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Índice de Biblio 3W

Biblio 3W
REVISTA BIBLIOGRÁFICA DE GEOGRAFÍA Y CIENCIAS SOCIALES
Universidad de Barcelona 
ISSN: 1138-9796. Depósito Legal: B. 21.742-98 
Vol. XVI, nº 933, 25 de julio de 2011

[Serie  documental de Geo Crítica. Cuadernos Críticos de Geografía Humana]

 

O QUE É RELEVANTE PARA INOVAR NO BRASIL?
DILEMAS DE UMA CONSTRUÇÃO ECONÔMICA E SOCIOCULTURAL NO PAÍS DO “JEITINHO

 

Christian Luiz da Silva
Pós-doutor em Administração pela Universidade de São Paulo (USP); professor do Programa de Doutorado em Tecnologia (PPGTE) e coordenador do mestrado profissional em Planejamento e Governança Pública da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR);
christiansilva@utfpr.edu.br

Fabiana Ieis
Economista e pesquisadora da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR)
fabi_ieis@hotmail.com

Nadia Solange Schmidt Bassi
Bióloga, analista da Empresa Brasileira de Agropecuária (Embrapa), mestranda no Programa de Pós-Graduação em Tecnologia (PPGTE) da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR)
nadia@cnpsa.embrapa.br

Recibido: 30 de julio de 2010. Devuelto para revisión: 8 de noviembre de 2010. Aceptado: 15 de diciembre de 2010.

O que é relevante para inovar no Brasil? Dilemas de uma construção econômica e sociocultural no país do “jeitinho”[1] (Resumo)

A inovação tem várias motivações e condicionantes, não apenas econômica. O objetivo deste artigo é avaliar os principais fatores que contribuem ou dificultam a inovação no Brasil pós-2000. Trata-se de uma pesquisa aplicada, exploratória e de análise de conteúdo dos dados básicos da Pesquisa Nacional de Inovação Tecnológica (PINTEC) de 2000, 2003 e 2005. Os resultados mostraram que a inovação tem seu espaço estratégico na indústria brasileira, mas ocorre de maneira incremental, explorando a melhoria de processos ou novos produtos, na maioria das vezes, para o mercado local e com menor participação cooperativa entre diferentes instituições. Validou-se a hipótese de que apesar da criatividade caracterizada pelo “jeitinho brasileiro”, a inovação não se converte em maior desenvolvimento em razão da pré-indisposição a realizar inovações radicais construídas em termos socioculturais, bem como da fragilidade institucional para garantir o planejamento de longo prazo.

Palavras-chave: inovação, indústria, fatores determinantes da inovação, Brasil.


¿Que es relevante para innovar en Brasil? Dilemas de una construcción económica y sociocultural en el país del jeitinho (Resumen)

La innovación tiene varias motivaciones y limitaciones, no sólo económicas. El objetivo de este trabajo es evaluar los principales factores que contribuyen o dificultan la innovación en el post-2000 Brasil. Es una pesquisa aplicada, exploratoria y de análisis de contenido de los datos básicos de la Pesquisa Nacional de Innovación Tecnológica (PINTEC) hecha en Brasil en los años 2000, 2003 y 2005. Los resultados indicaran que la innovación es estratégica en la industria brasileña, pero es incremental, solamente con la mejoría de los procesos o nuevos productos, en la mayoría de las veces, para el mercado local y con menor participación cooperativa entre diferentes instituciones. Así se ha validado la hipótesis que mientras hay una creatividad caracterizada por el “jeitinho brasileiro” la innovación no se convierte en desarrollo porque se tiene una dificultad natural, dibujadas históricamente y sociocultural, de realizar innovaciones radicales. Aún más, hay una fragilidad institucional para garantizar el planeamiento a largo plazo.

Palabras clave: innovación, industria, elementos determinantes de la innovación, Brasil.


What is relevant for innovation in Brazil Dilemmas of an economic construction and social-cultural in the country of the "Brazilian way" (Abstract)

Innovation has several motivations and constraints, not just economic. The aim of this paper is to evaluate the main factors that contribute or hinder innovation in the post-2000 Brazil. This is an applied research, of exploration and analysis of the basic content data from of the research National Research on Technological Innovation (PINTEC) of 2000, 2003 and 2005. The results show that the innovation has its strategic space in Brazilian industry, but occurs incrementally, exploring the process improvement or new products, most of the time, for the local market and with less cooperative participation between different institutions. Being true the hypothesis characterized by the “Brazilian way”, the innovation does not convert into a bigger development because of the pre-indisposition to perform radical innovations built in social and cultural ways, as well as institutional weakness to guarantee the long term planning.

Key words: innovation, industry, determinants of innovation, Brazil


Apesar de investimentos e políticas industriais estabelecidas para incentivar a inovação no Brasil, especialmente após 1990, o País desenvolve essencialmente inovações incrementais, conforme aponta a Pesquisa Nacional de Inovação Tecnológica (PINTEC). Neste aspecto, cabe questionar se esse investimento e esta inovação se revertem em maior capacidade competitiva e desenvolvimento local e, principalmente, o que é relevante para que haja inovação. Como hipótese, a inovação não se converte em maior desenvolvimento em razão da pré-indisposição a realizar inovações radicais construídas em termos socioculturais na nação, bem como da fragilidade institucional para garantir o planejamento de longo prazo.

Assim, o objetivo deste artigo é avaliar os principais fatores que contribuem ou dificultam a inovação no Brasil pós-2000. A delimitação temporal se deve ao fato de a PINTEC ter iniciado a série em 2000. A última atualização da pesquisa foi em 2005. Inicialmente, discute-se a inovação sob a ótica econômica e sociocultural, para depois apresentar a metodologia do trabalho e a análise dos dados e, por fim, as considerações finais.


Inovação: da Perspectiva Econômica à Sociocultural

A inovação é um tema constantemente associado apenas ao crescimento e desenvolvimento econômico, mas diversos autores têm chamado atenção para a necessidade de se incluir variáveis socioculturais nas avaliações e estudos sobre a implementação da inovação em contextos locais e nacionais[2]. Assim, inicialmente aborda-se a inovação sob a ótica econômica, para na subseção seguinte tratar desse contexto sociocultural do desenvolvimento tecnológico e da inovação e, por fim, sobre trabalhos de autores que inserem a inovação na formação sociocultural.

A inovação na economia sob a ótica da produtividade

A abordagem econômica sobre inovação adota pontos teóricos diferentes, os quais se apresentam como alternativos, mas também podem ser complementares e cada qual fornece compreensão importante das implicações sobre a adoção de políticas e sobre a pesquisa do tema. Considerando um contexto capitalista, no qual a concorrência é um processo que dinamiza os mercados, seleciona, cria e destrói oportunidades para as empresas, a inovação é um instrumento que pode trazer destaque a uma empresa, modificando as características atuais e promovendo o ganho de uma disputa no mercado.

A concorrência pode ser considerada uma das justificativas pela qual uma empresa resolve inovar, pois é caracterizada como um processo sem tréguas e sem fim previsível, pelo menos enquanto durar o capitalismo. Novos produtores podem surgir, com novas mercadorias e novas vantagens competitivas[3].

Coube a Joseph Alois Schumpeter (1997) abrir as discussões e alinhar os primeiros conceitos relativos à inovação no sistema capitalista. Ele parte do pressuposto de que cada inovação cria um novo conhecimento tecnológico. A inovação, a partir da ótica do produtor, é um método de transformação econômica, não tem natureza estacionária e faz parte de um ciclo. Este método define a figura do empresário como agente do fenômeno fundamental do desenvolvimento econômico: o “empreendimento”, que se resume na realização de novas combinações por parte dos empresários. Para Schumpeter, o individuo somente assume a característica principal de “empresário” quando realiza uma nova combinação e quando a inovação já perdeu seu caráter de novidade, tornando-se rotina, quando, então, o empresário passa a ser apenas o administrador. Assim, na concepção de Schumpeter, a figura do empresário traduz-se como a figura do inovador[4].

Joseph Schumpeter (1997) também argumentou que o desenvolvimento econômico é conduzido pela inovação por meio de um processo dinâmico, no qual novas tecnologias substituem as antigas, processo este por ele denominado destruição criadora. A ação de destruição criadora é fundamental na compreensão do capitalismo e a ela deve se adequar toda a empresa capitalista para sobreviver[5]. Para ele, a economia industrial evolui através desta destruição criadora. Quando um processo ou produto chega ao fim de suas aplicações produtivas, estas são substituídas por novas, pois as antigas não possuem mais capacidade de competir no mercado, ou seja, são destruídas e abrem lugar para a inovação.

Existe, contudo, relativa diversidade conceitual no entender da destruição de antigas estruturas para o alcance do novo. É observável que a ideia de inovação está sempre relacionada a mudanças, a novas combinações de fatores que rompem com o equilíbrio existente. No entanto, o conceito de inovação é mais abrangente do que os conceitos de mudança, renovação ou reforma, pois a inovação traz algo novo, algo ainda não conhecido. E, portanto, uma mudança, é mais intencional e bem evidente e exige um empenho deliberado e consciente para sua efetivação[6].

A economia adota perspectivas diferentes sobre as teorias da inovação, cada qual fornecendo entendimentos expressivos, mas que também podem ser complementares. Uma definição mais recente da teoria pode ser encontrada em um trabalho realizado em 2005 pela Organização de Cooperação para o Desenvolvimento Econômico (OCDE), para desenvolver modelos e estruturas de análise para estudos sobre inovação, o Manual de Oslo, o qual é centrado na Inovação Tecnológica de Produto e Processo na indústria de transformação. Nesse documento está descrito que a inovação se refere à “introdução de um bem ou serviço novo ou significativamente melhorado no que concerne a suas características ou usos previstos”, o que inclui “melhoramentos significativos em especificações técnicas, componentes e materiais, softwares incorporados, facilidade de uso ou outras características funcionais” (OCDE, 2005, p, 57).

A mudança tecnológica é uma atividade cumulativa. A ideia básica expressa no conceito de cumulatividade[7] é a de que a direção do progresso técnico não é aleatória, mas condicionada por padrões previamente selecionados. Com isso, o conhecimento relacionado à inovação é o resultado combinado de conhecimentos velhos e novos, adquiridos por um sistema de inovação. Outro pressuposto expresso no conceito de cumulatividade é a não aleatoriedade, segundo o qual o caráter tácito e não codificável do conhecimento é incorporado nas pessoas e instituições.

Inclui-se ainda no conceito de inovação o fato de que a expansão do conhecimento e da tecnologia é fundamental no processo de inovação. Segundo o Manual de Oslo (OCDE, 2005), o processo de difusão requer, com frequência, mais do que a mera adoção de conhecimento e tecnologia, pois as empresas inovadoras aprendem e constroem novos conhecimentos e tecnologias. Conforme afirma Manuel Castells (1999, p. 35), “No modo informacional de desenvolvimento, a fonte de produtividade acha-se na tecnologia de geração de conhecimentos, de processamentos da informação e de comunicação de símbolos”. Todas as empresas podem ser inovadoras, pois, segundo o Manual de Oslo, uma inovação pode consistir na implementação de uma única mudança significativa ou em uma série de mudanças incrementais que, juntas, podem se tornar uma mudança significativa.

Joseph Schumpeter (1997) propôs uma lista de cinco tipos de inovação: (a) a introdução de um novo produto ou de uma nova qualidade de produto; (b) a introdução de novos métodos de produção e distribuição, que podem ou não estar fundamentados na descoberta ou invenção de novos conhecimentos; (c) a abertura e/ou exploração de novos mercados antes inacessíveis ou inexplorados; (d) a obtenção de novas fontes de abastecimento de matérias-primas, produtos intermediários e insumos produtivos em geral; e (e) o estabelecimento de novas formas de organização econômica, conducentes à conquista ou à destruição de posição de monopólio, geralmente temporário[8]. Assim, a visão schumpeteriana enfatiza a inovação como experimentos de mercado e procura por mudanças amplas que reestruturam indústrias e mercados.

Entretanto, a definição de inovação abrange um amplo conjunto de inovações possíveis, além dos cinco tipos de inovação propostas por Schumpeter. Uma inovação é a implementação de um produto ou processo, bem ou serviço novo significativamente melhorado no mercado; poderá ser também a implantação de novos métodos de marketing, de organização nas praticas de negócios internas ou externas à organização. Desta forma, é importante considerar que uma inovação tem como aspecto geral a inserção ou implementação de algo novo. Um novo produto ou processo é implementado quando são introduzidos no mercado; novos métodos de marketing ou organizacionais são implementados quando efetivamente estão sendo utilizados nas operações das empresas. O Manual de Oslo (OCDE, 2005) define alguns tipos de inovação, a saber: os de produto, de serviço, de métodos de distribuição, de processo, de marketing e de organização (Quadro 1).

Quadro 1 - Tipos de inovação e as respectivas descrições

Tipo

Descrição

Inovação de produto

É a introdução de um bem ou serviço novo ou significativamente melhorado no que concerne a suas características ou usos previstos. Incluem-se melhoramentos significativos em especificações técnicas, componentes e materiais, softwares incorporados, facilidades de uso ou outras características funcionais.

Inovação de processo

É a implementação de um método de produção ou distribuição novo ou significativamente melhorado. Incluem-se mudanças significativas técnicas, em equipamentos e/ou softwares .

Inovação em marketing

É a implementação de um novo método de marketing com mudanças significativas na concepção do produto ou em sua embalagem, no posicionamento do produto, em sua promoção ou na fixação de preços.

Inovação organizacional

É a implementação de um novo método organizacional nas práticas de negócios da empresa, na organização do seu local de trabalho ou em suas relações externas.

 

Fonte: Manual de Oslo (OCDE, 2005).

Uma vez que a inovação é constituída de algo nunca feito antes e conduz a assimetrias do sistema econômico capitalista, a ausência de inovações pode levar o sistema a um estado de estagnação. A expectativa do empresário de fugir do estado de estagnação pode ser a motivação para a geração de inovações, mesmo considerando as incertezas dos resultados de sua implantação.

A habilidade de inovar expressa e as incertezas geradas nos levam a considerar a competitividade como o processo em que as empresas buscam o lucro por meio de constantes tentativas de diferenciação junto aos seus concorrentes[9]. A produtividade também é um elemento de medida do progresso técnico e está relacionada ao processo produtivo de uma empresa, enquanto medida de eficiência. Assim, no âmbito microeconômico, ela é utilizada como um indicador de desempenho. Em uma visão mais ampla, pode ser empregada como indicador de desempenho produtivo de um país[10]. A produtividade é considerada o índice mais confiável para avaliar a eficácia da utilização dos recursos de uma empresa. Uma empresa pode ser inovadora organizando e utilizando adequadamente seus recursos internos, ou seja, capital e trabalho[11].

Historicamente, nota-se nas economias que se industrializaram um movimento de abandono do campo. Até 1800, em todas as nações do mundo, necessitava-se de 80% da população ativa para alimentar a população total. Entretanto, atualmente, em alguns países, como França e Estados Unidos, respectivamente, menos de 10% e 5% de trabalhadores são necessários para alimentar a população de seu país e ainda exportar produtos alimentícios[12]. Com isso, relaciona-se imediatamente a produtividade como pressuposto da competitividade, que, associada à tecnologia, torna-se motivadora da inovação no sistema capitalista e, juntos, se constituem fatores da dinamização e versatilidade do sistema produtivo. Cabe, contudo, questionar: se é tão relevante, por que não são todos que inovam? Capacidade, estímulo, características empreendedoras, enfim, o que mais importa para inovar? Avança-se nesta questão tornando relativo o contexto da inovação, principiando pela tecnologia.

Tecnologia, produtividade e inovação sob o contexto sociocultural

Cada vez mais, nossa vida é influenciada pela tecnologia. Na opinião de Andrew Feenberg (1991), a tecnologia é um fenômeno de dois lados: operador e objeto. No caso de ambos serem seres humanos, a atuação de um sobre o outro é um exercício de poder. Onde a sociedade aparece organizada em torno da tecnologia, o poder tecnológico torna-se a forma básica de poder na sociedade. Para o autor, o exercício do poder técnico traz resistências por parte daqueles que são excluídos do processo, resultando em protestos contra as tecnologias desenvolvidas. Devido a esta característica, as decisões sobre a tecnologia não são decisões neutras; elas refletem as escolhas políticas dos atores no seu desenvolvimento, haja vista que a tecnologia traz em si diferentes possibilidades de desenvolvimento, com diferentes consequências sociais. Neste sentido, os meios e os fins não podem ser separados. O modo como fazemos as coisas determina quem somos e o que somos; assim, consequentemente, o desenvolvimento tecnológico transforma o ser humano.

Neste contexto, considerando o poder exercido pela tecnologia e sua relação com os processos sociais, Andrew Feenberg (1991) afirma que a democracia deve, obrigatoriamente, ser levada à sua produção. Deixar a democracia restrita ao Estado retira da população o controle de boa parte dos processos que afetam diretamente sua vida e a forma com que a população se relaciona com o mundo. Na opinião do autor, estas decisões sobre a tecnologia não são decisões neutras; elas refletem as escolhas políticas dos atores participantes do processo de desenvolvimento tecnológico. Desta forma, se a tecnologia final é a resultante das forças políticas, econômicas e sociais envolvidas no processo do seu desenvolvimento, ela estará enviesada se os atores envolvidos estiverem concentrados em uma pequena parcela da sociedade, isolados em relação às pressões de determinados grupos sociais e suscetíveis às pressões de outros. Da mesma forma que a tecnologia pode estar enviesada em um sentido, pode estar em qualquer outro, uma vez que a tecnologia traz em si diferentes possibilidades de desenvolvimento, com diferentes consequências sociais. Não há uma única correlação entre avanço tecnológico e distribuição social de poder[13]. A partir desta afirmação, se uma hierarquia social autoritária não é uma necessidade técnica, deve haver desenvolvimentos alternativos que democratizem o controle em vez de centralizá-lo.

Autores como Trevor Pinch e Wiebe Bijker (1990) também acreditam que o desenvolvimento tecnológico deve ter a participação da sociedade, conforme descrito em seu trabalho onde apresentam as bases da Social Construction of Technology (SCOT) em que demonstram, a partir do desenvolvimento da bicicleta, que os artefatos tecnológicos são construídos socialmente. Nestes estudos, o processo de desenvolvimento tecnológico é descrito como uma alternância entre variação e seleção. O resultado é um modelo multidirecional, do qual se conclui que o resultado final e os intermediários não são os únicos possíveis.

A constatação de que a tecnologia é uma construção social resultante da interação entre grupos sociais relevantes suscita questões sobre como realizar ações que caminhem no sentido de democratizar a tecnologia. O envolvimento constante da sociedade em atividades técnicas gera conhecimentos situados que se tornam a base para a intervenção pública. Em alguns casos, a intervenção pública ocorre através da união de pessoas que provocam controvérsias técnicas na tecnologia em questão e incluem novas visões no seu desenvolvimento. Em outros, há uma reinterpretação da tecnologia e um novo uso é dado a ela. As pessoas, quando são afetadas diretamente pela tecnologia, podem mobilizar-se e buscar alterar o desenvolvimento tecnológico de forma a incluir seus interesses, por meio de uma apropriação criativa, uma reinterpretação do artefato que assume um novo uso.

Para Andrew Feenberg (1999), a tendência tecnológica das sociedades modernas representa um caminho possível de desenvolvimento, porém, normalmente obstruído pelo poder. A tecnologia tem diversos potenciais benéficos que muitas vezes são suprimidos pelo capitalismo e socialismo de Estado, que poderia, certamente, oferecer um caminho de desenvolvimento tecnológico mais facilitado. Na visão do autor, quando a sociedade tem participação restrita no desenvolvimento tecnológico, perpetua as estruturas de força da elite  herdadas do passado, mutilando a própria tecnologia. Uma mudança na estrutura de poder resultaria em inovações tecnológicas, pois a tecnologia existe e não é neutra, mas favorece alguns fins específicos e impede outros.

Ainda que democratização da tecnologia esteja relacionada a novas maneiras de privilegiar valores excluídos e concretizá-los em novos arranjos técnicos, a realização mais completa da tecnologia é possível e necessária. Para isso, Andrew Feenberg (1999) propõe que seja aberta a caixa-preta das tecnologias. Abrir a tecnologia a uma extensão mais ampla de interesses e propósitos poderia levar seu replanejamento a uma maior compatibilidade com os limites humanos e naturais da ação técnica. Uma transformação democrática de baixo custo pode encurtar as curvas de feedback da vida humana e da natureza danificada e orientar uma reforma radical da esfera técnica.

Democratizar o processo tecnológico requer abertura do processo também para os atores que não possuem capital financeiro ou poder político, aumentando o numero e variedade dos atores participantes do processo. Longe de impedir o progresso, como muitas vezes supõe-se, a democratização do processo tecnológico pode ajudar a evitar problemas futuros, ao mesmo tempo em que assegura uma representação adequada de interesses que hoje estão subvalorizados. A democratização do processo tecnológico reflete as potencialidades contidas na natureza da própria tecnologia. As inovações tecnológicas abrem possibilidades não só interna, para o mundo particular onde é realizada, mas também metapossibilidades correspondentes a outros mundos, onde podem ser transformadas ou adaptadas para realizar novas funções.

Em pesquisa realizada pelo Global Entrepreneurship Monitor (GEM), no Brasil[14], tradicionalmente, no País não há uma cultura social que estimule as pessoas a serem empreendedores, ao revés, enfatiza-se uma educação formal e a posterior busca por um bom emprego. Além disso, não se enfatiza a autossuficiência, autonomia, iniciativa pessoal, bem como atividades que estimulem a criatividade e a inovação ao longo da educação formal do indivíduo. No entanto, o empreendedorismo e as inovações ocorrem pela necessidade de sobrevivência das pessoas, decorrente das dificuldades de inserção da mão de obra na economia brasileira, que força o cidadão a sobreviver em condições de incerteza e restrições.

A baixa qualificação dos trabalhadores também é apontada como um dos motivos da baixa introdução de tecnologia nos empreendimentos, como constatado nesta pesquisa. Essa característica da mão de obra está sendo apontada por entidades, como a Confederação Nacional da Indústria, como um impeditivo para o maior crescimento do País e, portanto, para um avanço no processo de inovação tecnológica no Brasil. A pesquisa aponta ainda a excessiva burocracia para as empresas, a elevada carga tributária e a insuficiência de recursos financeiros para fomentar atividades inovadoras como causas do baixo índice de inovação no País.

Com isso, ressaltam-se dois importantes pontos: primeiro, o contexto socioeconômico não estimula o espírito empreendedor por novas oportunidades e rumos da economia, mas força o brasileiro a empreender para sobreviver. Esse empreender tem o caráter de buscar oportunidades para se manter economicamente, contudo, não se trata de novos avanços, mas de circundar no mesmo contexto da inovação, como pressuposto por Schumpeter e outros atores tratados anteriormente, o que não caracteriza avanços neste contexto. Outro ponto é compreender que a tecnologia não se desenvolve por acaso[15]. Em países com forte dependência do Estado para inovar, como o Brasil, há uma importante vinculação do que e em que importa inovar na política de governo e no processo de desenvolvimento do país com os empreendimentos do empresariado nacional. Assim, o processo de inovação não é tão autônomo no sistema capitalista, como pressupõe a teoria, e é influenciada diretamente pelos determinantes do processo tecnológico no país. Esses dois pontos reforçam que a inovação é relevante para o sistema econômico, porém, não é fruto apenas do imaginário do empresário schumpeteriano e incorpora muito do contexto sociocultural nas suas decisões e empreendimentos.

A inovação como construção sociocultural

Na concepção de Andrew Feenberg (1991), as Ciências Sociais, em comparação com as Ciências Econômicas e as Ciências Organizacionais, estão inseridas de forma menos evidente nas agendas de pesquisa. Para o autor, desde o início de seus estudos, os cientistas sociais têm se ocupado com a problemática tecnológica, porém, frequentemente, têm se esquivado de debater o fenômeno técnico em si mesmo e a questão da inovação.

Thales de Andrade (2004) aponta para duas grandes tendências que se propuseram a discutir a questão da inovação no mundo contemporâneo: as correntes econômicas derivadas do pensamento schumpeteriano; e a sociologia construtivista das técnicas, desenvolvida principalmente por Bruno Latour e que criou espaço para a incorporação da temática nas Ciências Sociais. Andrade acredita que a disciplina econômica foi responsável por um grande impulso à construção da agenda da inovação. As considerações de Joseph Schumpeter no início do século XX impactaram consideravelmente no debate sobre transformações tecnológicas e desenvolvimento econômico.

A perspectiva construtivista da sociologia das técnicas contribuiu fortemente para ampliar o debate sobre inovação tecnológica. O trabalho de autores que abordaram aspectos que envolvem a relação entre tecnologia e economia resultou em uma nova compreensão do processo de inovação. Para exemplificar, Michel Callon (1987) concebeu a função de engenheiro-sociólogo, sustentando a afirmação de que o engenheiro estabelece critérios e procedimentos a partir de conhecimentos sociológicos; e Bruno Latour e Steve Woolgar (1997) asseguraram que a inovação é construída a partir da ação dos próprios inovadores, os quais devem controlar o contexto social onde a inovação está inserida e adaptar-se a ele.

A concepção de inovação busca a articulação da racionalidade das ações econômicas com as opções dos agentes que constituem a rede sócio-técnico em sua interação contextual. Tanto os tecnólogos como os leigos são agentes essenciais para a prática da inovação, uma vez que é através de sua atuação que projetos tecnológicos ganham consistência e viabilidade.

Renato Dagnino, Hernán Thomas e Amílcar Davyt (1996) esclarecem que no Brasil é evidente a tentativa de se adaptar às novas tendências econômicas e à globalização da economia mundial. Para os autores, este processo é conduzido pela acumulação e centralização de recursos e, mais fortemente, pelo ritmo intenso de inovação, resultando na reorganização da produção, da comercialização e do consumo. Esta visão é compartilhada por Antoninho Caron (2003), ao afirmar que o governo brasileiro tem consciência do distanciamento entre os investimentos nacionais em ciência e tecnologia, em comparação ao investimento realizado em outros países. Este distanciamento é visível ao se analisar o volume de recursos investidos e a intensidade das inovações que geram novos produtos, conquistam mercados e promovem melhoria de trabalho e renda para os cidadãos.

A partir desta constatação, o Brasil tem buscado a construção de um Sistema Nacional de Inovação que venha contribuir para vencer estes desafios. Porém, este se constitui um grande desafio nacional, em função da atual economia do conhecimento, pois o modelo de crescimento baseado na importação de tecnologia é insuficiente para assegurar o desenvolvimento sustentável e a soberania do País no cenário internacional.

Estudo recente do Banco Mundial[16] posiciona o Brasil em um nível intermediário entre as nações avançadas e os países em desenvolvimento. Porém, considerando o avanço das fronteiras do conhecimento e caracterização das novas tecnologias baseadas em conhecimento científico e pessoal qualificado, a base científica brasileira é relativamente pequena diante dos desafios que se apresentam e sua inserção na agenda econômica nacional ainda é insatisfatória.

Em um ambiente de intensa produção científica é imprescindível aproveitar as oportunidades criadas com o processo de desenvolvimento da ciência e transformá-lo em inovações econômicas e sociais. No Brasil, iniciou-se, a partir de meados dos anos 1990, um investimento crescente em políticas de inovação. A criação dos fundos setoriais para financiamento de pesquisas, a formulação da Lei de Inovação e o crescimento da importância das Incubadoras de Empresas apontam para a tendência de se integrar experiências e práticas de inovação tecnológica. Os direcionamentos das políticas de Ciência e Tecnologia no Brasil - a partir dos anos 1990 - foram fortemente ligados à inovação. Essa opção demonstra uma preocupação de ordem econômica.

No Brasil, a ampliação e consolidação de um aparato institucional de Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I) exige patamares de investimentos em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) mais próximos aos praticados pelos países desenvolvidos. A Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, realizada em setembro de 2001, resultou na elaboração da Política Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação brasileira, publicada no documento denominado Livro Branco. Este documento relata as principais preocupações dos diferentes agentes do Sistema Nacional de Ciência Tecnologia e Inovações e propõe linhas para uma política de longo prazo de desenvolvimento científico, tecnológico e de inovação, considerando um cenário de intensas e rápidas transformações que o Brasil vem passando, bem como demandas e desafios que o País deveria enfrentar na primeira década do século XXI.

Um dos grandes desafios propostos pela Política Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação é a ampliação do investimento em Ciência Tecnologia e Inovação para uma taxa em torno de 2 por cento do Produto Interno Bruto (PIB) até 2012, o que significa que os governos devem elevar seus investimentos em CT&I a uma taxa de 7 por cento ao ano. Em 1999, o Brasil aplicou 0,9 por cento do PIB em P&D (R$ 8,4 bilhões), enquanto que os países mais avançados despendem cerca de 2%. O objetivo é que o Brasil atinja este patamar ao final de 2012, com principal responsabilidade das empresas[17]. Contudo, isso não vem se consolidando. Os investimentos ainda representam próximo de 1 por cento do PIB e mais de 60 por cento sob responsabilidade do governo.

A terra dos “jeitinhos”[18] caracteriza o brasileiro como empreendedor, mas, por sua condição socioeconômica, esta se fundamenta mais na sobrevivência que na oportunidade de novos negócios. A criatividade do brasileiro, tão valorizada, serve especialmente nas tecnologias sociais, de baixo valor agregado, e para, como proposto na acepção da palavra tecnologia, vir a resolver problemas, usualmente, cotidianos ou incrementais ao processo. A cultura da criatividade para o aprimoramento dessas competências de resolução de problemas não é realizada nas universidades com a finalidade de desenvolvimento de novos produtos e processo, bem como não se incentiva a pesquisa com resultados patenteados. A falta de estímulo externo forma um profissional com atitudes incrementais, criativo, por sua construção sociocultural, mas pouco inventivo para inovações radicais. Aliado a isto, há um baixo estímulo nas grandes corporações, que ainda centralizam muito os desenvolvimentos de novos produtos e processos em outros países, ou que especializam o corpo técnico local para adaptações.

A concentração tecnológica e da inovação cria uma cultura ainda dependente e determinística do processo de inovação dos países mais ricos, que em países como o Brasil imagina-se romper com simples aumentos dos investimentos. Contudo, os obstáculos para esse rompimento têm raízes históricas e não necessariamente se deseja efetivá-lo, haja vista que não há estímulos para este fim. Ao concentrar e determinar espacialmente a tecnologia e a inovação, associa-se também a concentração de renda e de oportunidades. A “terra do jeitinho” não se especializa no processo criativo para inventar e inovar de modo a gerar mudanças radicais, mas ocupa-se de resolver problemas incrementais. Com isso, mantêm-se a fama de ser um povo criativo por resolver problemas impensados, mas também não se incrementa a renda porque estes problemas não são tão relevantes para o mercado.

Essa abordagem teórica será validada ou não pela apresentação dos resultados da análise da pesquisa de inovação realizada em diferentes setores no Brasil, a fim de compreender como se desenvolve esta dinâmica da inovação recente no País e se algum setor se destaca neste processo.

Indicadores de Inovação Tecnológica da Indústria e dos Serviços no Brasil

A Pesquisa Industrial de Inovação Tecnológica (PINTEC) tem por objetivo a construção de indicadores nacionais das atividades de inovação tecnológica e busca identificar os motivos para inovar e sua evolução nas empresas industriais e de serviços brasileiras. Os dados desta pesquisa estão disponíveis desde 2000, quando foi publicada a primeira PINTEC, até o ano de 2005. A abordagem desse trabalho compreende os fatores determinantes da inovação na indústria brasileira de 2000 a 2005. A coleta de dados está essencialmente baseada na PINTEC, de responsabilidade do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que, através de pesquisa aplicada e exploratória, discrimina os motivos de inovação das indústrias, extrativas e de transformação, e serviços, no Brasil, e sua evolução recente (IBGE, 2002, 2004, 2007).

De acordo com a PINTEC, de 1998 a 2000 participaram da pesquisa 72.005 empresas industriais extrativistas e de transformação; na PINTEC de 2001 a 2003, a pesquisa totalizou 84.262 empresas industriais extrativistas e de transformação, já no triênio de 2003 a 2005, a pesquisa registrou o total de 95.301 empresas industriais extrativistas, de transformação e de serviços. Ressalta-se que, de 2000 a 2005, houve um incremento de mais de 30 por cento na quantidade de empresas participantes[19].

Conforme dados do Ministério do Trabalho, na publicação da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), o total de empresas na Indústria Extrativa, de Transformação e Serviços em 2000 era de 1.033.777; em 2003, 1.145.813 e em 2005, 1.220.743 (Quadro 2). Dessa maneira, a amostra da PINTEC representa aproximadamente 7 por cento do total de empresas nacionais para a pesquisa de 2000; em 2003 representou cerca 7,3%; e em 2005 aproximadamente 8%. Em relação ao total de Indústrias Extrativas, a representatividade para os três anos foi de 26 por cento, 27 por cento e 24 por cento, respectivamente; a Indústria de Transformação teve representatividade de 28 por cento, 31 por cento e 31,7 por cento em 2000, 2003 e 2005, respectivamente. Em 2005, ano em que foi incluído o setor Serviços à pesquisa, a RAIS contabilizou 932.705 empresas, representando 0,45% da amostra do IBGE.

O setor de Serviços na PINTEC de 2005 foi adicionado à pesquisa para obter um melhor conhecimento e mensuração do processo de inovação tecnológica realizado pelas empresas brasileiras[20]. No entanto, em 2005, que contou com 95.300 empresas que responderam a pesquisa, o setor de Serviços representou apenas 4,4% do total, com 4.246 empresas, contra 93,6 por cento da Indústria de Transformação. A Indústria Extrativa representou menos de 2% do total. Nota-se claramente a maior participação da Indústria de Transformação no total de empresas que realizaram inovações no triênio de pesquisa da PINTEC de 2005. Essa constatação também é verdadeira para as pesquisas de 2000 e 2003: em 2000, das 72.005 empresas, 1729 eram da Indústria Extrativa e 70.277 da Indústria de Transformação; já em 2003, do total de 84.262 empresas, 1.888 eram da Indústria Extrativa e 82.374 da Indústria de Transformação (Quadro 2).

Quadro 2
Total de empresas extrativas, de transformação e serviços e total da amostra da PINTEC. Brasil. 2000/2005

Tipo de Indústria (1)

Ano

2000

2003

2005

RAIS

Amostra

(%)

RAIS

Amostra

(%)

RAIS

Amostra

(%)

PINTEC

PINTEC

PINTEC

Indústrias Extrativas

6.587

1.729

26,2

6.914

1.888

27

7.420

1.849

25,0

Indústrias de Transformação

242.798

70.277

28,9

262.706

82.374

31

280.618

89.205

32,0

Serviços

784.392

n/d

-

876.193

n/d

-

932.705

4.246

0,5

Total

1.033.777

72.005

7,0

1.145.813

84.262

7

1.220.743

95.300

7,8

Fonte: Ministério do Trabalho e Emprego, dados estatísticos dos Registros Administrativos RAIS e do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados CAGED - IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Indústria, Pesquisa Industrial de Inovação Tecnológica 2000 a 2005 - Elaboração Própria.
Nota: Em 2000 e 2003 não foram divulgados dados dos Serviços na PINTEC.
(1) Fazem parte da PINTEC e dos dados do CAGED apenas as empresas formais.

 

Nos períodos pesquisados foram analisadas as empresas que: (a) implementaram produto e/ou processo tecnologicamente novo ou substancialmente melhorado; (b) desenvolveram projetos que foram abandonados ou ficaram incompletos; e (c) realizaram mudanças organizacionais[21]. Em 2000, das 1.729 empresas da Indústria Extrativa que realizaram inovações, 297 inovaram com um produto e/ou processo novo, 110 com projetos incompletos e/ou abandonados e 513 com mudanças estratégicas e organizacionais. Em 2003, o número de empresas que implementaram inovações na Indústria Extrativa aumentou 9,2%, sendo que 415 inovaram com um produto e/ou processo novo, 25 com projetos incompletos e/ou abandonados e 568 inovaram com mudanças estratégicas e organizacionais. Na PINTEC de 2005, o número de empresas da Indústria Extrativa que realizaram inovações caiu pouco mais de 2% (de 1.888 empresas, em 2003, para 1.849, em 2005), e das 1.888 empresas que realizaram inovações, 427 inovaram com um produto e/ou processo novo, 78 com projetos incompletos e/ou abandonados e 578 com mudanças estratégicas e organizacionais.

A Indústria de Transformação realizou inovação de produto e/ou processo em 22.401 (32%), 27.621 (34 %) e 29.951 (34%) empresas em 2000, 2003 e 2005 respectivamente nas empresas pesquisadas; com projetos incompletos e/ou abandonados, 2.850 (4%), 2.290 (3%), 1.977 (2%) empresas em 2000, 2003 e 2005, respectivamente; e com apenas mudanças estratégicas e organizacionais, 28.105 (40%), 30.404 (37%), e 33.359 (37%), respectivamente nos anos pesquisados. Observa-se que houve um aumento na implementação de inovações de produto e/ou processo, em termos absolutos, no decorrer dos três períodos da pesquisa, assim como nas inovações estratégicas e organizacionais. Nota-se ainda a maior relevância desse tipo de inovação na pesquisa: percentualmente, os números apresentam estabilidade. O aspecto positivo observado é que o número de empresas com projetos incompletos ou abandonados é decrescente (Quadro 3).

O setor de Serviços, que incrementa a pesquisa a partir de 2005, realizou inovações em produto e/ou processo em 2.418 empresas, sendo 144 com projetos incompletos e/ou abandonados e 466 inovando com mudanças estratégicas e organizacionais. Quanto às empresas pesquisadas que não inovaram em 2000, houve um percentual de 25 por cento; em 2003 e 2005 cerca de 30 por cento não implementaram inovações. Em termos relativos, a Indústria Extrativa foi a que demonstrou maiores índices de não implementação de inovação em 2000 (47%), 2003 (27%) e 2005 (41%); a Indústria de Transformação apresentou índices que variaram entre 24% e 27%; e o percentual das empresas do setor Serviços que não inovaram em 2005 foi de 29 por cento (Quadro 3).


Quadro 3
Total de empresas que realizaram inovações de produto e/ou processo, apenas projetos, e mudanças estratégicas e organizacionais, na Indústria e Serviços. Brasil. 1998-2005

Ano

Tipo de inovação

Indústria Extrativa

(%)

Indústria de Transformação     

(%)

Serviços (1)

(%)

Total

(%

1998-2000

Inovação de produto e/ou processo

297

17

22.401

32

n/d

n/d

22.698

32

Apenas projetos incompletos e/ou abandonados

110

6

2.850

4

n/d

n/d

2.960

4

Apenas mudanças estratégicas e organizacionais

513

30

28.105

40

n/d

n/d

28.618

40

Que não implementaram

809

47

16.921

24

n/d

n/d

17.730

25

Total

1.729

100

70.277

100

-

-

72.006

100

2001-2003

Inovação de produto e/ou processo

415

22

27.621

34

n/d

n/d

28.036

33

Apenas projetos incompletos e/ou abandonados

25

1

2.290

3

n/d

n/d

2.315

3

Apenas mudanças estratégicas e organizacionais

568

30

30.404

37

n/d

n/d

30.972

37

Que não implementaram

880

47

22.059

27

n/d

n/d

22.939

27

Total

1.888

100

82.374

100

-

-

84.262

100

2003-2005

Inovação de produto e/ou processo

427

23

29.951

34

2.418

57

32.796

34

Apenas projetos incompletos e/ou abandonados

78

4

1.977

2

144

3

2.199

2

Apenas mudanças estratégicas e organizacionais

578

31

33.359

37

466

11

34.403

36

Que não implementaram

766

41

23.918

27

1.218

29

25.902

27

Total

1.849

100

89.205

100

4.246

100

95.300

100

Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Indústria, Pesquisa Industrial de Inovação Tecnológica 2000 a 2005 - Elaboração Própria.
(1) Em 2000 e 2003 não foram divulgados dados dos Serviços na PINTEC.


A pesquisa demonstra que o foco inovativo para as empresas é de apenas mudanças estratégicas e organizacionais, que se mostra uma tendência, nos três anos pesquisados, de que existe inovação, porém, elas não se caracterizam como radicais. Como visto pela teoria schumpeteriana, as inovações que promovem maiores rupturas são aquelas que inserem no mercado um produto ou processo totalmente novo, enquanto que os melhoramentos ou mudanças apenas garantem a continuidade na ação de mudança.

É observado também que a Indústria Extrativa pode ter como característica de mercado baixa demanda por inovações, já que os projetos incompletos ou não implantação de inovação foram maior para essa indústria; no entanto as Indústrias de transformação e serviços apresentam-se mais dinâmicas na implementação de inovações. A inovação estratégica e organizacional é, nas três pesquisas para as Indústrias e setor de Serviços, a mais representativa; seguida por inovações em produto e/ou processo e, depois, por projetos incompletos e /ou abandonados.

Em relação ao produto, o mesmo apresenta - de 2003 para 2005 - uma evolução de mais de 10% no aperfeiçoamento de um já existente; e nos completamente novos para empresa uma redução expressiva (18%); os produtos novos para o mercado nacional, mas já existentes no mercado mundial dobraram de um período para outro; já os completamente novos para o mercado mundial não são expressivos em termos de produto. A partir desses dados, abre-se a questão sobre a escala da inovação no Brasil. Uma vez que as inovações de produtos totalmente novos mundialmente não são expressivos, há a possibilidade de o País estar utilizando a tecnologia e inovações estrangeiras de produtos e disseminando-os no mercado nacional. Essa ideia é reforçada por Maria Beatriz Borher et al. (2007, p. 285), quando afirmam que “sistemas de inovação como o brasileiro apresentam como característica relevante à concentração das atividades de P&D na adaptação de tecnologias estrangeiras, na imitação, na cópia e em melhoramentos marginais”.

Em termos de processo, a inovação com base no aprimoramento de um já existente elevou-se substancialmente (17%) de 2003 para 2005; por sua vez, os completamente novos para a empresa tiveram redução de 21 por cento (Figura 1). Aqui a questão seria analisar mais profundamente os motivos do aumento do aprimoramento de um processo já existente de uma pesquisa para a outra, ou seja, se os motivos são a diminuição de investimentos em novos processos, ou se o processo anteriormente implantado já faz parte do domínio da empresa, ou, ainda, se esse melhoramento é fruto da aprendizagem adquirida ou da cumutatividade do conhecimento tácito.

As informações das pesquisas de 2003 e 2005 reforçam a preocupação da indústria nacional especialmente com a competitividade interna, por se concentrar em inovações para o mercado nacional e de um aprimoramento de produtos existentes. Apesar da Política de Ciência e Tecnologia Brasileira relacionar a inovação com a competitividade internacional, ainda há um importante vínculo de um processo de imitação internacional no mercado local a partir de um fortalecimento das relações intra-firma em um processo de maior globalização.

 

Figura 1 - Evolução da composição da inovação para produto e processo. Brasil. 2003/2005
Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Indústria, Pesquisa Industrial de Inovação Tecnológica 2005 - Elaboração Própria.

 

São vários os métodos de proteção utilizados pelas empresas para garantir a legitimidade de suas inovações. Entre eles, a PINTEC, a partir de 2003, destaca os métodos por escrito, com a utilização de patentes e marcas, e estratégicos, através de complexidade nos desenhos, segredos industriais e tempo de liderança sobre os competidores. Quantitativamente, a pesquisa revela que a estratégia mais utilizada é a marca.

A marca é uma forma de proteção que, de acordo com a visão da demanda, objetiva situar o produto de uma empresa em um novo mercado ou oferecer-lhe uma nova imagem[22].

O número de empresas que escolhem a proteção via marca é maior que a escolha por proteção via patente. Isso pode ser justificado pelos onerosos e burocráticos processos de patentes no Brasil, e elo fato de, muitas vezes, o processo de aprendizagem ou inovações não aparecerem revestidos de proteção legal.

O número de empresas que implementaram inovações e utilizaram o método de proteção de patentes cresceu cerca de 90 por cento, de 2000 para 2005, sendo que o número de patentes em vigor, em relação ao número de depósitos de patentes, é maior nos três segmentos pesquisados, Indústria Extrativa, Indústria de Transformação e Serviços (Quadro 4).

 

Quadro 4
Total de empresas que implementaram inovações, com indicação de depósito de patentes e de patentes em vigor, segundo a Indústria e Serviços. Brasil. 2000/2005.

Ano

Inovações implementadas

Indústrias Extrativas

Indústrias de Transformação     

Serviços (1)

Total

2000

Total

297

22.401

n/d

22.698

Com depósito de patente

8

1.819

n/d

1.827

Com patente em vigor

11

1.919

n/d

1.930

2003

Total

415

27.621

n/d

28.036

Com depósito de patente

8

1.713

n/d

1.721

Com patente em vigor

8

1.391

n/d

1.399

2005

Total

427

29.951

2 418

32.796

Com depósito de patente

7

1.851

130

1.988

Com patente em vigor

13

3.454

240

3.707

Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Indústria, Pesquisa Industrial de Inovação Tecnológica 2000 a 2005 - Elaboração Própria.
(1) Em 2000 e 2003 não foram divulgados dados dos Serviços na PINTEC


A PINTEC identifica alguns impactos associados a implementações de inovação de produto e processo relacionadas com o meio ambiente, a saúde e a segurança, e ao enquadramento em regulamentações e normas[23].
Nas três pesquisas realizadas, observa-se que o impacto maior e de maior importância, segundo as empresas pesquisadas, foi a melhoria na qualidade dos produtos, seguida pela manutenção da participação da empresa no mercado e aumento da capacidade produtiva.

Esse fato remete, novamente, à importância da marca nas inovações no País (impacto de maior importância, mesmo comparando a redução dos custos de produção e do trabalho), uma vez que a melhoria na qualidade dos produtos fortifica a marca no mercado, já destacado anteriormente, que é, no Brasil, o método de proteção mais utilizado nas inovações. Além disso, o alto grau de importância auferido à aquisição de máquinas e equipamentos pode estar diretamente ligado ao alto grau de importância dado para o aumento da capacidade produtiva.

Existe uma variedade de fontes de informação e orientação nas quais as empresas podem buscar inspirações para o processo de inovação. A PINTEC definiu em suas pesquisas a hierarquia de importância dessas fontes. Segundo a PINTEC as empresas podem desenvolver atividades, produzir novos conhecimentos ou utilizar conhecimentos científicos e tecnológicos já incorporados nas patentes, máquinas e equipamentos, artigos especializados, softwares etc[24].

São os fornecedores os principais difusores de informação quanto a inovações na Indústria de Transformação, seguido por clientes e consumidores e logo mais por feiras e convenções. A mesma tendência é observada na Indústria Extrativa e de Serviços. A pequena participação, como fonte de informação, das universidades e institutos de pesquisa, apresenta-se entre as menos acessadas pelas empresas, isso pode mostrar a importância do círculo de relações da Indústria: os fornecedores, clientes e consumidores são fonte de informação suficiente para incentivar a empresa a inovar.

A interatividade que envolve e influencia as inovações proporcionam incentivos ou limites às ações de inovação. Sendo assim, observa-se que as empresas, na Indústria e nos Serviços, participam de um sistema de fontes de informação com suas redes mais próximas de interação (fornecedores, clientes e concorrentes), e, ainda, que a maioria das fontes seja residente no Brasil. Instituições governamentais fazem parte desse item da pesquisa.

A identificação das fontes de ideias e de informações utilizadas no processo inovativo pode ser um indicador do processo de criação, disseminação e absorção de conhecimentos. Para tanto, a PINTEC busca identificar não só as fontes de informação, mas também os cooperadores e parceiros das empresas nas atividades inovativas. São os clientes ou consumidores e fornecedores as maiores fontes de relação de cooperação para as atividades inovativas das empresas, para os três anos da pesquisa na Indústria e nos Serviços. Os clientes ou consumidores e os fornecedores são os que incentivam e contribuem para a viabilização da inovação quando são informados como de maior grau de importância quanto afontes de informação e, ao mesmo tempo, de cooperação[25].

O sistema de cooperação criado pelas empresas é percebido nos resultados da pesquisa e mostra que as relações comerciais são desenvolvidas com clientes, fornecedores e pela própria experiência das empresas. A partir da publicação do triênio de 2003, a PINTEC incluiu dados relativos ao apoio do governo à inovação das empresas. A pesquisa questionou as empresas sobre incentivos fiscais e financiamento para projetos e compra de máquinas e equipamentos. Para a PINTEC, esses dados são relevantes para compreender o papel do governo no incentivo à inovação das empresas.

Em 2003, do total de empresas que implementaram inovações, pouco mais de 18 por cento da Indústria Extrativa recebeu algum tipo de apoio do governo; o mesmo percentual se repetiu na Indústria de Transformação. No triênio de 2005, os percentuais da Indústria Extrativa e de Transformação foram de 20,8 por cento e 19 por cento, respectivamente; já o percentual de apoio recebido do governo no setor de Serviços foi de 14,5 por cento. Em relação ao apoio do governo, destaca-se que o financiamento é a forma de apoio mais recebido na Indústria e nos Serviços.

É possível afirmar que, no limite do que podem as empresas, existem inovações de produto e que as empresas sabem do poder estratégico das inovações. Porém, as inovações não são substancialmente significativas, uma vez que o processo inovativo acontece a partir da melhora de um processo ou produto já existente, os índices de patentes são pequenos e que as inovações, no Brasil, em sua maioria, não têm alcance mundial.

Os principais problemas e obstáculos apontados pelas empresas para inovar referem-se ao risco econômico excessivo e ao elevado custo de inovação (Quadro 5). O primeiro obstáculo é próprio de um ambiente com instituições fracas e com mudanças frequentes das regras do jogo, que dificulta sobremaneira o planejamento de longo prazo[26], como acontece no Brasil[27]. Enquanto não se fortalecer as instituições brasileiras, haverá dificuldade de estabelecer uma democracia forte e uma participação mais inclusiva da sociedade, bem como a inserção duradoura em termos sociais e econômicos da população por meio de regras do jogo claras e que permitam o planejamento de risco e de longo prazo.

O segundo ponto pode ter várias origens, mas destacam-se: falta de tecnologia básica nacional e demanda de base tecnológica importada para pesquisas aplicadas; alto custo tributário; falta de incentivos fiscais; e alto custo de infraestrutura. A falta de tecnológica básica não parece ser um problema, pois, em linhas gerais, não há falta de pessoal e de informação sobre tecnologia, não há dificuldade de se adequar a padrões, normas e regulamentações e não há falta de informações sobre os mercados. A existência de informação demonstra a capacidade de compreender o contexto de inovação para tomada de decisão sobre a mesma. O alto custo tributário é um problema, mas para a inovação, em especial, há certos benefícios fiscais que diminuem esse fator na decisão por inovar. Isso corrobora a existência de incentivos fiscais no Brasil, com linhas de créditos especiais por nível de desenvolvimento do processo de inovação e por setor. Para exemplificar a existência de um conjunto significativo de linhas de créditos especiais, o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC) apresenta sintetiza estas diferentes linhas de financiamento e fomento para vários estágios de desenvolvimento científico, tecnológico e inovação nas empresas brasileiras, considerando as fontes de recursos disponíveis por estágio de desenvolvimento das empresas inovadoras (MDIC, 2010).

Com isso, pressupõe-se que o risco econômico excessivo e o alto custo para inovar, presente como importante problema pelos empresários (Quadro 5), estão mais relacionados à percepção do empresariado sobre as dificuldades de planejar no longo prazo, do que a existência de recursos mais baratos com linhas de créditos especiais. Contudo, a dificuldade de acesso ao crédito e de compreensão dessas linhas especiais tornam-se um problema para o empresário brasileiro, que pode traduzir isso também como risco econômico excessivo. Há um número excessivo de órgãos desarticulados e com precária capacidade de mobilizar recursos, o que torna o arranjo institucional de política industrial e tecnológica brasileira ineficaz[28].

Outros pontos de destaque refere-se à baixa importância da falta de pessoal qualificado e da rigidez organizacional para justificar um processo mais inovador. Isso rebate os argumentos de que não há pessoas qualificadas para desenvolvimento de novas tecnologias e capazes de inovar. Aqui também se pode pressupor que os dois primeiros pontos (risco excessivo e custo da inovação) levam à questão organizacional e de capacitação pessoal para segundo plano, sem, na realidade, ser testada sua efetividade no processo de inovação.

Esses pontos caracterizam o contexto social e econômico como cruciais para a decisão sobre inovar. Adicionado ao processo de formação profissional e preparação para ser empregado ao invés de empreender e inovar, isso gera uma aversão a risco, que é um elemento crucial para desenvolver o empresário schumpeteriano. Neste aspecto, corrobora ainda a vinculação das grandes empresas com o potencial de inovação e a relação estratégica das empresas transnacionais subordinando a estratégia de inovação ao projeto global executado pela matriz. Tal ação torna a decisão de inovar no Brasil dependente da relação entre matrizes e filiais, e não do processo de decisão empresarial local de inovar. Corroborando esta afirmação, um estudo da OCDE (2005) mostra que a decisão de inovar está relacionada ao fluxo de comércio intrafirma e ao direcionamento dos recursos e dos esforços de desenvolvimento tecnológico e de inovação. Contudo, isso não significa que políticas e sistemas de inovação não influenciem, mas sim que se trata de um elemento a mais para a definição por parte das corporações transnacionais da localização do desenvolvimento da tecnologia e inovação.

 

Quadro 5
Empresas: total, as que não implementaram inovações, e as sem projetos, devido a outros fatores, por grau de importância dos problemas e obstáculos apontados, segundo a Indústria e Serviços. Brasil. 2000/2005

Grau de importância dos problemas e obstáculos apontados (1)

Indústrias Extrativas

Indústrias de Transformação

Serviços (2)

Total

2003

2005

2003

2005

2005

2003

2005

Total das Empresas

1.888

1.849

82.374

89.205

4.246

84.262

95.301

Total das empresas que não implementaram inovações

226

177

12.448

10.746

481

12.674

11.404

Riscos econômicos excessivos

Alta

54

24

7.346

5.584

177

7.400

5.785

Média

97

131

2.840

2.614

126

2.937

2.871

Baixa e não relevante

75

22

2.262

2.548

178

2.337

2.748

Elevados custos da inovação

Alta

144

118

8.861

7.185

197

9.004

7.500

Média

41

41

2.172

2.052

58

2.212

2.151

Baixa e não relevante

42

18

1.415

1.509

226

1.458

1.753

Escassez de fontes

Alta

44

43

5.745

5.502

194

5.790

5.739

Média

45

5

1.777

1.503

12

1.822

1.520

Baixa e não relevante

137

130

4.926

3.741

275

5.063

4.146

Rigidez organizacional

Alta

28

24

783

666

16

812

707

Média

21

28

1.036

1.613

11

1.058

1.652

Baixa e não relevante

176

125

10.628

8.466

453

10.805

9.045

Falta de pessoal qualificado

Alta

10

8

2.355

1.686

55

2.365

1.748

Média

83

6

1.777

1.702

71

1.861

1.779

Baixa e não relevante

133

164

8.316

7.358

355

8.449

7.877

Falta de informação sobre tecnologias

Alta

8

2

1.114

1.193

25

1.123

1.220

Média

54

44

1.544

1.373

6

1.599

1.423

Baixa e não relevante

164

132

9.789

8.179

450

9.953

8.761

Falta de informação sobre mercados

Alta

2

-

1.013

811

25

1.016

836

Média

6

65

1.440

1.743

36

1.446

1.844

Baixa e não relevante

218

113

9.994

8.191

420

10.213

8.724

Escassas possibilidades de cooperação com outras empresas/instituições

Alta

21

3

1.481

1.541

50

1.502

1.594

Média

2

7

1.093

1.087

92

1.095

1.186

Baixa e não relevante

203

167

9.873

8.117

340

10.077

8.624

Dificuldade para se adequar a padrões, normas e regulamentações

Alta

68

56

1.904

1.654

47

1.971

1.757

Média

17

43

1.267

1.430

82

1.284

1.554

Baixa e não relevante

141

79

9.277

7.662

352

9.419

8.093

Fraca resposta dos consumidores quanto a novos produtos

Alta

22

1

978

759

34

1.000

793

Média

60

36

1.705

1.503

14

1.765

1.553

Baixa e não relevante

144

141

9.765

8.484

433

9.909

9.058

Escassez de serviços técnicos externos adequados

Alta

15

26

1.010

1343

23

1.025

1.392

Média

60

37

999

1363

49

1.059

1.449

Baixa e não relevante

151

114

10.439

8.040

408

10.590

8.563

Centralização da atividade inovativa em outra empresa do grupo

Alta

-

-

25

80

16

25

96

Média

-

2

24

35

-

24

36

Baixa e não relevante

7

13

303

152

35

311

201

Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Indústria, Pesquisa Industrial de Inovação Tecnológica 2003 a 2005 - Elaboração Própria.
(1) O questionário da pesquisa permitia a marcação de mais de uma alternativa; (2) Em 2000 e 2003 não foram divulgados dados dos Serviços na PINTEC.


Considerações Finais

As inovações podem, de fato, criar situações novas e projetar uma economia mundialmente, mas é difícil que a esse passo, sem o fortalecimento e interação das instituições, o Brasil possa, de repente, alcançar patamares elevados de inovação. Para que isso aconteça, há muito o que se fazer no sentido de incentivar e realizar inovações na indústria brasileira, bem como desenvolver uma cultura de inovação. Para isso, precisa-se de capacidade tecnológica, que é fonte de diferenças entre setores industriais e países, reconhecida em termos de progresso industrial e do crescimento econômico.

O objetivo deste estudo foi avaliar os principais fatores que contribuem ou dificultam a inovação no Brasil. Constatou-se que as empresas se esforçam para inovar e que a inovação nasce a partir de estratégias e determinação próprias, e estão voltadas para a melhora de processos já existentes. Por isso, ainda existe pouco esforço na realização de inovações mais radicais que criam e inserem produtos totalmente novos no mercado nacional ou, ainda menos, no mercado mundial.

A trajetória das inovações no Brasil acompanha a situação da indústria brasileira e de sua história, das suas estruturas e das instituições relacionadas. As empresas registraram na pesquisa dificuldade de encontrar fontes de financiamento específico à inovação, pouca ligação com universidades e centros de pesquisa, mas, especialmente, não reconhecem as instituições como fortes para permitir o planejamento de longo prazo. A própria dificuldade de fontes de financiamento está mais relacionada ao alcance destas fontes devido à burocracia envolvida, às parcerias e à própria cultura de interação entre universidades e centro de pesquisas e empresas.

A produção industrial brasileira em diversos segmentos produtivos já conta com uma boa capacidade instalada. Porém, para serem mais inovadores, é necessário aumentar e sustentar a capacidade competitiva do setor produtivo nacional. A inovação que cumpre esse papel é tanto a inovação incremental, derivada de aperfeiçoamentos em produtos e processos de produção, como a inovação radical, que envolve conhecimentos mais consistentes e prazos mais longos. Esta última ainda distante da realizada dos setores produtivos nacionais.

Desta forma, pode-se considerar que a base brasileira para a inovação ainda não é capaz de desencadear um processo importante de projeção da indústria nacional, apesar de ter alcançado, aos olhos dos empresários nacionais, relativa importância para a competição contemporânea e fortalecimento industrial. Há certo incentivo para inovar no Brasil, principalmente pelas políticas públicas e de disseminação do tema, mas não há um ambiente propício para a inovação devido ao contexto sociocultural, que consiste em imitações e inovações incrementais. O rompimento com esse contexto sociocultural seria tão relevante quanto os investimentos para essa transformação e inovação na indústria. O baixo indicador de inovação radical e para o mercado global, como apresentam as pesquisas da PINTEC, é resultado, portanto, do próprio contexto sociocultural e das fracas instituições que aumentam os riscos e dificultam o planejamento de longo prazo.

A visão puramente econômica da inovação é relevante para compreender a sua importância para o processo de desenvolvimento; contudo, restritivo para entendê-lo como único ou principal elemento para inovação. Além do estímulo econômico, faz-se mister a existência de condições institucionais que permitam o planejamento e a implementação do processo inovativo pelo empresário schumpeteriano. Demanda-se, também, um contexto sociocultural que favoreça a característica de assumir riscos e de buscar romper ciclos existentes, como pressupõem as inovações radicais. No Brasil, há uma preocupação limitada ao incentivo econômico por meio de novas linhas de crédito, mas ainda se está distante do fortalecimento institucional e do estímulo a um contexto sociocultural que desenvolva o espírito empreendedor de inovações na concepção do empresário schumpeteriano. Torna-se relevante, portanto, desenvolver estas questões institucionais e socioculturais para inovar no Brasil. Isso requer políticas públicas e desenvolvimento de um processo educacional em prol desse espírito inovador para o País se fortalecer no longo prazo.

Esse espírito inovador não se espelha na capacidade de buscar alternativas criativas para resolver pequenos problemas, como se pressupõe com o “jeitinho brasileiro”, mas de desenvolver essa habilidade para buscar novos meios de produção e de produtos. Tal característica não se aprende nos bancos escolares, mas pode ser desenvolvido à medida que se estimula a criatividade e a inovação com incubação de ideias. No entanto, para uma ideia se tornar uma invenção e posteriormente uma inovação precisa trilhar um longo caminho e necessita de regras bem definidas e instituições fortes que as farão ser cumpridas. Neste aspecto, viabilizar linhas de crédito para projetos com altos riscos, como é usual em inovações radicais, é um item nesta composição de fatores relevantes para inovar. No Brasil, ainda se precisa dar mais crédito aos elementos socioculturais, com fortalecimento educacional pró-ativo para inovação, e institucionais, para garantir o planejamento e a tomada de decisão. Ser criativo na “terra do jeitinho” pode ser um potencial a desenvolver, mas o seu atual uso não garante mais que inovações incrementais, especialmente de adaptação do que já existe. Se não for desenvolvido, não deixará de ser potencial.

Propõem-se a sequência desta pesquisa com avaliação da efetividade das políticas públicas de ciência, tecnologia e inovação no Brasil, a partir de 2000, relacionando-a com os indicadores deste estudo. Outra sugestão para pesquisas seria uma avaliação qualitativa dos estímulos para inovar, com empresas de diferentes portes, setores e regiões para compreender as suas prioridades e obstáculos para inovar, detalhando os resultados da PINTEC discutidos neste artigo. Assim, há muito caminho a percorrer na pesquisa deste importante tema nacional e que está diferentemente vinculado a outros problemas históricos, como a desigualdade social, dependência e interdependência econômica, qualificação profissional e indústrias estratégicas. Ao pesquisar sobre o tema da inovação no Brasil, adentra-se em outras questões relevantes, como estas indicadas, mas que são interdependentes no contexto histórico brasileiro.


Notas

[1] Jeitinho [zhae-’te–n(y)o]: skillful, smart, astute way of achieving something, especially something that seems particularly difficult to most people. Houaiss Dictionary of the Portuguese Language (2001). Traduzido como “Brazilian way”.

[2] Andrade, 2004, p. 90.

[3] Pelaez e Szmrecsányi, 2006, p. 17.

[4] Silva, 2004, p. 61.

[5] Schumpeter, 1997, p, 76.

[6] Como se descreve em Pelaez e Szmrecsányi (2006, p. 112): “Em termos econômicos, as inovações tecnológicas correspondem à aquisição, introdução e aproveitamento de novas tecnologias (conjunto de conhecimentos técnicos) na produção e/ou distribuição de quaisquer bens e serviços para o mercado. A nova maneira de produzir e/ou distribuir, bem como as novas mercadorias daí resultantes, sempre são um produto do desenvolvimento seqüencial ou simultâneo de três processos correlatos, porém distintos: a descoberta ou invenção, a inovação propriamente dita, e sua difusão nas atividades econômicas”.

[7] Baptista, 2000, p. 46.

[8] Schumpeter, 1997, p. 76.

[9] Para Ferraz, Kupfer e Haguenauer. (1996, p. 3), competitividade “pode ser entendida como a sua capacidade de formular e implementar estratégias, concorrências que lhe permitam ampliar ou conservar, de forma duradoura, uma posição sustentável no mercado”.

[10] Para Anjos, 2005, p. 73, “a produtividade pode ser apresentada como indicador de um segmento produtivo de um país”.

[11] Anjos, 2005, p. 88.

[12] Fourastié, 1990.

[13] Feenberg, 1999, p. 160.

[14] Schlemm et al., 2007.

[15] Como afirma, por exemplo, Feenberg, 1999, p. 160.

[16] The World Bank, 2009, p. 314.

[17] Metas estabelecidas em Brasil, 2002.

[18] Castor, 2004.

[19] IBGE, 2002; IBGE, 2004; IBGE, 2007.

[20] IBGE, 2007, p, 13.

[21] A PINTEC segue a recomendação do Manual Oslo, no qual a inovação tecnológica é definida pela implementação de produtos (bens ou serviços) ou processos tecnologicamente novos ou substancialmente aprimorados. A implementação da inovação ocorre quando o produto é introduzido no mercado ou quando o processo passa a ser operado pela empresa (IBGE, 2007, p, 19).

[22] Segundo o Manual de Oslo, “pode também ser considerada uma inovação de marketing a introdução de um sistema de informação personalizado, obtido, por exemplo, com cartões de fidelidade, para adaptar a apresentação dos produtos às necessidades específicas dos consumidores individuais” (OCDE, 2005, p. 61).

[23] De acordo com a PINTEC, “as decisões de implementar produtos e processos tecnologicamente novos ou substancialmente aprimorados são motivadas por expectativas de ganhos futuros de competitividade e, conseqüentemente, de lucro que possam gerar. Os resultados que as inovações produzem na performance competitiva das empresas podem ser diversos e de intensidades variadas” (IBGE, 2007, p. 53).

[24] IBGE, 2007, p. 23.

[25] Para o IBGE (2007, p. 24), “As questões focando a cooperação para inovação, presentes na PINTEC, buscam identificar as relações entre um amplo conjunto de atores que, interligados por canais de troca de conhecimento e/ou articulados em redes, formam o que se denomina Sistema Nacional de Inovação”.

[26] Somanathan e Sterner, 2006, p. 240.

[27] Bresser-Pereira, 2003, p. 418.

[28] Suzigan e Furtado, 2007, p. 26.

 

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[Edición electrónica del texto realizada por Nara Santos]



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Ficha bibliográfica:

SILVA, Christian Luiz; IEIS, Fabiana; BASSI, Nadia Solange Schmidt. O que é relevante para inovar no Brasil? Dilemas de uma construção econômica e sociocultural no país do “jeitinho”. Biblio 3W. Revista Bibliográfica de Geografía y Ciencias Sociales. [En línea]. Barcelona: Universidad de Barcelona, 25 de julio de 2011, Vol. XVI, nº 933. <http://www.ub.es/geocrit/b3w-933.htm>. [ISSN 1138-9796].