o surgimento de erosões e voçorocas, problemas estes que recaem sobre o conjunto da sociedade.


Bibliografia

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MACEDO, J. Os Cerrados brasileiros: alternativa para a produção de alimentos no limiar do século XXI. Revista de Política Agrícola. Brasília (DF): Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Secretaria de Política Agrícola, ano IV. n. 02., p. 11-18, abr./ maio/ jun., 1995.

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RIBEIRO, D. D. Agricultura “caificada” no Sudoeste de Goiás: do bônus econômico ao ônus sócio-ambiental. 264 f. Tese (Doutorado em Geografia) – Instituto de Geociências, Universidade Federal Fluminense, Niterói (RJ), 2005.

ROMEIRO, A. R. et al. (Orgs.). Economia do meio ambiente: teoria, políticas e a gestão de espaços regionais. 3. ed. Campinas: UNICAMP, 2001.

SEMARH, Secretaria do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos do Estado de Goiás – gerência de geoprocessamento Of. no. 953/2005. Informações sobre detecção e mapeamento de desmatamentos.

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Referencia bibliográfica

RIBEIRO, Dinalva Donizete y BINSZTOK, Jacob. Impactos da agricultura tecnificada em áreas de cerrado do Brasil Central: análise do uso da terra, do grau de vulnerabilidade dos solos e do desmatamento. Diez años de cambios en el Mundo, en la Geografía y en las Ciencias Sociales, 1999-2008. Actas del X Coloquio Internacional de Geocrítica, Universidad de Barcelona, 26-30 de mayo de 2008. <http://www.ub.es/geocrit/-xcol/446.htm>


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