Biblio 3W
REVISTA BIBLIOGRÁFICA DE GEOGRAFÍA Y CIENCIAS SOCIALES
Universidad de Barcelona 
ISSN: 1138-9796. Depósito Legal: B. 21.742-98 
Vol. XVII, nº 978, 30 de mayo de
2012
[Serie  documental de Geo Crítica. Cuadernos Críticos de Geografía Humana]

 

GEOGRAFIA E MÚSICA: UMA INTRODUÇÃO AO TEMA

 

Lucas Manassi Panitz
Mestre em Geografia. Doutorando no Programa de Pós-graduação em Geografia. Universidade Federal do Rio Grande do Sul et Université Bordeaux 3.
lucaspanitz@gmail.com

 

Recibido: 8 de agosto de 2011. Devuelto para revisión: 10 de noviembre de 2011. Aceptado: 20 de diciembre de 2011.


Geografia e música: uma introdução ao tema (Resumo)

A geografia da música, apesar de quase um século de existência oficial, só recentemente têm tido a devida atenção dos geógrafos interessados no estudo da cultura e das manifestações artísticas em sua dimensão espacial. A quantidade de materiais disponíveis em formato digital atualmente permite um bom reconhecimento deste campo de estudo em geografia, e indica Estados Unidos, Inglaterra e França como centros de discussão avançada, além do Brasil como potencial âmbito ibero-americano, por sua considerável produção acadêmica. Neste sentido, o presente texto se dispõe a trazer uma bibliografia sistematizada. Contudo, diferentemente das publicações de autores como Carney, Nash e Carney, Kong, Guiu, focados na apresentação de linhas temáticas, o presente texto busca a diversidade da produção em termos territoriais, no intuito de ampliar os olhares sobre a produção do conhecimento geográfico sobre a música.

Palavras-chave: Geografia, Música, Geografia da Música


Geography and music: an introduction (Abstract)

Geography of Music, despite its absence from the canon of the discipline, has gained such an important dimension for geographers concerned with cultural studies and artistic expressions in their spatial dimension. The increased availability of digital materials and archives allowed for the recognition of this field of study in geography, being the United States, the United Kingdom, France and Brazil (given its potential for ibero-american studies) important centers of debate and scholarly production. This article offers a literature review, but with a different approach of the ones by Carney, Nash and Carney, Kong, Guiu, whose focus is on the presentation of the thematic trends in Geography. My discussion addresses the diversity of the academic production in regards to territoriality, offering a comprehensive approach to the study of music.

Key-words: Geography, Music, Geography of Music


Geografía y música: una introducción al tema (Resumen)

La geografía de la música, en que pese prácticamente un siglo de existencia oficial, solo recientemente tuvo la debida atención de los geógrafos interesados en estudio de la cultura y de las manifestaciones artísticas en su dimensión espacial. La cantidad de materiales disponibles en formato digital permite un bueno reconocimiento de este campo de estudios en geografía, y apunta Estados Unidos, Inglaterra y Francia como centros de discusión avanzada, además el Brasil como potencial ámbito ibero-americano, por su considerable producción científica. En este sentido, el presente texto se dispone a traer una bibliografía sistematizada. Sin embargo, diferente de las publicaciones de autores como Carney, Nash y Carney, Kong, Guiu, con foco en la presentación de líneas temáticas, el presente texto busca la diversidad de la producción en términos territoriales, con el reto de ampliar las miradas sobre la producción del conocimiento geográfico sobre la música.

Palabras-clave: Geografía, Música, Geografía de la Música


A música há algum tempo vem despertando largo interesse nas ciências humanas, principalmente na etnologia, história e sociologia. Uma possível origem desse interesse, surpreendentemente, aponta para uma interface com a geografia moderna. A geografia da música, apesar de quase um século de existência oficial, só recentemente têm tido a devida atenção dos geógrafos interessados no estudo da cultura e das manifestações artísticas em sua dimensão espacial. A quantidade de materiais disponíveis em formato digital atualmente permite um bom reconhecimento deste campo de estudo em geografia, e indica Estados Unidos, Inglaterra e França como centros de discussão avançada. No âmbito ibero-americano verifica-se sua pouca difusão, com exceção do Brasil, onde se encontra um considerável número de teses e dissertações produzidas nos últimos vinte anos, além de artigos e traduções de artigos seminais na temática. Neste sentido, o presente texto se dispõe a trazer ao público ibero-americano uma bibliografia extensa – e em continua construção – e sistematizada, de alguns dos principais trabalhos desenvolvidos na temática. Contudo, diferentemente das publicações de autores como Carney [1], Nash e Carney[2], Kong[3], Guiu[4], focados na apresentação de linhas temáticas, o presente texto busca a diversidade da produção em termos territoriais, no intuito de ampliar os olhares sobre a produção do conhecimento geográfico sobre a música. Nesse sentido foram buscados trabalhos em inglês, castelhano, português, catalão, francês, italiano e, em menor medida, alemão. Obviamente, tal levantamento não é definitivo, pois a diversidade de bases de dados e periódicos digitais existentes é imensa. Contudo, buscou-se um panorama que permite reconstruir a história do interesse da geografia pela música, a partir de uma comunidade territorial de amplas trocas acadêmicas, ou seja, os continentes americano e europeu. Ao fim do texto se dá destaque à importante produção brasileira nos últimos vinte anos, marcada pela diversidade de abordagens teóricas e interesses de pesquisa.

As raízes da discussão

Ao contrário do que se possa imaginar, quando tratamos de manifestações culturais e espaço geográfico, o interesse geográfico pela música não aparece no giro cultural dos anos 1980, quando decorridas as reorientações teóricas nas ciências sociais, em especial nos países anglosaxões. As primeiras considerações que ligam a Geografia moderna à expressão musical podem ser atribuídas à Friedrich Ratzel e seu discípulo Leo Frobenius, etnólogo e arqueólogo africanista. Como observa Reynoso[5], Ratzel influenciou decididamente a Escola Histórico Cultural alemã e austríaca, sendo Frobenius o principal pesquisador que levou adiante as teorias do geógrafo alemão. Atento aos indícios materiais da cultura, Ratzel observou similaridades entre os arcos da África Ocidental e da Melanésia, suas características morfológicas, bem como as formas das flechas usadas junto com o arco. Frobenius levou a pesquisa adiante e relacionou similaridades entre os tambores e outros instrumentos musicais, que o levou a desenvolver a noção de Círculos Culturais (Kulturkreis) junto aos etnologistas austríacos Fritz Graebner e Wilhelm Schimidt, inspirados em Ratzel. Partindo dessa noção, a partir do estudo da distribuição espacial de instrumentos musicais, entre outros procedimentos, Frobenius estabeleceu regionalizações na África que remetem aos ciclos de difusão de etnias, propondo, por exemplo, a seguinte divisão: Negra, Melanésio-Negra, Indo-Negra e Semítico-Negra[6]. Estabelecendo áreas culturais a partir de uma espacialidade dos instrumentos musicais na África, Leo Frobenius pode ser considerado o primeiro sistematizador do estudo entre espaço geográfico e música, que irá influenciar toda uma geração de etnólogos e musicologistas. Dessa forma, na busca de uma gênese do interesse da Geografia moderna pela música, até o presente momento encontramos em Ratzel o princípio inspirador dessa discussão, bem como em Frobenius o desenvolvimento teórico e empírico da mesma.

É bom lembrar que a noção de Kulturkreis postulava que certo número de ciclos culturais se desenvolvia em todo o mundo, em distintos lugares, em distintas épocas históricas e se difundiam no espaço, dando origem a novas culturas; essas proposições basearam-se em princípios difusionistas, que influenciaram diretamente a Antropologia e a Geografia Cultural norte-americanas, a partir da Universidade de Berkeley. Carl Sauer, filho de imigrantes germânicos radicados nos Estados Unidos, foi o fundador da Geografia Cultural americana, também chamada de Escola de Berkeley. Sauer foi profundamente influenciado pelas teorias difusionistas de Ratzel, utilizando-se da noção de Área Cultural de seu colega, o antropólogo Alfred Kroeber (este, discípulo do prussiano Franz Boas, a quem se deve a criação da noção de Área Cultural, e responsável por levar aos Estados Unidos uma versão renovada da Kulturkreis). Carl Sauer, profundo leitor da obra de Ratzel, herda o interesse pelos estudos de difusão e, sobretudo pela noção de Área Cultural, de Boas e Kroeber, amplamente relacionada com os postulados de Ratzel. Vendo assim, não se estranha que o interesse geográfico pela música tenha se dado justamente com os discípulos de Sauer, e que, como veremos adiante, sejam os Estados Unidos e o Canadá aqueles que desenvolvem até hoje boa parte das publicações na área.

Porém, tal interesse não foi exclusividade dos países germânicos e dos Estados Unidos. Nas duas primeiras décadas do século XX, na França, são desenvolvidas reflexões acerca de uma “Geografia musical” como disciplina própria. Nesse sentido o etnólogo, arqueólogo e geógrafo francês Georges de Gironcourt propõe esse novo campo de estudos para a geografia nos Annales de Géographie da Associação Francesa de Geografia[7], tendo realizado diversos estudos na Tunísia, Java e Camboja. Com a intenção de estabelecer um novo campo de estudo na Geografia, o autor afirma que “pode-se admitir que o repertório de sons eles mesmos e de suas associações em combinações musicais foram até agora negligenciados pelos geógrafos.”[8]. Segundo o autor, a Geografia musical deveria se debruçar sobre as formas musicais através do espaço e do tempo, permitindo analisar a fixação e a mobilidade de sociedades e civilizações. A simples introdução, por exemplo, de certo tipo de chocalho em uma banda de jazz norte-americana, pode dar informações importantes sobre a origem étnica e geográfica de determinados grupos, mas também de instrumentos e formas musicais que vão se transformando e se adaptando a cada sociedade em que são inseridos. É assim que, em trabalho posterior, Gironcourt[9] expõe alguns dos resultados pessoais coletados ao longo de doze anos dedicados ao tema, desde seu artigo seminal advogando pela nova disciplina geográfica. No referido texto, o autor afirma através de diversos estudos realizados pelo mesmo, que é possível recompor a mobilidade de populações e suas origens através das formas musicais, pois estas formas permanecem no tempo e no espaço ao longo da história humana ou se modificam levando algumas características pretéritas para outros lugares: ou seja, há um caráter de fixidade e um caráter de mobilidade dos grupos humanos os quais podem ser estudados através da música.

A principal diferença entre Frobenius e Gironcourt é que enquanto o primeiro reconstituía períodos históricos e pré-históricos através da cultura material, ao segundo também interessavam as formas não materializadas como os ritmos, o canto e as danças tradicionais. Gironcourt permanece desconhecido até hoje, tendo sido o novo corpo editorial da revista La Géographie[10] responsável por resgatar a importância desses artigos seminais quando da organização de uma edição especial sobre geografia e música. Dessa forma, considera-se que desde as últimas publicações de Gironcourt, ao final da década de 1930, a geografia francesa permaneceu distante do tema, até que grupos de geógrafos retomaram seu interesse, e de forma mais sistemática, dentro de unidades de pesquisas do CNRS[11].

Music Geography: de Berkeley às renovações da geografia anglo-saxônica

Nash & Carney[12], dois dos principais precursores do tema na América do Norte, fazem um retrospecto das últimas três décadas de trabalhos na área, no mundo anglófono. No esforço de atribuir uma origem à geografia da musica, e sem citar à Frobenius e Gironcourt, os autores afirmam que

“A pré-história da geografia da música foi dominada por etnomusicologias e folcloristas, os quais focaram não só nos tipos e localizações de instrumentos musicais, mas também em regiões musicais. Curt Sachs, e seu Geist un Werden der Musikinstrumente (Significado e Desenvolvimento de Instrumentos Musicais) publicado em 1929 [...] e outros profundamente interessados nos aspectos espaciais de suas pesquisas etnomusicológicas”[13].

Os autores ainda avaliam que desde a década de 1960 até 1996, mais de quarenta artigos foram publicados em revistas internacionais e nacionais e quase o mesmo número de papers sobre o tema foram apresentados em encontros de geografia e ciências humanas. Eles ainda atribuem a conferencia “The Place of Music” organizado pelo Instituto de Geógrafos Britânicos e as sessões especiais de geografia da música na Associação de Geógrafos Americanos, ambos realizados na primeira metade da década de 1990, como notáveis indícios da credibilidade da disciplina, considerada pelos mesmos com um subcampo da geografia cultural; essa credibilidade, segundo os autores, também foi corroborada pelas citações dos pesquisadores da área em atlas, enciclopédias, bibliografias, livros-textos de geografia humana e livros acadêmicos. Para Nash e Carney, o desenvolvimento e a expansão da geografia da música nas últimas décadas pode ser entendidos através de sete temas de interesse, encadeados temporalmente, quais sejam: a) origens – desenvolvido por etnomusicólogos e folcloristas, focados na distribuição de instrumentos musicais e regiões musicais; b) distribuições e tipos mundiais – os autores consideram que um dos trabalhos pioneiros foi o do próprio Nash quando da apresentação, no Encontro da União Geográfica Internacional em 1968, de mapas e análises de dezesseis atividades musicais:

“áreas da cultura musical global; zonas musicais; áreas de polifonias naturais; influxos musicais na Ásia e Europa desde a pré-história; trovadores dos séculos 12 e 13 e zonas de influência de notação neumática; centros musicais da Idade Média; centros religiosos influentes na difusão da música ocidental na Idade Média através do século 18; centros de difusão da polifonia ocidental nos séculos 15 e 16; viagens de Mozart, Handel y Bach; centros de atividades musicais dentro e fora da Europa ocidental; localização de órgãos nas principais igrejas da Europa”[14];

c) Análises Locacionais – localização das atividades musicais, como composições, viagens de seus compositores, notadamente abordagens em escala mais restrita, diferentemente da anterior, baseada em generalizações mundiais; d) zonas de origem das atividades musicais – aborda áreas de origem de ritmos ou cenas musicais e sua difusão, bem como o papel das músicas de caráter nacionalista na construção das identidades nacionais. e) tendências baseadas na eletricidade – os autores falam da importância da eletricidade – pode ser equivalente à 'eletrificação' no caso de instrumentos musicais – para a universalização da música popular, como o jazz, o rock-and-roll, gospel, folk e tantas outras formas que não poderiam ser acessadas sem os meios de comunicação como o rádio e a televisão, nem sem a eletrificação dos instrumentos; f) impacto nas paisagens – analisa (não só nas paisagens, como se deduz pelo título) o impacto da música no espaço através de fatores econômicos, turismo, acessibilidadeade e transporte, fatores políticos, formas culturais e implicações sociológicas; g) Musical Global – esse tema se foca desde guias de músicas do mundo, até as temáticas que ligam a música com aspectos da existência humana e sua relação com o mundo e com a natureza[15], notadamente abordando a música erudita. Por fim os autores adicionam um tema emergente, como consequência do tema “e”, citado anteriormente: inovações tecnológicas. Para eles o papel das tecnologias multimídia, como as rádios broadcasting de televisões a cabo e emissoras pioneiras em música como a MTV, seriam campos de interesse dos geógrafos. Na redação desse artigo os autores ainda não puderam incluir dois fenômenos tecnológicos muito recentes e que mudariam definitivamente o panorama musical no mundo: em primeiro lugar a popularização do acesso à internet e a criação dos arquivos MP3 – MPEG Audio Layer 3. Em segundo lugar, e completamente ligado ao item anterior, a popularização de equipamentos digitais, e a consequente proliferação de home studios16] e estúdios profissionais de pequeno e médio porte, barateando os custos de produção musical e multiplicando consideravelmente o número de novos artistas em circulação. Responsável por uma recente revolução no acesso e circulação da música mundial em concomitância com o progressivo desenvolvimento de tecnologias mais ágeis e rápidas de circulação de dados via Internet, o MP3 só iniciou a popularizar-se a partir de 1995, sendo 1997 um ano-marco quando do lançamento de vários sítios web especializados, como o mp3.com.

Carney[17] propõe também os temas em geografia da música em cinco divisões: 1) percepção – imagens de lugares, senso de lugar, percepção de lugar e consciência de lugar; 2) núcleos culturais e difusão cultural – agentes de difusão, processos, caminhos/trilhas e barreiras; 3) região cultural – formal e funcional, nós e centros; 4) interações espaciais – migração, conectividade, rotas e redes de comunicação; 5) relações homem-ambiente – ecologia cultural. Porém, como observam Nash e Carney, ao contrário de sua proposição mais atual[18], a anterior não tinha um caráter temporal e evolutivo em torno dos temas.

Uma renovação, em direção à abordagens mais críticas no estudo geográfico da música, pode ser pontuada com a conferência The Place of Music em 1993, organizado pelo Instituto de Geógrafos Britânicos, como citado anteriormente, e que redundou em um livro homônimo à conferência alguns anos mais tarde[19]. De fato, a conferência aparece em um momento de franca renovação da geografia cultural nos países de língua inglesa, levado adiante em grande medida por pesquisadores britânicos, e já passado mais de uma década desde o artigo “O supra-orgânico na geografia cultural americana” de James Duncan[20], onde o autor faz uma crítica à geografia cultural saueriana, e que é considerado um dos momentos mais importantes da virada cultural na geografia anglo-saxã. A obra The Place of Music reúne artigos de pesquisadores estadunidenses, canadenses e, sobretudo britânicos, do campo da geografia, da etnomusicologia, da história, dos estudos culturais, entre outros. Logo em sua introdução, seus organizadores tratam de expor a perspectiva da coletânea. Se opondo ao tratamento dado pela music geography de influência saueriana, como George Carney, Peter Nash, entre outros, os autores afirmam:

“o trabalho geográfico sobre música teve até pouco recentemente uma tendência de restringir-se ao mapeamento de difusão de estilos musicais, ou analisar o imagético geográfico nas letras de canções, trabalhando com um restrito deliberado sendo de geografia, oferecendo o ângulo de um geógrafo fincado ao chão, ao invés de se perguntar o quanto uma abordagem geográfica pode refigurar o próprio chão que pisa. Ao contrário, nós procedemos com uma compreensão que, ao injetar geografia na música, poderá produzir um efeito análogo a que David Harvey advoga na relação com a teoria social: “Ao inserir conceitos de espaço em qualquer teoria social, se produz um efeito de borrar/confundir as proposições centrais daquela teoria”. The Place of Music apresenta espaço e lugar não como simples locais onde a música é fabricada, ou de onde ele é difundida/ ao invés disso, diferentes espacialidades são sugeridas como formadoras do som. […] Considerar o lugar da música não é reduzí-la a sua localização, estabelecer um ponto exato no espaço, mas permitir uma abordagem rica em estéticas, culturas, economias e geografias políticas da linguagem musical”[21].

Opondo-se ao pouco aprofundamento teórico das proposições anteriores, que valorizaram grandemente a espacialidade em termos de localização e narrativas dos lugares – o que na visão dos autores se configura com um senso restrito de geografia – Leyshon et al se colocam no campo das abordagens críticas, valendo-se, por exemplo, da economia política da música de Jacques Attali, da geografia radical de David Harvey ou dos estudos culturais de Paul du Gay. A obra segue com autores abordando temas como identidade, redes de músicos e hibridismos, universos transglóssicos na música popular, políticas culturais para a música, indústrias da música, entre outros.

Nesta corrente de estudos é que ganhou notoriedade a geógrafa singapurense Lily Kong e sua tese de doutorado sobre música, políticas culturais, identidade e globalização em Singapura. Kong foi uma das primeiras que se tem notícia que trouxe para o debate teórico da geografia[22] – já nesta fase de renovação – a formulação de uma análise geográfica da música popular[23]. Kong afirma que, como interesse geográfico, a música não foi explorada largamente e os estudos publicados até então mantiveram uma distância das questões teóricas e metodológicas da geografia cultural renovada. Afirma Kong: “A maioria das pesquisas geográficas em música popular (de agora em diante, música) não foi, durante um longo tempo, nem teoricamente nem metodologicamente sofisticadas. A agenda de pesquisas reflete largamente um interesse em geografia cultural segundo tradição da escola de Berkeley”[24].

Kong afirma que aquele campo anterior de estudos pode ser dividido em cinco áreas principais: a) a distribuição espacial das formas, atividades e personalidades musicais; b) os musical hearths e difusão, usando conceitos como 'contágio', 'relocalização' e 'difusão hierárquica', e ainda examinando os agentes e as barreiras da difusão; c) regionalização de tipos musicais em diversas escalas; d) identidade dos lugares através de letras, melodias e instrumentos; e) por último temáticas que exploram os conceitos de ambiente/ambientação na música – imagens da cidade, paisagens etc. Embora reconhecendo a importância de tais estudos, principalmente para trabalhar com conceitos geográficos como “fonte cultural, difusão cultural, vetores de difusão e percepção ambiental, bem como narrativas de imagens de distintos lugares[25] a autora identifica que a orientação de tais estudos falhou em pelo menos quatro aspectos: em primeiro lugar foi a falta de contextualização social e política no qual a música era produzida; segundo, não se reconheceu a construção social da natureza do espaço e da experiência de lugar, tampouco considerou-se o papel da música nessa construção; terceiro, houve pouca atenção para a música enquanto consumo e, neste processo de consumo, as consequentes transformações da mesma; em quarto, e último lugar, negligenciou-se a contribuição da música na construção social das identidades nacionais, de gênero, raça, classe etc. Em seguida a autora afirma que a ênfase nos estudos em geografia cultural renovada da última década proporciona uma nova agenda para o estudo geográfico da música, com pelo menos cinco eixos: a) a análise do simbólico, do significado e dos valores; b) música como comunicação cultural; c) políticas culturais da música; d) economias musicais ou da música; d) música e a construção social das identidades. Dentre os métodos de análise para dar conta de tais proposições, Kong destaca a análise de conteúdo das letras, os “intertextos” (vídeos, materiais promocionais etc.), a análise da estrutura e estética da tonalidade das canções, entrevistas com produtores, músicos e compositores, a observação participante e a integração entre dados quantitativos e qualitativos. Em artigos posteriores, Kong[26] explora a construção das identidades locais e dos processos de transculturação em Singapura através da música popular, expondo sua tese no sentido de que “apesar de um mundo com tendências globalizantes, as fronteiras não estão inteiramente apagadas. De fato [...] onde o cruzamento de forcas globais é mais forte, a afirmação do local é maior, concomitantemente”[27].

Alguns anos depois da renovação no campo da geografia da música, nos países anglófonos, o reconhecimento das propostas de Kong e outros autores, é expresso em um verbete do Oxford Dictionary of Human Geography:

Uma série de idéias para a ampliação da agenda das geografias da música é apresentada por Leyshon et al. (1995, 1998) e Smith (1994, 1997). Foi argumentada que a música oferece uma crítica útil às ideologias visuais da disciplina; que a música popular adiciona uma nova dimensão à geografia das políticas culturais, e à construção social das identidades, em particular Kong (1995); também que há uma geografia econômica da música que amplia nossa compreensão das relações entre acordos/negociações globais e locais, e que lança luz sobre o processo de regeneração urbana (Cohen, 1991; Hudson, 1995)”[28].

Analisando atualmente alguns dos principais periódicos de geografia do mundo anglófono, é possível visualizar um fértil panorama dos estudos da música em geografia, com bom número de geógrafos trabalhando nessa perspectiva – em muitos dos casos relacionados com a agenda que Kong propusera – tais como Anderson, Morton & Revill[29], Connel & Gibson[30], Finn[31], Florida & Jackson[32], Gibson[33], Hogan[34], Hudson[35], Jazeel[36], Kearney[37], Kingsburry[38], Kruse[39], Revill[40], Saldanha[41], entre outros. Em geral nesses trabalhos, e seguindo a tendência da geografia cultural anglo-saxônica, o binômio “space and place” continua sendo o mais utilizado para os estudos que envolvem geografia e música.

 A perspectiva francesa: o território no centro das geografias da música

Embora as bases de dados de teses e dissertações na França sejam heterogêneas, de difícil acesso, e de certa forma incompletas[42], foi possível visualizar alguns trabalhos, que serão comentados a seguir, juntamente com os artigos encontrados. Como comentado anteriormente, o interesse da geografia francesa pela música, ao contrário da anglo-saxã, teve um hiato de várias décadas. Se os artigos pioneiros do tema são atribuídos a Gironcourt, os próximos textos encontrados que retomam a discussão - já com propostas renovadas - datam da década de 1990. Nesse sentido, vemos em Lévy[43] uma retomada com interessantes observações teóricas e filosóficas ao tema. Em seu artigo, Lévy usa o panorama musical erudito europeu para contextualizar seus distintos desenvolvimentos, seus condicionantes políticos e culturais e as difusões de inovação musical por seu território. Afirma o autor: “Os espaços musicais são geralmente complexos, pois possuem uma componente social (a geografia 'setorial' da música) e um componente societal (as relações que este tipo de atividade mantém com o resto da vida social)”[44].

Analisando os processos sociais-políticos-econômicos que contribuíram para uma cena de vanguarda musical na Viena dos inícios do séc. XX, caracterizada pela atonalidade, Levy afirma que a questão da identidade de um território e de suas manifestações artísticas tem a ver com o cruzamento de distintas espacialidades: “Nos deparamos com interfaces complexas entre redes e territórios, entre diferentes regiões, sobrepostas parcialmente, e suas co-espacialidades – a posição de metrópole imperial, a relação Viena-Europa Oriental, ou a cultura alemã, passando pelo império austro-húngaro na Europa central”[45].

A observação de Levy é importante, pois aborda uma questão que não só aos inícios do século XX, como tratado no artigo, mas sobretudo hoje expressa cada vez mais a condição contemporânea do espaço, onde diversas espacialidades e territorialidades se entrecruzam.

Jöel Pailhé[46], por sua vez realiza um estudo da territorialidade do Jazz e das desigualdades do território em tempos de mundialização. O artigo, rico em coremas e em mapas de fluxos e distribuições mundiais do ritmo musical, se oferece como um bom exemplo em que a valorização da representação cartográfica no estudo da espacialidade/territorialidade dos fenômenos musicais pode ser aliada com proposições teóricas críticas. Anos mais tarde, Pailhé, numa direção semelhante a de Levy, aborda os processos identitários na Europa central (Hungria e países tchecos) e suas características particulares no contexto europeu[47]. Ao final o autor realiza uma cartografia das “metrópoles musicais” da região, bem como seus centros de criação musical, os lugares de memória da música e os fluxos de migração de músicos para outras regiões. Além disso o autor discute a postura diferenciada da região frente a outros centros culturais europeus (como Paris, Berlim e Londres) e aborda o papel desta na contribuição à manifestação da modernidade na Europa.

Romagnan[48], por sua vez, advoga pela música como um novo campo de estudos para a geografia. O autor não remonta o interesse até à época de Gironcourt, mas sim aos artigos seminais de Lévy e Lechaume[49], à abordagem cultural de Paul Claval e Pierre Augustin, e defende o diálogo da ciência geográfica com a sociologia da música e a etnomusicologia. Romagnan introduz alguns aspectos importantes da música como uma atividade de grande importância cultural e social, explica a contribuição de sociólogos, antropólogos e etnomusicólogos, e insere a idéia da atividade musical como um geo-indicador do território ao abordar temas como política culturais, música e espaço público, sistemas de produção dessa atividade, uso dos lugares de práticas musicais e seus significados, entre outros temas.

Calenge, também enfocando o território, porém em sua dimensão econômica, discute as redes da indústria musical[50]. O autor afirma que a geografia econômica deu pouca atenção ao campo das indústrias culturais e, portanto, pouco contribuiu para a criação de uma geografia econômica da cultura ou cultural. Em primeiro lugar, afirma o autor, as indústrias culturais e de multimídia representam uma importante fatia da produção do valor agregado das sociedades ditas “pós-industriais”. Em segundo lugar a reflexão econômica e geográfica da produção cultural permite testar e questionar os modelos estabelecidos pela geografia dos sistemas de produção. "Em outras palavras" afirma Calenge "nós podemos usar o exemplo da indústria da música como um testemunho da informatização da economia e da vida social”[51]. O autor defende ainda que a indústria da música suscita alguns questionamentos para o geógrafo:

Podemos definir um modelo espacial próprio das indústrias culturais? As indústrias culturais são sensíveis aos efeitos de proximidade? Quê modelo (distrito, sistema local de produção, sistema regional etc) descreve melhor a organização espacial da produção de uma indústria cultural? […] Como o espaço intervem na introdução de inovações que estão afetando a indústria da música? O advento dos downloads música em formatos digitais afeta a geografia clássica da distribuição e do consumo de música por sua nova forma de fonograma ou será que por sua lógica geográfica?”[52].

Calenge, ao analisar as diferentes redes envolvidas no campo da indústria musical (rede de criação, rede de reprodução, rede de distribuição e rede de consumo), estabelece seu funcionamento interno e a relação das redes umas com as outras. Analisa também a relação da França no contexto das grandes produções mundiais, o impacto do MP3 nas gravadoras globais e as recomposições/reorganizações destas frente às mudanças contemporâneas. Ele propõe adiante um esquema coremático da organização da indústria musical em Îlle de France e discute as inovações técnicas e econômicas dentro de cada uma das redes supracitadas, bem como as consequentes disputas e recomposições no território.

Lamantia trata dos efeitos territorializantes do sons, em especial dos muzaks[53] (músicas de ambiente, comuns em supermercados e lojas). O autor afirma que esses muzaks longe de serem sons “neutros”, são estrategicamente pensados para os momentos de consumo, junto com fragrâncias e perfumes. Segundo Lamantia:

“A presença do “musak” contribui para aumentar as vendas. Este processo tem sido melhorado constantemente e completado pela difusão de fragrâncias sintéticas – lavanda, lírio, pêssego... tudo está cuidadosamente pensado, organizado. O “musak” muda com frequênca e participa da identidade dos grandes magazines. Emitido em um nível de decibeis calculados para não aborrecer os consumidores, este “musak” é todo original [...]”[54].

Dessa forma, o autor aborda a não-neutralidade na escolha da música destinada aos espaços de consumo e o progressivo desaparecimento da paisagem sonora espontânea dos lugares. Poderíamos pensar a partir das observações de Lamantia o papel que cada tipo de música tem em cada espaço. Muzaks como o jazz, o blues e a música popular de alto padrão poderiam nos indicar os lugares de seletividade sócio-econômica e de distinção social, nos termos de Bourdieu, assim como outros lugares, de características mais populares, expressariam-se musicalmente (ou muzakmente) de outra forma.

Goré em sua tese doutoral aborda a música no plano das manifestações tradicionais – a música e a dança – e sua importância para a constituição territorial e identitária na região da Bretanha, norte da França. Conforme o autor, a reflexão de sua tese

“leva em conta uma prática musical que reivindica o território, em ocorrência na Bretanha. Essa opção metodológica deixa de lado a grande parte das práticas musicais em Bretanha que não clamam por nenhum caráter bretão, para analisar a relação entre a criação musical e o território. Para revelar a dimensão espacial de uma prática popular regional na Bretanha, nosso enfoque geográfico da música popular é mostrar como uma prática musical pode contribuir a uma valorização do território”[55].

Trata-se então, nesta abordagem, de mostrar a música como uma prática cultural de valorização-recuperação-recomposição do território. Da mesma forma que Goré, Leroux também aborda em seu artigo a questão da dança e da música tradicional no norte da França, contemplando semelhante enfoque territorial[56].

Na sistematização e na organização desse campo de estudos na França, vemos Yves Raibaud (juntamente com Claire Guiu) como importante nó articulador de colóquios, edições temáticas em periódicos[57], coletâneas de artigos[58] e reflexões empíricas e teóricas[59] para o uso da música com interesse geográfico, com considerações também na interface com o gênero. Raibaud, ao fazer um balanço das publicações mais contemporâneas em geografia e música na França, afirma que o geógrafo pode estudar a música e as práticas musicais como geo-indicadores da organização dos lugares e as políticas culturais da música como forma de gestão territorial. Na opinião deste geógrafo, isto ajudaria a construir um conhecimento mais detalhado dos territórios e ajudaria a sociedade a compreender como ela se apropria do espaço e o transforma. De todos os modos, afirma Raibaud, “a música aparece como uma realidade cognitiva possível para compreender o espaço das sociedades, inclusive como um princípio de organização territorial”[60]. O artista, para esse autor, é um portador da cultura coletiva e seus significados espaciais, mas ele pode alterá-los também: “se pode considerar desde esta perspectiva que a música é parte da esfera ideacional (Godelier, 1992), na qual o homem tem a capacidade de construir o mundo material que o rodeia com idéias, e por extensão e por aquilo que nos interessa, com a linguagem e objetos musicais”[61]. Para Raibaud a música “borra os mapas: sua fluidez se adapta à organização em redes, conexões, ramificações (Amselle, 2001), a música se multiplica com as tecnologias da informação e da comunicação”[62]. O autor propõe finalmente cinco formas de estudar a relação música-espaço. Primeiro a música como indicador geográfico, um elemento para descrever e decifrar realidades espaciais. Conforme o autor “captar o universo sonoro dos espaços permite escapar da tirania do mapa e da ditadura das imagens”[63]. Em segundo lugar temos a música como um vetor em movimento entre escalas e são sensíveis às composições musicais e aos instrumentos que usa; o uso de instrumentos como a guitarra espanhola e a percussão africana na música bretã atual, por exemplo, joga com referências múltiplas de tempo/espaço. Em terceiro lugar a música aparece como um fixador das adesões territoriais, ou seja, ajuda a criar laços entre os indivíduos e o território, sejam esses laços mais efêmeros ou mais duradouros. Em quarto lugar a música se configura como um construtor de imagens regionais; a regularidade da repetição em um mesmo lugar se inscreve na materialidade. Podemos pensar aqui em casas de apresentações dedicadas à determinados tipos musicais, ou mesmo o nexo estabelecido entre um ritmo e um território ou paisagem – seria o caso da milonga no Pampa, do candombe nas ruas de Montevidéu, do flamenco na Andaluzia ou da bossa nova no Rio de Janeiro. Em quinto lugar, diz o autor, a música aparece como um modo de governança territorial. Ela revela também ser um dos recursos políticos usados por aqueles que foram excluídos da política tradicional. Ela pode servir como ferramenta para o desenvolvimento cultural e territorial em áreas fragilizadas, ajudando a recompor o território e sua população.

Guiu também possui importantes contribuições para o estado da arte do campo de estudos, tendo organizado a primeira edição temática dedicada ao tema no periódico Géographie et Cultures[64], fundado por Paul Claval, além da organização de uma edição especial da revista La Géographie[65]. Guiu trabalha também na perspectiva dos fenômenos de folclorização e patrimonialização de práticas culturais, bem como suas relações com o território[66].

Em termos institucionais, atualmente, há pelo menos quatro UMR’s (Unité Mixte de Recherche) vinculadas ao CNRS que, valorizando o papel da música no campo dos estudos territoriais, acolhem doutorandos, desenvolvem pesquisas e organizam eventos na interface entre geografia e o fenômeno música. São elas: ADES[67] e TIDE/EEE[68], ESO[69] e PACTE[70], situados nas universidades de Bordeaux, Rennes e Grenoble, respectivamente

Encerramos essa seção, chamando a atenção para a síntese que Raibaud[71] faz dos trabalhos mais contemporâneos na França, e que revelam uma característica bem marcante daquele contexto. Para o autor se pode constatar que as noções de território e espaço aparecem em todos os autores citados anteriormente[72] como elementos importantes para compreender a permanência ou emergência das formas musicais, identificar os lugares e as fronteiras que os separam, interrogar as representações que formam os imaginários territoriais, projetar no espaço processos de mestiçagem ou hibridação. Seu denominador comum, diz o autor, é considerar a música como um construto cognitivo que permite apreender um fenômeno espacial.

Dessa forma, verifica-se que muito embora o interesse da geografia francesa pela música seja recente, os trabalhos contemporâneos mostram-se bem organizados e têm no território, em suas diversas abordagens, a sua principal categoria de análise geográfica.

Alguns estudos europeus e latino-americanos

Não só nos países anglófonos e francófonos houve contribuições da geografia no estudo da música. Nota-se que, mesmo em menor escala, visualizam-se abordagens interessantes no restante da Europa e na América Latina.

A geógrafa espanhola Mercedes Arroyo, iniciou uma discussão sobre geografia e música e até hoje permanece sendo um dos poucos textos de ampla divulgação disponível naquele país. Arroyo procede com a intenção de compreender

“Que conjunto social de representações socialmente determinadas subjazem nas imagens transmitidas pelas obras musicais, posto que acreditamos estar em condições de afirmar que em muitas delas é possível rastrear os elementos que formam o enredado da consciência – interdependentes em diversos graus do contexto social, político, econômico e tecnológico – sobre o qual elaboramos consciente ou inconscientemente nossas categorias ou sistemas de valores”[73].

Arroyo afirma que a música, por possuir superior comunicabilidade à linguagem verbal, resulta ser facilmente compreendida coletivamente, sendo usada para legitimar racionalmente uma ordem social - objetivo de toda ideologia, segundo a autora. Assim ela analisa a Gran Música, dirigida à burguesia culta, o canto coral como veículo das representações moralizadoras da classe média e a Zarzuela, expressão das classes populares urbanas. A geógrafa chama a atenção que a música é “uma parte importante do sistema cultural e se acha impregnada da ideologia que subjaz no conjunto de ideias e representações que tendem a reprodução do sistema e que cumpre a função de veículo para sua expressão[74]”. A reflexão de Arroyo é importante pois trás os contextos musicais envolvidos em cada camada social da sociedade espanhola em um dado período histórico, a saber, os séculos XIX e início dos XX.

No restante da Europa também encontramos outros trabalhos igualmente importantes, revelando diversidade de interesses. Na Itália, Bettinelli analisa em sua tese doutoral a cena musical e a cidade de Bologna desde uma perspectiva da geografia humanista, com forte enfoque na paisagem[75]. Na Alemanha, Adamek-Schyma, em sua dissertação de mestrado, estuda a cena da música eletrônica em Colônia, as relações desta com os movimentos globais e a produção de lugares por meio da cena musical[76]. Outra publicação alemã, organizado por Bödeker et al, em versão trilíngue, traz uma coleção de textos de ciências humanas e sociais voltados ao estudo dos espaços e lugares de concerto na Europa entre 1700 e 1920 . Em Portugal, Sarmento, em uma perspectiva da geografia do turismo, analisa os festivais de música e sua potencialidade de se constituírem como políticas locais de atividade cultural[77].

Na América Latina, excetuando-se o Brasil, poucos trabalhos são encontrados, a partir de buscas pela Internet em bases de dados acadêmicas. Silvia Valiente, antropóloga e professora de geografia na Universidad Nacional de Córdoba, aborda o cancioneiro folclórico do norte argentino, nas províncias de Salta e Santiago del Estero, e seus discursos de identidade territorial na interface da geografia cultural com os estudos culturais latino-americanos. Segundo a autora a sua análise

“Articula as categorias de narrativa e representações. [...] o cancioneiro folclórico é considerado um tipo de narrativa, noção tomada da antropologia que se refere a representações-construções de eventos passados no qual os narradores intertextualizam elementos provenientes de diferentes discursos ou diferentes épocas, elaborando um novo discurso (Pizarro, 2006) [...]. Assim, o cancioneiro folclórico entendido como um tipo de narrativa, dá conta de práticas sociais que fundam relações sociais, as que por sua vez se expressam como representações”[78].

Trabalhando na perspectiva da análise de discurso, Valiente selecionou obras que tinham identificação com o território, realizou análise de conteúdo “centrada no nível semântico ou análise temática do cancioneiro[79]”, analisou os sentimentos compartilhados pelos artistas escolhidos, interpolou níveis de identificação e categorias. A autora critica, por fim, a naturalização dos discursos folclóricos:

O cancioneiro essencializa o território e seus agentes sociais, tira-os de seu contexto histórico-social com a finalidade mostrar o típico. Desta maneira não dá conta como as especificidades locais se sedimentam com novos elementos procedentes da modernidade reflexiva em que estamos imersos. Portanto, o cancioneiro analisado exclui os agentes sociais destes territórios da modernidade, e os coloca como que vivendo em outro espaço e tempo”[80].

No Mèxico, Burgos[81] realiza um estudo da expressão musical na região da Huasteca Potosina, travando um diálogo da geografia com a antropologia e a etnomusicologia. A autora explana sobre usos e funções da música no cotidiano, nos festejos e cerimonias religiosas, bem como a construção de referências geográficas na música a partir do mundo vivido.

Rodó realiza uma crítica das teorias de clusterização econômica, onde as idéias de aglomeração geográfica na indústria criativa assumem uma idéia de cenários estáticos[82]. O autor, usando o exemplo da cena de música experimental em Santiago do Chile, mostra como esse tipo de indústria criativa possui uma espacialidade distinta, com práticas múltiplas, móveis e eventuais, que não são apreendidas pelas teorias econômicas de análise locacional tradicionais. Dessa forma, Rodó chama a atenção à complexidade das espacialidades musicais contemporâneas, que se expressam como espacialidades fluídas, e sua necessária análise sobre outras bases teóricas e metodológicas.

Geografia e música no Brasil: pluralidade de interesses

No Brasil, poucas, mas importantes, pesquisas foram realizadas na interface da geografia com a música. Elas demonstram uma heterogeneidade de abordagens, usando a música para trabalhos de caráter humanista e abordagens culturais renovadas, ou de enfoque econômico-social, ou como ferramenta para sala de aula. Em termos conceituais, também, encontramos diversidade nas abordagens, ora focando-se na paisagem, ora no espaço geográfico, ora na região, ora no território. Será exposto, nesta seção, todas as dissertações e teses relacionadas no banco de teses e dissertações da CAPES, e alguns artigos encontrados durante nossa busca.

Teses e dissertações no Brasil

Se bem é verdade, como pontua Kong, as contribuições na Geografia anglo-saxônica para o campo na música careceram até a década de 1990 de um conceitual teórico e analítico de acordo com as reorientações na Geografia cultural e social, o mesmo não se pode afirmar dos trabalhos realizados no Brasil. No Brasil, desde a sua introdução, no início da década de 1990, e já influenciados pela renovação teórica no estudo em espaço e cultura, os trabalhos se caracterizam entre abordagens da Geografia Humanista, Cultural renovada e Social; ou seja, a perspectiva da Geografia Cultural saueriana não se mostrou presente nos estudos brasileiros desde o início da introdução da música como interesse geográfico.

Considera-se que João Baptista Ferreira de Mello tenha sido o precursor do tema na geografia brasileira, com sua dissertação defendida na UFRJ em 1991. Ao contrário da literatura e da pintura, largamente tratadas pela corrente da geografia humanista, como Yi-fu Tuan, Anne Buttimer, Antoine Bailly, Joan Nogué, entre outros, o uso da música não suscitou interesse detalhado naquela corrente, embora seu valor não tenha sido negligenciado[83]. João Baptista Ferreira de Mello pode ser considerado, então, um dos precursores do tema na abordagem humanista, uma vez que sua dissertação é uma dos únicos trabalhos de sua época efetivamente encontrados até o momento[84]. É a partir de alguns dos autores citados acima e outros como David Seamons, David Ley e Douglas Pocock, que Mello se inspira para interpretar a cidade do Rio de Janeiro sob a ótica de seus compositores, no período de 1928 à 1991. Mello afirma que

A literatura tem sido pródiga em mostrar os diferentes modos de vida e o processo de entendimento, podendo ser, até mesmo, uma maneira de se conhecer os lugares. Os geógrafos podem aprender com os escritores, poetas e – sustenta-se neste estudo – compositores, sem a necessidade de aplicar inquéritos […] Cabe, então, aos geógrafos analisarem esse material, já pronto, um meio eficaz de investigação, a respeito dos lugares, tradições religiosas, motivações migratórias e contraste espaciais”[85].

Sendo assim, Mello trabalha na perspectiva da canção como uma “literatura musicada”; portanto, sua dissertação utiliza amplamente a perspectiva dos trabalhos literários, considerando o texto da canção como foco. Seu método, por conseguinte, trata as canções como um dado primário de sua investigação. Assim, o geógrafo agrupou experiências vividas pelos compositores no Rio de Janeiro, como um reflexo do homem comum que vive na cidade e que expressa, através de canções suas percepções sobre os lugares de moradia, trabalho, lazer, as ligações físicas – afetivas, o lugar de identidade e amizade, os espaços de segregação, de transformação da natureza, as memórias e fantasias, entre outros temas. Mello destaca ainda o papel da geografia humanista, capaz de valorizar a experiência do ser humano cotidiano e sua importância para o trabalho geográfico e social. Em outra oportunidade[86]. Mello realiza o estudo da geografia da Grande Tijuca, usando duas abordagens: aquela dos lugares centrais, largamente usada na geografia, e as representações da Grande Tijuca por meio da oralidade e das canções.

Em 2001, quando o trabalho de Mello completava uma década, uma tese e uma dissertação são defendidas. Glauco Vieira Fernandes publica sua dissertação de mestrado na Universidade Estadual do Ceará; o autor trata da territorialidade sertaneja a partir da obra de Luiz Gonzaga. Para Fernandes a arte é uma “dimensão cultural preponderante na representação imagética de um povo. O sertão de Luiz Gonzaga é um exemplo. Seu canto e sua musicalidade recriam uma possibilidade de conhecimento geográfico[87]”. Para o autor, a territorialidade sertaneja e nordestina está particularizada no compositor; sendo assim “as atividades do cotidiano do sertão, o lúdico, o modo de habitar, entre outras, compõem a paisagem do espaço sertanejo, portanto bem representada e recriada na obra de Gonzaga[88]”. Tratando de maneira particular na questão relativa ao migrante nordestino em direção ao Sudeste brasileiro, Fernandes mostra como a música de Gonzaga traz consigo as representações sociais do sertanejo e a construção de sua territorialidade nesse contexto.

No mesmo ano, 2001, Nélson Nóbrega Fernandes trata em sua tese de doutoramento das escolas de samba do Rio de Janeiro. A obra de Fernandes é importante, não só por ser a primeira tese em geografia que aborda o tema, mas também porque trata a escola de samba em termos de instituição cultural. O autor mostra de que maneira os grupos populares deslocaram de cena as classes superiores da sociedade que dominavam a festividade do carnaval, por meio das escolas de samba – organizada pelos grupos sociais de subúrbios, favelas e bairros populares do Rio de Janeiro. Nesta obra, o geógrafo carioca refuta uma tese corrente sobre a domesticação das massas pela elite e também relativiza as ideias de esquerdismo na década de 1960 sobre a cultura popular como resistência ao poder e ao domínio capitalista. O próprio autor afirma que seu trabalho descreve “[a] trajetória destas instituições festivas, constatando que os sambistas - sujeitos celebrantes – agiram conscientemente e com relativa autonomia no sentido de fazer aderir o ritual de seus cortejos carnavalescos - objetos celebrados - ao imaginário da identidade nacional brasileira, numa estratégia de ganhar legitimidade política e cultural para as suas práticas festivas”[89].

É assim que o autor se dispôs a estudar a gênese, a formação e consagração das escolas de samba no contexto do carnaval do Rio de Janeiro. Por isso, valorizou a origem de tais associações, o processo de construção identitária, as disputas com modelos concorrentes e por fim oficializar-se como um símbolo nacional, em um período que vai de 1928 a 1949. O objetivo de Fernandes não é focar a música em si, mas mostrar o papel das instituições culturais e dos grupos sociais – no caso as escolas de samba nos subúrbios e periferias – que acabaram por consolidar um gênero musical, o samba, aliado a uma festividade, o Carnaval, que por fim se tornarão duas das maiores representações da identidade nacional brasileira.

Nilo Lima discute, no ano seguinte (2002), em sua dissertação defendida na USP, os diferentes usos do território no contexto do evento musical, com foco no município de São Paulo[90]. Encontramos nesta dissertação o primeiro esforço de reconhecimento e delimitação do campo de estudos entre geografia música. Na primeira metade do trabalho, o autor mapeia as produções geográficas naquele momento, por níveis de ensino, mostrando artigos e projetos de pesquisa e extensão. Também faz um breve reconhecimento da discussão acadêmica em geografia e música, apresentando o livro “The Place of Music” e artigos de Jaques Lévy, citados anteriormente. Em seguida, o autor reflete sobre o fenômeno musical e a cultura, a partir das categorias “lugar” e “evento” na obra de Milton Santos. Na segunda parte são apresentadas as relações entre indústria cultural e Estado, analisa a política cultural em São Paulo entre 1989 e 1992, e o papel das normas na regulação do uso do território, como a LDA (Lei de Direito Autoral) e o ECAD (Escritório Central de Arrecadação e Distribuição). Na terceira parte o autor aborda as formas de uso e as novas formas de solidariedade no território a partir da música, baseando-se sobretudo na obra de Milton Santos e sua abordagem para uma geografia cidadã.

Partindo de uma abordagem entre a geografia humanista e as teorias pós-modernas, Cláudia Regina Vial Ribeiro propõe o conceito de “espaço-vivo” em sua tese doutoral[91], defendida na PUCMG em 2006. Ribeiro se propõe a compreender alguns referenciais com os quais são construídas as significações de lugares vitalizados, que a autora chama espaços-vivos, ou seja, seu objetivo é identificar as referências mais relevantes ao espaço que o qualificam como vivo. Para tanto, a autora escolhe a cidade de Diamantina como contexto e os músicos da cidade como sujeitos, com os quais realizou entrevistas, além de análise do conteúdo das suas canções. A autora mostra as narrativas dos músicos/compositores juntamente com mapas e esquemas relacionados ao patrimônio histórico, à reestruturação urbana, aos rituais e festas, entre outros. Através disso Ribeiro propõe uma série de características que indicam a existência dos espaços-vivos, ou seja, o espaço da cidadania e do bem-estar da população, onde ocorre o encontro, a presença da natureza no quadro paisagístico, as trocas físicas e visuais entre espaços públicos e privados, os lugares da memória da cidade – em contraposição ao espaços-não-vivos, aqueles do confinamento, da segurança em excesso, das relações impessoais, dos pastiches/simulacros, etc.

Analisar as estratégias territoriais presentes no movimento Hip Hop da cidade do Rio de Janeiro, e suas relações com a política e a cultura, é do que se trata a dissertação de Denilson Araújo de Oliveira, apresentada igualmente em 2006 na UFF. O trabalho, que incorpora e aprofunda seu trabalho monográfico de graduação, apresenta na primeira parte a base conceitual e teórica do trabalho, focada na mundialização da cultura, na identidade e no território. Em seguida, Oliveira contextualiza a cultura Hip Hop no mundo globalizado, propondo-o como uma cultura política negra e essencialmente globalizada, uma vez que ela possui na sua gênese a condição diaspórica do negro, sobretudo em direção do continente americano, sendo observada nos Estados Unidos, no Brasil, no Haiti entre outros. Por fim o autor analisa as territorializações do Hip Hop no Rio de Janeiro, observando que diferentes estratégias territoriais identitárias se manifestam em diferentes arenas políticas, que chama de arenas geográficas - ou seja, uma arena política que envolve uma base territorial[92].

A dissertação de Alexandro Francisco Camargo, defendida em 2008 na UFMT, aborda a rave – festas de música eletrônica - a partir da geografia psicológica, que analisa o território do ponto de vista subjetivo. Sua análise concentra-se em responder se as raves configuram-se ou não como uma Zona Autônoma Temporária – TAZ[93], conceito criado pelo escritor anarquista Hakim Bey, para designar espaços de resistência e libertação, que fogem ao controle estatal. Segundo Camargo no “imaginário social recriado pela cultura jovem, as festas rave tem um caráter de liberdade[94]”; completa ainda que “é na rave que o frequentador se encontra consigo mesmo e se desconecta da matriz do controle e da disciplina[95]”. “Por outro lado”, afirma o autor,

“o controle que as autoridades impõem sobre a população, e que a população impõe sobre si própria, modificou a maneira de ver esse “estilo de vida”. […] As raves hoje, no Brasil, se transformaram em mais um sistema disciplinar e de controle, não apenas pelos convites pagos e numerados por lotes, mas pelo modo como são pensadas e concebidas: as luzes negras e pulseiras para identificação de convidados e aferição de convites, a segurança, a iluminação intensa como modo de vigilância. Toda sua estrutura, divulgação e organização têm um propósito disciplinar pré-determinado”[96].

Dividido em três partes principais, Camargo apresenta inicialmente seu referencial teórico com foco na geografia psicológica de Georges Hardy e na abordagem geográfica das festas. Em seguida expõe o contexto histórico mundial e brasileiro das raves. Por fim discute as raves em Cuiabá/MT, diversos aspectos – enquanto produto da indústria cultural, local de uso de psicoativos, lugar de socialibilidade e construção da identidade e também as tecnologias de controle envolvidas. O autor, contextualizando os frequentadores, interpretando os questionários realizados, compreendendo a rave em suas amplas dimensões, conclui que “só porque a prática da rave pode prover uma liberdade de certas práticas regulatórias mais amplas do dia-a-dia […] isso não significa que ela constitua necessariamente um espaço desregulado, uma TAZ”[97].

Assim como Nélson Fernandes faz com o samba e o carnaval, porém com outra abordagem, Camargo liga a manifestação festiva da rave com o gênero musical eletrônico, mostrando assim como são duas instâncias de uma mesma manifestação cultural – elas estão inextricavelmente relacionadas.

Quais são as territorialidades geradas pelo samba na cidade de São Paulo? É a pergunta-chave da tese de Alessandro Dozena, defendida na USP em 2009. O autor estudou a dimensão espacial e o uso do território pelo samba, tanto na sua expressão mais comercial como na expressão popular do cotidiano. Dividindo a tese em três partes, ele se propôs à “compreender alguns processos pelos quais o samba estabelece territorialidades por meio de práticas sociais e representações subjetivas que tornam São Paulo uma cidade capaz de “convidar” os indivíduos à realização humana por meio da integração com o samba, que permeia todas as suas regiões; faz-se necessário perceber os significados dos territórios demarcados pelos sambistas e como se dá a interação dos sambistas com esses territórios”[98].

Na primeira parte, seguindo a compreensão de Milton Santos, em periodizar os sistemas de ações e objetos, o autor faz a leitura de distintos momentos da constituição do samba na cidade de São Paulo. Neste sentido, realiza-se uma leitura das transformações na cidade e a relação do samba com estas transformações, periodizando a dispersão desta expressão pela cidade, bem como a fundação das escolas de samba. Entre outras análises, o autor relaciona a localização das escolas de samba com as classes econômicas predominantes nos bairros, com vistas a demonstrar diferentes estratos sociaisenvolvidos na produção do samba na cidade. Mostra também dois bairros estudados de forma mais detalhada, como o Peruche e o Bexiga, e suas territorialidades do samba. Na segunda parte, Dozena trata da dimensão cultural do mundo do samba; nesse sentido ele trabalha na perspectiva de que “as práticas de samba na capital paulista possibilitam cada vez mais a configuração de contraespaços dentro das ordens sociais majoritárias; desafiando o poder estabelecido [...][99]”. Trata também do papel da corporeidade nas territorializações urbanas e dos movimentos de samba na cidade. Na terceira parte o autor trata da dimensão política e econômica do samba, abordando temas como as negociações políticas, a geração de empregos e renda, e a criação de um território especializado para as produções das escolas de samba do grupo especial. Sendo assim, para compreender as relações do samba na cidade de São Paulo, Dozena procedeu com periodizações, estudo das territorialidades por meio das dimensões cultural, econômica e política, consideração da coexistência de manifestações de caráter popular e espontâneo com outras mais elitizadas e comercias, demonstrando a complexidade do tema e as diferentes formas de uso do território a partir do samba.

A dissertação de Michel Rosadas, defendida em 2009 na UERJ, segue na linha da geografia humanista do orientador e precursor no estudo da geografia e da música no Brasil, João Baptista Ferreira de Mello. Rosadas propõe a metáfora de um “Rio Musical”, na cidade do Rio de Janeiro, sendo suas cabeceiras os bairros de Cidade Nova, Praça Onze e Estácio de Sá, e o bairro Vila Isabel como sendo um dos afluentes desse “Rio”[100]. O autor segue no interesse do samba na Vila Isabel, estudando a construção da identidade deste recorte espacial, através de entrevistas, registros históricos, canções, mapeamento de lugares importantes dessa manifestação musical. Dividida em três partes, a dissertação apresenta em primeiro lugar uma capítulo dedicado à discussão teórica sobre a geografia humanista, apontando a categoria “lugar” como chave para a compreensão da experiência vivida, bem como valorizando as fontes poéticas na abordagem humanista. Na segunda parte, Rosadas apresenta as transformações urbanas do Rio de Janeiro no início do século XX, com a expulsão de parte expressiva de negros da parte central da cidade em direção às periferias, como o bairro Cidade Nova, no qual o autor ressalta a convergência de elementos necessários para o surgimento do samba moderno. O autor ressalta ainda que “o samba resulta de uma série de influências musicais, muitas delas, ainda do século XIX. A recriação do samba ocorrerá no fim da década de 1920 com os malandros do Estácio. Estes, incluídos em outro contexto social, promoverão mudanças melódicas e temáticas capazes de fundar um estilo novo. O samba do Estácio será então consagrado como o “verdadeiro samba”, inspirando todos os renomados compositores das gerações seguintes”[101].

Ainda nessa segunda parte, Rosadas aborda desde as transformações urbanas dos novos bairros de periferia, bem como as especificidades culturais de cada contexto, a importância das casas de personalidades da comunidade, o papel da mulher na promoção de alguns contextos onde nasceu o samba moderno, os locais de criação das músicas, a relação dos compositores com as gravadoras, o nascimento das escolas de samba, o processo de parcerias entre intérpretes e compositores, entre outros temas. Na terceira parte, o autor se propõe a analisar o contexto do bairro Vila Isabel e seu papel na consolidação da forma e da imagem do samba, tornando-se uma referência do samba moderno. Faz um retrospecto do surgimento do bairro, seus agentes empreendedores, os planos urbanísticos e a modernização do bairro. Alguns fatos importantes para que se consolidasse a imagem de bairro do samba, se exprime através da figura de compositores como Noel Rosa, além de escola de samba Unidos da Vila Isabel, e mais adiante o compositor Martinho da Vila. Nota-se também diversas práticas de territorialização da música no bairro através da materialidade, como as “calçadas musicais” (pautas musicais de canções consagradas, desenhadas nas calçadas do bairro), o monumento em homenagem à Noel Rosa, a escola de samba Unidos de Vila Isabel e o uso de nomes de canções e símbolos musicais no comércio local, reforçando assim sua identidade musical.

A pesquisa “Representação e Ensino – A Música nas Aulas de Geografia: Emoção e Razão nas Representações Geográficas” dá origem à dissertação de Correia[102] defendida também em 2009, na UFPR. O autor buscar demonstra “como a arte musical e seu aparato metodológico junto aos mapas mentais e atividades didático-pedagógicas podem contribuir à educação formal de alunos das séries iniciais do ensino médio, representados por estudantes dos grupos A e B de colégios da rede pública do Estado do Paraná”[103].

Trabalhando na perspectiva das representações e da corrente humanista, Correia busca levar a experiência das músicas e seu conteúdo para o campo da geografia escolar, ressignificando conteúdos geográficos em sala de aula, a partir de canções escolhidas pelos alunos e professor. O trabalho divide-se em quatro partes. Na primeira o autor caracteriza a pesquisa e advoga pela música como aparato metodológico dos mapas mentais e atividades didático-pedagógicas. Baseando-se nos documentos do Plano Político-Pedagógico do Estado do Paraná, ele também caracteriza aos grupos A e B através de variáveis socioeconômicas e características gerais dos jovens no que diz respeito à relação com a família e práticas culturais. O autor mostra também como procedeu para tratar os conteúdos geográficos, utilizando as canções como “mapas mentais” na proposta metodológica de sua orientadora, Salete Kozel. Como afirma o autor “é importante frisar que o objetivo primordial da pesquisa é trabalhar aspectos como: processo mental, construções, imagens, conceitos, idéias e teorias, concebidas pelos alunos e reproduzidas em forma de “mapas mentais,” que hoje, tratados de maneira ampla, ultrapassam as questões cartográficas e se caracteriza em aporte indispensável no ensino de geografia”[104].

Na segunda parte é apresentada a perspectiva teórica do trabalho, versada no diálogo entre a geografia humanista cultural, de inspiração predominantemente fenomenológica, e o uso das representações sociais. Na terceira parte o autor mostra como essa perspectiva teórica dialoga com a geografia escolar, e realiza um diálogo permanente com as diretrizes nacionais e estaduais em termos de planos curriculares e planos político-pedagógicos. Mostra também uma argumentação sobre a importância do uso da música no ensino, e relaciona com a abordagem teórica assumida no trabalho. Na quarta e última parte, Correia discute o uso da música e dos mapas mentais na ressignificação dos conteúdos geográficos, nos grupos de alunos anteriormente citados. Primeiro se procedeu com atividades individuais (subjetivas), e após coletivas (intersubjetivas). Na primeira atividade – subjetiva - eles procederam com desenhos vinculados às canções, com um texto explicativo, além de um registro de suas impressões. Na segunda atividade – intersubjetiva – os alunos construíram interpretações dos conteúdos geográficos, através de maquete, painel, mapas, além de poesias e músicas. Dessa forma, Correia procedeu de forma a resgatar as emoções para o conhecimento geográfico, criando envolvimento entre os alunos e dotando significados subjetivos e intersubjetivos aos conteúdos geográficos.

As abordagens em geografia e música erudita já são conhecidas dos geógrafos europeus e norte-mericanos, porém, no contexto brasileiro, tal interesse de estudo é inaugurado na dissertação de Castro. A pesquisa "Heitor Villa-Lobos: A Espacialidade na Alma Brasileira", defendida na UFRJ em 2009, buscou uma “leitura geográfica a partir da música, tomando-a, principalmente, embora não exclusivamente, a partir de sua dimensão sonora[105]”, e usou de abordagens teórico-metodológicas da hermenêutica e da semiótica em conjunto com a perspectiva da geografia cultural. Em recente artigo, o autor trabalha exclusivamente com a obra “O Descobrimento do Brasil[106]”. O autor analisa a obra seguindo orientações da tripartição semiológica de Jean-Jacques Nattiez, do campo da semiologia musical. Nattiez, segundo Spoladore propõe a existência de três níveis no estudo de uma obra musical: " nível poiético (tudo aquilo que envolve o processo de produção), nível estésico (aspectos referentes aos processos de recepção) e nível neutro (que corresponde a uma “descrição dos fenômenos na qual não fazemos intervir as condições de produção e de recepção da mensagem, e na qual não se põe em questão nem a validade da transcrição nem os instrumentos utilizados para a realizar”)"[107].

É nessa perspectiva que Castro buscou o diálogo da música com a geografia. Faz considerações sobre o contexto de produção e a descrição das suítes contidas em “O Descobrimento do Brasil”, os elementos sonoros evocados, os documentos que referenciavam a criação da obra e as narrativas contidas em cada trecho. Com base em discussões geográficas sobre território e identidade territorial, Castro sublinha a contribuição de Villa-Lobos no processo de construção simbólica no que tange a temática da “descoberta do Brasil” e afirma que esta obra “explora todas as características definidas por Naves (1998) como estética da monumentalidade, ou seja, o recurso ao excesso e a grandiosidade, a partir da alusão à apropriação do território por parte dos portugueses, [e que] o Maestro dá a sua contribuição artística à edificação de um “poder simbólico” que, por sua vez, irá atuar como um importante fator na construção de identidades territoriais”[108].

Por fim, em 2010, Juliana Costa aborda a segregação espacial produzida pelas festas raves, usando o exemplo de Salvador e Camaçari, em sua dissertação defendida na UFBA[109]. Costa aborda como a música eletrônica – inicialmente um estilo musical alternativo – se tornou um produto mercantilizado, mostrando como os agentes dessas cidades baianas procederam com a segregação do espaço para a reprodução destas festas. Aborda também a delimitação e a segregação em boates, trios elétricos e camarotes de música eletrônica. A autora, portanto, dá destaque às funções que o fenômeno musical pode produzir no que diz respeito à segregação espacial.

Ainda em 2010, Panitz traz uma discussão dos imbricamentos identitários em um contexto transfronteiriço, envolvendo Argentina, Brasil e Uruguai. Na dissertação intitulada “Por uma geografia da música: o espaço geográfico na música popular platina”[110], defendida na UFRGS, o autor investigou um grupo de cancionistas contemporâneos de distintos lados da fronteira, suas bases de criação estética apoiadas em boa parte na paisagem pampeana (região de campos e planícies na porção meridional da América do Sul) e nos elementos culturais constitutivos da região (como os ritmos folclóricos, reprocessados no seio da música popular). Composto por quatro principais partes, encontra-se em sua primeira uma discussão sobre o “espaço platino” e suas diversas definições e superposições. Em seguida é mostrado um levantamento bibliográfico da relação entre geografia e música, com vistas à construção histórica desse campo de pesquisa. Após, apresenta-se a abordagem teórico-metodológica apoiada no estudo do espaço geográfico e seus desdobramentos, com o auxílio da Teoria das Representações Sociais no nível interpretativo, e com o método de trabalho multi-situado a partir do antropólogo George Marcus no nível operacional. Por fim, o autor trata de dois eixos centrais no estudo das representações do espaço: a) em primeiro lugar consideram-se as propostas geografizantes, ou seja, os elementos geográficos evocados na criação musical, fruto de seus mundos vividos e da reelaboração das matrizes folclóricas no contexto da música atual, que criaram uma nova regionalidade; b) em segundo lugar são ressaltadas as propostas territorializantes, ou seja, o questionamento do mercado musical mainstream e as dificuldades de circulação nos grandes centros, evocando uma nova centralidade para a difusão de sua obra musical a partir de cidades como Porto Alegre, Montevidéu e Buenos Aires, entre outras. Além disso, o autor traz a importância das tecnologias da comunicação para os artistas independentes, bem como o papel das políticas culturais na consolidação dessa “cena” musical platina. Ao realizarem representações do espaço e o uso de matrizes musicais semelhantes (tomadas as devidas singularidades de cada artista); ao realizarem shows conjuntos abordando temas como a permeabilidade das fronteiras, transbordamento das paisagens vividas, elementos culturais comuns e mescla de elementos das culturas brasileiras e rio-platenses; e considerando que além de narrativas do espaço vivido comum aos artistas e ouvintes, essa “cena” também se inseria nas políticas culturais, gerava intercambio entre produtores musicais e selos discográficos, e incrementava o intercambio de artistas de forma rizomática, Panitz trás a dimensão da geograficidade nas canções e da territorialidade do fenômeno musical e sua relação com a identidade territorial transfronteriça. Nessa abordagem em geografia cultural e social, que valoriza a discussão humanista e também os aspectos econômicos e políticos envolvidos, o autor mostra o encontro entre o Brasil e a América Latina através do sul e a importância da música no contexto da integração latino-americana.

No Quadro 1 é possível visualizar os trabalhos realizados na interface da geografia com a música, em Programas de Pós-Graduação em Geografia[111], conforme pesquisa realizada no Banco de Teses e Dissertações da CAPES[112]. Tal pesquisa teve o objetivo de mapear o interesse e a acolhida do tema no campo da geografia acadêmica no Brasil.

 

 Outras produções acadêmicas

Outros trabalhos, em formato de livros, artigos em periódicos ou eventos, também trazem a importância da interface entre música e geografia. Os exemplos não são absolutos, não refletem toda a produção existente que envolve o tema, e por certo não contemplam todos os campos já explorados. Porém, o intuito é revelar algumas discussões, abrindo possibilidades para que outras possam ser incorporadas progressivamente em nossa pesquisa[113] e em um futuro banco de dados, que deverá servir de base de consulta a todos aqueles interessados no estudo do espaço e da música, em suas mais diversas abordagens.

Zilá Mesquita[114] foi uma das geógrafas pioneiras no país quando publicou seus artigos abordando os territórios fronteiriços do Prata e a música de cunho social daquela região. Campos[115], por sua vez, oferece o potencial da música popular para a análise geográfica no ensino fundamental e médio, no que toca as questões do ambiente e da cultura nordestina do semi-arido. Ainda voltados ao ensino, Correia e Kozel voltam-se para uma geografia fenomenológica e das representações sociais, para discutir as ressignificações dos conteúdos geográficos por meio da música[116].

Evangelista trata em recente livro as distintas “ambiências espaciais” do samba, da bossa-nova, do rock e do funk. Conforme o autor ambiência espacial é entendida “como o meio no qual os promotores da música viviam, seu local de moradia, o local dos encontros, áreas de shows inicialmente utilizadas[117]”. O autor também afirma que não se trata de um trabalho histórico

“mas sim uma análise sobre o espaço nos quais estes gêneros musicais surgira e a partir deste diagnóstico realizar uma reflexão sobre o Rio de Janeiro. A rigor, ao considerarmos estes quatro estilos estamos a considerar quatro momentos da cidade do Rio de Janeiro e um estudo comparativo destes momentos nos auxilia na discussão sobre cenários futuros da cidade do Rio de Janeiro”[118].

Diferente da abordagem de Mello[119], Evangelista propõe um estudo não baseado nas representações literárias das canções, “mas sim ao conteúdo da história espacial das músicas na cidade do Rio de Janeiro[120]”.

Eduardo Schiavone Cardoso, por sua vez, realizou uma análise da geografia urbana de São Paulo através das canções do compositor Itamar Assumpção; a posição teórica do autor, em relacionar espaço e identidade, se dá aos termos de Romagnan, que “apresenta a possibilidade de ligação da música com os lugares onde os atores e os processos musicais se realizam, formando ‘geo-indicadores’ da atividade musical[121]”.

Reflexões teóricas sobre a relação entre a escala musical e a escala geográfica - é o que propõe Guimarães em outro artigo publicado recentemente. O autor propõe uma relação entre as considerações musicológicas do pesquisador e compositor José Miguel Wisnik e as concepções de escala geográfica do geógrafo Roger Brunet. Afirma Guimarães que “ tanto Wisnik quanto Brunet, são autores que remetem a discussão dos mapas e das partituras musicais para uma reflexão de filosofia da linguagem. Eles se aproximam da questão da essência do conhecimento que está sendo apreendido na produção dos mapas e das partituras musicais”[122].

Apesar da difícil leitura, em função de requerer dos geógrafos uma compreensão particular da teoria musical, o artigo traz reflexões importantes para um debate teórico de maior relevo. Constitui-se, assim, em um texto o qual abre uma possibilidade de exploração mais profunda entre geografia e música, no campo epistemológico.

A publicação mais recente, e o primeiro esforço de remontar a história do interesse geográfico pela música, vem de Castro (2010). O autor centra sua análise em dois grandes divulgadores do estudo da músicano âmbito da geografia: George Carney e Lily Kong. Castro oferece um panorama rico sobre a contribuição da geografia anglo-saxã, seus trabalhos pioneiros, a contribuição da escola saueriana e a renovação levada a cabo por Kong[123]. Portanto, a discussão centra-se mais sobre a contribuição das pesquisas em língua inglesa e apresenta apenas alguns trabalhos no Brasil. Por fim, o autor afirma que para além das abordagens já utilizadas (estudo de letras das canções, mapeamento das áreas musicais, indústrias fonográficas), seria necessário uma reflexão na geografia sobre “o elemento fundamental da qual a música se compõe: o som”[124] – reflexão que o próprio autor mesmo em sua dissertação.

O NEPEC, Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Espaço e Cultura, foi o responsável por trazer com mais vigor o debate da cultura no âmbito da geografia. Dividida entre uma linha editorial de coleções de artigos sobre a área, e a edição de um periódico, o NEPEC dispõem uma grande quantidade de publicações. Especificamente ao campo da música, vemos contribuições importantes: uma bibliografia sobre geografia, literatura e música, oferecida por Corrêa[125], três coletâneas de artigos que tratam do tema em Corrêa e Rosendahl[126], além dos textos de Cardoso e Castro citados anteriormente, que constam no periódico Espaço e Cultura. Outros núcleos como o NEER – Núcleo de Estudos em Espaço e Representação já acolheram alguns trabalhos em seus encontros bienais.

Geografia e música no Brasil: algumas considerações

A geografia brasileira, à exceção do importante trabalho de Castro[127], valorizou em suas pesquisas sobretudo a música popular, diferente da geografia norte-americana e européia que manifestou interesse também na música erudita. Tal fato pode ter relação com, pelo menos, dois motivos, por certo relacionados. O primeiro é a tradição crítica brasileira, atentando para uma disciplina preocupada com as questões sociais e culturais, tendo por base as representações sociais populares. O segundo pode estar relacionado com a pouca penetração da música erudita no panorama cultural da sociedade brasileira e, relacionando com o primeiro motivo, que a música erudita sempre representou uma expressão das classes econômicas mais abastadas, não figurando com  preponderância como um objeto crítico de interesse geográfico. Se o campo da música popular tem tido atenção quase que exclusiva dos geógrafos brasileiros, a música erudita brasileira figura como um campo promissor para o estudo geográfico, sobretudo no que tange ás questões de identidade territorial e às representações da nação ou das regiões brasileiras.

Embora seja inviável neste momento realizar um mapeamento sistemático das linhas dos estudos em geografia e música no panorama mundial (dado o enorme volume de trabalhos existentes), no Brasil podemos afirmar que em seu conjunto, o interesse geográfico pela música expressa heterogeneidade nas abordagens, porém já denotam campos importantes de interesse. Podemos visualizar um campo de abordagem humanista que se articula em torno das representações das paisagens e do lugar e a compreensão dos significados destas representações através da música. Nessa abordagem a letra da canção é a fonte da representação, ou seja, a canção configura-se como um dado primário, como a geografia humanista também tem feito largamente com a literatura. Isto não impediu, é bom lembrar, que os geógrafos desta abordagem realizassem os devidos nexos com a produção do espaço em termos mais gerais, sobretudo relacionado com a cidade.

Outro campo, de abordagem social e cultural mais amplo compreende a letra, a produção da música e seu contexto social, cultural e ambiental, de forma a compreender tanto a identidade espacial, como os espaços de referencia identitária. Nesta abordagem, encontramos o compositor como um intérprete da condição dos espaços, que ele percebe e representa, pois o estudo das suas representações tem muito a ver com os processos sociais e culturais que constroem a identidade.

Em uma perspectiva mais social utiliza-se a música para compreender os usos do território. Nesta, não importam tanto as representações nas canções, mas os conteúdos espaciais envolvidos no processo de produção do espaço e uso do território que a música engendra. Desta forma, foca-se no consumo e na produção da música, tomando-a como uma atividade econômica e social passível de ser analisada em sua instância espacial. Sua característica mais clara é o estudo dos circuitos espaciais da economia que a música produz.

Ainda outro campo importante tem relação com o uso da música como ferramenta de reflexão e construção de conceitos em sala de aula. Valoriza-se, desta forma, as representações do espaço, as formas geográficas, as paisagens, os lugares, e as dinâmicas sociais, para ajudar o estudante a compreender a geografia em termos amplos.

Sendo assim, a diversidade de interesses apresentada pela geografia brasileira, e a indiscutível riqueza musical do país, fazem deste campo de estudo um lugar fecundo para explorar o espaço geográfico em suas mais diversas abordagens e já tem oferecido, sem dúvidas, novos olhares para as relações entre espaço e cultura.

Fenômeno musical: um objeto geográfico?

Now we must learn to judge a society by its sounds, by its art and by its festivals, than by statiscs.

Jacques Attali

A música é, talvez, o produto cultural mais presente no cotidiano das populações. Diferentemente da literatura e das artes plásticas, que requerem atenção e âmbito de consumo específicos, a música é consumida a todo o instante, sendo executada ao longo das tarefas mais corriqueiras, como em uma caminhada na cidade, ao praticar esportes, em viagens e deslocamentos diários, momentos de entretenimento ou descanso. No nível pessoal, ela cria repertórios subjetivos, organiza memórias (e consequentemente os lugares da memória), participa ativamente na sonorização da vida cotidiana, cria sentido ao mundo. No nível coletivo ela relaciona-se com memórias e histórias de vida compartilhadas, lugares de encontro, narrativas do espaço-tempo, períodos históricos específicos, e até mesmo com a estética sonora de cada geração, que por certo possui conteúdos geográficos específicos. No quadro geral da sociedade ela configura-se como uma importante atividade econômica e sócio-cultural que produz espacialidades diversas, como redes fonográficas (parcerias entre gravadoras locais e internacionais), locais de difusão (como rádios e televisões), locais de execução (teatros, bares, estúdios, gravadoras), lojas especializadas, cenas musicais, tribos urbanas, entre outros. A música ainda relata os lugares e lhes dá significado, protesta contra as injustiças do mundo ou cria ainda mais alienação, pode ser uma ferramenta de controle do imaginário social ou pode ser libertadora, ao construir espaços de esperança e resistência. Sua dimensão, como representação do mundo e como prática no/do espaço, se apresenta como uma geografia complexa que desafia os geógrafos a refletirem juntos com outras áreas do conhecimento, como por exemplo, sociologia, a antropologia, a história, os estudos culturais, a comunicação social e a economia da cultura.

O fenômeno musical, reconhecido pela sua importância não só como prática artística, mas sobretudo cultural e social, chamou atenção de geógrafos há cerca de cem anos. Contudo apenas recentemente, nas últimas quatro décadas, tal fenômeno tornou-se um interesse central para alguns geógrafos, o qual contribui significativamente para o desenvolvimento de uma geografia cultural e social. Atentos à multiplicidade de fatores que o fenômeno musical engendra, os geógrafos manifestaram interesse especial no estudo da difusão de formas musiciais, das representações do espaço, do imaginário geográfico e das práticas e transformações espaciais nos quais foi reflexo ou agente. Sendo assim, este breve resgate cronológico, consoante com a produção acadêmica em nível territorial, buscou contextualizar esse campo de estudos e fornecer à ciência geográfica subsídios para o debate que envolve o fenômeno musical como um objeto de interesse.


Notas

[1] Carney 1990

[2] Nash e Carney 1996

[3] Kong 1995

[4] Guiu 2007

[5] Reynoso 2006

[6] Merriam 1983, p.284

[7] Gironcourt 1927

[8] ibidem, p. 292, tradução nossa

[9] Gironcourt 1939

[10] La Géographie 2009.

[11] Centre National de la Recherce Scientifique.

[12] Nash & Carney 1996,

[13] idem, p.70, tradução nossa

[14] ibidem, p. 71, tradução nossa

[15] ibidem, p.73

[16] Home studio é o nome usado para denominar os estúdios caseiros, com variados níveis de profissionalização, dispondo de equipamentos digitais de gravação e edição. Essa modalidade de estúdio tem sido cada vez mais popularizada entre instrumentistas e todo o tipo de artistas independentes, pelo baixo custo de montagem e considerável qualidade obtida.

[17] Carney, 1990

[18] Nash e Carney 1996

[19] Leyshon et al 1998

[20] Duncan 1980

[21] Leyshon et al 1998, p.4, tradução nossa

[22] Se verá, adiante, que na França na mesma década, Lévy (1999) também trabalha teoricamente o uso da música em geografia.

[23] Kong 1995

[24] idem, p.4, tradução nossa

[25] ibidem, p.6, tradução nossa

[26] Kong1996, 1997

[27] Kong, 1997 p.10, tradução nossa

[28] Johnston et al 2000, p.530, tradução nossa

[29] Anderson, Morton & Revill 2005

[30] Connel & Gibson 2004

[31] Finn 2009

[32] Florida & Jackson 2009

[33] Gibson 1998, 2009

[34] Hogan 2007

[35] Hudson 2006

[36] Jazeel 2005

[37] Kearney 2008

[38] Kingsburry 2008

[39] Kruse 2004

[40] Revill 2000, 2005

[41] Saldanha 2005

[42] Foram encontradas diversas teses e dissertações diretamente nos sítios web dos departamentos ou dos programas em geografia que não constavam nas bases de dados nacionais. Assim, se crê que bancos de teses como TEL (Thèse em Ligne) e Catalogue Sudoc, não possuam atualizações constantes ou não estejam conectadas a todas as universidades do país.

[43] Lévy 1994, 1999

[44] Lévy 1999, p.25, tradução nossa

[45] idem

[46] Pailhé 1998

[47] Pailhé 2004

[48] Romagnan 2000

[49] Lechaume 1997

[50] Calenge 2002

[51] idem, p.38, tradução nossa

[52] ibidem

[53] Segundo Lamantia, a palavra musak provém do nome de uma empresa estadunidense que fornecia música para elevadores (2002, p.174). A empresa Muzak funciona até hoje no segmento de sonorização de espaços comerciais.

[54] Lamantia 2003

[55] Goré 2004, p.5, tradução nossa

[56] Leroux, 2007

[57] Raibaud 2011a

[58] Raibaud 2008

[59] Raibaud 2005, 2006, 2011b

[60] Raibaud 2008, p.2, tradução nossa

[61] ibidem, p.3, tradução nossa

[62] ibidem

[63] ibidem, p.7

[64] Guiu 2006

[65] La Géographie 2009

[66] Guiu 2009

[67] Aménagement, Développement, Environnement, Santé et Sociétés.

[68] Territorialité et Identité dans le Domaine Européen, atual Europe - Européanité – Européanisation.

[69] Espace et Sociétés.

[70] Politique(s), Culture(s), Territoire(s).

[71] Raibaud 2008

[72] Raibaud está dialogando com outros companheiros no Colloque International Musique, territoire et développement local, celebrado em 2009 em Grenoble.

[73] Arroyo 1992, tradução nossa

[74] idem

[75] Bettinelli 2007

[76] Adamek-Schyma 2002, 2006

[77] Sarmento 2007

[78] Valiente 2009, p.47-48, tradução nossa

[79] idem, p.54, tradução nossa

[80] ibidem, p.63, tradução nossa

[81] Burgos 2006

[82] Rodó 2010

[83] Se reconhece que Anne Buttimer já apontara em suas obras a música como importante foco de estudo, bem como Joan Nogué i Font, nos trabalhos relativos a paisagem sonora na Catalunha.

[84] Mello 1991

[85] idem, p. 57

[86] Mello 2009

[87] Fernandes, G. 2009, p.2

[88] idem

[89] Fernandes, N. 2001, p. XVII

[90] Lima 2002

[91] Ribeiro 2006

[92] Oliveira 2006, p. 18

[93] Sigla para o inglês – Temporary Autonomous Zone.

[94] Camargo 2008, p. 87

[95] idem

[96] ibidem

[97] Ibidem, p.89

[98] Dozena 2009, p. 30

[99] idem

[100] Rosadas 2009

[101] idem, p.32

[102] Correia 2009

[103] idem, p.7

[104] idem, p.32

[105] Castro 2009

[106] Castro 2011

[107] Spoladore 2009, p.3

[108] Castro 2011, p.13

[109] Costa 2010

[110] Panitz 2010

[111] Para tanto, foi pesquisado os seguintes descritores: 1) geografia e música; 2) território e música; 3) região e música; 4) paisagem e música; 5) espaço e música. Foram considerados somentesos trabalhos em Programas de Pós-Graduação em Geografia; em outros programas interdisciplinares, como “Planejamento Urbano” ou “Ciências Humanas”, os trabalhos foram considerados se provenientes de geógrafos, mas não figuraram na presente listagem.

[112] Reconheço a existência de outros trabalhos os quais possuem relação direta ou indireta com a temática tratada, mas que não foram encontrados no referido banco de teses por diversas razões, dentre elas: o universo de descritores para a pesquisa. Nesse ponto, é preciso ressaltar que a procura nesta base de dados se realiza sobre o título, as palavras-chave e o resumo fornecido. Assim, quando o termo “música” é substituído, por exemplo, pelo termo “hip hop”, não se alcança tais trabalhos. Da mesma forma, a pesquisa “Por uma geografia da música” vem incorporando um maior número de descritores, bem como contato direto com os programas de pós-graduação em geografia para aperfeiçoar o levantamento.

[113] Parte do desenvolvimento da pesquisa “Por uma geografia da música”, que vem mapeando os trabalhos realizados nacional e internacionalmente que possuem interface entre o espaço e música, em suas mais diversas abordagens, dentro e fora da ciência geográfica.

[114] Mesquita 1994, 1997

[115] Campos 2006

[116] Correia, Kozel 2009

[117] Evangelista 2005, p.7

[118] idem

[119] Mello 1991

[120] Evangelista 2005, p.8

[121] Cardoso 2009,p. 39

[122] Guimarães 2009

[123] Mas também por Leyshon, Mattless and Revill 1998

[124] Castro 2010, p.18

[125] Correa 2007

[126] Corrêa e Rosendahl 2007, 2008, 2009

[127] Castro 2009

 

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[Edición electrónica del texto realizada por Miriam Hermi Zaar]

 

Ficha bibliográfica:

PANITZ, Lucas Manassi. Geografia e música: uma introdução ao tema. Biblio 3W. Revista Bibliográfica de Geografía y Ciencias Sociales. [En línea]. Barcelona: Universidad de Barcelona, 30 de mayo de 2012, Vol. XVII, nº 978. <http://www.ub.es/geocrit/b3w-978.htm>. [ISSN 1138-9796].



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