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REVISTA BIBLIOGRÁFICA DE GEOGRAFÍA Y CIENCIAS SOCIALES
(Serie documental de Geo Crítica)
Universidad de Barcelona 
ISSN: 1138-9796. 
Depósito Legal: B. 21.742-98 
Vol. XII, nº 729, 15 de junio de 2007

O DEBATE SOBRE A QUESTÃO RACIAL NO BRASIL URBANO: PASSADO E PRESENTE

Pedro de Almeida Vasconcelos, Ph.D em Geografia
Mestrado em Planejamento Territorial,
Univ. Católica de Salvador; Pesquisador CNPq


O debate sobre a questão racial no Brasil urbano: passado e presente (Resumo)

A discussão sobre um projeto no Congresso Nacional para o estabelecimento de cotas nas universidades para estudantes origem africana, seguindo a experiência norte-americana, gerou um enorme  debate sobre a questão racial no Brasil. O artigo propõe uma revisão da literatura sobre a temática, desde os inícios do século passado até o momento atual, através do comentário dos textos dos autores que trouxeram as principais contribuições sobre a questão. O artigo é concluído com uma síntese dos principais pontos levantados na literatura examinada e de uma indicação da contribuição possível da Geografia Histórica Urbana. 

Palavras chave: questão racial; literatura; Brasil.


El debate sobre el problema racial en el Brasil urbano: pasado y presente (Resumen)

El proyecto de establecer cuotas en las universidades de estudiantes de origen africano, basado en la experiencia establecida en Norte América, genero un gran debate sobre el problema racial que afecta al Brasil urbano. Este artículo tiene por objetivo realizar una revisión de la bibliografía mas destacada referente a este tema, desde el inicio del siglo pasado hasta el momento actual, incluyendo una síntesis de los aspectos principales abordados en esta literatura, como también, la contribución posible da la Geografía Histórica Urbana. 

Palabras clave:cuestión racial; bibliografía; Brasil.


O Brasil é um purgatório para os brancos, um inferno para os negros e um paraíso para os mulatos (Antonil, 1711).

Introdução

Com a discussão sobre as cotas para estudantes de descendência africana, a questão racial voltou a ter um grande interesse no Brasil. Com raras exceções, os geógrafos estão ausentes do debate. O que os geógrafos poderiam acrescentar ao referido debate cuja discussão é dominada pelos colegas da antropologia, da sociologia e da história?

Nos Estados Unidos os descendentes de africanos foram segregados, até os anos 1960, por uma linha de cor rígida, a partir da regra do “one drop rule”, ou seja, a presença constatada de sangue africano coloca o indivíduo na categoria de negro ou afro-americano, o que levou ao desenvolvimento de uma cultura específica e a formação de movimentos políticos em defesa dessa minoria discriminada.

No Brasil a situação é mais complexa: não houve uma separação residencial entre grupos raciais distintos; a miscigenação foi generalizada entre os três estoques populacionais (indígenas, europeus e africanos), dificultando, por um lado, a identificação de grupos raciais “negros” e sua organização política, assim como à implantação de políticas focadas aos declarados “afro-descendentes”, que incluiriam, segundo os movimentos políticos e parte dos intelectuais que tratam da questão, todos os indivíduos, classificados nas estatísticas como “pretos” e “pardos” a partir de suas auto-declarações de cor.

O debate foi ampliado com a publicação do polêmico artigo dos sociólogos franceses Bourdieu e Wacquant (1998; 2002) em que os mesmos denunciavam o enquadramento da complexa questão racial brasileira aos padrões dicotômicos norte-americanos, como parte da imposição por Fundação norte-americana, dos critérios de ação afirmativa para obtenção de seu patrocínio. 

O longo debate

As observações sobre a questão racial brasileira por cronistas, viajantes e outros observadores são muito antigas e remontam ao período colonial. Residentes estrangeiros como o inglês Koster, no início do século XIX, comentaram as diferenças sociais entre ser “branco” ou “de cor” no Brasil, como no exemplo, da presença de oficial mestiço entre as tropas coloniais[1]:

            "Conversando numa ocasião com um homem de côr que estava ao meu serviço,  perguntei-lhe se certo Capitão-Mor era mulato. Respondeu-me: Era, porem já não   é! E como lhe pedisse eu uma explicação, concluiu: - Pois Senhor, um Capitão-Mor póde ser Mulato?" [2].

Um dos precursores dos estudos sobre o negro no Brasil, foi o médico maranhense Nina Rodrigues (1862-1906). Imbuído pelo racismo “científico” do século XIX, considerava os negros como uma “raça inferior" e que os mestiços eram inertes e indolentes[3]. Seus estudos foram voltados, sobretudo para o exame dos cultos africanos na Bahia. Entre seus seguidores destaca-se o médico alagoano Arthur Ramos (1903-1949), que publicou um clássico sobre as religiões de origem africana no Brasil em 1934. Ele afirmou que muitas idéias de Nina Rodrigues "já não resistirão á critica cientifica de nossos dias", e que não endossava "os postulados de inferioridade do negro e da sua incapacidade de civilização"[4]. Outros estudiosos deram maior continuidade às pesquisas sobre as religiões afro-brasileiras, como o antropólogo baiano Edison Carneiro, que publicou uma importante antologia sobre o negro brasileiro[5]

Oliveira Vianna escreveu um dos primeiros livros específicos sobre a questão racial, Raça e Assimilação em 1932. Dividiu a população brasileira em quatro grupos étnicos: (1) o grupo branco, formado por brancos puros e os fenótipos do branco (mestiços); (2) o grupo caboclo, constituído pelos ameríndios puros e fenótipos do ameríndio (mamelucos e cafusos); (3) o grupo negro, formado pelos negros puros e fenótipos do negro (mulatos e cafusos); e (4) os pardos e mulatos, que formavam um grupo a parte[6]. Destacou que havia um grande preconceito contra a mestiçagem: os mestiços arianizados procuravam inscrever-se na classe dos brancos, dissimulando-se na roupagem eufemística de “morenos”. Na classe dos mestiços só ficavam os pardos e caboclos característicos, componentes da plebe, pois se fossem “coronéis” ou “doutores” eles seriam considerados “morenos”. Afirmou que o que importava nas conclusões sociológicas não era determinar o tipo puro (genótipo) e sim o tipo aparente (fenótipo). Haveria então dois tipos de brancos no Brasil: o branco puro (genótipo) e o branco aparente (fenótipo), assim como haveria o negro puro e o mestiço negroide (mulato). Considerou ainda o tipo característico do mulato, que se objetivava no “pardo” e o tipo característico do mameluco, que se objetivava no “caboclo” [7].

Na edição de 1959 foram anexados textos publicados em 1933, no qual Oliveira Vianna afirmava que as raças eram desiguais[8] e confirmava suas visões estereotipadas do negro: ele não poderia competir com as raças brancas ou amarelas[9]. Para ele, o negro nunca teria sido criador de civilizações e para que os negros pudessem exercer um papel civilizador “faz-se preciso que eles se caldeiam com outras raças ... especialmente com as raças arianas ou semitas”[10], ou seja, um registro tardio da visão preconceituosa de parte das “elites” brasileiras[11]

O sociólogo pernambucano Gilberto Freyre deu início à publicação de uma série de livros, sobretudo o clássico Casa Grande e Senzala em 1933, que modificaram fundamentalmente a visão da contribuição dos diferentes grupos raciais para a formação da sociedade brasileira. Dentro da perspectiva da história social, evidenciou a contribuição dos grupos dominados, sobretudo dos africanos, para a formação da cultura brasileira. Afirmou, por exemplo, que “Híbrida desde o início, a sociedade brasileira é de todas da América a que se constituiu mais harmoniosamente quanto às relações de raça” [12] e que o negro "era superior ao indígena e até ao português em vários aspectos de cultura material e moral". Também foi favorável a mestiçagem, com afirmações como a seguinte: "quando mestiços resultaram quase sempre da união do melhor elemento masculino - os brancos afidalgados das casas-grandes - com o melhor elemento feminino das senzalas - as negras e mulatas mais bonitas, mais sadias e mais frescas" [13]. Suas idéias foram consideradas, posteriormente, como as bases da ideologia da “democracia racial” brasileira[14], assim como do senso comum de que os problemas brasileiros eram, sobretudo, de classe e não de corte racial. Gilberto Freyre apresentou uma visão da questão racial totalmente oposta aos membros da elite brasileira da época, como as de Oliveira Vianna[15].

Donald Pierson, doutorando da Universidade de Chicago, sob a orientação de Robert Park, foi um pioneiro nos estudos das questões raciais no Brasil, a partir de pesquisa direta realizada em Salvador da Bahia, nos anos 1935 e 1937. O autor informou que a cidade em 1890 já apresentava uma maioria de população de cor: 35,1 por cento mestiços e 26,4 por cento pretos e apenas 32 por cento eram brancos[16]. Pierson afirmou que a sociedade baiana era multirracial, e que sua estrutura se fundamentava em distinção de classe e não de casta[17]. A desigualdade se baseava, sobretudo na classe[18]. A classe e não a raça representaria o principal critério de status. Ele citou um ditado popular para confirmar suas afirmações: “negro rico é branco e branco pobre é negro” [19]. Chegou a afirmar que a contextura do cabelo era mais importante que a cor da pele para a classificação do indivíduo[20].  

O autor deu destaque à questão dos mestiços: eles eram liberados de preferência aos pretos e desde o período colonial faziam parte das classes livres[21] e citou a lei que, em 1774, dava aos pardos acesso a “todos os ofícios, honras e dignidades, sem discriminação por questão de cor” [22], enquanto as restrições eram mantidas para os negros livres. Afirmou que os casamentos transpunham mais freqüentemente as linhas de raça que as de classe[23] e que os casamentos inter-raciais se realizavam mais facilmente entre as pessoas dos círculos “inferiores” [24]. Os mestiços eram 56,3 por cento das classes intermediárias, enquanto que os pretos eram apenas 5,1 por cento. Por outro lado, os pretos eram 75,2 por cento das classes “inferiores” enquanto os mestiços eram 23,3 por cento [25]. A diferença entre os estudantes era ainda maior: em 1936 havia 16,7 por cento de mulatos nos três cursos superiores de maior prestígio, enquanto os negros eram apenas 2,2 por cento. Quanto aos professores universitários, os mestiços eram 28,5 por cento e não havia negros nessa categoria[26].   

O autor concluiu com o levantamento de 25 hipóteses, dentre as quais destacamos: a miscigenação colocou os mestiços em posição favorável para a elevação social[27]; o preto e o mestiço estão representados em toda escala ocupacional[28]; não existe segregação propositada, sendo a distribuição espacial conseqüência da competição econômica; uma gota de sangue não classifica um mestiço como um negro[29]; existe preconceito no Brasil, mas seria antes de classe do que de raça; e existem distinções sociais no Brasil[30].

A antropóloga norte-americana Ruth Landes também realizou estudos sobre as religiões afro-brasileiras em Salvador, entre 1938 e 1939, tendo contado com o apoio de Edison Carneiro. A autora deu destaque ao papel das mulheres na religião e na sociedade. Observou que no Brasil as diferenças de educação, de ocupação e de distinção familiar teriam criado um hiato tão grande quanto as diferenças baseadas na cor nos Estados Unidos[31]. Observou que a “educação ou o dinheiro ... retiram um indivíduo do pitoresco grupo dos ‘negros’” [32] e afirmou que os negros "eram oprimidos por tiranias políticas e econômicas, mas não por tiranias raciais" [33].  

Nos anos 40, outros pesquisadores norte-americanos também realizaram estudos em Salvador, visando tanto às questões raciais como o exame das sobrevivências dos cultos de origem africana. Destacam-se a vinda do sociólogo negro F. Frazier, que publicou texto em 1942, quando estabeleceu a diferença entre preconceito de raça e preconceito de cor[34], e o antropólogo M. Herkovits (1943), que tinha maior interesse no exame das sobrevivências culturais africanas, sobretudo nas religiões[35].

Após o falecimento de Arthur Ramos, em 1949, foi publicado na França seu livro sobre a mestiçagem no Brasil em 1952. Além de realizar um balanço sobre a literatura estrangeira e brasileira sobre a questão, o autor diferenciou três áreas no Brasil: á "área do caboclo" no extremo Norte e no Oeste do país; a "área do negro e do mulato" no Leste e no Centro e a "área do europeu" no Sul e lembrou que a "base geral da população brasileira é constituída pela mistura inicial, tanto física como cultural, do elemento português com o Índio e o Negro". O autor considerou que a "mistura das raças nos trópicos não revelou qualquer desvantagem quanto aos resultados desta mistura" [36], confirmando suas divergências com Nina Rodrigues nessa questão.

Nos início dos anos 50, os dirigentes da Unesco, dentre os quais participava Arthur Ramos, encomendaram uma série de pesquisas, para o exame das relações raciais no Brasil, consideradas, na época, exemplares, para possíveis sugestões para outros contextos conflituosos, sobretudo os Estados Unidos e a África do Sul. Os estudos foram realizados com inclusão de pesquisas no terreno nas cidades de Recife, Salvador, Rio de Janeiro, São Paulo e Itapetininga e apresentaram resultados diferenciados: pela primeira vez foi colocada em questão a existência da “democracia racial” no Brasil. Outros estudos foram voltados para o meio rural[37].  

O estudo sobre as elites de cor em Salvador, cidade de maioria negro-mestiça, elaborado pelo médico e antropólogo baiano Thales de Azevedo, foi publicado, em francês, pela Unesco em 1953. O estudo visava compreender a ascensão social das pessoas de cor, através dos canais de mobilidade vertical. O autor informou que em 1950, os "pardos" correspondiam a 41,59 por cento da população da cidade, os pretos a 24,8 por cento e os brancos a 33,59 [38]. Outros pontos interessantes encontrados foi o aumento de número de pardos e a queda dos pretos no conjunto da população, o que levou o autor a afirmar que "Todos notam que marchamos para uma população totalmente mestiça, mas com aparência branca" [39]. Assim como Pierson, seus dados indicam uma forte diferença entre os mestiços e os pretos: por ex., das 137 pessoas diplomadas pela Faculdade de Filosofia, entre 1945 e 1950, 33,5 por cento eram pardos e apenas 2,9 por cento eram pretos[40]. O autor chegou as seguintes conclusões: "É somente em parte verdadeira a idéia de que na Bahia não existem preconceitos e discriminações por motivo de cor"; que "a sociedade baiana é uma sociedade multi-racial de classes, em que realmente não há castas, isto é grupos fechados" [41]; e que a educação era o principal canal de ascensão social "através o qual grande número de pretos e mestiços tem adquirido status elevado" [42]

Em texto excluído do livro de 1953 e publicado posteriormente em 1956, Thales de Azevedo apresentou outras questões de interesse: para ele "a Bahia não concluiu a sua passagem de uma sociedade de status para uma sociedade exclusiva ou preponderantemente de classes sociais" [43]. A sociedade seria dividida em três estamentos: a classe alta ou elite, a classe média e a classe baixa, "os pobres" [44]. Havia uma linha de distinção que separava os dois grupos de status e prestígio: de um lado as classes alta e média, e do outro a classe baixa[45]. A elite, onde se concentravam as pessoas de fenótipo branco, era discriminatória em relação aos pobres, sem ser arrogante. A classe média se identificava com a alta sociedade[46], enquanto que na classe baixa, onde se encontrava a maioria das pessoas de cor, os preconceitos de cor eram reduzidos ao mínimo[47]. O autor concluiu que a mobilidade social era freada pelo status de nascimento e pela cor e que a mestiçagem promovia a ascensão de grupos de cor[48]

Em 1953 também foi publicado o estudo do sociólogo baiano L. A. Costa Pinto sobre o Rio de Janeiro. O autor apresentou inicialmente os dados da população da cidade: em 1872 estava dividida em 52,21 por cento brancos, 44,79 por cento pardos e 24,13 por cento e pretos. Em 1950 os brancos passaram para 69,86 por cento, os pardos reduziram para 29,80 por cento e os pretos para 12,30 por cento [49].

Para o autor, o baixo nível de instrução era responsável pela posição social inferior dos grupos de cor[50]. De fato, em 1872, apenas 329 dos 45.040 escravos eram alfabetizados. Houve uma considerável melhoria nessa área: em 1940, os alfabetizados eram 87,84 por cento (brancos), 75,07 por cento (pardos) e 53,64 por cento (pretos), ou seja, os pardos estavam mais próximos do percentual dos brancos[51], porém entre as pessoas com grau superior, os pardos eram apenas 4,24 por cento e os pretos 0,5 por cento [52]. O mesmo se dava no total dos empregadores: eles contavam apenas 4,25 por cento entre os elementos de cor[53].

Quanto ao padrão ecológico, visto como a “composição étnica das classes sociais” e a "distribuição dessas classes pelas zonas urbanas” [54], o autor informou que a população favelada, na época 27 por cento da população total, era composta, em 70,95 por cento por pessoas de cor[55].

Costa Pinto afirmou que nos Estados Unidos os negros e brancos estavam estratificados por um sistema de castas, enquanto que no Brasil a estratificação era baseada num sistema de classes[56], mas concluiu que sociologicamente, as diferenças da situação racial entre os Estados Unidos e o Brasil eram antes de tudo de grau, mas não de espécie[57]. Não existiria no Brasil “uma filosofia racista definida e forte dando apoio à sanção moral à discriminação racial” [58], mas a questão racial estaria em processo de agravamento[59].  

São Paulo, a metrópole que sofreu o maior impacto da imigração européia (e posteriormente asiática), foi examinada pelo sociólogo francês Roger Bastide, que já tinha vários estudos publicados sobre as religiões afro-brasileiras, em conjunto com o sociólogo paulista Florestan Fernandes em 1955.

Florestan Fernandes escreveu os dois primeiros capítulos. Apresentou dados sobre São Paulo em 1818 e 1872. Nesse último ano, os brancos eram 18.834 habitantes (60 por cento), os pardos 6.711 (21,4 por cento) (sendo 950 escravos) e os negros 4.968 (15,8 por cento) (dos quais 2.878 eram escravos)[60]. Lembrou que, com a abolição, aos escravos teria sido concedida uma liberdade teórica, sem “qualquer garantia de segurança econômica ou de assistência compulsória” [61]. Destacou que o trabalhador negro, deformado pela escravidão, não estava em condições de resistir a livre competição com o imigrante europeu[62]. As oportunidades do trabalho foram aproveitadas pelos imigrantes e, posteriormente, pelos “trabalhadores nacionais”, que constituíam a camada livre da população, tendo o elemento negro perdido sua posição no sistema econômico da cidade[63]. Ele só teria sido absorvido nas ocupações mais humildes e mal remuneradas[64].

Informou que em 1940 a população de São Paulo passou para 1.326.261, sendo que os brancos teriam aumentado para 90,7 por cento, enquanto que os pretos foram reduzidos para 4,8 por cento e os pardos para 3,4 por cento [65]. Florestan destacou também que alguns mulatos claros teriam sido incorporados às famílias senhoriais[66]. Para ele, a estratificação social de São Paulo nunca representou o produto de diferença de raça ou de cor[67]. A cor, de marca racial passou a ser um símbolo de posição social[68].

Os capítulos 3 e 4, sobre o preconceito de cor, foram escritos por Roger Bastide. O autor destacou que as famílias tradicionais não aceitavam “o novo negro”, que não saberia ficar “no seu lugar” [69]. Também existiria um “certo preconceito” do imigrante italiano contra o negro[70]. Por outro lado, teria sido criada uma elite e uma classe média puritana, respeitável, formada, sobretudo pelos mulatos[71], que manifestariam um “preconceito mais tenaz” contra o preto[72]. Para o autor, o estereótipo de cor seria no fundo um preconceito de classe[73]. As barreiras na escola seriam mais de classe do que de raça[74]. Nos bairros pobres, os brancos viviam com os negros, e a mistura seria tal que qualquer preconceito seria ridículo[75]. As misturas de sangue fariam desaparecer as oposições de cor, através da fusão em uma “raça morena” que tenderia a abolir o problema racial, através da supressão das raças[76]. De fato não existiria uma definição sociológica do “negro” ou do “mulato” no Brasil[77]. Bastide concluiu que “ninguém queria perder o clima tão mais livre e afetivo do Brasil” [78], e a política dos brancos, quanto às massas, era a do “laisser-faire”, não havendo barreiras legais[79].

No capítulo 5, Fernandes concluiu que o preconceito de cor não atingiria de maneira uniforme todas as pessoas negras e mulatas[80].

Outro estudo vinculado ao programa da Unesco é o de Oracy Nogueira, publicado em 1955, no qual o autor analisou as relações raciais na cidade de Itapetininga no interior do estado de São Paulo. Uma originalidade local era que os mestiços eram o grupo mais numeroso, em 1799: 47,5 por cento (mulatos livres), 42,6 por cento (brancos), 7,6 por cento (pretos cativos), mulatos cativos (2 por cento) e pretos livres (0,3 por cento) [81]. O autor comentou que para essa população, “ascensão de classe e branqueamento são dois aspectos do mesmo processo” [82]. Com a abolição, os últimos escravos, 6 a 7 por cento da população ficaram “entregues a própria sorte, obrigados a competir” com os demais habitantes, inclusive os de origem estrangeira[83]

Em 1940 a população do município era de apenas 34.437 habitantes, agora com maioria branca (89,77 por cento), em detrimento dos pretos (5,21 por cento) e pardos (3,99 por cento). O autor, porém, estimou que o grupo mestiço alcançava 20 por cento da população[84]. De fato, ao longo do tempo, mestiços se incorporaram no grupo dos “brancos”, pois os indivíduos de cor, em condição de subir socialmente, se uniriam com pessoas brancas[85].

Os descendentes de estrangeiros eram cerca de 10 a 15 por cento da população[86]. A sociedade estava classificada em três classes, tendo o autor estimado 20 por cento na classe média e 75 por cento na camada “menos favorecida” [87]. Essa era formada por brancos (75 por cento), pretos (15 por cento) e pardos (10 por cento). Os pardos declarados comporiam 10 por cento da classe média e os pretos apenas 1 por cento [88].

O autor concluiu que a ideologia brasileira de relações raciais “é ostensivamente miscigenacionista e igualitária” [89] e que a ideologia do branqueamento “assinala como recomendável a miscegenação” [90]. Sua maior contribuição é a distinção do preconceito de “marca racial” ou “de cor”, que faz com que o mesmo seja antes individual do que de grupo[91], e que contrasta com o preconceito racial de origem, pois não implicaria em exclusão ou segregação dos membros do grupo discriminado, e sim a sua preterição[92]. A ideologia que prevalece no Brasil contrasta com a dos países de colonização inglesa que seria “segregacionista e racista” [93]. Haveria também a tendência a se “ignorar a cor escura de indivíduos socialmente bem sucedidos” [94], o que reforça a visão da classificação social das “raças” no Brasil.

Em Recife, René Ribeiro, médico e discípulo de Herkovits, numa linha muito próxima de Gilberto Freyre, procurou examinar as relações raciais naquela cidade, com destaque para a questão das religiões (1956).

O autor informou que em 1940, Pernambuco tinha 54 por cento de sua população registrada como brancos, 30 por cento como mestiços e 15 por cento como pretos[95]. Para o autor a miscigenação era vista como encontro de culturas, e seria um dos "elementos capitais para a formação ... de uma sociedade hibrida ... e tolerante dos contatos de raça" [96]. A intensa miscigenação tiraria a todo indivíduo "qualquer veleidade de pureza racial", e o preconceito, quando existente seria de cor e não de raça como em outros países[97]. Comentou a tendência dos mestiços e negros em "limpar a raça", o que levaria a uma "estabilização de um tipo de mestiços de côr mais escura nas classes pobres e de côr predominantemente clara nas classes privilegiadas" [98]. Considerou, de maneira otimista, que a tolerância do patriarcalismo cristão luso-brasileiro teria permitido o "estabelecimento de relações mais harmônicas entre as raças em nossa sociedade" [99] e lembrou que nunca houve segregação nas igrejas durante o período colonial[100].

Quando tratou da etiqueta das raças, afirmou que a ausência de segregação racial seria uma das características principais da situação social no Nordeste[101]. Pesquisou, através de sondagens, universitários, grupos confessionais e alunos de colégios, chegando à conclusão que os alunos nordestinos seriam mais tolerantes para com os negros e mulatos do que seus colegas de São Paulo ou dos alunos americanos, a partir de resultados de pesquisas semelhantes[102]. Nessa parte, desviou da temática principal, analisando o preconceito com várias nacionalidades, inclusive questionando sobre armênios e hindus ...  

Afirmou, como Pierson e Azevedo, que o Nordeste estaria evoluindo para uma sociedade multi-racial de classes[103]. As classes sociais se diferenciariam etnicamente com a predominância dos mestiços de cor escura nas classes "baixas" e de mestiços de pele clara mais acentuadas nas classes "altas" [104]. Finalmente, o preconceito contra negros e mulatos existiria, mas se manifestaria nas classes médias e superior[105]. Dos estudos encomendados pela Unesco este é o que teve menor impacto[106].

Em paralelo, intelectuais negros como o ativista Abdias do Nascimento e o sociólogo baiano Guerreiro Ramos, residentes no Rio de Janeiro, além de terem sido exilados nos Estados Unidos, participaram em conjunto de instituições como o Teatro Experimental do Negro e publicaram textos sobre a questão racial.

Alberto Guerreiro Ramos[107] fez uma longa crítica à sociologia brasileira e a sua dependência das idéias importadas, em seu livro de 1957. Criticou os estudos realizados pelos cientistas sociais sobre o “problema do negro”, inclusive os do projeto da Unesco. Para ele o negro é “um ingrediente normal da população do país, como povo brasileiro” e afirmou enfaticamente: “o negro é povo, no Brasil” [108]. Comentou que no Brasil “o negro é mais negro nas regiões onde os brancos são maioria e é o mais claro nas regiões onde os brancos são minorias”, ou seja, minoria no Sul e maioria no Norte e Nordeste do país. Lembrou que o “nosso branco é, do ponto de vista antropológico, um mestiço, sendo entre nós, pequena minoria o branco não portador de sangue preto” [109]. Considerou que o caso patológico seria o do “branco”, sobretudo no Nordeste e da Bahia e que nessas regiões os membros da minoria “branca” seriam “muito sensíveis a quem quer que ponha em questão a sua ‘brancura’" [110]. Concluiu que, do ponto de vista étnico, o Brasil era um país de mestiços[111]

O ativista negro Abdias do Nascimento[112], reuniu os resultados do I Congresso do Negro Brasileiro, realizado em 1950, no livro O Negro Revoltado, de 1968. Embora, em 1950, o autor ainda afirmasse que "a larga miscigenação ... está se transformando ... numa bem delineada doutrina de democracia racial, a servir de lição e modelos para outros povos" [113], na sua apresentação de 1968, refletindo o título de sua obra, o autor ampliou suas criticas de forma bastante agressiva: estaria havendo um evidente retrocesso na participação do negro na direção da vida no país[114]. Afirmou que a estratégia da discriminação no Brasil, sob certo aspecto seria "mais sutil e mais cruel" do que a praticada nos Estados Unidos, pois não permitira a oportunidade da defesa da vítima[115]. Criticou a sociologia, que pregaria a aculturação como forma de solução do problema negro no Brasil. Para ele no Rio de Janeiro "a segregação residencial atinge seu ponto mais alto, basta percorrer os guetos das favelas" [116]. A miscigenação teria sido facilitada pela condição do escravo[117]. Para reagir, o primeiro passo do negro seria de assumir sua "negritude", e que o que valeria era o conceito popular e social da raça. Numa das suas críticas mais fortes afirma que "aos 'cientistas' tem cabido a tarefa gloriosa de endossar esse verdadeiro genocídio aqui apresentado como modelo e exemplo de cruzamento de raças e harmônica convivência social" [118].     

No prefácio da segunda edição, em 1982, o autor anexou cópia da conferência realizada nos Estados Unidos, em 1980, quando denunciou que "a única ocupação do colonizador branco foi a de massacrar os povos indígenas brasileiros e de estuprar e torturar mulheres e homens africanos e indígenas" [119]. Para ele o genocídio do povo negro teria se dado "através da liquidação física, inanição, doença não atendida e brutalidade policial, mais sutil é a operação da miscigenação compulsória" [120]. Por outro lado, defendeu que sua experiência nos Estados Unidos "apenas reforçou, reconfirmou e ampliou a consciência que já havia se desenvolvido no Brasil" [121].

Nos finais dos anos 50 e inícios dos anos 60 foram realizados estudos pelos discípulos de Florestan Fernandes, Otavio Ianni e Fernando Henrique Cardoso, nas capitais dos estados da região sul do Brasil, onde a população de cor é bastante minoritária. 

No livro Raças e Classes Sociais no Brasil, de Octavio Ianni, foram republicados três capítulos sobre a questão racial em Florianópolis. Publicados originalmente em 1959 pelo autor, e em 1960, em conjunto com Fernando Henrique Cardoso. Foram analisados os resultados de pesquisa realizada com 552 jovens de famílias burguesas e da classe média[122].

A maioria da população negra e mulata morava nos "morros" da periferia da cidade[123]. Segundo o autor, o grupo negro e mulato, dado ao seu número reduzido na cidade e das condições em que se encontravam "define seus objetivos em termos de ajustamento integrativo ao grupo branco" [124]. Uma pequena parcela de negros e mulatos, sobretudo os últimos, começava a penetrar na classe média. O autor considerou que democracia racial era um mito[125], mas o preconceito seria menos intenso na "classe baixa" da população[126]. O preconceito racial porém não se confundiria com o de classe[127]. No passado houve clubes negros e clubes exclusivos de mulatos e até de mulatos claros[128]. "Branquear" seria uma inspiração dos negros e mulatos[129]. Dos 20 estudantes mulatos examinados, os 10 mais claros teriam se declarados brancos[130]. Encontrou diferenças: enquanto o negro seria reservado, o mulato, em geral, seria afável[131]. Os mestiços teriam tomado a vanguarda das "populações de cor" [132] e o autor destacou que o mulato nunca queria ser confundido com um "preto" e muito menos com um "negro" [133].     

Os estudos de Curitiba e de Porto Alegre examinaram a questão da escravidão, com análises de inspiração marxista, tratando a problemática racial de forma complementar.

O exame de Curitiba, também efetuado por Ianni, foi publicado em 1961. A população de cor era muito reduzida: em 1950 os negros eram apenas 1,85 por cento da população e os mulatos 3,88 por cento, em 1950 [134]. Ianni concluiu que Curitiba era uma sociedade de classes e que o grupo negro e mulato se encontra disperso em mais de uma classe[135].

No caso do Rio Grande do Sul, estudado por Cardoso, publicado em 1962, o número de escravos era maior, mas caiu de cerca de 60.000 em 1884 para 8.500 em 1887 (dos quais apenas 58 escravos em Porto Alegre), um ano antes da abolição[136]. Para Cardoso os mulatos tinham mais possibilidades de ascensão[137] e haveria “preconceito dos mulatos contra os negros” [138].

Em 1964 foi publicado o livro do antropólogo norte-americano Marvin Harris que examinou a questão dos padrões raciais no contexto do continente americano.

Inicialmente o autor informou que os donos das plantações de açúcar consideravam o preço do escravo africano como equivalente ao de cinco índios[139]. Também destacou que a plantation com escravos era uma inovação ecológica racional, pois os escravos iam trabalhar numa forma de agricultura que não existia nem na África nem na Europa[140].

O autor dedicou um capítulo ao padrão brasileiro. Afirmou que nas regiões de plantations faltaram as divisões de tipo casta, baseadas em diferenças raciais, pois na maior parte da América Latina não existiriam nem “grupo negro” nem “grupo branco” [141]. No caso brasileiro, irmãos e irmãs podem ser considerados como representantes de tipos raciais opostos[142]. Quanto aos Estados Unidos, o autor comentou que um meio-branco ser considerado negro em vez de branco, não pode ser explicado por argumentos racionais[143]. Por outro lado seria enganoso pensar que “no Brasil não há preconceitos raciais” [144], mas não haveria “nenhum papel real para o negro ser negro, ou para o branco ser branco, ou para o mulato ser mulato”. Não haveria grupos raciais no Brasil. Seria a classe a que o indivíduo pertence e não a raça, que determinaria a adoção de atitudes subordinadas ou superiores entre os indivíduos[145], lembrando que os brancos de classe inferior e os negros da mesma classe seriam igualmente segregados e “discriminados” [146].

A maior contribuição de Harris é quando ele trata das “origens da lei de descendência”. Destaca que no Brasil a proporção de brancos sobre os não-brancos era o oposto dos Estados Unidos. Em 1819 os brancos eram menos de 20 por cento da população do Brasil (nos Estados Unidos eram 80 por cento em 1820) e havia cerca de 585.000 homens de cor livres sobre 1.500.000 a 2.000.000 de escravos (nos Estados Unidos 233.634 negros livres sobre 1.538.000 escravos). O que o autor considera espantoso era o número de pessoas de cor livres, no Brasil, em relação ao número de brancos[147].

O autor elaborou então a seguinte hipótese: “dada a falta crônica de mão-de-obra em Portugal ... os donos de escravos não tiveram outra solução senão a criação de uma classe de mestiços livres”, ou seja foram forçados a criar um grupo intermediário livre de mestiços que se colocasse entre eles e os escravos, para realizar funções econômicas e militares essenciais  (como a supervisão dos escravos e a perseguição de escravos fugidos) que não poderiam ser realizadas pelos escravos e para as quais não havia brancos suficientes[148]. No sul dos Estados Unidos essas funções foram exercidas pelos camponeses brancos[149].

O autor conclui que uma das conseqüências mais profundas do plantio utilizando escravos teria sido a limitação das famílias de imigrantes europeus[150]. Quanto ao valor dado à classe seria sintoma dos sistemas em que a mobilidade social é extremamente difícil. Depois do final da escravidão, os brancos pobres, os mulatos e os negros se encontravam mais ou menos na mesma situação[151].

Mas o principal estudo do período é o volumoso texto de Florestan Fernandes (1965), agora elaborado como tese para concurso na Universidade de São Paulo, retomando, de forma mais crítica, as questões raciais na cidade de São Paulo, tratadas conjuntamente com Bastide na década anterior.

Afirmou inicialmente que, “esse contingente da população teve o pior ponto de partida para a integração ao regime social que se formou ao longo da desagregação da ordem social escravocrata e senhorial e do desenvolvimento posterior do capitalismo no Brasil” [152]. Destacou que São Paulo era a cidade brasileira na qual a revolução burguesa teria se processado com maior vitalidade, e que o “negro” só teria adquirido importância econômica tardia e teria sofrido os efeitos da concorrência da substituição populacional[153]. Tratou da emergência do negro na sociedade de classes. Comentou os dados da população em 1890, e que o ex-escravo teria sido expelido para as ocupações marginais ou acessórias do sistema de produção capitalista[154]. O negro concorreu com o operário imigrante e com os elementos da plebe nacional[155]. Desenvolveu uma longa discussão sobre a pauperização e anomia social entre os "negros". Por outro lado, afirmou que, a coexistência racial era a regra nas camadas sociais "pobres" e "dependentes" [156]. Para ele o “homem de cor” nunca teria ameaçado o “homem branco”, e que barreiras não teriam sido formadas para impedir a ascensão do “negro”. Por outro lado, afirmou que a “democracia racial” era um mito, pois a igualdade racial perante a lei só favoreceria a hegemonia do “homem branco” e que seria um mecanismo de acomodação das elites dirigentes[157]. A ordem racial teria sido elaborada no passado, e teria permanecido ao longo da desagregação da sociedade de castas e dos primeiros desenvolvimentos da sociedade de classes[158]

No segundo volume tratou, inicialmente, dos movimentos sociais do “meio negro” e da impulsão igualitária de integração social. Lembrou que o “branco miserável” compartilhava por igual da miséria, da degradação e da corrupção do segmento da população de cor[159]. Para ele, os mecanismos de dominação racial sempre comportaram a prática de acefalização da “população de cor” [160]. Em seguida tratou do problema do negro na sociedade de classes. Deu como exemplo que havia apenas 133 negros e mulatos (0,78 por cento) entre os empregadores, em 1941 [161]. O Brasil seria um "caso extremo de tolerância racial", mas a tolerância não estaria a serviço da igualdade social[162]. Para Fernandes, o “preconceito de cor” só se desencadeia quando o “negro” emergiria a tona. Afirmou que o “branco” cultivaria, o “preconceito de não ter preconceito” [163], enquanto que o “negro” absorvia a ideologia “racial” dominante[164]. De fato haveria “um hiato considerável entre o sistema de relações raciais e o padrão de integração social da ordem social competitiva” [165].

Nas conclusões o autor afirmou que a desigualdade racial era “aceita socialmente como algo natural” [166], e que era inexistente “uma filosofia democrática nas relações raciais” [167].

Nos anos 70 foram publicados dois livros importantes de dois historiadores norte-americanos.

O livro de Carl Degler (1971) teve como objetivo explicar historicamente as diferenças dos padrões raciais no Brasil e nos Estados Unidos[168]. A partir de levantamento aprofundado na literatura sobre a questão racial o autor destacou que o preconceito de raça no Brasil seria aparentemente ausente[169], assim como o caráter historicamente benigno das relações raciais no Brasil[170]. Para ele, preconceito é uma atitude enquanto que a discriminação é uma ação[171]. O status legal seria mais importante para a diferenciação entre os homens do que a raça[172]. As barreiras de classe teriam sido efetivas barreiras raciais ou de cor[173]. Por outro lado, a ausência de discriminação racial aberta dificultava o reconhecimento de aspectos comuns da questão racial[174]. Comentou também que as relações entre as raças variavam entre as regiões brasileiras[175].

Sua maior contribuição foi sobre a questão do mestiço: destacou que o mulato é negro nos Estados Unidos e não é negro no Brasil[176]. A "válvula de escape" do mulato (escape hatch)[177] seria a chave das diferenças das relações sociais nos dois países[178]. Seria extremamente difícil desenhar uma linha entre brancos e pretos no Brasil[179]. Por outro lado à válvula de escape do mulato teria tido o efeito de inibir o avanço do negro como grupo[180]. A questão racial no Brasil, portanto, não teria sido “resolvida” [181]. O autor conclui comparando a situação do negro no Brasil com a da mulher[182], ou seja, outra “minoria” que também seria discriminada[183].

Thomas Skidmore, estudou, com profundidade, as opiniões sobre a raça expressas pelos representantes da elite brasileira, com livro publicado em 1974[184]. Constatou que a teoria da superioridade ariana era aceita como fato de determinismo histórico, por essa elite, entre 1888 e 1914 [185]. Só nas décadas de 30 e 40 do século XX é que o racismo científico teria perdido a sua credibilidade no Brasil[186]. Fez o elo importante entre o laissez-faire da ideologia liberal dominante no período da política imigratória brasileira (1887-1914) com o abandono das massas, que era constituída, em sua maior parte pelos não brancos[187].

Destacou que Gilberto Freyre “virou de cabeça para baixo a afirmação de ter a miscigenação causado dano irreparável” ao Brasil, e que era, ao contrário, “uma vantagem imensa” [188]. Comentou também a “saída” mulata no Brasil, quando cita Degler, afirmando que a mesma nunca funcionaria nos Estados Unidos. Levantou, também, a hipótese de que “essa recente reafirmação da negritude talvez contribua também, para a ascensão dos mulatos norte-americanos, capazes de se beneficiar do virtual sistema de cotas que as pressões governamentais criaram” [189], temática de grande atualidade nos Estados Unidos e no Brasil. Para ele a questão racial fica submersa, debaixo da questão mais importante da justiça social para os milhões de pobres brasileiros, que estão na base da desigual escala de distribuição de renda[190].   

Thales de Azevedo, duas décadas depois do seu trabalho para a Unesco, trouxe mais uma publicação sobre a democracia racial (1975), reunindo textos publicados anteriormente.

Em artigo de 1966, sobre mestiçagem e status, comentou que indivíduos de cores mais claras teriam maiores possibilidades de "se tornar socialmente brancos" [191]. Em texto de 1974, considerou que a escravatura no Brasil teria sido "em verdade, cruel e dura" [192] e que a "pretendida democracia racial realmente é uma ficção ideológica" [193].

Na Introdução, de 1975, afirmou que não existem expressões ostensivas de segregação de um grupo pelo outro[194]. Em texto inédito, lembrou que o mito da democracia racial era o de haver igual oportunidade para brancos, pretos e mestiços[195]. Por outro lado, seria "branco" "todo aquele que, ainda sendo mestiço, tem certos atributos do grupo social superior" [196], confirmando o critério social de classificação racial na Bahia.

A publicação da tese de doutorado do sociólogo argentino Carlos Hasenbalg, de 1979, realizada na Universidade da Califórnia, traz a discussão da questão racial brasileira para o período após a abolição (1888). O ponto central da sua análise é o de tirar a ênfase do legado do escravismo e de "acentuar o racismo e a discriminação depois da abolição como as principais causas da subordinação social dos não brancos e seu recrutamento a posições sociais inferiores" [197]. O autor lembrou que, enquanto na África do Sul e nos Estados Unidos havia a coerção estatal legalizada, nos países latino-americanos a dependência maior tinha sido na ideologia[198]. Comentou as conseqüências sociais da abolição, mostrando as diferenças regionais, como a existência, há séculos, de pessoas de cor livres no Nordeste e em Minas Gerais[199], o que teria atenuado a dicotomia do negro como escravo e do branco como livre. Isso teria também facilitado a absorção do ex-escravo na estrutura social dessas regiões[200]. No Sudeste, os ex-escravos e a população de cor livre teriam sido deslocados pelos imigrantes.

Para o autor as causas históricas das desigualdades raciais refletiriam as oportunidades desiguais de ascensão social após a abolição[201]. Os dados sobre os alfabetizados, de 1950, mostravam uma diferença entre os 62 por cento de brancos e 42,8 por cento de não-brancos no Sudeste, porém esses últimos tinham uma taxa mais elevada do que a dos "brancos" das demais partes do Brasil, 40,7 por cento [202], o que confirma a importância da questão regional, além da racial. Os dados levantados sobre a concentração de diplomas universitários e secundários entre os brancos, em 1950, levaram a afirmação exagerada, pelo autor, da existência de uma "discriminação educacional", que juntamente com uma discriminação racial teria produzido à "exclusão virtual dos não brancos das escolas secundárias e universitárias" [203].

Hasenbalg entrevistou 1.314 pessoas (80 por cento brancos e 20 por cento não brancos)[204], em seis estados do Centro-Sul. Após registrar que as pessoas de cor atingiram um menor número de anos de educação do que os brancos da mesma origem social, o autor concluiu ser difícil decidir se as diferenças inter-raciais seriam resultado de práticas discriminatórias na escola ou por fatores fora da escola[205]. Os não-brancos também entrariam no mercado de trabalho com menores qualificações educacionais[206]. O autor lembra que na análise realizada os preditores mais importantes seriam a ocupação do pai e a educação dos entrevistados, enquanto que sexo e raça seriam preditores mais fracos[207].

Hasenbalg chegou a várias conclusões: nem durante a escravidão nem depois teria havido a formação de mercados de trabalho racialmente segmentados[208]; o ideal de "branqueamento" e o mito da "democracia racial" seriam produtos intelectuais das elites dominantes brancas[209]; entre os operários negros predominava a identidade de classe sobre a identidade racial[210]; na classe baixa, negros e mulatos compartilhavam condições de vida semelhantes às de muitos brancos e de mestiços quase brancos[211]; não teria havido tendência à formação de guetos racialmente homogêneos[212]; as restrições a extensão da cidadania e a pouca tolerância às pressões de baixo pelas sucessivas coalizões no poder, estariam entre os traços mais persistentes do sistema político brasileiro[213]; finalmente, os negros e "outros grupos sociais subordinados", tais como os camponeses, a classe trabalhadora urbana e o subproletariado "foram sujeitos a mecanismos de dominação que incluem controles ideológicos, cooptação social e pura repressão" [214]. É interessante observar que os negros foram separados, pelo autor, dos demais “grupos sociais subordinados” dos quais eles fazem parte. As afirmações sobre as "práticas discriminatórias" generalizadas nas escolas levantam a questão de como explicar que os não-brancos do Sudeste tenham percentuais mais elevados em alfabetização dos que os "brancos" do Nordeste?[215]   

Em 1981 foi publicado pelo IBGE[216], o estudo O Lugar do Negro na Força de Trabalho, elaborado por Lúcia Elena G. de Oliveira, Rosa Maria Porcaro e Tereza Cristina N. Araújo. A pretensão do estudo era o de examinar a “articulação entre raça e estratificação social através do estudo de brancos e negros na estrutura ocupacional”, a partir de dados da PNAD – Mão-de-Obra de 1976[217]. As autoras informaram que, no quesito aberto sobre cor, 34,4 por cento dos informantes se declararam de cor “morena”. Mas as autoras optaram por juntar pretos e pardos como “negros” porque os “indivíduos que se autoclassificaram nestas categorias compartilham de uma situação sócio-econômica semelhante ...”; consideraram que o termo “negro” já era consagrado no pensamento social brasileiro, incluindo autores desde Gilberto Freyre a Florestan Fernandes; e que também estabeleceram contato com “entidades negras” na busca de subsídios[218]. Elas utilizaram “raça” em vez de “cor” pois o último termo não incorporaria aspectos culturais e históricos dos grupos sociais[219]. Deram destaque a Otávio Ianni e Florestan Fernandes na questão das raças e classes, assim como a teoria da marginalidade social.

Chegaram aos resultados seguintes: a força de trabalho em 1976 tinha 57,1 por cento trabalhadores declarados de cor branca, 30,9 por cento de cor parda e 9,3 por cento de cor preta. Nas ocupações não manuais os brancos eram 8,5 por cento, enquanto os pardos eram 2,7 por cento e os pretos 1,1 por cento [220]. Esses trabalhadores correspondiam a 18 por cento da força de trabalho e concentravam 47,8 por cento do total dos rendimentos[221]. Quanto aos anos de estudo os brancos tinha 9,7 anos em média, os pardos 6,5 e os pretos 4,8, ou seja, os pardos estavam mais próximos dos brancos[222]. [Os amarelos tinham 9,6 anos de estudo[223]]. Os brancos tinham rendimentos médios mais elevados: Cr$ 10.229,80, os pardos Cr$ 5.070,30, os pretos Cr$ 3.776,50[224]. [Os amarelos, com Cr$ 9.732,90 se aproximavam dos brancos[225]]. Dos 10 por cento da população mais pobre os brancos eram 40 por cento, os pardos 39,2 por cento e os pretos 17,4 por cento [226]. Do total das empregadas domésticas as pretas eram 43,8 por cento, as pardas 25,8 por cento e as brancas 18 por cento, ficando o percentual das pardas mais próximo do das brancas[227].    

A última parte é sobre a questão da família e da reprodução da desigualdade: 80,5 por cento das famílias pretas, 74,2 por cento das famílias pardas e 50,4 por cento das famílias brancas tinham rendimentos de até três salários mínimos. Já o rendimento médio familiar era de 10,3 salários mínimos para os brancos, 8,1 para os pardos e 6,0 para os pretos, mais uma vez os pardos ficaram mais próximos dos brancos[228].

Quanto ao sexo, as mulheres tinham, em média, 2,8 anos de estudo (os homens 3,6), o que as aproximam do percentual dos pardos: 2,5 (brancos 4,4 e pretos 1,9). O mesmo ocorre com o rendimento: as mulheres tinham, em média, 2,8 salários mínimos (os homens 5,0) e os pardos 3,0 salários mínimos (brancos 5,8 e pretos 2,1), o que lembra a semelhança da situação das mulheres com a dos negros proposta por Degler (1971).

Finalmente, quanto à homogamia racial, as autoras apresentaram dados interessantes: enquanto os chefes de família brancos tinham apenas 11,9 por cento pardas e 2,2 por cento pretas como cônjuges, os pardos casados com brancas chegavam a 26,2 por cento (e apenas 4,8 por cento com pretas), enquanto que os pretos casados com pardas alcançavam 26 por cento e 17,3 por cento com as brancas. Os chefes de família “negros”, com mais de 11 anos de estudo, tinham uma alta proporção, 43,2 por cento, de casados com brancas, o que confirma a elevada mestiçagem no Brasil[229].  

As autoras concluíram que “a raça seria um critério fundamental a ser relevado no estudo da divisão social do trabalho no Brasil”[230]. O estudo tem importância por ser originado de uma instituição federal e por admitir a junção de pardos e pretos como “negros”.

O antropólogo Roberto DaMatta publicou, em 1987, um texto interessante sobre a “fábula das três raças”. O autor, que ensinou em universidades norte-americanas, sempre estabelece paralelos com os Estados Unidos. Nesse país não haveria escalas entre os elementos étnicos: “ou você é índio ou negro ou não é!”, enquanto que no caso brasileiro o ponto chave seria a admissão de gradações e nuances[231]. No Brasil haveria uma junção ideológica entre um sistema hierarquizado real e sua legitimação ideológica em um plano muito profundo. Na nossa sociedade "cada coisa tem um lugar demarcado ...” e os índios e negros teriam uma posição demarcada num sistema orientado de modo vertical[232]. O autor constatou a existência de dois impulsos contraditórios no passado, um, o de manter o status quo, libertando o escravo juridicamente, mas deixando-o “sem condições de liberta-se tanto social quando cientificamente”, e o outro, corresponderia a “fábula das três raças”, que seria o encontro harmonioso das três “raças” e que teria a força e o estatuto de uma ideologia dominante[233]. Para o autor o racismo brasileiro teria nascido na Europa no século XVIII, passando a dominar no século XIX como doutrina explicativa para a realidade que existia no país[234]. O “racismo”, portanto, como as demais ideologias importadas, teria sido modificado no Brasil[235]. Mas o ponto crítico de todo o sistema brasileiro era a sua profunda desigualdade. Não teria sido necessário segregar o mestiço, o índio e o negro “porque as hierarquias asseguram a superioridade do branco como grupo dominante” [236]. O autor conclui que teríamos deixado de estudar as relações entre as “raças” preferindo o estudo das “raças” em si mesmas[237].

O historiador norte-americano George Reid Andrews, em Negros e brancos em São Paulo (1888-1988), publicado em 1991, tentou aplicar bipolaridade racial da sua sociedade para o caso paulista: examinou, de um lado os “euro-brasileiros” e do outro os “afro-brasileiros”, chegando a afirmar que existiria uma “linha de cor” separando os brancos e os não brancos[238]. O objetivo do autor era o de “documentar alguns padrões da desigualdade racial que tem existido no Brasil desde a abolição da escravidão” [239]. Suas principais contribuições, porém, estão no destaque do papel dos fazendeiros e do Estado na República Velha (1889-1930).

Inicialmente o autor criticou tanto Gilberto Freyre quanto Florestan Fernandes pela visão otimista dos autores quanto ao futuro das relações raciais no Brasil[240]. Quanto à escravidão, lembrou que em 1872, 59 por cento dos escravos já estavam concentrados no Sudeste contra 32 por cento no Nordeste[241]. Com a abolição, a crise da mão-de-obra não ocorre em São Paulo, devido à decisão do Estado de subsidiar a imigração européia: mais da metade dos imigrantes europeus vieram para São Paulo[242]. Essa imigração resultou na substituição e marginalização dos trabalhadores “afro-brasileiros” [243], lembrando, porém, que os “afro-brasileiros” foram empregados em outras regiões[244]. Criticou Florestan Fernandes por ter considerado os mesmos “alienados, irresponsáveis e sociopatas” [245], como base em entrevistas realizadas com “afro-brasileiros” de classe média[246]. Com o aumento da exigência dos imigrantes e de seus filhos, os subsídios à imigração estrangeira terminaram[247] e a atração de migrantes brasileiros foi iniciada[248], juntamente com a incorporação dos trabalhadores “afro-brasileiros”.

Em seguida o autor analisou duas empresas em São Paulo. A primeira, uma indústria têxtil, tinha 7,6 por cento de trabalhadores “negros” no período 1921-1930, passando para 26,3 por cento na década de 1951-1960[249]. A segunda, a companhia de eletricidade, desde o primeiro período contava com 20,9 por cento de trabalhadores “negros”, passando para 23,5 por cento no segundo período[250]. Deve ser observado que o autor utilizou o artifício de classificar racialmente parte dos trabalhadores da segunda empresa a partir do exame de fotografias nos arquivos (!) [251]. O autor também constatou o crescimento de trabalhadores nordestinos nas empresas: na indústria têxtil eles passaram de 3,4 por cento (1931-1940) para 37,5 por cento (1951-1960), enquanto que na companhia de eletricidade passaram de 3,7 por cento para 19 por cento nos mesmos períodos[252]. O autor constatou, por um lado, que os pardos estavam “super-representados em ambas as companhias em relação aos pretos” [253] e que a exclusão dos “negros” da força de trabalho era um fenômeno anterior a 1930[254].

A análise sobre a classe média foi apoiada na pesquisa da imprensa “negra”. O autor lembrou que os negros eram barrados nos clubes sociais dos brancos[255], porém informou que um diretor que teria barrado um negro era ele próprio um pardo[256]. Destacou as denúncias de jornais “negros” da discriminação dos imigrantes contra os negros[257]. Lembrou a admiração do fascismo europeu pelos dirigentes da Frente Negra[258] e confirmou a desigualdade de salários entre brancos e negros, a partir da análise de dados do censo de 1980[259]. Para Andrews haveria um “modelo brasileiro das relações raciais”, que manteria os negros em posições subordinadas[260], chegando a afirmar, inclusive, que os paulistas negros sofreriam “restrições raciais em relação ao local onde podem morar” [261]. O autor comentou também o esforço da classe média negra de se separar dos “afro-brasileiros” pobres e da classe trabalhadora[262]. Quando examinou o movimento negro, considerou existência de partidos políticos “brancos” [263], e constatou que os ativistas de classe média e os negros pobres “tinham muito pouca coisa em comum além da côr da sua pele” [264]. Lembrou que Celso Furtado teria proposto, em 1988, a garantia de “um número mínimo de vagas nas escolas e universidades brasileiras para estudantes afro-brasileiros” [265].

Concluiu afirmando que o caráter da desigualdade social mudou com o tempo[266] e afirmou que o poder dos estereótipos raciais negativos parece “fluir e refluir com o correr do tempo, e de um setor para outro da economia” [267]. O autor questionou ainda sobre a probabilidade dos brasileiros “brancos” de classe média concordarem em abdicar de seus “privilégios raciais” [268]. Por outro lado, comentou o fracasso dos programas de “ação afirmativa” nos Estados Unidos[269].

No Apêndice, o autor concordou que “os pardos têm mais probabilidade que os pretos de conseguir uma mobilidade [ascendente]”, mas apenas para uma pequena proporção do grupo racial pardo[270].  

Outro norte-americano, o cientista político negro Michael G. Hanchard publicou em 1994, livro sobre o Movimento Negro no Rio de Janeiro e em São Paulo, no período de 1945 a 1988. O livro, baseado na sua tese de doutorado, parte da questão “porque não existiu nenhum movimento social afro-brasileiro sistemático no Brasil” [271]. O autor procurou aplicar no seu estudo o conceito de hegemonia de Gramsci.

Para ele “raça” se refere ao emprego de diferenças fenotípicas[272]. Nos Estados Unidos à segregação de facto e de jure teria levado ao desenvolvimento de instituições paralelas pelos grupos minoritários[273]. Quanto no Brasil o autor já reconhecia uma “crescente bipolaridade da política racial brasileira ... que passou a se assemelhar à política racial de nações como os Estados Unidos e a África do Sul” [274], o que mostra um exagero tendo em vista, que na época ainda funcionava o sistema do Apartheid no último país. Também comparou a evolução das leis segregacionistas registradas nos Estados Unidos, com as “novas leis e práticas sociais [que] foram concebidas ... para manter os padrões de desigualdade”, no século XX, no Brasil[275]. Também criticou Florestan Fernandes por ter desprezado o papel do Estado nos seus estudos[276]. O autor chegou a afirmar que o Estado brasileiro, desde o nascimento da república, teria negado “sistematicamente o acesso dos afro-brasileiros às oportunidades educacionais e de emprego” [277].

Quanto à formação da consciência racial destacou a existência de duas facções do movimento negro: uma “americanista” e outra “africanista” [278]. Informou que órgãos recebiam verbas de instituições sediadas nos Estados Unidos[279], e que muitos ativistas brasileiros “lamentavam a inexistência de um confronto aberto” [!][280]. Um aspecto interessante levantado pelo autor é sobre o conflito entre as ativistas afro-brasileiras e suas camaradas feministas brancas, pois as mesmas “oprimiam as mulheres afro-brasileiras” [281], através do trabalho doméstico. Também constatou a existência de debates internos entre pretos e pardos dentro do próprio movimento[282].

Afirmou que o movimento negro brasileiro teria sido vulnerável ao culturalismo[283], e que os “afro-brasileiros”, membros do proletariado e da pequena burguesia teriam modos de consciência heterogêneos[284], ou seja, o autor destacou a importância das classes sociais. Finalmente, o problema fundamental do movimento teria sido “esse olhar para trás, para uma África ... como base da identidade, ideologia e ação coletiva” [285]. Certamente a atitude correta seria olhar para frente, para a realidade racial norte americana ...   

No Dicionário de Relações Étnicas e Raciais na edição de 1996, o verbete “Brasil” ficou a cargo do sociólogo belga Pierre L. Van Den Berghe. O autor destacou que seria notável a ausência, na sociedade brasileira, de grupos raciais distintos e conscientes. Ninguém poderia dizer onde termina o “branco” e onde começa o “negro” no Brasil. Estimou de cerca de 40 por cento da população brasileira teria ascendência parcial africana e no Nordeste essa proporção poderia chegar a 70 a 90 por cento [286]. Lembrou que, um século depois da abolição, os “afro-brasileiros” continuavam “excessivamente representados” na base da pirâmide das classes sociais, porém eram encontrados “em números substanciais” na classe média, enquanto que muitos brancos eram também bastante pobres.

Os “afro-brasileiros” nunca teriam sido submetidos a um racismo institucionalizado, nem a segregação. Eles não constituíam um grupo consciente, uma vez que os brasileiros não se auto classificam em grupos raciais, mas eram muito conscientes dos fenótipos raciais[287]. Também lembrou que o Brasil não seria livre de preconceitos raciais, embora fosse livre de uma “discriminação categórica” e que não haveria barreiras institucionais que impeçam a ascensão dos negros, ao contrário da visão de Hanchard. O fenótipo seria um componente do status e do atrativo pessoal, e em muitas situações a classe social pesaria mais. A segregação residencial e escolar seria baseada “quase inteiramente na classe social e não na raça”. Por outro lado às distinções de classe seriam “marcadas e profundas”, freqüentemente prevalecendo à classe social sobre a cor. O autor conclui que o Brasil seria uma “sociedade com consciência racial, mas sem casta”. Não seria um paraíso racial, mas também não seria uma “sociedade racialmente obcecada” como a da África do Sul e a dos Estados Unidos[288].   

A obra coletiva Cor e Estratificação Social (1999), organizada por Hasenbalg e Silva, traz alguns textos interessantes sobre a questão das definições raciais nos censos brasileiros.

O texto “Uma nota sobre raça social no Brasil”, datado de 1994, é de Nelson do Valle Silva. O autor é doutor pela Universidade de Michigan, em 1978. No início o autor comenta a classificação racial dicotômica dos Estados Unidos, que estaria sendo contestada por 40 por cento dos hispânicos. A aplicação desse esquema teria mostrado algumas deficiências[289]. Na América Latina, o conceito de raça seria baseado em características fenotípicas e sócio-econômicas, propondo o autor à definição de “raça social”, pois a identidade racial no Brasil não dependeria apenas da aparência física das pessoas, sendo também influenciada pela posição sócio-econômica[290]. Examinando a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios de 1976, a partir de respostas a questões abertas e fechadas sobre a cor dos informantes, em São Paulo, o autor observou uma redução “muito acentuada no poder explicativo quando mudamos de auto classificação de cor para a cor atribuída pelo entrevistador ... cai para menos da metade” [291], ou seja, a diferença entre a cor atribuída pelo entrevistado e a registrada pelo entrevistador modificaria os resultados das análises.

No segundo texto, “Morenidade: modos de usar”, de 1996, Silva comenta o resultado do levantamento realizado pelo Data Folha[292] em 1995: 43 por cento dos entrevistados se identificaram como morenos e apenas 6 por cento como pardos e 1 por cento como mulatos[293], o que confirma a rejeição da classificação do IBGE, que não inclui a noção de “moreno”. Voltando ao exame do PNAD de 1976, o autor comparou com os dados de 1995: os auto classificados como brancos caíram de 47 por cento para 39 por cento, os “morenos” aumentaram de 32 por cento para 35 por cento, os pardos caíram de 7 por cento para 6 por cento, enquanto os negros permaneceram em 4 por cento [294]. Na análise realizada pelo autor, os “morenos” e “morenos claros” predominam nas regiões Nordeste (47,3 por cento) e Norte-Centro-Oeste (48,3 por cento), e são apenas 6,6 por cento no Rio de Janeiro, enquanto nessa cidade os pardos contam com 20,4 por cento dos declarantes[295], o que mostra diferenças regionais no uso da própria terminologia de classificação. O autor observou que a auto-declaração de cor, em direção as cores mais claras, está relacionada com o nível de renda e de escolaridade.

Pode-se levantar a hipótese de que os mestiços claros ao se declarem “brancos”, estariam ampliando esse grupo racial nas estatísticas brasileiras, o que aumentaria os resultados de desigualdade racial, na medida que não estariam sendo incluídos, entre os dados dos “pardos”, muitos dos mestiços de mais alta renda e escolaridade.

O sociólogo baiano Antonio Sérgio Guimarães, professor da Universidade de São Paulo, reuniu vários textos sobre a questão racial no seu livro Racismo e Anti-Racismo no Brasil (1999; 2005), que pode ser considerado exemplar das posições favoráveis às políticas afirmativas no Brasil.

Para o autor “raça” seria um conceito que denota uma forma de classificação social[296].  Ele concorda que não há base científica para a sustentar a noção de “raça” [297], e vê a necessidade de teorizar as “raças” como construtos sociais, como formas de identidade baseada em uma idéia biológica errônea, mas socialmente eficaz[298].

Para o autor o racismo brasileiro estaria umbilicalmente ligado a uma estrutura estamental, que o naturalizaria e não estaria ligado à estrutura de classes[299]. O racismo e o “preconceito de cor” seriam formas socializadas de naturalizar a segmentação da hierarquia social[300]. Segundo o autor, desde a abolição não teríamos experimentado nem segregação nem conflitos raciais[301]. Mas, para ele, o racismo brasileiro e o norte-americano teriam se tornado muito parecidos entre si[302]. Contrastando com essa semelhança, no Brasil, entre os “brancos” estariam incluídos os mestiços e mulatos claros[303], o que não ocorre nos Estados Unidos, e os “baianos” e “nordestinos” teriam sido transformados nos alvos principais do “novo racismo” brasileiro[304]. Para o autor, as desigualdades sociais separariam brancos de negros, ricos de pobres e nordestinos de sulistas[305]. Guimarães comparou os estudos realizados sobre as relações raciais entre os autores baianos e paulistas, tendo constatado diferenças regionais. 

O autor considera correto a agregação de dados de cor entre os grupos brancos e não brancos, pois, para ele, não haveria diferenças substantivas entre os grupos não brancos (pardos e pretos) entre si, sendo a maior diferença entre o conjunto desses grupos e o grupo branco[306]. A sociedade brasileira estaria segmentada em dois blocos contíguos, mas sempre estranhados entre si: a elite e o povo; os ricos e os pobres; os cidadãos e os excluídos; os brancos e os negros[307].

Na parte final, o autor “toma partido” sobre a questão das ações afirmativas: o problema da cota estaria no fato de que a mesma ignora e contraria a noção de mérito e do valor individual[308], mas, para ele, “seria preciso que aceitemos tratar como privilegiados os desprivilegiados” [309]. Lembra que um dos objetivos das ações afirmativas seria o de reforçar a identidade[310]. Mas o grande problema no combate ao racismo no Brasil, seria a sua invisibilidade, na medida que ele seria negado e confundido com formas de discriminação de classe[311]. Constatou também que as políticas de ação afirmativa, adotadas nos Estados Unidos, mostraram-se impotentes para reverter à situação de desigualdade racial[312]. Por outro lado “o carisma de cor é mobilizado junto com o da classe fazendo com que os brancos pobres estejam numa situação mais próxima dos negros e mestiços do que dos brancos de classe média” [313], o que parece um argumento que enfraquece a opção de priorizar o enfoque racial.

No debate mais recente, temos a contribuição do antropólogo inglês Peter Fry, no livro A Persistência da Raça (2005), que retoma vários textos anteriores, inclusive alguns sobre a "persistência da crença em raças", tanto no Brasil como na África Austral[314], países em que o autor conhece bem por ter residido durante longos períodos.

O autor inicia lembrando que as políticas de "ação afirmativa" exigem dos seus beneficiados uma identidade racial, o que fortalece a crença nas raças. Os Estados Unidos, a África do Sul e o Zimbábue teriam suas sociedades construídas formalmente através do mito das raças, já no Brasil, o racismo seria exercido informalmente pela sociedade, mas não seria assumido pelo Estado[315]. Ele destaca, que no Brasil há desigualdades sociais e econômicas entre os mais escuros e os mais claros, porém há uma semelhança cultural que não se encontra na África[316]. Ele considera que em vez de achar a democracia racial uma farsa, ela deveria ser um ideal a ser alcançado[317].

No capítulo em que o autor tenta entender por que o Brasil é diferente, sua resposta é que o caminho escolhido foi o da assimilação e da integração[318]. Em outro texto lembra que a exclusão da oportunidade educacional não seria um monopólio dos brasileiros negros[319]. No texto sobre as reservas de vagas para negros nas universidades, escrito com a antropóloga Yvonne Maggie, os autores chegam à conclusão que "não estamos convencidos de que seja possível 'corrigir' séculos de desigualdade ... por meio de uma política de custo zero ..., a política de cotas não tem custo material nenhum" [320]. Em outro texto Fry levanta a hipótese de que a reserva de vagas para os negros responderia a uma vontade de "nomear uma identidade de 'negro' e torná-la uma entidade jurídica" [321].

Nas conclusões, o autor levanta as seguintes questões: a ação afirmativa no Brasil veio desfazer a "mistura racial" para produzir só duas raças[322]; em seguida adverte que "há um sério risco de que as políticas de ação afirmativa que exigem a definição racial dos cidadãos ... resvalem para a produção de uma cisão racial" [323]; propõe como alternativa o investimento em "territórios pobres", pois seriam beneficiados, predominantemente "pessoas negras sem incorrer na racialização que decorre de políticas dirigidas a 'grupos raciais'" [324]. Finalmente, o autor conclui com: "temo que a crença em raças persista e se fortaleça" [325], o que corresponde ao título do livro.

O jornalista e cientista social Ali Kamel, escreveu o livro Não Somos Racistas, (2006) que reúne artigos publicados na imprensa, tomando posição sobre a questão.

O autor lembra que no início do século XX o pensamento majoritário nas ciências sociais era racista. Gilberto Freyre teria contraposto esse pensamento, resgatando a importância do negro e da mestiçagem[326]. Nos anos 50, uma “certa sociologia” começou a dividir o Brasil entre brancos e não-brancos, e a chave metodológica teria sido a de “importar dos Estados Unidos uma terminologia que não era a nossa, revistindo-a de uma nova roupagem” [327]. Kamel cita as pesquisas do geneticista Sérgio Pena para destacar que 87 por cento dos brasileiros têm 10 por cento de ancestralidade genômica africana e 24 por cento têm o mesmo percentual de ancestralidade ameríndia[328], ou seja, a mestiçagem é generalizada.

O autor destacou entre as metas do Programa Nacional de Direitos Humanos, de 1996, no governo F. H. Cardoso, a sugestão para o IBGE “considerar os mulatos, os pardos e os pretos como integrantes do contingente da população negra” [329]. No primeiro governo Lula, com a criação da Secretaria de Igualdade Racial teriam sido lançadas diretrizes curriculares onde constaria à grave afirmação de que “os negros foram submetidos a uma política de eliminação física depois da Abolição” [330].

Em seguida o autor destaca que os negros eram apenas 5,9 por cento da população do Brasil e não 48 por cento, e que os pardos alcançavam 42 por cento, tendo concluído que “se a pobreza tem uma cor no Brasil, essa cor é parda” [331]. De fato, os pardos, eram 58,7 por cento dos pobres no Brasil e contavam com 44,7 por cento de pobres em seus contingentes (enquanto que os negros contavam com 36,4 por cento) [332].

Fazendo a relação entre renda e estudo, a partir dos dados da PNAD 2004, o autor informa que os amarelos recebiam em média 7,4 salários mínimos, enquanto os brancos 3,8, e os negros e pardos apenas 2 salários mínimos[333]. Por outro lado os amarelos estudavam, em média 10,7 anos, os brancos 8,4 e os “negros” 6,4 anos[334]. Levantou também dados em que mostram que os domésticos pardos têm salários menores que os equivalentes “negros” [335], e no Nordeste, os domésticos brancos tem salários mais baixos do que os “negros” [336]. Quanto às favelas do Rio de Janeiro, os negros e pardos eram 58,6 por cento dos habitantes e os brancos 41,4 por cento, sendo que, em 114 comunidades havia mais brancos do que negros e pardos[337].

O autor considera que o principal mecanismo de reprodução da pobreza é a educação pública de baixa qualidade[338]. Nesse sentido, ele é contrário às cotas raciais e mesmo as cotas sociais, porque “não é a condição de pobre que impede os cidadãos a entrar na Universidade, mas o péssimo ensino público” [339], e a única solução seria o investimento maciço na educação[340]. Ele condena os investimentos em Bolsa Família e os Benefícios de Prestação Continuada, que contavam com a previsão de 19 bilhões de reais a serem gastos em 2006, enquanto que os investimentos para educação seriam de apenas 8,5 bilhões[341].

O autor considera que o racismo decorre do “classismo”, ou seja, o preconceito contra os pobres[342]. Concluindo defende uma “nação misturada, miscigenada, colorida, sem espaço para diferença de ‘raça’” [343].

Uma das últimas publicações sobre a questão, além da imensa literatura disponível na Internet, é o livro Divisões Perigosas, organizado por P. Fry, I. Maggie, M. Chor Maio, S. Monteiro e R. Ventura (2007), no qual são reunidos textos de 38 autores, publicados na imprensa juntamente com alguns inéditos, que contestam dois projetos apresentados ao Congresso Nacional sobre a implantação de “cotas raciais” e do “Estatuto da Igualdade Racial”, que propõem a implantação de uma classificação racial oficial no país e estabelecem cotas raciais nas universidades, no serviço público e criam privilégios “nas relações comerciais com o poder público” [344]. Membros do grupo foram responsáveis pela iniciativa da elaboração de uma Carta Pública, assinada por 114 intelectuais, artistas e lideranças do movimento negro, entregue ao Congresso Nacional em junho de 2006[345]

Para concluir este balanço sobre a discussão racial no Brasil, que não busca ser exaustivo, podemos ainda lembrar a enorme literatura sobre a realidade norte-americana, que tem sido referência para os intelectuais e para os estudiosos dos movimentos negros brasileiros. Serão comentados apenas três autores, que embora extrapolem nossos objetivos, devem ser mencionados, na medida que apresentam discussão sobre a mestiçagem e classe social e sobre os aspectos críticos a adoção de políticas afirmativas naquele país.

Franklin Frazier escreveu um livro sobre a burguesia negra norte-americana, publicado inicialmente na França, em 1955, que causou muita polêmica entre os próprios negros.

Comentou, inicialmente, o papel dos mulatos: eles teriam sido emancipados pelos seus pais, formando a base da população livre de cor no Sul dos Estados Unidos, antes da guerra da Secessão[346], ocupando um papel de casta intermediária no Sul, sobretudo em New Orleans[347]. Quando escravos, em geral eram escolhidos para os serviços domésticos ou como operários especializados[348]. Em 1860 os mulatos eram cerca de 600.000, sobre quase 4.500.00 negros[349]. Cerca de 98 por cento das estudantes de escolas fundadas por missionários eram mulatas[350]. Segundo o autor, a classe dos mulatos livres e seus descendentes teria feito o possível para ficar a frente das massas de cor[351].

Dentro do “mundo fechado da segregação” teria aparecido, sobretudo nas cidades, uma estrutura de classes baseada, sobretudo, nas distinções sociais. No alto da pirâmide social se encontrava uma “pequena aristocracia” que devia sua superioridade a uma herança familiar, devido a sua ascendência mestiça[352]. Informou que a maioria dos 4.000 negros que possuíram escravos viviam nas cidades, além dos da Louisiana[353]. O autor concluiu com a dura afirmação de que a burguesia de cor tinha explorado as massas negras com a mesma impiedade como fizeram os brancos[354]. Frazier, que esteve na Bahia, destacou o favorecimento dos mulatos, o que também teria ocorrido no Brasil, assim como a importância das diferentes classes sociais mesmo dentro de uma sociedade segregada.   

O artigo de Winthrop Jordam, publicado originalmente em 1962, tem o interesse de comparar a situação dos mulatos nos Estados Unidos e no Caribe inglês, pois os colonizadores ingleses tiveram comportamentos diferentes nos diferentes espaços. No continente os mulatos não tinham tratamento legal diferente dos negros[355] pois as colônias, tanto as do norte como as do sul proibiam legalmente a miscigenação[356].

Nas colônias inglesas do Caribe os mulatos e mulatas eram preferidos para o trabalho no comércio, para as atividades domésticas e como concubinas. Os colonos das ilhas chegaram a utilizar uma terminologia emprestada dos espanhóis (mulatto, sambo, quadroon e mestizo) para diferenciar os vários graus de mistura racial[357]. Também não havia legislação proibindo a miscigenação fora do casamento. Em Montserrat, entretanto, havia legislação contra os casamentos mistos. A principal explicação apontada pelo autor para a aceitação da miscigenação é a da elevada proporção de negros no Caribe, indo de 75 por cento nos Barbados a 90 por cento na Jamaica[358]. Os plantadores ingleses estavam perdidos em “um mar de negros” [359]. O autor, citando E. Long, comentou que na Jamaica os mulatos da terceira geração eram “chamados ‘ingleses’ e se consideravam como livres de qualquer mancha da raça negra”[360]. A explicação dada pelo autor, assemelha-se a hipótese apresentada por Harris (1967) para o caso brasileiro.

O sociólogo negro norte-americano William J. Wilson, no seu livro The Truly Disadvantaged [361], publicado em 1987, tratou daqueles que são classificados nos Estados Unidos como componentes da underclass e que continuam a residir nos “hiper-guetos” negros das cidades, onde dominavam o sub-emprego, a criminalidade, a gravidez de adolescentes, os nascimentos fora dos casamentos, as mães solteiras com crianças e a dependência da ajuda social[362], e que se distanciavam dos membros da classe média negra ascendente que tinham saído do gueto.

O autor chegou a duas constatações importantes: ele se considera convencido que nos próximos anos os problemas dos deserdados da sociedade americana deverão ser atacados através de programas universais[363]; e enquanto que as políticas de tratamento preferencial continuarão a serem definidas a partir do pertencimento racial, no lugar do exame das desvantagens sócio-econômicas, elas contribuirão a aumentar as possibilidades de promoção social dos mais favorecidos sem colocar em questão os problemas que os pobres do gueto se debatem[364].  

Dessa vasta literatura examinada, alguns pontos podem ser destacados:

1. As diferenças entre mestiços e negros, com vantagens para os primeiros, conforme os dados apontados por Pierson (classes intermediárias, estudantes e professores universitários); Azevedo (diplomados), Costa Pinto (alfabetizados e com grau superior), Bastide (elites e classes médias), Nogueira (participação na classe média), Harris (funções essenciais), Degler (válvula de escape), IBGE (indicadores sócio-econômicos) e Andrews (super representação nas indústrias). Essas diferenças vão contra a proposta de reunir os pardos e pretos em uma única categoria como "negros" ou "afro-descendentes" [365]. Por outro lado, a partir de dados recentes, Kamel indica uma situação mais desfavorável para os pardos;

2. A importância da mestiçagem na ampliação do número de declarados "brancos", comentário efetuado desde Oliveira Vianna em 1932; passando pelas observações de Pierson nos anos 30 e as de Azevedo, Fernandes, Nogueira, Ribeiro e Ianni nos anos 50, até os recentes estudos de Silva (1999), sobre as auto declarações da cor;

 3. A predominância das práticas de discriminação e racismo entre os membros das elites: Azevedo destacou no caso de Salvador, Ribeiro em Recife, Bastide e Fernandes em São Paulo e Nogueira em Itapetininga;

4. A presença de atitudes racistas de mestiços contra os negros: conforme os textos de Bastide, Ianni, Cardoso, Andrews;

5. A precariedade dos brancos pobres foi observada por Pierson, Nogueira, Harris, Fernandes, Hasenbalg, IBGE, Van den Berghe, Guimarães e por Fry;

6. As questões sociais como mais importantes que as raciais. Essa discussão é encontrada em muitos autores: Vianna, Pierson, Landes, Azevedo, Costa Pinto, Bastide, Nogueira, Ribeiro, Harris, Skidmore, Hasenbalg, Van den Berghe e Kamel;

7. As distribuições de população de cor nas cidades estudadas: numa escala que vai de Salvador (75 por cento da população), Recife e Rio de Janeiro (mais de 40 por cento), Itapetininga (9 por cento), São Paulo (8 por cento) e no estado do Paraná (6 por cento); ou seja, passando da condição de maioria para a de minoria nos diferentes contextos urbanos, o que pode resultar em relações raciais e sociais diferenciadas;

8. Finalmente, as diferenças regionais: os alunos nordestinos seriam mais tolerantes (Ribeiro); o peso da imigração estrangeira em São Paulo (Bastide; Fernandes e Andrews); a variação das relações raciais segundo as regiões (Degler); as diferenças das declarações das cores segundo as regiões (Guerreiro Ramos); a antiga presença de população livre de cor em Minas e no Nordeste (Hasenbalg); a ascendência africana mais elevada no Nordeste (Van den Berghe); o preconceito contra nordestinos no Sudeste (Guimarães); a diferença na auto definição do termo “moreno” (Silva); os "negros" do Sudeste com taxas mais elevadas de alfabetização do que os brancos do Nordeste (Hasenbalg); e os nordestinos brancos com rendas menos elevadas do que "negros" do Sudeste (Kamel).

A contribuição da Geografia Histórica

Diante de um tão rico, longo e complexo debate, qual seria a contribuição do “olhar geográfico” ? As comparações espaciais (e temporais) podem ser uma boa resposta: o estudo da segregação junta a análise racial com a ênfase no espaço. Mas a questão não é tão simples, a começar pela inexistência de bairros segregados racialmente no Brasil, apesar da predominância de grupos sociais e raciais.

Na geografia a temática das relações raciais ainda está pouco desenvolvida[366], podendo ser destacado, no Brasil, além dos artigos na imprensa escritos por Demétrio Magnoli[367], a tese de doutorado de Andrelino Campos, ainda não publicada, que trata da questão original da invisibilidade do negro no Rio de Janeiro e do planejamento urbano[368]. Em tabela apresentada na mesma podemos verificar a importância das diferenças regionais: os "pretos", no Rio de Janeiro têm apenas 8,2 por cento de seu contingente abaixo da linha de pobreza, enquanto que em Alagoas, no Nordeste, eles atingem 40,2 por cento. Outro dado interessante que pode ser destacado é que os pardos têm percentuais abaixo dessa linha mais reduzidos no Nordeste (Pernambuco, 46 por cento; Bahia, 48 por cento) e mais elevados no Sudeste e no Sul (Rio Grande do Sul, 80 por cento; São Paulo, 86 por cento; Rio de Janeiro, 88 por cento). Finalmente, outro destaque é que os pardos, em geral, apresentam maior contingente abaixo da linha da pobreza do que os declarados pretos, tanto no Norte (Pará, 69 por cento a 18,9 por cento), no Nordeste (Pernambuco, 46 por cento a 31,6 por cento; Bahia, 48 por cento a 29,4 por cento), no Sudeste (Rio de Janeiro, 68,6 por cento a 8,2 por cento; São Paulo, 86 por cento a 10 por cento) e no Sul (Rio Grande do Sul, 80 por cento a 12,5 por cento)[369], o que confirma a hipótese de Kamel de que os pardos são os mais pobres do Brasil.    

Outra entrada possível seria a comparação entre duas sociedades tão diferentes, como a norte-americana e a brasileira, sem falar de uma possível comparação com a sociedade sul-africana, mas tornaria o trabalho bastante longo.

Talvez a contribuição maior pode ser dada a partir da análise do passado escravista brasileiro, o que, recentemente não tem sido aprofundado, na medida em que as críticas atuais mostram que a abolição já conta com quase 120 anos, e que a situação dos descendentes de escravos teria sido dificultada com a ampliação do preconceito e da discriminação racial numa sociedade competitiva.

Algumas considerações finais[370] a serem destacadas:

O Brasil é um dos países mais desiguais do Mundo, e os grupos mais desfavorecidos são formados, em sua maioria, por mestiços, negros e indígenas;

A escravidão brasileira teve seu início quase um século antes dos Estados Unidos, cobriu todo o território e foi a mais longa do Ocidente (abolição em 1888);

A sociedade brasileira desde sua formação inicial apresenta uma grande mestiçagem, incluindo componentes indígenas, brancos e negros;

Houve segregação de tropas e irmandades (brancas, pardas e negras) e restrições de origem (judia, moura ou negra) no período colonial, mas não houve segregação residencial;

Os mestiços brasileiros tiveram maiores possibilidades de mobilidade que os negros desde o período colonial. As restrições legais foram eliminadas[371] desde o período pombalino;

Formou-se desde o início da colonização um segmento de “pobres”, composta de brancos pobres, mestiços e negros libertos, cujos componentes ficaram afastados em uma economia baseada no trabalho escravo;

No Brasil, desde o período colonial houve um crescente contingente de libertos[372], muito dos quais possuíam escravos. Por outro lado os ex-escravos foram abandonados após a abolição;

Há uma grande diferença entre o Norte-Nordeste brasileiro, “atrasado” e mestiço e sobretudo o estado de São Paulo, que além de ter recebido um grande aporte de imigrantes europeus e asiáticos, tornou-se a principal região econômica do país;

A situação atual mostra que além das desigualdades sociais e raciais as desigualdades regionais também são muito graves[373];

Os Estados Unidos, devido a sua linha de cor, e à formação histórica de uma “comunidade negra”, não servem como referência para a estruturação social e racial brasileira, ficando nossa situação mais próxima da do Caribe.

Conclusões

- A questão racial é delicada;

- As diferenças espaciais e regionais devem ser levadas em conta: as políticas públicas devem contar com as diferenças regionais;

- É difícil “separar” os negros dos mestiços (e dos índios) em uma sociedade muito miscigenada;

- Por um lado à junção dos negros e mestiços como “afro-descendentes” pode favorecer os últimos, e por outro, pode favorecer os componentes das classes médias nas políticas afirmativas, sobretudo no acesso a universidade, e não atingir os mais necessitados devido à baixa qualidade do ensino público e das precárias condições econômicas e sociais. Políticas sociais universais são mais republicanas e democráticas: conseqüentemente atingiriam prioritariamente os negros e mestiços que são majoritários entre os pobres. Por outro lado requerem investimentos pesados na educação pública de base, enquanto que as cotas para a entrada na universidade são apenas uma “discriminação positiva”, sem custos financeiros, em benefício de um grupo selecionado em detrimento de outros grupos.

- O fato do ensino fundamental ser de responsabilidade dos municípios, o ente que conta com menor volume de recursos, comparativamente ao nível estadual (maior responsável pelo ensino médio) e ao nível federal (principal responsável pelas universidades públicas). Não estaria aqui a resposta sobre a precariedade do ensino público de base, abandonado pelas classes médias e pelas “elites”, responsável pela fragilidade dos alunos de baixa renda, que não terão possibilidades de alcançar nem as cotas raciais ou sociais previstas?

- A discussão sobre a questão racial não estaria colocando em posição secundária as enormes desigualdades sociais do país? Não seria melhor examinar as ações (ou ausência de ações) das duras "elites" brasileiras, que parecem não ter nenhuma solidariedade nem identificação com os pobres que, independentemente da cor, não são cidadãos a parte inteira? Basta examinar por um lado o abandono (ou insuficiência) do Estado de tudo que é público: o ensino fundamental, a saúde pública, a segurança social, o sistema carcerário, o espaço público nas cidades; por outro lado o descaso para o enorme efetivo de trabalhadores ocupados em atividades informais, assim como para os bairros periféricos com infra-estrutura e equipamentos insuficientes. Podemos comparar então com as prioridades ao ensino universitário público (e a pós-graduação) gratuito; a pesquisa de ponta na saúde; a urbanização de bairros "nobres"; a impunidade dos crimes políticos e de agentes financeiros; a esdrúxula existência de prisões especiais para quem tem diploma (e não apenas para os "brancos"). Uma tentativa de explicação poderia ser que a maioria dos "pobres" é de cor, mas será apenas isso? Não há um descaso (ou desprezo) pelos pobres em geral, por parte das “elites” brasileiras?

Notas   

[1] O dialogo aparece assim em Rugendas (1989, p. 83): "Esta resposta de um mulato, ao qual se perguntava se determinado capitão-mor era também mulato. "Era", respondeu ele, "porém já não é." E, como o estrangeiro desejasse uma explicação para tão singular metamorfose, o mulato acrescentou: "Pois, senhor, capitão-mor pode ser mulato?".

[2] Koster, 1942, p. 480.

[3] Rodrigues, 1988, p.5 e 9.

[4] Ramos, 1988, p. 21 e 23.

[5] Carneiro, 2005.

[6] Vianna, 1959, p. 45.

[7] Ibid., p. 170.

[8] Ibid., p. 177.

[9] Ibid., p. 195.

[10] Ibid., p. 178.

[11] Skidmore registra que Oliveira Vianna era descrito pelos contemporâneos como mulato (1989, p. 219).

[12] Freyre, 1990, p.91.

[13] Ibid., p.284 e 447.

[14] Freyre em uma nota faz a referência de Minas Gerais ter "tomado a dianteira nos movimentos de democratização social do Brasil, contra preconceitos de branquidade e de legitimidade” (1990, p.465).

[15] Nos dois clássicos seguintes, Sobrados e Mocambos, de 1936, e Ordem e Progresso, de 1959, que formam uma trilogia, Freyre continuou dando destaque às questões da miscigenação e da ascensão social do mulato.

[16] Pierson, 1945, p. 187.

[17] Ibid., p. 30.

[18] Ibid., p. 217.

[19] Ibid., p. 31.

[20] Ibid., p. 201.

[21] Ibid., p. 223.

[22] Ibid., p. 225.

[23] Ibid., p. 208.

[24] Ibid., p. 212.

[25] Ibid., p. 409.

[26] Ibid., p. 252.

[27] Ibid., p. 417.

[28] Ibid., p. 419.

[29] Ibid., p. 421.

[30] Ibid., p. 422. O livro de Pierson foi comentado juntamente com os de Wagley e Azevedo por Guimarães (2004).

[31] Landes, 1967, p.69.

[32] Ibid., p. 122.

[33] Ibid., p. 278.

[34] Arthur Ramos, in Pierson, 1945:25.

[35] Sobre Herskovits ver Yelvington (2004).

[36] Ramos, 2004, p. 9 e 10.

[37] Um bom resumo sobre o Projeto Unesco pode ser encontrado em Maio (1999), que defendeu sua tese de doutorado sobre a questão.

[38] Azevedo, 1996, p.53.

[39] Ibid., p.52.

[40] Ibid., p.114.

[41] Ibid.,  p.163.

[42] Ibid., p.166.

[43] Azevedo, 1959, p. 170.

[44] Ibid., p. 171.

[45] Ibid., p. 175.

[46] Ibid., p. 172-3.

[47] Ibid., p. 174.

[48] Ibid., p. 178.

[49] Pinto, 1998, p. 73.

[50] Ibid., p. 151.

[51] Ibid., p. 153.

[52] Ibid., p. 157.

[53] Ibid., p. 84.

[54] Ibid., p. 132.

[55] Ibid., p. 136.

[56] Ibid., p. 88.

[57] Ibid., p. 283.

[58] Ibid., p. 294.

[59] Ibid., p. 295.

[60] Fernandes, in Bastide; Fernandes, 1959, p. 41.

[61] Ibid., p. 47-8.

[62] Ibid., p. 49.

[63] Ibid., p. 51.

[64] Ibid., p. 54.

[65] Ibid., p. 61.

[66] Ibid., p. 122.

[67] Ibid., p. 79.

[68] Ibid., p. 82.

[69] Bastide, in Bastide; Fernandes, 1959, p. 166.

[70] Ibid., p. 175,

[71] Ibid., p. 181.

[72] Ibid., p. 215.

[73] Ibid., p. 179.

[74] Ibid., p. 192.

[75] Ibid., p. 183.

[76] Ibid., p. 204.

[77] Ibid., p. 188.

[78] Ibid., p. 231.

[79] Ibid., p. 238.

[80] Fernandes, in Bastide; Fernandes, 1959, p. 318.

[81] Nogueira, 1998, p. 41.

[82] Ibid., p. 67.

[83] Ibid., p. 108.

[84] Ibid., p. 146.

[85] Ibid., p. 268.

[86] Ibid., p. 169.

[87] Ibid., p. 164.

[88] Ibid., p. 166.

[89] Ibid., p. 191.

[90] Ibid., p. 199.

[91] Ibid., p. 239.

[92] Ibid., p. 243.

[93] Ibid., p. 245.

[94] Ibid., p. 244.

[95] Ribeiro, 1956, p. 104.

[96] Ibid., p. 85.

[97] Ibid., p. 106.

[98] Ibid., p. 107.

[99] Ibid., p. 129.

[100] Ibid., p. 225.

[101] Ibid., p. 136.

[102] Ibid., p. 203.

[103] Ibid., p. 229.

[104] Ibid., p. 230.

[105] Ibid., p. 231.

[106] Sobre René Ribeiro ver o texto de Motta (2004).

[107] Sobre Guerreiro Ramos ver o artigo crítico de Oliveira (2004).

[108] Ramos, 1995, p. 200.

[109] Ibid., p. 255.

[110] Ibid., p.227.

[111] Ibid., p.231.

[112] Sobre Abdias do Nascimento ver Guimarães (2006).

[113] Nascimento, 1982, p. 121.

[114] Ibid., p. 69.

[115] Ibid., p. 73.

[116] Ibid., p. 79.

[117] Ibid., p. 94.

[118] Ibid., p. 101.

[119] Ibid., p. 25.

[120] Ibid., p. 27.

[121] Ibid., p. 18.

[122] Iani, 2004, p. 51.

[123] Ibid., p. 52.

[124] Ibid., p. 59.

[125] Ibid., p. 74.

[126] Ibid., p. 65.

[127] Ibid., p. 66.

[128] Ibid., p. 68.

[129] Ibid., p. 71.

[130] Ibid., p. 105.

[131] Ibid., p. 75.

[132] Ibid., p. 91.

[133] Ibid., p. 96.

[134] Ianni, 1988, p. 268.

[135] Ibid., p.8.

[136] Cardoso, 1977, p. 82.

[137] Ibid., p. 266.

[138] Ibid., p. 267.

[139] Harris, 1967, p. 22.

[140] Ibid., p. 77.

[141] Ibid., p. 85.

[142] Ibid., p. 90.

[143] Ibid., p. 88.

[144] Ibid., p. 94.

[145] Ibid., p. 96.

[146] Ibid., p. 100.

[147] Ibid., p. 135-6.

[148] Ibid., p. 137.

[149] Ibid., p. 141.

[150] Ibid., p. 151.

[151] Ibid., p. 152.

[152] Fernandes, 1965, vol. 1, p. xi.

[153] Ibid., p. xii.

[154] Ibid., p. 12.

[155] Ibid., p. 28.

[156] Ibid., p. 187.

[157] Ibid., p. 198.

[158] Ibid., p. 210.

[159] Fernandes, 1965, vol. 2, p. 167.

[160] Ibid., p. 262.

[161] Ibid., p. 286.

[162] Ibid., p. 293.

[163] Ibid., p. 299.

[164] Ibid., p. 331.

[165] Ibid., p. 387.

[166] Ibid., p. 392.

[167] Ibid., p. 393.

[168] Degler, 1971, p. x.

[169] Ibid., p. 18.

[170] Ibid., p. 274.

[171] Ibid., p. 112.

[172] Ibid., p. 84.

[173] Ibid., p. 271.

[174] Ibid., p. 274.

[175] Ibid., p. 97.

[176] Ibid., p. xii.

[177] Motta (2000) traduz a expressão por “ saída de emergência do mulato”.

[178] Degler, 1971, p. 224.

[179] Ibid., p. 260.

[180] Ibid., p. 275.

[181] Ibid., p. 287.

[182] Ibid., p. 288.

[183] Para uma visão crítica ao texto de Degler ver Oliveira (1974).

[184] Skidmore, 1989, p. 240.

[185] Ibid., p. 69.

[186] Ibid., p. 226.

[187] Ibid., p. 155.

[188] Ibid., p. 210.

[189] Ibid., p. 231.

[190] Ibid., p. 233-4.

[191] Azevedo, 1975, p.61.

[192] Ibid., p. 13.

[193] Ibid., p. 29.

[194] Ibid., p. 8.

[195] Ibid., p. 35.

[196] Ibid., p. 36.

[197] Hasenbalg, 2005, p.20.

[198] Ibid., p. 119.

[199] Ibid., p. 162.

[200] Ibid., p. 163.

[201] Ibid., p. 176-7.

[202] Ibid., p. 192.

[203] Ibid., p. 193.

[204] Ibid., p. 211.

[205] Ibid., p. 217.

[206] Ibid., p. 221.

[207] Ibid., p. 230.

[208] Ibid., p. 235-6.

[209] Ibid., p. 247.

[210] Ibid., p. 259.

[211] Ibid., p. 260.

[212] Ibid., p. 261.

[213] Ibid., p. 264.

[214] Ibid., p. 267.

[215] Motta (2000) contesta as afirmações de Hasenbalg, pois, segundo ele, o autor pretende “deduzir discriminação a partir da desigualdade” e trata “como evidente justamente o que devia demonstrar” (p. 9).

[216] Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Fundação subordinada à Secretaria do Planejamento da Presidência da República.

[217] IBGE, 1985, p. 5. PNAD: Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios.

[218] Ibid., p. 11.

[219] Ibid., p. 12.

[220] Ibid., p. 30.

[221] Ibid., p. 55.

[222] Ibid., p. 31.

[223] Ibid., p. 52.

[224] Ibid., p. 32.

[225] Ibid., p. 53.

[226] Ibid., p. 58.

[227] Ibid., p. 38.

[228] Ibid., p. 67.

[229] Ibid., p. 76.

[230] Ibid., p. 79.

[231] Da Matta, 1987, p. 81.

[232] Ibid., p. 63.

[233] Ibid., p. 69.

[234] Ibid., p. 70.

[235] Ibid., p. 84.

[236] Ibid., p. 75.

[237] Ibid., p. 85.

[238] Andrews, 1998, p. 382.

[239] Ibid, p. 47.

[240] Ibid, p. 32.

[241] Ibid., p. 65.

[242] Ibid, p. 91.

[243] Ibid., p. 93.

[244] Ibid., p. 135.

[245] Ibid., p. 119.

[246] Ibid., p. 120.

[247] Ibid., p. 146.

[248] Ibid., p. 144.

[249] Ibid., p. 156.

[250] Ibid., p. 158.

[251] Ibid., p. 396.

[252] Ibid., p. 161.

[253] Ibid., p. 167.

[254] Ibid., p. 165.

[255] Ibid., p. 237.

[256] Ibid., p. 270.

[257] Ibid., p. 237.

[258] Ibid., p. 238.

[259] Ibid., p. 254.

[260] Ibid., p. 271.

[261] Ibid., p. 272.

[262] Ibid., p. 278.

[263] Ibid., p. 305.

[264] Ibid., p. 310.

[265] Ibid., p. 351.

[266] Ibid., p. 361.

[267] Ibid., p. 363.

[268] Ibid., p. 369.

[269] Ibid., p. 372.

[270] Ibid., p.391.

[271] Hanchard, 2001, p. 19.

[272] Ibid., p. 30.

[273] Ibid., p. 35.

[274] Ibid., p. 41.

[275] Ibid., p. 53.

[276] Ibid., p. 49.

[277] Ibid., p. 184.

[278] Ibid., p. 108-9.

[279] Ibid., p. 110.

[280] Ibid., p. 109.

[281] Ibid., p. 155.

[282] Ibid., p. 157.

[283] Ibid., p. 184.

[284] Ibid., p. 191.

[285] Ibid., p. 193.

[286] Van Den Berghe, 2000, p. 103.

[287] Ibid., p. 104.

[288] Ibid., p. 105.

[289] Silva, 1999-a, p.108.

[290] Ibid., p. 111.

[291] Ibid., p. 125.

[292] Instituto de pesquisa vinculado ao jornal Folha de São Paulo.

[293] Silva, 1999-b, p. 86.

[294] Silva, 1999-b, p. 89.

[295] Ibid., p. 94.

[296] Guimarães, 2005, p. 11.

[297] Ibid., p. 215.

[298] Ibid., p. 67.

[299] Ibid., p. 15.

[300] Ibid., p. 127.

[301] Ibid., p. 39.

[302] Ibid., p. 43.

[303] Ibid., p. 50.

[304] Ibid., p. 58.

[305] Ibid., p. 59.

[306] Ibid., p. 69.

[307] Ibid., p. 127.

[308] Ibid., p. 193.

[309] Ibid., p. 196.

[310] Ibid., p. 208.

[311] Ibid., p. 226.

[312] Ibid., p. 233.

[313] Ibid., p. 238.

[314] Fry, 2005, p. 15.

[315] Ibid., p. 16.

[316] Ibid., p. 27.

[317] Ibid., p. 33.

[318] Ibid., p. 174.

[319] Ibid., p. 236.

[320] Ibid., p. 317-8.

[321] Ibid., p. 332.

[322] Ibid., p. 336.

[323] Ibid., p. 341.

[324] Ibid., p. 342.

[325] Ibid., p. 347.

[326] Kamel, 2006, p. 18-20.

[327] Ibid., p. 20.

[328] Ibid., p. 26.

[329] Ibid., p. 35.

[330] Ibid., p. 39.

[331] Ibid., p. 49.

[332] Ibid., p. 50.

[333] Ibid., p. 59.

[334] Ibid., p. 60.

[335] Ibid., p. 64.

[336] Ibid., p. 63.

[337] Ibid., p. 70.

[338] Ibid., p. 66.

[339] Ibid., p. 84.

[340] Ibid., p. 85.

[341] Ibid., p. 133.

[342] Ibid., p. 101.

[343] Ibid., p. 143.

[344] Fry et ali, 2007, p.345.

[345] Ibid., p.13.

[346] Frazier, 1969, p. 13.

[347] Ibid., p. 14.

[348] Ibid., p. 124.

[349] Ibid., p. 213.

[350] Ibid., p. 67-8, citando Raffalovith, 1932.

[351] Ibid., p. 103.

[352] Ibid., p. 19.

[353] Ibid., p. 29, citando Woodson, 1924.

[354] Ibid., p. 213.

[355] Jordam, 1969, p. 190.

[356] Ibid., p. 197.

[357] Ibid., p. 196.

[358] Ibid., p. 198.

[359] Ibid., p. 199.

[360] Ibid., p. 201.

[361] Em francês Les oubliés de l´Amérique.

[362] Wilson, 1994, p. 25.

[363] Ibid., p. 210.

[364] Ibid., p. 253.

[365] As diferenças entre mestiços e negros também foram observadas nos Estados Unidos, no estudo de Frazier (1969) sobre a burguesia negra.

[366] Talvez a discussão racial tenha sido evitada na geografia em conseqüência das teses evolucionistas levantadas por Ratzel na sua Antropogeografia, no final do século XIX, e, sobretudo, dos trabalhos de seus discípulos nos Estados Unidos. Pode ser destacada a publicação do número 85 da revista francesa Herodote sobre a questão racial, sobretudo nos Estados Unidos (1997).

[367] Ver Fry et ali, 2007.

[368] A participação da banca de doutorado do Andrelino Campos (2006) foi um dos motivos que me estimulou a aprofundar as leituras sobre o assunto.

[369] Campos, 2006, p.341.

[370] Essas considerações serão ampliadas em artigo específico a ser publicado.

[371] Conforme Pierson, 1945, p. 225.

[372] Alguns tiveram funções importantes: já no século XVII, o negro Henrique Dias que teve "foros de cavaleiro fidalgo da Casa d'El-Rey" em Portugal, pela sua participação nos combates contra os holandeses (Carneiro, 2005, 491).

[373] Os dados apresentados por Paixão (2003, p.82) mostram que o IDH - Índice de Desenvolvimento Humano dos “Afro-descendentes” do Sudeste (0,733) é mais elevado que a dos “brancos” do Nordeste (0,716), e conseqüentemente dos “negros” da mesma região (0,633). A taxa de alfabetização influencia a formação do índice: os "Afro-descendentes" no Sudeste (87,5 por cento), Centro Oeste (85,9 por cento) e Sul (85,1) têm taxas mais elevada que os "brancos" do Nordeste (79,7 por cento) (p.77). Poderia ser perguntado, ironicamente, se não teria mais sentido a existência de cotas regionais ...

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Ficha bibliográfica

VASCONCELOS, P. de A. O debate sobre a questão racial no Brasil urbano: passado e presente. Biblio 3W Revista Bibliográfica de Geografía y Ciencias Sociales, Universidad de Barcelona, Vol.XII, nº 729, 15 de junio de 2007. [http://www.ub.es/geocrit/b3w-729.htm]. [ISSN 1138-9796].


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