IX Coloquio Internacional de Geocrítica

LOS PROBLEMAS DEL MUNDO ACTUAL.
SOLUCIONES Y ALTERNATIVAS DESDE LA GEOGRAFÍA
Y LAS CIENCIAS SOCIALES

Porto Alegre, 28 de mayo  - 1 de junio de 2007.
Universidade Federal do Rio Grande do Sul


A PRODUÇÃO E O CONSUMO DE ESPAÇOS TURÍSTICOS

Cristiane Alcântara de Jesus Santos
Faculdade de Sergipe - FaSe
Doutoranda em Geografia HumanaUniversitat de Barcelona
cristie09@uol.com.br

A produção e o consumo de espaços turísticos (Resumo)

A partir da década de 70, vários autores de distintas áreas de conhecimento começaram a estudar a cultura do consumo principalmente desde a perspectiva de análises da cotidianidade da sociedade no espaço. Então, todo um conjunto de imagens e símbolos que vão sendo criados e recriados, associados a bens ou lugares, além de novas formas de comportamento efetivo, no pensar e sentir de segmentos cada vez mais amplos da sociedade reitera a idéia de que o consumo está intrinsecamente ligado à produção, mesmo que esta seja simplesmente uma construção mental e/ou efêmera. Ao analisar a evolução do turismo, visto aqui enquanto um conjunto de atividades e serviços diretamente relacionado à cultura do consumo, podemos identificar etapas diferenciadas que estão diretamente relacionadas a intensificação de um processo chamado de “turistificação de lugares”, ou seja, a produção de lugares turísticos.

Palavras-chave: turismo – consumo – produção espacial


Touristic spaces production and consumption (Abstract)

From the 70s on, several authors from different knowledge areas started to study consumerism culture mainly from the perspective of the analysis of society quotidian in space. So, a whole set of images and symbols that are being created and created again, associated to assets or places, in addition to new ways of effective behavior in the thinking and feeling of broader segments of society, reiterates the idea that consumption is deeply linked to production, even if the latter is simply an ephemeral and/or mental construction. By analyzing tourism evolution, hereby considered as a set of activities and services straight connected to consumption culture, it is possible to identify different steps directly related to the intensification of the so-called “places touristification” process, ie., the production of touristic sites.

Keywords: tourism – consumption – spacial production


No momento em que a humanidade experimenta uma nova mudança de época, as transformações nas relações sociais, espaciais e culturais são reveladas a partir da emergência de novos paradigmas, sobretudo, dentro da visão ocidental, onde a ruptura de alguns valores e a persistência pela construção de modos específicos de apropriação dos objetos e lugares, aliado a ampliação do consumo tenta corresponder ao nível tecnológico dominante.

Desta forma, as revoluções que acontecem em torno das tecnologias de informação alteram de forma estrutural e tecnicamente as relações sócio-espaciais, transformando assim, a economia e o modo de vida da sociedade. Assim, novos valores culturais, políticos e ideológicos passam a engendrar as características da produção e do consumo do espaço hoje.

Neste sentido, a inovação tecnológica garante uma série de produtos e imagens que se configura como produtos de consumo em um mundo cada vez mais integrado e repleto de fetiches, em que o tempo comprimido eletronicamente parece atemporal e o espaço parece conter e se transformar em objeto susceptível às reorganizações em função das falsas ou não reais necessidades[1] da sociedade urbana.

Este pressuposto aliado a flexibilidade e mobilidade organizacional do trabalho introduzem a “ditadura do ócio” como uma necessidade pós-fordista que sugere modificações na organização do trabalho e na luta sindical. De fato, os trabalhadores passam a reivindicar diminuição da jornada laboral e, assim, passam a planejar ou mesmo criar condições de dispor dos momentos de ócio, ou seja, o trabalhador passa a utilizar o tempo de ócio para realizar a abstração concreta da troca das horas ou dias de férias em mercadorias, lugares, imagens e signos[2].


A cultura do consumo

A partir da década de 70, vários autores de distintas áreas de conhecimento começam a estudar a cultura do consumo principalmente desde a perspectiva da análise da cotidianidade da sociedade no espaço doméstico no período da Revolução Industrial, tendo como pressuposto: a mudança das relações entre os objetos e as pessoas.

Os estudos sobre a sociedade de consumo de Jean Baudrillard (1970), as análises de Appadurai (1986) sobre a vida social dos objetos, as idéias de Rybczynski (1986) e Ferry (1990) sobre a introdução do conforto no cotidiano da sociedade se destacaram como obras importantes num mundo marcado pelos usos e conflitos de identidade que prescindem da incorporação psicológica ao corpo de algum elemento distinto da realidade.

Então, todo um conjunto de imagens e símbolos que vão sendo criados e recriados, associados à bens ou lugares, além de novas formas de comportamento efetivo no pensar e sentir de segmentos cada vez mais amplos da sociedade reitera a idéia de que o consumo está intrinsecamente ligado à produção, mesmo que esta seja simplesmente uma construção mental e/ou efêmera.

Assim, a idéia de uma conceituação de consumo que leve em consideração os processos de comunicação e recepção de bens simbólicos, procurando não restringi-los a uma racionalidade econômica, mas por uma possível racionalidade sócio - política interativa, a partir da análise das relações entre os lugares, os produtores desses lugares e os consumidores é apresentada dor Nestor Canclini em seu livro intitulado “Consumidores e cidadãos: conflitos multiculturais da globalização” publicado no ano de 1995.

Dessa maneira, a cultura do consumo passa a ser uma expressão da sociedade contemporânea capitalista[3] que através do acesso e uso das diversas mercadorias e espaços, passam a estabelecer níveis de qualificação social distinto. Essa concepção traduz claramente o papel do turismo no processo de criação de espaços de consumo para classes privilegiadas, como é o caso dos resorts, campos de golf, condomínios fechados e praias privadas localizadas no litoral nordestino do Brasil.

Assim, o consumo passa a ser um importante elemento de diferenciação social, a partir da apropriação dos meios de distinção simbólica, em que ocorre uma coerência entre nível social e tipo de consumo. Deve-se considerar que o valor de troca não é alguma coisa contida naturalmente nos objetos, mas é resultante das interações sócio-culturais de uso.

Em sua formulação clássica sobre a vida cotidiana, Lefebvre em seu livro “A vida cotidiana no mundo moderno” ressalta que não há uma separação entre o consumo do objeto e do signo, ou seja, o ato de consumir é, ao mesmo tempo, real e imaginário. Além disso, questiona a expressão sociedade de consumo, que pode ser aplicada a atual sociedade, onde há uma grande lacuna entre a abundância, o superconsumo de uma classe e a escassez e falta de acesso da massa de excluídos desse processo em todo mundo.

De acordo com Jean Baudrillard,

o problema principal do capitalismo contemporâneo não é a contradição entre maximização do lucro e a racionalização da produção (ao nível do empresário), mas entre a produtividade virtualmente ilimitada (ao nível da técnico - estrutura) e a necessidade de vender produtos. Nesta fase, é vital para o sistema controlar não só o aparelho de produção, mas a procura de consumo; não apenas os preços, mas o que se procurará a tal preço. O efeito geral, quer por meios anteriores ao próprio ato de produção (sondagens, estudos de mercado) quer posteriores (publicidades, marketing, condicionamento) é retirar do comprador o poder de decisão e transferi-lo para a empresa, onde poderá ser manipulado (1970, p. 79 - 80).

Conforme Baudrillard, o consumo tornou-se uma linguagem da atualidade, através da qual a sociedade se comunica, tornando-se um sinônimo de felicidade, um bem estar mensurável por objetos e signos, como também pela instituição das classes sociais, já que a aquisição, as escolhas e as práticas são reguladas pelo poder aquisitivo dos diferentes grupos sociais. Ainda segundo este autor, o consumo pode ser analisado através da lógica da produção e da manipulação dos significantes sociais. Ele destaca que os conceitos de valor de uso e de troca são insuficientes para pensar o consumo tornando-se necessário mensurar o valor/ signo ou valor simbólico, já que os objetos e paisagens (lugares específicos) encarnam funções relativas ao uso e ao prestígio.

O trabalho de Baudrillard (1970), enfatiza a lógica implacável da mercadoria, apoiando-se na semiologia para defender a idéia de que o consumo tem na sua essência a manipulação de signos. Segundo o autor, o consumo não deve ser visto apenas como aquisição geral de mercadorias, mas fundamentalmente pelo consumo de signos.

Assim, a relação de produção e consumo passa a ser um processo de significação e valorização cultural, podendo diferenciar a utilização de produtos ou mesmo a valorização de determinados lugares, a partir da satisfação dos impulsos biológicos e estéticos adquiridos durante todo processo de construção da sociedade.

Canevacci (1990) destaca que para a passagem da sociedade de consumo para a cultura de consumo, a ordem simbólica foi transformada, prescindindo e condicionando a expansão das mercadorias e paisagens a serem vendidas. A cultura do consumo fundamenta-se na constante produção e reprodução de sinais comuns e reconhecidos pelos seus possuidores e pelo seu público

ela não encoraja um conformismo passivo na escolha das mercadorias, mas ao contrário, procura educar os indivíduos a ler as diferenças dos signos, a decodificar as infinitas minúcias que distinguem as roupas, os livros, as comidas, os carros, os quartos e os costumes. (Canevacci, 1990, p. 131).

Na realidade, a reprodução da natureza como pressuposto do mundo da troca (uma vez que o ócio se transforma numa mercadoria trocada por tempos cada vez mais caros ao trabalhador), destruída aos poucos pela técnica, recria de forma artificial os lugares e os insere no conjunto das mercadorias ilusórias do mundo do consumo.


A produção de espaços turísticos

Ao analisar a evolução do turismo, visto aqui enquanto um conjunto de atividades e serviços diretamente relacionado a cultura do consumo, podemos identificar três etapas diferenciadas conforme afirma Fayos-Solá (1994):

a)      Etapa de produção artesã: iniciada no século XIX e finalizada na década de 50 do século XX. Essa etapa é caracterizada pela utilização intensiva de mão-de-obra, a escassa utilização de técnicas e uma orientação para a produção limitada e mercados reduzidos;

b)      Etapa de produção em cadeia ou fordista: que podemos considerar a sua finalização na década de 80 do século XX. Seu paradigma é a elaboração e consumo de produtos estandardizados com o menor custo possível e orientados para mercados amplos e com escassa segmentação, ou seja, prevalece o turismo de massas;

c)      Etapa pós-fordista ou nova era do turismo: essa etapa é caracterizada por novas tendências na demanda e na oferta, além da segmentação dos mercados, a flexibilidade nos fatores de produção, distribuição e consumo.

A reestruturação produtiva pós-fordista dos últimos anos nos mostra – principalmente nas camadas das populações dos países ricos - uma ampliação do processo de criação de espaços para o turismo e o lazer como necessidades da acumulação. Por sua vez, o não-trabalho (ócio) passou a gerar além das atividades que minimizam ou mesmo anulam as heterogeneidades específicas dos lugares, com a estandardização dos parques, museus, teatros, cafés e outros elementos do desejo do trabalhador, produz a contradição do trabalho entre outras camadas de populações que sobrevivem de acordo com a negação do próprio ócio em função da manutenção de diversos negócios e serviços criados para oferecer conforto e comodidade a quem poder pagar.

Essa dialética pode ser observada, simultaneamente, nas escalas do local e do mundial, mantendo suas heterogeneidades temporais e espaciais, uma vez que os produtos e os lugares estão cada vez mais se adaptando as necessidades da demanda que por sua vez está mais complexa e diversa. O marketing e as novas tecnologias assumem papéis importantes nesse processo, já que propõe mudanças tão velozes e tão sublimes que passam a transformar realidades e desejos como novas necessidades e atividades da vida do homem.

Dessa maneira, a produção de espaços turísticos surge com novos objetos/ signos “que adentram artificialmente no rol das necessidades básicas do homem” (Rodrigues, 1997, p. 26) transformando-os em consumidores – produtores de símbolos cada vez mais (des) seqüenciados do conjunto da sociedade.

Este processo chamado de turistificação de lugares é caracterizado pela produção de lugares pelo/para o uso turístico e passa a desempenhar papel fundamental na inserção e/ou reaquecimento de economias em declínio.

Francisco López Palomeque em seu artigo intitulado “El turismo en el desarrollo local y regional: aportaciones conceptuales” (2001), faz uma comparação do turismo com outros processos de produção/consumo e afirma que o turismo enquanto atividade econômica apresenta algumas singularidades e que o espaço geográfico desempenha um papel importante nesse processo. Essas singularidades são:

  1. O turismo apresenta uma diferenciação em relação a outras atividades econômicas, já que o espaço de destino apresenta um papel fundamental para cada um dos agentes que intervêm nos processos de produção e consumo turísticos: os proprietários de solo, promotores de espaço, agentes do setor, os consumidores, os intermediários e finalmente a própria administração;
  1. A espacialização do turismo envolve fatores específicos, diferenciados ou com protagonismos distintos em comparação com os fatores gerais que explicam a localização das atividades econômicas. A dialética entre turismo e espaço se manifesta em dois fatos: a) o recurso turístico transformado em produto turístico se consome onde se produz e por outro lado o consumidor turístico necessita se locomover para consumi-lo; b) o consumo e a produção turística se dão de forma simultânea;
  1. O processo de produção do espaço turístico compreende uma produção física que também é própria de outras atividades econômicas, mas essa produção é, sobretudo, de caráter simbólico, ou seja, valorização simbólica através da valorização social da imagem.

Dessa maneira, a criação de lugares turísticos fundamenta-se na personalização de lugares e caracteriza-se por uma ordenação de signos e valores impressos às comunidades locais de tal maneira que o turismo, como um conjunto de atividades, conduz a percepções de símbolos, normas éticas, regras e valores culturais que são trocados e consumidos tanto pelos turistas que visitam os lugares e, em alguns casos, pelas comunidades visitadas.


O consumo de espaços turísticos

Por vários anos, o turismo, em muitos países, baseou-se somente num segmento denominado turismo de “sol e mar”. Porém, atualmente, as novas demandas e exigências do consumidor turístico, assim como, a intensificação do nível de competitividade entre os destinos turísticos contribui para o desenvolvimento de novas formas de turismo, com a finalidade de adaptar plenamente novos produtos e lugares às novas necessidades do mercado.

Assim, para analisar o consumo de espaços turísticos partiremos de dois pontos fundamentais:

1.         O comportamento do consumidor do turismo;

2.         As novas características do atual consumidor turístico;

Desta forma, as mudanças no consumo turístico estão relacionadas a uma série de modificações no comportamento do turista/consumidor. Essas modificações são fruto da evolução do consumidor turístico e se analisarmos esses novos comportamentos veremos que os novos consumidores turísticos formam grupos distintos com novas motivações e necessidades.

O comportamento  do consumidor do turismo

Entender o comportamento do consumidor é uma tarefa extremamente complexa e requer a contribuição de diversos campos da ciência. Seu estudo vem evoluindo desde o início do século passado e, de acordo com Cooper et al. (2001) é possível classificar essa evolução em três grandes fases. A primeira fase inicia-se em 1930 e se conclui em 1940 e é baseada em trabalhos empíricos. A segunda fase finaliza na década de 60 e foi marcado por trabalhos ligados à psicologia, principalmente no estudo das motivações humanas. Dentro desta fase, o trabalho mais conhecido foi desenvolvido por Maslow em 1943, em que o autor analisou o comportamento a partir da hierarquização das necessidades humanas. Esta hierarquização pode ser dividida em cinco grandes grupos: a) Necessidades Fisiológicas, como a fome, sede, descanso, etc. b) Segurança; c) Amor; d) Estima e, e) Auto-realização.

De acordo com Maslow, a motivação surge quando um indivíduo não se encontra satisfeito com uma dessas necessidades citadas acima. À medida que uma necessidade fosse satisfeita, os indivíduos seriam motivados pela necessidade hierarquicamente superior.

A última fase do desenvolvimento da teoria do consumidor inicia-se nos anos 60 e é denominada de “fase formativa”, uma vez que esta fase foi marcada pela elaboração dos primeiros modelos de comportamento do consumidor.

Rivas, em seu livro intitulado “El Comportamiento del Consumidor” (1984) estabelece três enfoques que vem sendo utilizado para estudar o comportamento do consumidor:

a) O enfoque econômico, que se baseia na importância que tem as variáveis econômicas na decisão do consumidor.

b) O enfoque psicosociológico, que indica que o comportamento do consumidor está determinado por variáveis psicológicas (internas ao individuo) e por variáveis externas.

c) O enfoque motivacional, que se centra nos motivos ou causas que explicam o comportamento do consumidor.

Assim, partiremos do pressuposto que para analisar o comportamento do consumidor em turismo é necessário abordar a ótica geral do consumidor e relaciona-lo ao processo de aquisição dos serviços turísticos, a exemplo, da compra de bilhetes de passagens.

Independentemente de não compartilhar das idéias emitidas nos conceitos de turismo e turista da OMT[4] (Organização Mundial do Turismo), os fluxos e rendimentos promovidos pelo conjunto de atividades estão inter-relacionados com os deslocamentos domésticos e internacionais realizados pelos consumidores e produtores do fenômeno turístico.

Assim, Valls afirma que ao analisar o comportamento do turista devemos partir, sobretudo, "do subconjunto do comportamento do consumidor que tem lugar no processo de aquisição do produto turístico, assim como na participação na experiência de turismo que é influenciado por fatores de situação internos e externos". (1996, p. 151).

Um dos primeiros estudos sobre comportamento do consumidor em turismo foi realizado por Plog (1989) em 1966[5]. Partindo desse estudo, Plog desenvolveu uma segmentação dos turistas que tinha por objetivo proporcionar às empresas um critério de segmentação que permitisse posicionar melhor os seus produtos no mercado segundo o perfil comportamental dos turistas.

Mcintosh, Goeldner e Ritchie (1995) desenvolveram uma teoria de análise do comportamento do consumidor turístico baseada nas seguintes motivações: as motivações físicas; culturais; interpessoais e, por fim, as motivações baseadas em status.

Já para Swarbrooke & Horner (1999) existem dois fatores motivacionais gerais que atuam no poder de decisão do consumidor turístico: os que motivam a pessoa a realizar a viagem e; os que motivam a pessoa a realizar uma viagem particular, a uma destinação específica em um determinado momento.

De fato, o comportamento do consumidor turístico é distinto, uma vez que existem  ações e atitudes próprias do consumidor, além de que devemos considerar que encontramos no mercado produtos turísticos com características distintas.

Bigné, Andreu, Rodriguez e Sánchez (1998) elaboraram um artigo intitulado “El comportamiento del turista en la selección del destino vacacional: el caso de los británicos hacia el destino España” e realizaram uma breve revisão bibliográfica acerca dos principais modelos de comportamento do turista. O quadro abaixo mostra de forma sintetizada os modelos de comportamento e seus respectivos autores.


QUADRO 1

PRINCIPAIS MODELOS DE COMPORTAMENTO DO TURISTA

PRINCIPAIS INVESTIGADORES

CONTRIBUIÇÃO

Schmoll (1997); Moutinho (1987)

Modelos baseados nos clássicos modelos de comportamento do consumidor

Woodside y Lysonski (1989); Crompton (1992); Crompton y Ankomah (1993);

Modelos baseados em conjunto de eleição.

Goodal (1991); Kotler et al. (1993)

Modelo baseado na decisão de “sair de férias”

Moscardo et al. (1996)

Modelo baseado na decisão do destino através das atividades.

FONTE: Bigné, Andreu, Rodriguez y Sánchez. (1998). “El comportamiento del turista en la selección del destino vacacional: el caso de los británicos hacia el destino España”.

XII Congreso de la Asociación Europea de Dirección y Economía de la Empresa. Benalmádena (Málaga). Junio 1998, pp 1203-1211.

Uma outra forma de analisar o comportamento do consumidor em turismo é através da incorporação de outros fatores, além dos aspectos motivacionais descritos anteriormente. A incorporação de outros fatores à explicação do comportamento do consumidor em turismo é geralmente descrita como modelo “push and pull” (Uysal & Hagan, 1993). Neste modelo, os fatores push são os que impulsionam o consumidor turístico a viajar e incluem outras variáveis, além das motivações psicológicas. Os fatores pull afetam diretamente os destinos turísticos, já que estão associados às características de atração destes destinos.

Como podemos observar, a partir dos distintos estudos, existem várias variáveis que condicionam o comportamento do turista. Essas variáveis influenciam tanto na decisão de viajar como nas atuações que surgirão a partir da tomada de decisão.

Características do atual consumidor turístico

Existe um consenso entre vários autores ao afirmar que o consumidor turístico atual apresenta características claramente distintas das que possuíam nas décadas de 70 e 80. Dentre estas características podemos destacar seis que se aplicam a uma parte importante dos turistas atuais. Vale ressaltar que estas características citadas são uma adaptação das estabelecidas por Valls, J.F. (1996), Poon, A. (1993) e Santos Arrebola, J.L. (1992).

1.- O atual consumidor é um multiconsumidor turístico perfeito, ou seja, atua em função de diversas formas de consumo turístico e realiza distintas atividades em um determinado período de tempo. De fato, a realização de viagens e atividades diferentes por um mesmo turista, aponta a existência de múltiplas motivações turísticas em cada individuo, que de acordo com as circunstâncias de cada momento podem gerar comportamentos distintos.

2.- A segunda característica está relacionada à mudança de valores, principalmente no que diz respeito aos aspectos ecológicos da viagem. Este fator se reflete no novo estilo de vida adotado pelo atual consumidor turístico, uma vez que estes são marcados pela consciência meio ambiental mais desenvolvida em que buscam um equilíbrio entre a paisagem natural e o urbano, além de desfrutar intensamente do entorno. Esta característica comum a muitos turistas atuais tem gerado o desenvolvimento de turismos alternativos, a exemplo do turismo rural. Adyr Balastreri Rodrigues (1997) em seu livro intitulado “Turismo e espaço – Rumo a um conhecimento transdisciplinar” chama esse novo tipo de consumo de “consumo produtivo do espaço”, uma vez que esse tipo de consumo parte do princípio da instalação de equipamentos turísticos que causem o menor impacto ambiental. Estes princípios estão baseados na educação ambiental que tem como objetivo a conservação do meio ambiente, além de aprofundar a consciência ecológica através da interação e do respeito à natureza.

3.- O consumidor turístico atual fragmenta suas estâncias, ou seja, durante o ano realiza vários períodos de férias curtas.

4.- A quarta característica está relacionada ao aumento da oferta de novos destinos turísticos e nas mudanças na estratégia de marketing das empresas do setor que possibilita que o consumidor obtenha uma ampla e variada informação. Desta forma, o turista passa a analisar as ofertas existentes e a efetuar a eleição do destino de forma mais racional. Nesse contexto se insere a variável marketing como uma estratégia fundamental no turismo, principalmente, para os produtos e destinos que ainda não são conhecidos pelo turista.

5.- Outra característica é que o novo consumidor turístico é muito mais independente e exigente, uma vez que opta por um turismo personalizado e de maior qualidade. De fato, observa-se no mercado atual um crescimento de viagens mais especializadas, a exemplo, das áreas como saúde, negócios ou esportes, e conseqüentemente, a diminuição progressiva do turismo baseado em pacotes rígidos, estandardizados e massivos que está sendo identificado por muitos turistas como um turismo barato e de baixa qualidade nos serviços. Podemos afirmar que esta característica é fruto da característica citada anteriormente, uma vez que é conseqüência da informação disponível que possibilita ao turista elaborar e organizar suas próprias viagens.

6.- Por fim, a última característica consiste na forma de reserva das viagens. Os consumidores turísticos atuais reservam em curto prazo, ou seja, o seu comportamento passado era baseado na antecipação das reservas. De fato, esse comportamento foi modificado a partir da inserção das novas tecnologias de informação e comunicação no processo de comercialização dos produtos turísticos.

Essas características constituem a base das múltiplas mudanças nos hábitos do consumo turístico. Essas mudanças podem ser analisadas a partir de quatro grupos distintos:

a) Novos hábitos de férias: Atualmente as famílias já não realizam viagens de larga duração no seu período de férias, ou seja, há um novo hábito de fracionar essa viagem, a fim de que se tornem vários períodos de férias durante o ano: Semana Santa, Natal, Carnaval, etc.

b) Mudança no hábito de compra: Com a evolução das tecnologias de informação houve uma transformação no momento de realização de compra de serviços turísticos. Os consumidores, cada vez mais, vêm utilizando canais alternativos para escolher o destino turístico, organizar a viagem e comprar. Esse fato se reflete na disponibilidade na internet dos C.R.S (Sistemas de Reservas Computadorizados), a exemplo do SABRE e Amadeus, como uma estratégia de comercialização baseada nas necessidades individuais dos consumidores, a partir de produtos e serviços personalizados.

c) Mudanças nos hábitos de consumo: Essa mudança é reflexo do maior nível sócio-econômico do turista associado com o aumento das experiências vividas.

d) Novos mercados turísticos: Uma das motivações para se realizar uma viagem é a possibilidade de conhecer novos lugares. Atualmente, a sociedade conta com uma grande oferta de novos destinos turísticos capazes de atender as necessidades das novas demandas.


Turismo e impacto social

John Urry (1996) em seu livro intitulado “O olhar do turista – Lazer e viagens nas sociedades contemporâneas” aponta algumas singularidades do turismo dentro do ponto de vista social. A primeira singularidade diz respeito aos serviços prestados ao consumidor turístico quando comparado a outros tipos de consumidores. Os serviços proporcionados aos turistas têm de estar ao alcance deles no momento e no lugar em que são produzidos (1996, p.63). Esse fator nos leva a analisar um outro ponto fundamental: a qualidade de interação social entre o fornecedor do produto e o turista, uma vez que essa interação está presente no momento de compra de um determinado produto turístico.

Em muitos casos, um produto turístico é constituído por uma série de serviços e que se a interação social entre um determinado prestador desses serviços e o turista não for satisfatória todo o produto ficará prejudicado, ou seja, a relação entre o garçom de um restaurante x, a recepcionista de um hotel y e o consumidor faz parte do produto que o turista o adquiriu e que conseqüentemente deseja satisfação.

O turismo enquanto um conjunto de atividades e serviços quando é visto como uma possibilidade de desenvolvimento das comunidades, a primeira afirmação que surge é que através dele serão gerados empregos e renda. Quando Urry (1996:63) afirma que o grande problema da atividade turística é que “a produção dos serviços (turísticos), destinados ao consumidor não pode ser inteiramente realizada nos bastidores, longe do olhar dos turistas”, faz com que a análise seja encaminhada em outro sentido: a qualidade da mão-de-obra utilizada pelo setor turístico. A OMT (Organização Mundial do Turismo) identificou algumas características comuns dos empregos turísticos (Sancho, 1998):

Vale ressaltar que essas características devem ser levadas em consideração, uma vez que a qualidade do emprego turístico é um fator de extrema importância na relação produção/consumo. A falta de qualidade do emprego gerado com a atividade turística pode repercutir de forma desfavorável e negativa.

A segunda singularidade refere-se a fixidez espacial que é fundamental no que diz respeito aos serviços turísticos. John Urry (1996) afirma que os produtos “têm que ser produzidos e consumidos em lugares muitos particulares”. Apesar dos consumidores atuais serem mais móveis e capazes de consumir os serviços turísticos em base global é importante que cada lugar mantenha seus traços identitários visando não somente a existência de seu produto, mas a organização dos serviços ofertados, já que “quase todos os lugares do mundo podem muito bem atuar como um objeto do olhar do turista”. (Urry, 1996, p. 64).

Assim, a criação de ambientes turísticos, na maioria das vezes, ocorre de maneira contrária, apresentando-se em suas fases, políticas desenvolvimentistas baseadas nas idéias de crescimento e integração econômica, que de certa forma, dirige os planejamentos das áreas potencialmente turísticas no sentido de dotá-las de infra–estrutura receptiva adequada para atender as demandas, tanto das elites, quanto das massas, inaugurando assim, a liberdade e a igualdade social num mundo de fantasias.

Essas idéias de igualdade e/ou ampliação do consumo dos espaços norteiam os programas de desenvolvimento de vários setores econômicos e sociais, uma vez que o turismo, nos últimos anos, tem se constituído, em muitos casos, numa alternativa única de desenvolvimento.

É certo que o consumo não se dá apenas ao nível do estímulo capitalista da exploração local das necessidades materiais aquisitivas do turista, uma vez que envolve também o consumo da paisagem.

Desta forma, o consumo consiste em um processo dual de produção e destruição espacial, já que a paisagem enquanto parte da função consumo, tal como mercadoria, deve ser “aperfeiçoada” a fim de atrair o consumidor. A transformação da paisagem se dá no sentido da adequação da estética ao consumo, mesmo que essa adequação implique alterações profundas.

Além disso, outro ponto que merece ser destacado é a absorção dos novos hábitos de consumo que são transferidos para a região receptora a fim de atender a demanda dos turistas. A cultura local, naturalmente não imune às transformações que traz o turismo e o consumo, vai aos poucos assimilando os novos hábitos. O contato com os novos hábitos de consumo e o bem-estar trazido com o avanço tecnológico, cria novas necessidades, que até então não faziam parte do cotidiano dessas comunidades.

Assim, velhos hábitos e costumes são aos poucos abandonados. O contato intenso com o exterior cria novos padrões de comportamento, que encontram correspondência nas condições objetivas que aos poucos vão sendo inseridas, em que a resistência é cada vez mais difícil. Desta forma, cria-se o impasse. A essência cada vez mais é substituída pela aparência, o conteúdo passa a não ser mais um fator primordial, o tradicional é substituído pelo espetáculo, a produção pelo consumo e a historicidade pelo desenraizamento.


Considerações finais

Este artigo apresenta algumas considerações sobre as características do novo consumidor turístico baseado no comportamento e nas motivações. A partir das análises podemos concluir que o turista atual apresenta motivações, necessidades, comportamentos distintos, além do elevado grau de exigência, flexibilidade e seletividade.

A demanda por turismo é influenciada por diversos fatores e, se considerarmos que o consumo turístico é antes de tudo a busca de uma experiência, existe uma grande influência das características psicológicas do consumidor no sentido do que representa a busca desta experiência.

De fato, a produção do espaço turístico está cada vez mais se adequando a nova demanda de consumo atual, em que os espaços enquanto destinos turísticos estão sendo criados e recriados, com a finalidade de satisfazer as exigências (sociais, econômicas, culturais e ambientais) de uma clientela dual, ou seja, ao passo que o consumo torna-se global a partir da inserção das novas tecnologias de informação e comunicação, os consumidores turísticos tornam-se seletivos.

De nada vale as iniciativas de copiar símbolos de destinos já consolidados e promover transformações espaciais radicais, já que cada vez mais prevalece o poder da identidade local como condição diferencial capaz de promover o desenvolvimento e o sucesso dos destinos e satisfazer as atuais características dos consumidores da atividade turística.

Notas


[1] Sobre as verdadeiras e falsas necessidades vide Marcuse, A ideologia da sociedade Industrial. Rio de Janeiro: Zahar, 1967, p.154.

[2] Lefèbvre, Henri. A vida cotidiana no mundo moderno. São Paulo: Ática, 1991.

[3] Mike Featherstone (1995) destaca a vinculação dessas teorias a expansão capitalista centrada na produção de mercadorias proporcionando prazeres emocionais, sonhos e desejos celebrados no imaginário cultural consumista e em locais específicos. In: Cultura do consumo e pós-modernismo. São Paulo: Nobel, p. 31.

[4] Para a OMT (Organização Mundial do Turismo), o turismo “comprende las actividades que realizam las personas durante sus viajes y estancias en lugares distintos al de su entorno habitual, por un período de tiempo consecutivo inferior a un año con fines de ocio, o negocios y otros” e turista es el visitante que se queda por lo menos una noche en acomodaciones privadas o colectivas. Ambos os conceitos são operacionais.

[5] Esse estudo tinha como objetivo definir quais os motivos que levavam uma grande parte da população dos Estados Unidos, com nível de renda alto, a não utilizar o transporte aéreo.


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