Biblio 3W
REVISTA BIBLIOGRÁFICA DE GEOGRAFÍA Y CIENCIAS SOCIALES
(Serie  documental de Geo Crítica)
Universidad de Barcelona 
ISSN: 1138-9796. Depósito Legal: B. 21.742-98 
Vol. XIV, nº 841, 30 de septiembre de 2009


ESTADO E PODER LOCAL: ENSAIO TEÓRICO SOBRE ESTUDOS NO BRASIL

 

Márcia da Silva
Departamento de Geografia da Universidade Estadual do Centro-Oeste (UNICENTRO) - Paraná, Brasil
msilva@unicentro.br


Estado e poder local: ensaio teórico sobre estudos no Brasil (Resumo)

O estudo das teorias e das formas de poder, dentre elas as do Estado, das elites, dos grupos de interesses, dos micro-poderes, do poder de influência etc, estão relacionados, neste texto, à formação do Estado patrimonialista brasileiro e as estruturas que comprometeram suas transformações ou possibilitaram suas permanências, como às singularidades expressas no poder local. O poder dos grupos locais ora está em disputa e ora está em associação, sendo compreendido a partir de sua história e memória próprias, por identidades e práticas políticas determinadas. Com isso, é socialmente construído, mesmo configurando-se, no Brasil, a partir do município, ou seja, também como recorte territorial localizado e localizável. O objetivo, assim, é o de discorrer sobre a formação do Estado brasileiro e sua relação com o poder local por meio de um ensaio que buscou aglutinar estudos que deram origem e contribuíram para a fundamentação teórico-empírica do mesmo a partir dos anos 1950. Os aportes metodológicos diferenciados e os critérios específicos das abordagens tornaram o tema poder local instigante e fizeram com que o mesmo fosse pesquisado por correntes sociológicas, históricas, antropológicas, geográficas, da Ciência Política, todos com expressividade analítica que os tornaram referência, até os dias atuais, reafirmando a pertinência das pesquisas sobre poder nessa escala de análise.

Palavras-chave: poder, Teorias sobre poder local; Estado patrimonialista brasileiro


Estado y poder local: ensayo teórico sobre estudios en Brasil (Resumen)

Las teorías y las formas de poder (entre ellas las del Estado, de las elites, de los grupos de interés, de los micro-poderes, del poder de influencia etc.), se relacionan, en este texto, con la formación del Estado patrimonialista brasileño y las estructuras que comprometerán sus transformaciones o posibilitarán sus permanencias, como las singularidades expresadas en el poder local. El poder de los grupos locales unas veces está en disputa y otras en asociación, siendo comprendido a partir de su historia y memoria propias, por identidades y prácticas políticas determinadas. Está pues, socialmente construido, configurándose, en Brasil, a partir del municipio, o sea, también como territorio localizado y localizable. El objetivo, así, es reflexionar sobre la formación del Estado brasileño y su relación con el poder local por medio de un ensayo que trata de integrar los estudios que dieron origen y contribuyeron a la fundamentación teórica-empírica del mismo a partir de los años 1950. Las aportaciones metodológicas identificadas y los criterios específicos de las aproximaciones han convertido el tema del poder local en un estímulo y han hecho que el mismo haya sido investigado por corrientes sociológicas, históricas, antropológicas, geográficas y de la ciencia política, reafirmando la pertinencia de las investigaciones sobre el poder en esa escala de análisis.

Palabras-clave: poder, teorías sobre el poder local, Estado patrimonialista brasileño


State and local power: theoretical essay on studies in Brazil (Abstract)

The study of the theories and the forms of power, amongst them the theories of State, elites, groups of interests, micron-powers, the power of influence etc, are related in this text to the Brazilian Patrimonialist State formation and the structures that compromised its transformations or enabled its permanencies, as the expressed singularities in the local power. The power of local groups is sometimes confronted and sometimes in combination, being understood from their own history and memory, for determined identities and political practices. Therefore, it is socially constructed, even setting up in Brazil from the municipality, that is, as a located and locatable territorial clipping. Thus, the aim of this paper is to examine on the formation of the Brazilian State and its relations with the local power by means of an essay that attempted to agglutinate the studies that originated and contributed for the theoretical empiric substantiation of the same from the 50s. The differentiated methodological contribution and the specific criteria of the explanation let the local power theme instigating and get the same to be researched by some points of view, as the sociological, historical, anthropological, geographical thoughts and by the Political Science, all with analytical expressivity that made them reference, until the current days, reaffirming the relevance of the research about power in this scale of analysis.

Key words: power; Local power theories; Brazilian Patrimonialist State


As formas de poder e o Estado

Ao tratamento dos temas do Estado ou a ele relacionados dá-se o nome de política. O Estado e a política têm em comum a referência ao poder. Não há teoria política que não parta, direta ou indiretamente, de uma definição de poder e de uma análise do fenômeno do poder. Assim, é no poder político, a princípio aquele que tem exclusividade do uso da força, mas não necessariamente a física, que se estabelece mais eficazmente essa relação. Além de concebido como órgão de produção jurídica, o Estado é uma forma de organização social e não se dissocia da sociedade e das relações sociais subjacentes. A abordagem aqui realizada trata o Estado nesta dimensão social, como ordenamento jurídico da sociedade, residindo aí uma das justificativas para seu estudo pela Geografia e pelas demais ciências que se ocupam não só das relações sociais, mas de sua organização, inclusive espacial.

A teoria do Estado apóia-se, a partir dessa premissa, na teoria dos três poderes - o legislativo, o executivo e o judiciário – e na relação entre eles. É a inserção da teoria do Estado como uma parte da teoria política e desta, por sua vez, como parte da teoria do poder. “Por longa tradição o Estado é definido como o portador da summa potestas: e a análise do Estado se resolve quase totalmente no estudo dos diversos poderes que competem ao soberano” (Bobbio, 1985, p. 77). Se as teorias do Estado e da política derivam da teoria (ou das teorias) do poder, é nela, a priori, que se deve pensar. 

É objetivo deste texto apresentar um ensaio teórico, posto resultado da análise de pesquisas e não propriamente de uma exploração empírica realizada pela autora, sobre o Estado patrimonialista brasileiro e conseqüências ou causas que fizeram com que o denominado poder local, conjuntamente com outras matizes, direcionasse os rumos do mesmo, impedindo, por vezes, intervenções mais democráticas tanto dos grupos que o dominam quanto daqueles que são por ele dominados, num sentido ideológico que este incorpora em suas bases de poder.   

O “problema” do poder foi apresentado na filosofia política sob alguns aspectos, dando origem há três teorias, sendo elas: a substancialista (Hobbes), a subjetivista (Locke) e a relacional (a mais conhecida é a de Robert Dahl). Na primeira, “o poder é concebido como uma coisa que se possui e se usa como um outro bem qualquer (...) dotes naturais como a força e a inteligência, ou adquiridos, como a riqueza”; na segunda, o poder é compreendido não como “a coisa que serve para alcançar o objetivo mas a capacidade do sujeito de obter certos efeitos” e; na terceira, o poder se estabelece como “uma relação entre dois sujeitos, dos quais o primeiro obtém do segundo um comportamento que, em caso contrário, não ocorreria” (Bobbio, 1985, p. 77). Nesta última teoria, as relações de poder político passam, entre outros, pela influência (para o autor um conceito mais amplo que o de poder) de um indivíduo sobre o outro e pela aceitação dessa influência, isto é, o indivíduo B, que recebe influência de A, tem confiança nas considerações desse último. Esta definição inclui a de liberdade, ou seja, “o poder de A implica a não liberdade de B” (Bobbio, 1992, p.77). Das três teorias, a última é a mais aceita no discurso político contemporâneo.

Se o poder político é aquele que têm condições de recorrer, em última instância, a força, com exclusividade sobre ela, “se refere ao meio de que se serve o detentor do poder para obter os efeitos desejados” (Bobbio, 1985, p. 82). O critério do meio permite uma tipologia fundada nos poderes sociais: o econômico (da riqueza), o ideológico (saber) e o político (da força). Definido o poder político como aquele sustentado pela força, os demais se apresentam como se segue: O poder econômico é aquele que se vale da posse de certos bens, necessários ou percebidos como tais, numa situação de escassez, para induzir os que não os possuem a adotar certa conduta, consistente principalmente na execução de um trabalho útil (...). O poder ideológico é aquele que se vale da posse de certas formas de saber, doutrinas, conhecimentos, às vezes apenas de informações, ou de códigos de conduta, para exercer uma influência sobre o comportamento alheio e induzir os membros do grupo a realizar ou não realizar uma ação (Bobbio, 1985, p. 82-3). As três formas de poder contribuem para manter sociedades desiguais, produzindo ricos e pobre[1], sábios e ignorantes e fortes e fracos. Ao longo do tempo, o objetivo das grandes correntes do pensamento político e da filosofia da história, com visões diferenciadas, foi o de dispor esses poderes mediante hierarquias, com maior ou menor grau de importância. Em Hobbes, por exemplo, o poder por excelência é o poder político, ou seja, o poder que tem no primado da política a razão de sua existência. Os estudos realizados por Hobbes sobre o tema lhe concederam o status de maior teórico do Estado moderno.  As idéias anteriormente expostas não podem ser aplicadas, diretamente, para o caso brasileiro, já que essas reflexões tiveram como pressuposto, principalmente, o modelo europeu, que contou com a existência de organizações e diversos movimentos que pressionaram os governos quanto às reivindicações dos grupos menos favorecidos, bem como do fato de que as instituições que formaram o Estado moderno assim o fizeram por meio de heranças culturais.   

Isso não significa ausência, no entanto, de reivindicações ou de movimentos de resistência. Ao contrário, eles sempre existiram ao longo de nossa história. Mas o que houve também foi uma resistência das oligarquias em atender às pressões realizadas por esses movimentos e instituições. Como são elas (as oligarquias) as ocupantes de grande parte dos postos nos órgãos decisórios impedem manifestações que possam ameaçar sua hegemonia. Nesse caso, podemos citar a persistência do poder dos latifundiários para se defender, por exemplo, da mobilização social do MST.

Bem como a definição, a legitimidade também é considerada um problema clássico do poder político. Os mais importantes fatores de legitimidade, no decorrer da história, partem de três grandes princípios unificadores: a vontade, e assim os governantes receberiam seu poder de Deus ou do povo, cabendo a eles aplicar as leis naturais da razão; a natureza, existindo naturalmente fracos e fortes, sábios e ignorantes – o poder natural de mandar e obedecer, independente da vontade humana e; a história passada, a tradição (teorias tradicionalistas do poder), o uso prolongado do poder ou a manutenção do status quo.

É neste último princípio que se inclui a ideologia conservadora, já que defende uma visão estática da história. Nela, é bom o que dura, como apontou Burke[2], ao se colocar favorável ao poder dos reis às pretensões dos revolucionários na Inglaterra. Analisando Burke, Bobbio (1985) afirma que a referência à história passada constitui-se um critério de legitimação do poder instituído. Em contrapartida, o revolucionário tenderia a impor o deslocamento do antigo e o nascimento de novas etapas, mais avançadas que as precedentes e baseadas, nesse exemplo, nos princípios da Revolução Francesa, dos quais Burke era contra. Nesse caso o revolucionário apresenta uma concepção dinâmica da história (apesar de nem todo indivíduo ou grupo que busca transformações o fazer pela via revolucionária), considerando a mudança como fator primordial de renovação do poder.

No Brasil é possível encontrar alguns dos elementos discutidos acima, em relação à ideologia conservadora, quando nos atemos à análise da formação do Estado pela corrente de estudos fundada por Raymundo Faoro, que denomina essa formação de patrimonialista. Um dos aspectos da proposta é o de que o Estado brasileiro, mediante uma série de práticas que permite a reprodução de relações arcaicas, impede transformações de cunho mais profundas na sociedade de forma geral e, em particular, em sua própria base.


A formação do Estado patrimonialista brasileiro

De acordo com Mota (1999) o Brasil, formado por três séculos de escravidão e presença marcante da igreja em relações diversas, com a independência política foi inserido em questões que levaram à construção de outras idéias. Elas definiram, ao longo do processo de formação econômico-social e político-cultural, os dois séculos seguintes. “No processo, pontilhado de conflitos, insurreições, golpes e acomodações, forjou-se a nacionalidade como categoria histórica e, não menos importante, como ideologia política e cultural” (Mota, 1999, p. 200). O autor afirma, ainda, que esse período de formação de uma idéia de Brasil ocorreu, primordialmente, entre 1817, quando se iniciou a ruptura a partir da Revolução Pernambucana, e 1850, quando certos comportamentos e formas de pensamento passaram a ser chamados de nacionais.

Para ele, no entanto, o que se presenciou foi a formação de uma consciência nacional conservadora. Essa consciência ou a nacionalidade, apesar de assegurada pela consolidação do Estado, foi algumas vezes revista, como no governo de Getúlio Vargas. Mas nem por isso, por exemplo, isentou-se de um liberalismo consolidado como meio pertinente de encobrir a dependência (da portuguesa à inglesa) e manter relações patrimonialistas. E aí está, afirma Mota (1999), o que se chama de “nó” histórico. Muda, mas permanece. 

Raimundo Faoro (1975), ao estudar a formação histórica brasileira, identificou um processo um pouco diferente. Para o autor, as tentativas de mudança não só da idéia de Brasil, mas da política brasileira, como os movimentos revolucionários, a Cabanada e as Revoluções Praieira e Farroupilha, por exemplo, foram abafadas pelos mecanismos políticos do Estado patrimonialista. O patrimonialismo, na acepção de Faoro (derivada da sociologia weberiana da qual é seguidor), é um subtipo de dominação tradicional. O Brasil, “herdeiro do patrimonialismo português, recebeu, com a independência, o impacto do mundo inglês, já moderno, adotando a máscara capitalista e liberal, sem negar, ou como se diria com mais propriedades, sem superar o patrimonialismo” (Faoro, 1998, p.17)[3]. Patrimonialismo esse que nem mesmo a ideologia liberal e democrática conseguiu quebrar ou desfazer.

Para o autor, o patrimonialismo só ocorre quando tradicional for o tipo de dominação. Além disso, é adepto de uma orientação à sociedade de cima e do alto, nunca permitindo a ordem inversa. Para que “haja patrimonialismo é necessário que os recursos econômicos e administrativos (em sentido amplo) dependam do poder soberano ou do poder público, que atua por meio de concessões, subsídios e autorizações” (Faoro, 1998, p.17). Numa sociedade patriarcal, de mando familiar, onde o indivíduo e o Estado pouco dominam, não se desenvolve o patrimonialismo.

A busca realizada por Faoro (1975) remonta a Portugal do século XVII, portanto, à gênese da história brasileira. Para ele, o patrimonialismo é a forma como “a comunidade política conduz, comanda, supervisiona os negócios privados, seus na origem, como negócios públicos, depois”. Para o autor, o patrimonialismo (em que pese ter assumido novos contornos) está no fato de o Estado preceder ou se colocar acima do grupo social cuja segurança, ordem pública e legitimidade deve garantir. Ora, afirma Faoro (1975), o predomínio do Estado sempre foi uma característica marcante da sociedade brasileira, constituída justamente no conservadorismo[4] e na tradição, mas não somente a tradição patriarcalista, de mando político familiar, como abordado por Gilberto Freyre[5] e que, de acordo com Faoro (1998), se consagrou impropriamente como sinônimo de direita.

Prado Júnior (2000), por sua vez, explica que mesmo com a constituição de um Estado brasileiro, o poder continuou sendo exercido externamente, por meio das metrópoles. Esse Estado, compreendido como nacional, reproduziu quase que totalmente as relações de poder anteriores, isso porque não surgiu “do íntimo da sociedade brasileira” (Prado Júnior, 2000, p. 357). Com ele formou-se um conjunto social que se identificou por contradições próprias da organização político-econômica daquele período, como as existentes na relação senhores e escravos e outras citadas pelo autor. Para Faoro (1998, p. 25), Prado Júnior também “acatou a tese da dominação patrimonial, sem lhe indicar as fontes”. Assim, as relações conservadoras de poder podem ser identificadas na própria constituição do Estado patrimonialista brasileiro e em seus pares, como o clientelismo e a troca de favores.

Para Fernandes (1973), no entanto, a idéia de Estado e, por sua vez, de Estado subdesenvolvido ou subdesenvolvimento, não se configura enquanto atraso, isso porque quando discorre sobre a heteronomia ou dependência o faz por meio do seu conceito de capitalismo dependente, ou seja, uma das fases do capitalismo em sua forma específica de desenvolvimento e parte de um momento histórico do mesmo, o capitalismo monopolista. A nós importa o fato de que o autor trabalha com a teoria do desenvolvimento capitalista dirigindo sua atenção ao sistema de classes sociais e que suas relações dinamizam esse desenvolvimento, o que pode ocorrer por meio do conflito ou da parceria/associação.

É por isso que o autor não atribui a condição de dependência exclusivamente à dominação externa, entendendo que o capitalismo possui lógica própria e que esta consiste exatamente na articulação entre os mecanismos “de fora para dentro” (dos centros capitalistas hegemônicos para as economias capitalistas dependentes) e “de dentro para fora” (da periferia para os centros hegemônicos). Assim conclui que “um não se fortalece sem ou contra o outro”  (1973, p. 54).

Com esta argumentação, a de que as relações de classe estão no centro da constituição dos mecanismos próprios do capitalismo, tanto no seu desenvolvimento clássico, quanto na sua especificidade dependente, Fernandes (1973) apresenta dois elementos, com os quais comungamos, considerados fundamentais para o processo de  funcionamento e de continuidade da dependência: a importância da burguesia local que se vincula à burguesia externa sendo com menor intensidade e subordinada a ela e; a exacerbada relação das classes internamente, caracterizada pela “sobre exploração” e pela “sobre expropriação” capitalista do trabalho (Fernandez, 1973, p. 54).

Trata-se de “uma realidade sócio-econômica que não se transformou ou que só se transformou superficialmente, já que a degradação material e moral do trabalho persiste e com ela o despotismo nas relações humanas, o privilégio das classes possuidoras, a super concentração da renda, do prestígio social e do poder, a modernização controlada de fora, o crescimento econômico dependente etc” (1973, p. 42).

Com isso, para a América Latina, o que se entende é que as possibilidades de transformação deflagradas pelas burguesias locais são impedidas de se darem em razão da subordinação às burguesias externas e da tímida pressão sobre elas exercida pelas classes trabalhadoras. Entretanto,

(...) não é que existam duas ‘burguesias’, mas uma hegemonia burguesa duplamente composta, graças à qual interesses burgueses internos e externos se fundem, funcionando estrutural e dinamicamente de forma interdependente e articulada. Esta associação cria a inviabilidade da América Latina sob o capitalismo, porque é ela que origina, preserva e legitima um padrão de mudança social que continuamente reorganiza a dependência, a espoliação, a miséria e as iniqüidades sociais, que tornam a revolução nacional uma improbabilidade histórica” (Fernandez, 1973, p. 146).

Há, no entanto, segundo o autor, uma relação de “dependência interna” neste processo. Como dominantes, as burguesias dependentes são tanto mais fortes quanto mais frágeis e desorganizadas forem as demais classes sociais, mas, enquanto classe, isto é, enquanto possuidora de capacidade para conduzir transformações ou forjar permanências que organizem a sociedade de acordo com os seus moldes, a atonia das demais classes a afugenta. Assim, “por paradoxal que pareça, o que mais debilitou as burguesias latino-americanas, reduzindo sua capacidade de ação econômica e de atuação política, foi a maneira pela qual pretenderam fortalecer-se, excluindo ou enfraquecendo outros protagonistas sociais” (Fernandez, 1973, 57). Essa inquietação, aliás, retrocede à década de 1930, com a publicação de Raízes do Brasil (1936), de Sérgio Buarque de Holanda[6], onde o tema da permanência de um seleto grupo dominante em determinadas relações de poder já era discutido.

É nesse sentido que se faz marcante a presença histórica do Estado patrimonialista na sociedade brasileira, na qual a correlação de forças políticas, sociais e econômicas implica relações ideológicas de poder conservador. Destaca-se, porém, que é preciso compreender esse Estado como uma das alternativas ou formas de poder, envolvendo-se com outras formas, como aquelas dos grupos sociais de interesses, dos micro-poderes, do poder simbólico, das elites, dos grupos de influência e outros, não apenas como única fonte ou fonte superior e conservadora de poder.


O atraso e as transformações do Estado brasileiro

De acordo com Marques (2003, p. 188), para “uma parte significativa das ciências sociais, assim como para praticamente todo o senso comum, o Estado brasileiro teria como uma de suas principais características sua interpenetração com atores privados”. Levando-se em consideração os referenciais citados pelo autor, a justificativa estaria nas próprias relações entre Estado e classes dominantes no Brasil, ou na finalidade equivocada das instituições brasileiras que incentivariam o personalismo, o clientelismo e a corrupção (Geddes e Ribeiro Neto, 2000). Além disso, num nível mais micro, pela importância das relações pessoais na estruturação do poder político (Bezerra, 1995) e na separação entre indivíduo e pessoa nas relações sociais (Mata, 1978).

Além de Raymundo Faoro, citado há pouco, José de Souza Martins também estuda a ordem patrimonialista no Estado brasileiro. Para este autor, o Estado brasileiro domina a sociedade e o faz a partir de relações políticas atrasadas, como o clientelismo, a dominação tradicional de base patrimonial e o oligarquismo. É o atraso que, para o autor, é instrumento de poder.

Isso acontece porque no caso da sociedade brasileira as transformações sociais e políticas são lentas, mesmo considerando-se a “juventude” do Estado brasileiro. As estruturas, as instituições, as concepções, os valores do passado com elas se reproduzem. A “modernização se dá no marco da tradição, o progresso ocorre no marco da ordem (...) o novo surge sempre como um desdobramento do velho” (Martins, 1994, p. 30). O príncipe herdeiro da Coroa portuguesa proclamou a independência, os senhores de escravo aboliram a escravidão, latifundiários rurais transformaram-se em grandes comerciantes e industriais (a moderna elite econômica do país). É por isso que se engana quem acredita que o pensamento conservador “é imobilista. Ao contrário, o pensamento conservador se tornou ativo e transformador[7]” (Martins, 1994, p. 15), como estratégia para se manter no poder.

Para Martins (1994), “o trânsito de dinheiro particular para os bolsos dos políticos por meio das funções públicas que ocupam combina-se, na tradição brasileira, com o movimento inverso do dinheiro particular dos políticos em favor dos interesses particulares dos eleitores, justamente como compensação pela lealdade política destes últimos” (Martins, 1994, p. 19-20).

Concorda-se com Martins (1994) que ao longo do tempo a política do favor não permitiu a distinção entre o patrimônio público e o patrimônio privado na formação do Estado brasileiro, até porque ela nunca chegou a se constituir. A novidade, porém, está na dominação política patrimonial revestida de moderno ou de caráter burocrático-racional-legal. Ou seja, a tradição não se opõe ao moderno, mas nutre-se dele. É neste sentido que as “oligarquias políticas no Brasil colocaram a seu serviço as instituições da moderna dominação política, submetendo a seu controle todo o aparelho de Estado” (Martins, 1994, p. 20).

O autor afirma, porém, que há contradições no interior dessa legitimidade de tipo tradicional, e que são elas reveladoras das fragilidades de um Estado cuja constituição resulta da união entre o tradicional e o moderno. Para Martins (1994, p. 21) aí reside à possibilidade da mudança: “nas contradições e debilidades que a modernização introduziu na dominação oligárquica tradicional”. Para os autores analisados, mesmo com todos os acontecimentos político-econômicos pelos quais o Brasil passou, especialmente no século XX, bem como as de ordem mundial, algumas relações pouco mudaram, como aquelas que se asseguram em relações de poder mais específicas, sendo exemplos muitas arraigadas numa singularidade de poder político local.


A análise do local no poder local

Analisar a natureza e o significado do poder enquanto um campo de investigação com imensas diversidades teórico-metodológicas é uma tarefa complexa, independente de sua escala, mesmo considerando “relações concretas, socialmente construídas e territorialmente localizadas - a chamada análise do local” (Fischer, 1992, p. 106). O que se denomina de local, remete-se, no Brasil, à esfera municipal, o lugar de exercício do poder, prefeitura e câmara municipal e as múltiplas instituições sociais a esta esfera vinculadas (Daniel, 1988). Compreende-se, também, como o autor, que o poder local constitui-se nas relações que delimitam o poder entre os diferentes grupos sociais, o que pode ocorrer externamente a essa esfera.

Para compreender o local e as relações de poder nele existentes, não basta identificá-lo ao poder político. É preciso conceituar esse poder como o poder exercido econômico, social, cultural e simbolicamente. Nas palavras de Fischer (1992, p. 106):

A noção de ‘local’ contém duas idéias complementares em um sentido e antagônicos em outro. Se o ‘local’ refere-se a um âmbito espacial delimitado e pode ser identificado como base, território, microrregião e outras designações que sugerem constância e certa inércia, contém igualmente o sentido de espaço abstrato de relações sociais que se deseja privilegiar e, portanto, indica movimento e interação de grupos sociais que se articulam e se opõem em relação a interesses comuns. E, assim, invariavelmente a análise do ‘local’ remete ao estudo do poder enquanto relação de forças, por meio das quais se processam as alianças e os confrontos entre atores sociais, bem como ao conceito de espaço delimitado e à formação de identidades e práticas políticas específicas. No entanto, se o espaço local tem um fundamento territorial inegável, não se resume a este, como, aliás, assinalam os geógrafos ao nos dizerem das muitas maneiras de se construir os espaços, refutando fronteiras institucionais e reconstruindo-as em função de problemáticas adotadas.

Concorda-se, ainda, com a autora (1992, p. 106) que o poder local “alude-se ao conjunto de redes sociais que se articulam e se superpõem, com relações de cooperação e conflito, em torno de interesses, recursos e valores, em um espaço cujo contorno é definido pela configuração desse conjunto”.

Villasante (1988, apud Fischer, 1992) conclui, então, que o local é menos um espaço físico e mais um conjunto de redes estruturadas em torno de interesses identificáveis. Essa identificação leva a indagações sobre o espaço político local, as competições e os conflitos, sobre a memória política local e as formas de exercício do poder. O local é, então, a singularidade, com história e memória próprias, com identidades e práticas políticas determinadas. “Como objeto de investigação, o local não é, portanto, apenas fisicamente localizado, mas socialmente construído” (Fischer, 1992).

É bem verdade que as dimensões escalares do espaço geográfico sofreram mudanças com as transformações econômicas, sociais e políticas impetradas pelo processo de globalização. Alguns chegam a afirmar que a falência de projetos de desenvolvimento regional tornaram essa escala obsoleta. Outros, que a redefinição do significado do Estado-Nação coloca em questão a escala nacional. Apesar de não concordar com essas abordagens, indica-se que o local assume, nesse contexto, um papel importante, pois é nele que as diferentes articulações, advindas desses processos, tornam-se mais visíveis. É o acontecimento configurando o que é local. É a realidade vivida e vivenciada, mas também a realidade vinculada a relações maiores, de contornos nacionais e globais.

Para Davidovich (1993), a viabilidade de uma escala local de poder, mesmo numa economia capitalista e ainda que articulada a outros instâncias de dominação, passa por um suporte de bases sociais específico, sustentado pelas elites, grupos econômicos, políticos e instituições com influência efetiva[8]. Como Davidovich, Daniel (1988, p.30) também conforma que os grupos dominantes locais (...) se representam como portadores da tradição local e do esclarecimento, razão pela qual se percebem como responsáveis pela condução do município e pelo seu futuro. (...) Na medida em que sua constituição se dá no nível simbólico [são formados] por agentes sociais de raízes heterogêneas: profissionais liberais, membros do empresariado local, das classes médias assalariadas do município, etc.

Esses grupos, quase sempre em minoria, acabam por ter poder sobre a região e sua população, inclusive repassando às novas gerações sua maneira de agir e de pensar, permitindo, se não perpetuar, ao menos consolidar temporariamente a hegemonia nas decisões locais. A população é manipulada, voluntariamente ou não, pelo caráter simbólico de crenças, valores e outros, bem como pelos meios de comunicação (que transmitem essas ideologias), legitimando as ações dos grupos detentores de poder.

Os grupos, entretanto, tendem a atuar de maneira relativa, mas não completamente autônoma, já que se articulam em partidos políticos, entidades de classe e/ou associações para ganharem maior legitimidade. A existência de articulação não significa ausência do conflito (lutas, negociações, alianças, antagonismos). Ele pode existir com ou sem a articulação, o que, de certa forma, garante a não consolidação do domínio de forças (tradicionais) duradouras (Davidovich, 1993).

É neste sentido que se justifica o fato de, atualmente, no Brasil, nenhum grupo exercer, sozinho, o controle sobre as decisões políticas, não somente locais. Temos como exemplo, o que já dizia, em 1994, José de Souza Martins: (...) as oligarquias políticas no Brasil colocaram a seu serviço as instituições da moderna dominação política, submetendo a seu controle todo o aparelho de Estado. Em conseqüência, nenhum grupo ou partido político tem hoje condições de governar o Brasil senão através de alianças com esses grupos tradicionais (Martins, 1994, p. 20).


A análise do poder local

Nas abordagens apresentadas acima pode-se perceber que o Estado é só um entre os vários modelos da organização institucional do poder (embora o mais bem elaborado). O universo político, marcado por transformações ao longo de sua existência, demonstra que algumas das mais importantes delas são relativamente recentes. Assim, a tradição de pensamento científico-social tende a situar na transição para a época moderna o principal ponto de mudança na percepção que atualmente se tem do Estado.

O Estado é uma das figuras que mediam o poder local, uma vez que é no cruzamento de suas várias concepções e das lutas simbólicas por elas desencadeadas que se projeta igualmente a idéia da atuação deste em nível local (Felizes, 1999), o que não implica que não se deva ultrapassar a fronteira do poder nele ou por ele estabelecido, o que conforma quando se pensa na existência de uma sociedade estratificada, com grupos de interesses, micro-poderes, relações individuais e de grupos estrategicamente formados. É o que nos lembra Felizes (1999): “o poder político não orbita unicamente em torno do Estado, pois os Estados coexistem com outras organizações, com outras estruturas igualmente relevantes do ponto de vista da sua capacidade de determinar as trajetórias globais das sociedades”. São os chamados ‘contra-poderes’ ou mesmo a ‘instrumentalização’ do Estado por meio de diversos agentes.

No universo do poder local (mas claramente não só dele), é possível a observação de um complexo relacionamento entre o poder político e uma rede de poderes difusos que, como indica o autor acima (1999, p. 125), “posicionam-se diferentemente perante o poder político e, de acordo com os atributos que lhes são próprios, podem disputar com ele a capacidade de decisão”.

Para Felizes (1999), a interpretação da forma como se configuram estes poderes vai ao sentido de distinguir entre, de um lado, os poderes difusos mais ‘organizados’, como é o caso das elites político-econômicas locais e, de outro lado, um poder difuso mais próximo do quotidiano social, das relações que envolvem estratégias mais ou menos conscientes de apropriação e utilização desse poder, que não é o poder político ou econômico formalmente reconhecido, mas sim o poder de ‘classificar’, de ‘ver’ e de ‘fazer ver’ o mundo, de reconhecê-lo com outros atributos, a exemplo dos simbólicos, como afirma Bourdieu (1989).

Interessa-nos saber como se articulam estes poderes. Como nos sugere a argumentação de Russ (1994, apud Felizes, 1999), podemos questionar ‘quem detém o poder’ de diferentes formas, apelando a figuras como as elites, os grupos de pressão, a rede de relacionamentos ou mesmo uma pluralidade de poderes. Tem-se, então, lançada uma das questões mais triviais dos estudos sobre o poder ou o poder local: quem governa?[9] Aqui, ousamos perguntar: quem efetivamente tem o poder de decidir? Quem manda afinal?

Compreendendo a escala local e do poder local como campo prioritário da ação política, cabe lembrar o estudo de Carlos Bernardo Vainer, em especial o sugestivo “As escalas do poder e o poder das escalas: o que pode o poder local?”[10]. Com esse questionamento, o autor relaciona o poder local a um sentido de patriotismo de cidade, uma pretensa capacidade extraordinária dos governos locais de cumprir, de maneira mais eficaz e eficiente, as funções até então tradicionais aos governos nacionais, como as de acumulação e de legitimação.

Por isso concorda-se com Vainer (2001, p. 144) que, enquanto “a polaridade local x global domina o debate contemporâneo”, não se deve opor escalas, mas articulá-las e combiná-las, já que “eu vivo cotidianamente no mundo e no meu local, no meu município, na minha cidade, no meu país”. Para se entender esse processo é preciso atentar que “o local, a cidade em primeiro lugar, constitui escala e arena de construção de estratégias transescalares e de sujeitos políticos aptos a optarem de forma articulada com coalizões e alianças em múltiplas escalas” (Vainer, 2001, p. 149).

Isso porquê a "escala local não encerra em si senão parte dos desafios a serem enfrentados" (Vainer, 2002, p.29). Mas faz-se importante questionar, também como Vainer (2002, p.13), se "é possível ir além de uma ação governamental cuja virtude máxima seja a de apaziguar localmente conflitos sociais engendrados pela estrutura social e agravados pela ofensiva neoliberal."

O levantamento realizado sobre os estudos de poder local no Brasil apresentados abaixo indicam, nos utilizando das palavras de Vainer  (2002), que o localismo e o municipalismo quase sempre estiveram associados ao mandonismo local e ao coronelismo, mas que no final dos anos 1970 e até a constituição de 1988 serviram como “bandeira da esquerda democrática” e que nos anos 1990 apareceram tanto nas propostas da esquerda quanto na eloqüência neoliberal.

Para os estudos de poder local, as ciências que originaram linhas explicativas vinculadas às dinâmicas políticas e as políticas locais foram Sociologia e a Ciência Política. As três linhas principais são: a teoria das elites, o pluralismo (também considerada por vários estudiosos como parte da teoria das elites, mudando apenas o método de análise) e o marxismo, que enfocaram fenômenos particulares e atores específicos, por isso representam visões praticamente impossíveis de se conciliarem em termos teóricos. Marques (2003), por sua vez, afirma que em nível analítico os mecanismos e atores destacados por elas são passíveis de articulação.

De acordo com este autor, em termos cronológicos, a teoria das elites, investigada a partir do método reputacional, foi a primeira a se destacar na temática, com o estudo de Floyd Hunter (1953) sobre o governo urbano na cidade de Atlanta (EUA)[11]. Para ele, a estrutura de poder local se comporia a partir da influência de determinados grupos. No topo da pirâmide estariam, principalmente, os empresários de sucesso e as lideranças políticas de destaque (as econômicas, as governamentais, as religiosas e as culturais). A inserção na estrutura de poder aconteceria pela riqueza, pelo prestígio social e pela utilização da máquina política. A coesão se daria pelos interesses comuns, pelas obrigações mútuas ou pelos hábitos partilhados por essa elite. Nesta teoria, a sociedade seria frequentemente composta por uma minoria detentora de poder (“classe superior”) em contraposição a uma minoria dele privada (Marques, 2003).

A principal conclusão, nesse sentido, é que a conformação do jogo do poder local, marcado pelo controle da elite, assim como a manutenção desse controle de maneira estável no tempo, levariam a que as políticas implementadas seguissem sempre os interesses dos indivíduos ali representados, tornando completamente viciados os resultados do governo sob a democracia representativa (Marques, 2003, p. 27).

Assim, os grupos que dominariam as várias dinâmicas políticas e que se apropriariam do Estado seriam sempre da elite, ajudados muitas vezes pelo próprio Estado, que seria parcialmente responsável pela reprodução da mesma. Consubstanciar-se-ia, assim, uma relação indissociável entre poder político e poder econômico (Fisher, 1992).

O poder, nessa perspectiva, se reproduziria na socialização, na educação familiar, na estrutura de propriedades, na distribuição da riqueza (acesso a certo padrão de vida), instituições de lazer (clubes e outros que complementariam as organizações anteriores), enfim, na composição do pertencimento a redes de relacionamentos ou de organizações as quais habitualmente freqüentariam, “através das quais seriam veiculados informação, negócios, apoios (...), assim como construídas e comungadas visões de mundo e valores” (Marques, 2003).

Ainda de acordo com Marques (2003), a teoria das elites apresenta dois problemas principais de análise: dificuldade em incorporar as mudanças e as contingências ao processo político (alternância de poder) e de incorporar a importância de atores localizados no próprio Estado. Segundo Marques (2003), a política elaborada pela teoria das elites “causa sérios problemas à idéia de democracia e ao princípio democrático de controle dos eleitores sobre o governo” (Marques, 2003, p. 30).

Em busca de sanar o que se apresenta como problema da teoria das elites, desenvolveu-se também, ao final dos anos 1950, a perspectiva pluralista do poder. O estudo em que efetivamente abordou-se o tema foi o de Robert Dahl (1961), citado há pouco. Nele, a principal crítica à teoria das elites é a de que ela deixa pouco lugar aos políticos ou aos indivíduos em suas análises. Para os pluralistas, então, de acordo com Marques (2003), quem governa, num primeiro patamar, são os partidos políticos e as organizações de interesses. Mas, aponta ainda o autor (2003) que, na própria teoria, muitas vezes os partidos políticos são reduzidos a pouco mais que grupos de interesses ou conjuntos de indivíduos com propósitos comuns. “A unidade básica da política seria, portanto, os grupos de interesses” (Dahl, 1961, apud Marques, 2003, p. 31).

Defendem os pluralistas, como o próprio nome indica, que “a sociedade seria composta por uma pluralidade de grupos, cada qual com seus instrumentos de poder e seus interesses específicos e temáticos” (Marques, 2003, p. 31). Assim, em primeiro momento, nenhum grupo ficaria no poder de forma estável ao longo de muito tempo. As críticas de Marques (2003) a essa abordagem mais uma vez se fundamentam na análise equivocada do Estado, que é considerado uma página em branco a “ser preenchida” pelos grupos vitoriosos na política. Nela, ainda, valoriza-se precariamente os funcionários, as instituições, os capitais por ele (Estado) contratados, bem como os detentores de cargos eletivos.

Para as duas teorias, foram elaboradas, ao longo do tempo, várias análises de caráter teórico-metodológico. Felizes (1999) aponta que, na teoria das elites, Hunter desenvolveu aquilo que mais tarde passou a ser conhecido como método reputacional, concluindo que quem detinha as ‘rédeas do poder’ eram quase exclusivamente os grandes homens de negócios de Atlanta, embora operassem mais nos bastidores.

Já o trabalho de Dahl (1961) estaria assentado numa metodologia mais plural, subsidiado no método decisional, com o objetivo de “examinar decisões para ver que processos de influência estão presentes”, bem como de “identificar os participantes na formulação das políticas e descrever o que eles faziam” (Dahl, 1961, apud Judge, 1995, p. 17). Para Judge (1995), as principais conclusões de Dahl contradizem em grande parte as de Hunter. New Haven teria transitado, naqueles últimos dois séculos, de uma oligarquia a um pluralismo e, ao invés de uma elite, Dahl teria encontrado um ‘estrato’ de indivíduos envolvidos em questões políticas. Já os adeptos as conclusões de Dahl colocaram em causa o pluralismo moderado de New Haven, no sentido de que, a partir dos anos 1960, a tensão social urbana e o envolvimento dos cidadãos no debate político aumentaram. Neste ponto, afirma Felizes (1999), alguns podem pensar que em vez de se perguntar: ‘quem governa?’, dever-se-ia perguntar: ‘será que alguém governa?’

A divergência entre os dois grupos, então, giraria em torno de questões fundamentais, como as metodológicas e as teóricas. Mesmo com a polêmica que dividiu os primeiros defensores do elitismo e do pluralismo, tanto o trabalho de Hunter quanto o de Dahl foram inicialmente atacados justamente por suas supostas debilidades metodológicas. Em nível internacional, de acordo com Marques (2003), essas duas correntes de pensamento foram expressivas nos estudos das dinâmicas políticas e do poder local. No Brasil, no entanto, a inserção de ambas as abordagens foi acanhada.

A última das três linhas explicativas das dinâmicas políticas é a marxista. Ela, em função da importância da análise do marxismo estruturalista althusseriano e dos estudos de Paulantzas, nos anos 1970 e 1980, fez uma revisão do Estado e de sua relação com o poder. Marques (2003) afirma que as maiores contribuições foram dadas pela literatura francesa, fundando, posteriormente, os dois ramos da escola de sociologia urbana representados, especialmente, pelas correntes neomarxistas criadas por Castells e Lojkine.

A crítica marxista à teoria das elites e ao pluralismo se constitui a partir de uma interpretação diversa de sociedade realizada por essa vertente. Nela, a sociedade é compreendida como o conjunto de relações entre dominantes e dominados, ou seja, duas classes antagônicas que conduzem, a partir de contradições, o cerne do movimento histórico, e não meramente como elites e massa, passivas entre si, com a existência de conflitos apenas no interior das elites. Além disso, a concepção de sociedade depende da estrutura ou da base econômica, e da superestrutura, sendo a forma de produção determinante, embora nem sempre dominante. Longe de ousar interpretar, neste ensaio, esta análise da sociedade, cabe afirmar que o núcleo da teoria marxista está na ruptura da ordem (diga-se do modo de produção) ou na passagem de uma ordem a outra, o que se daria mediante as contradições internas ao próprio sistema, em suas forças produtivas e nas relações de produção. A mudança social, então, é considerada o grande objetivo de Marx e da maior parte dos marxistas.

Para Marques (2003), mesmo não concordando com a captura estrutural do Estado, um elemento pode ser destacado, qual seja, a da ação dos capitais envolvidos com a produção da política, já que, para ele, esses se constituem em importantes atores políticos, pois possuem interesses próprios e recursos de poder não só financeiros, mas também simbólicos, organizacionais e discursivos, como alguns dos estudos exemplificados abaixo.


Os estudos de poder local no Brasil

Os estudos de poder local realizados no Brasil a partir dos anos 1950[12] foram sistematizados por alguns autores, especialmente como resultados de pesquisas de mestrado e de doutorado. Dentre as análises, podemos destacar as de Tabak (1961), Gomes e Costa (1968), Carvalho (1969)[13] e Castro (1974)[14]. Em função dos aportes metodológicos e dos critérios específicos das abordagens, no entanto, suas observações foram diferenciadas.

Pode-se afirmar que esses estudos constituem-se os clássicos sobre o tema, aqueles da primeira geração, estando divididos em dois grupos. No primeiro deles estão os estudos publicados pela Revista Brasileira de Estudos Políticos, caracterizados por Carvalho (1969) como estudos políticos. No segundo estão os estudos de comunidades locais realizados por antropólogos brasileiros e norte-americanos da USP e denominados, por Carvalho (1969), de estudos antropológicos.

Diante do interesse, aqui, pelos trabalhos de cunho político, optou-se pela análise de alguns desses. Dentre os citados, o de Carvalho, em 1969, alerta para alguns elementos que devem ser considerados ao se estudar a questão do poder local, elementos citados também por Castro, em 1974, e que tem sido preocupação daqueles que trabalham com o tema. Afirma ele que o conceito de poder local (como os demais) deve ser cuidadosamente definido e ter em vista a elaboração de uma discussão mais geral do poder em nível estadual ou nacional.

Castro (1974) acrescenta que é preciso atentar para não se fazer apenas descrições e narrações, lembrando-nos da importância do papel da estrutura de classes e/ou dos grupos na dinâmica das relações de poder. Para a autora, deve-se buscar entender, ainda, os discursos dos grupos não detentores de poder e verificar o porquê de assim se encontrarem. Nesse sentido, questiona-se de quais recursos alguns grupos locais são controladores para que se sobrepunham aos demais. E os excluídos, estão suprimidos do quê? 

Outra análise, mais recente, é realizada por Kerbauy (1992) em sua tese de doutorado. A autora repensa o poder local no Brasil a partir das transformações ocorridas no período de 1964 a 1982. Objetiva, em especial: “contrapor a velha imagem da política local, como esfera privilegiada do coronelismo, aos novos padrões e procedimentos locais que se desenvolveram à medida que progrediu a interação nacional e se rompeu o isolamento local” (Kerbauy, 1992, p. 1).

Kerbauy (1992) afirma que a implantação de um regime autoritário, no Brasil, em 1964, deu início a um processo de modernização conservadora, com o Estado ampliando sua intervenção sobre a sociedade e a economia, tendo em vista romper com os limites para a implantação do modo de produção capitalista. Demonstra, também, que as relações sócio-econômicas de então apresentam algum dinamismo, com as transformações urbanas e a industrialização, o avanço nos níveis de ensino, os transportes que romperam, de certa forma, o isolamento etc., mas também demonstra que as relações políticas não passaram por essa transformação, mesmo porque não permitiram a participação da sociedade em decisões fundamentais, como a própria escolha de seus representantes. Assim, pouco foram modificadas as relações entre Estado e sociedade. Nesse sentido, segundo ela, torna-se imperativo um esforço analítico mais matizado, que leve em conta alguns processos de mudança estrutural, mas também as transformações políticas.

Em sua análise, ainda, a autora afirma que há um vazio teórico, nas Ciências Sociais do país, sobre o tema poder político local. Para ela, aqui, não se consolidou uma teoria, e justamente porque existem incertezas do conceito de poder local. Assim, a busca pela articulação e interpretação teórica, para Kerbauy (1992), é o desafio a ser alcançado. Para ela, no Brasil, os estudos passam (não se aprofundam) pelos métodos de investigação reputacional e decisional. Como já citado, no primeiro, o poder está associado às pessoas com maior reputação ou prestígio em uma determinada comunidade. No segundo, o poder está associado às decisões locais tomadas por pessoas/famílias com base em seus interesses. A partir daí seguem as linhas direcionadas aos estudos de poder político local, desenvolvidas na UFMG, de estudos antropológicos (abordagem americana) e de estudos históricos.

Vale ressaltar, afirma Kerbauy (1992), mais recentemente, o desenvolvimento das pesquisas comparativas entre cidades. Nessas, é preciso instigar o desenvolvimento de análises, " (...) as quais pouco tem se oferecido relevância ao papel do governo municipal enquanto espaço político institucional em que se expressam à representação, a aliança, o conflito e a disputa de interesses, forças e organizações sociais que marcam e moldam o território político local dentro do contexto regional e nacional" (Kerbauy, 1992, p. 20-21).

Além dessas pesquisas, nos lembra Kerbauy (1992), há uma série de estudos que trabalha com análises de políticas públicas, de movimentos sociais e participativos e da questão fiscal (descentralização, reforma tributária, papel do poder local na construção do espaço urbano), bem como de outros.

Nesse contexto, é preciso observar que o local não é simplesmente um recorte de algo maior, mas resultado de relações entre o nacional e o global e vice-versa. Com isso, os estudos de poder local não necessariamente tem que se encontrar limitados pelas fronteiras político-administrativas de um município. O fundamental, para o controle político hegemônico de alguns grupos, nem sempre se encontra no interior desses limites e, muitas vezes, não tem nem existência física nos mesmos, muito embora sua influência seja decisiva. 

Fischer (1992, p. 106), destaca duas vertentes principais de estudos do poder local:

A primeira é a própria realidade, isto é, um cenário onde as questões de poder revelam-se concretamente no quotidiano das cidades como, por exemplo, nas cidades brasileiras, onde a discussão de planos-diretores tem como pano de fundo a progressiva degradação urbana, a carência de serviços essenciais, a relativa desilusão com o poder de transformação dos movimentos sociais, o desgaste dos prefeitos por não responderem a expectativas mínimas de qualidade da vida urbana. A segunda vertente (...) é a rica reflexão propiciada pelas abordagens teóricas do poder local, que são desenvolvidas por grupos europeus.

Na França, os estudos concentram-se na escola de sociologia marxista e no chamado funcionalismo institucional. Como exposto por Marques (2003), também para Fischer (1992), a escola francesa de sociologia urbana vem debatendo temas importantes desde os anos 1960. Destacam-se os relacionados ao Estado como instrumento de dominação, tendo o local como produto da lógica capitalista monopolista global e os do espaço urbano como resultado da organização da dominação de classe (são exemplos os estudos das primeiras fases de Castells e Lojkine, como já apontados, e os de Topalov e Lipietz).

Os estudos dos marxistas dos anos 1970, de acordo com Preteceille (1990, apud Fischer, 1992, p. 109) “já revelaram que o local não é decalque do nacional. No Brasil, a produção acadêmica acompanhou essa trajetória, pela inserção de doutorandos nas linhas de pesquisa dos centros franceses”. No final dos anos 1980, de acordo com a autora, os estudos se direcionaram para uma linha mais distinta de análise de políticas públicas, e que tem se fortalecido desde então. Já a escola funcionalista, para Fischer (1992), não trabalha com o poder local em suas particularidades, mas com o local e sua inserção no nacional e global. Tem como ideólogos Pierre Grenion e Michel Crozier. Nas últimas duas décadas, ressalta a autora, um fator importante é o da convergência de temas e métodos de análises entre ambas as escolas.

Na América Latina, também recentemente, a revalorização de espaços territorializados (regiões, áreas metropolitanas, municípios, distritos) tem ampliado os estudos sobre poder local. Assim, experiências de gestão mais democrática (como as observadas em alguns municípios do Brasil) e a ação de movimentos sociais passaram a ser observadas (Fischer, 1992). A transição democrática dos países da América Latina levou a um crescimento desses estudos, com intercâmbios com França e Espanha. Considerando as diversas análises, Fischer (1992) confirma que as pesquisas sobre poder local têm uma movimentação espontânea na direção de novas problemáticas.

O Brasil não se exclui do processo exposto, com trabalhos em praticamente todas as linhas citadas. Mais recentemente, no entanto, os estudos do local reúne trabalhos bastante diversos, também com grande ênfase nas políticas públicas ou na relação poder público e comunidade local. Vêm sendo agrupados em três dimensões principais: como espaços político e simbólico, como espaço de gestão e como espaço de consumo de serviços de bens e equipamentos urbanos (Fischer, 1992).

Nas Ciências Sociais, em geral, destacam-se os estudos realizados pela Associação Nacional de Planejamento Urbano (ANPUR), pela Associação Nacional de Programas de Administração (ANPAD) e pelo Núcleo de Estudos sobre Poder e Organizações Locais (NEPOL), da Escola de Administração da UFBA, que trabalham com o planejamento e a gestão urbanas (análise de políticas públicas e a participação cidadã); pela Associação Nacional de Pesquisas em Ciências Sociais (ANPOCS), voltada aos estudos da interação entre movimentos sociais e políticas públicas; dentre outros grupos[15]; além de publicações de periódicos na área. Na Geografia, os estudos dos cursos de pós-graduação e os DEGEOS da USP, da UNESP/PP e da UFPE, contribuem, além de outros, com uma análise espacializada dos fenômenos, fundamental nos estudos de poder local.

Como se observa, tomando-se por fundamento alguns critérios, o tema tem muito a contribuir também para os estudos das formas e possibilidades da espacialização de relações de poder.


Considerações finais

A abordagem realizada neste texto fundamentou-se nos estudos relativos ao poder e as suas formas e teorias, em especial as do poder local. As relações de poder se sustentam e são passíveis de existência por meio de alguns atores, dentre eles o Estado e os grupos de interesses (elites, partidos políticos, empresas e outros) vinculados ou não ao mesmo. O poder local, com isso, requer tratamento mais aprofundado quanto aos aspectos investigativos da realidade, posto procurar a si próprio na encruzilhada de diversas disciplinas e, na Geografia, difundir-se pelos aspectos econômicos, políticos, sociais e ideológicos, demarcando territórios.

Nesta ciência, as discussões sobre poder ou poder local não se constituem como tradição, apesar de serem realizadas há muito por estudiosos de outras áreas científicas. Afirma Raffestin (1993) que isso ocorre em função da Geografia ter sido quase sempre rebelde à introdução de noções que não são objeto de uma tradução espacial imediata, fato que, entende-se, tem se transformado nas últimas décadas. No texto apresentado, a hipótese é a de que as relações que ocorrem na sociedade supõem um sistema no qual circula o poder, que é inerente a toda relação, e não uma categoria espacial ou uma categoria temporal.  Assim, as relações de poder perfazem diversos conflitos como os estabelecidos nos grupos político-econômicos, sociais e outros atores, mas são imanentes, não havendo, diretamente, uma oposição entre dominantes e dominados, mas sim “situações de poder” que ora favorecem a um, ora a outro sujeito/coletivo.

As transformações nas formas de poder do Estado tem levado a difusão de outras posturas interpretativas (em maioria francesas, deixando-se em segundo plano as versões americana e inglesa) para as relações entre poder e espaço, especialmente as originárias de novos conceitos e categorias de análise, como as de regionalismo, identidade e adjetivações do território, como os territórios conservadores. O exemplo trabalhado neste texto foi o da formação do Estado patrimonialista brasileiro e os elementos apontados por alguns autores como um impedimento a constituição de um país politicamente “moderno”. Alguns desses elementos tiveram/tem como substrato as relações políticas constituídas a partir de estruturas que se caracterizaram/caracterizam, em especial, no poder local. É por isso e por outros motivos que os estudos sobre esta forma de poder também e ainda merecem atenção.

 

Notas

[1] Essas distinções estão freqüentemente presentes, de acordo com Bobbio (1985), nas teorias contemporâneas, nas quais o sistema social articula-se em três sub-sistemas: a organização das forças produtivas, a organização do consenso e a organização do poder coativo.

[2] Edmund Burke (1729-1797) é considerado o maior estudioso do conservadorismo moderno (o conservadorismo clássico ou histórico se fundamenta numa ideologia da nobreza ou da tradição feudal) por seus ataques aos revolucionários franceses e aos seus defensores na Inglaterra (KINZO, 2003). Burke não escreveu uma teoria política, sendo sua obra formada por uma série de cartas, discursos e panfletos.

[3] De acordo com Faoro (1975), a origem do patrimonialismo brasileiro é ibérica (dinastia de Avis, no século XIV), prolongando-se até os dias atuais.

[4] O conservadorismo implica a existência de um conceito de difícil natureza e fim. Isso se deve a fatos como o da inexistência de uma teoria política comum, a pouca propensão dos conservadores em sistematizar suas idéias e ao simplismo com que se usa o termo, da Psicologia Social a Ciência Política.

[5] FREYRE, Gilberto. Casa-grande e senzala: formação da família brasileira sob o regime de economia patriarcal. Rio de Janeiro: Maia & Schmidt, 1933.

[6] De acordo com Faoro (1998), Sérgio Buarque de Holanda utilizou a palavra patrimonial, pela primeira vez, no livro Raízes do Brasil (1936). O conceito de patrimonialismo, no entanto, e a análise do Estado brasileiro sob o prisma do patrimonialismo, não. O que Sérgio Buarque de Holanda apresentou, afirma ele, é a presença da família patriarcal na formação histórica brasileira.

[7] Segundo Martins (1994), a igreja católica é um exemplo desse processo. De conservadora e preservadora de interesses das elites, à identificação com diversas lutas populares.

[8] Os grupos dominantes não justificam seu poder exclusivamente pela possessão de fato, mas também pela base moral e legal que buscam para este poder, representando-o como conseqüência lógica e necessária de doutrinas e crenças que são geralmente reconhecidas e aceitas, como as religiosas e as científicas.

[9]Who governs?” é parte do título do estudo de Robert Dahl, desenvolvido na cidade de New Haven, e um clássico dos estudos do local, do qual se seguiram diversos outros (DAHL, Robert. Who governs? Democracy and power in American city. New Haven: Yale/University Press,  1961).

[10] VAINER, Carlos Bernardo. As escalas do poder e o poder das escalas: o que pode o poder local? Cadernos IPPUR, ano XV, n.2, ago-dez 2001 - ano XVI, n.1, jan-jul, 2002, pp. 13-32.

[11] HUNTER, F. Community power structure. Chapel Hill: University of North/Carolina Press, 1953.

[12] Citamos apenas alguns desses trabalhos. Posteriormente a essa década, outros estudos sobre o tema se destacaram, sob influência de Vitor Nunes Leal, especialmente tendo como norte a obra Coronelismo, enxada e voto: o município e o regime representativo no Brasil (LEAL, Vítor  N. Coronelismo, enxada e voto: o município e o regime representativo no Brasil. São Paulo: Alfa-Ômega, 1975).

[13] Carvalho faz uma compilação dos trabalhos sobre poder local no Brasil e nos EUA. Nesses últimos, segundo ele, os estudos possuem orientações sociológica (Floyd Hunter) e da Ciência Política (Robert Dahl). Para o autor, os estudos brasileiros, até então, definiam a política local como dominada pelo poder familiar.

[14] Castro trabalha com dois grupos: os estudos de caso:, Guimarães (1956), Silva (1957 e 1960), Azevedo (1959), Nogueira (1961), Santos (1961), Carvalho (1966), Michetti (1968), Silva (1972), Cruz (1973) e Soares (1974) e; os estudos de estrutura: Faoro (1958), Duarte (1966), Palmeira (1966) e Brasileiro (1973).

[15] Cabe destacar, também, os estudos realizados por grupos de pesquisa ainda em consolidação, do qual fazem parte as pesquisas vinculadas a tese de doutorado por mim defendida em maio de 2005, que tem como principal objetivo o estudo do poder local e a formação do que denominou-se de territórios conservadores de poder.

 

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Ficha bibliográfica

SILVA, Márcia da. Estado e poder local: ensaio teórico sobre estudos no Brasil. Biblio 3W. Revista Bibliográfica de Geografía y Ciencias Sociales, Universidad de Barcelona, Vol. XIV, nº 841, 30 de septiembre de 2009. <http://www.ub.es/geocrit/b3w-841.htm>. [ISSN 1138-9796].


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