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Scripta Nova.
 Revista Electrónica de Geografía y Ciencias Sociales.
Universidad de Barcelona [ISSN 1138-9788] 
Nº 94 (27), 1 de agosto de 2001

MIGRACIÓN Y CAMBIO SOCIAL

Número extraordinario dedicado al III Coloquio Internacional de Geocrítica (Actas del Coloquio)

A IMIGRAÇÃO PORTUGUESA E AS ASSOCIAÇÕES COMO FORMA DE MANUTENÇÃO
DA IDENTIDADE LUSITANA – SUL DO BRASIL

Regina Lucia Reis de Sá Britto Fiss
Escola Técnica João XXIII
Pelotas, RS, Brasil


A imigração portuguesa e as associações como forma de manutenção da identidade lusitana – sul do Brasil (Resumo)

O texto apresentado faz parte de um projeto de pesquisa que trata objetivamente sobre a constatação dos valores culturais trazidos pelos imigrantes portugueses e por eles mantidos em terra estrangeira, através do congraçamento junto às instituições associativas.Os imigrantes portugueses organizam-se em torno de diferentes tipos de associações como forma de amenizar a saudade e manter viva a sua cultura. Passam aos descendentes, tanto àqueles nascidos em Portugal como àqueles nascidos no Brasil, as suas raízes sem desprezar os valores do país de acolhimento. Com uma análise geral será dada particular ênfase à comunidade portuguesa radicada em Pelotas, especialmente àquela ligada a Sociedade Portuguesa de Beneficência e Centro Português 1º de Dezembro, instituições que têm congregado portugueses e brasileiros através de trabalhos na área da saúde, da cultura e do lazer.

Palavra-chave: Imigração/ imigrantes portugueses/ valores culturais/ associações/ descendentes/ sul do Brasil.


The portuguese imigration and the associations as a way of keeping the lusitanian identity – south of Brazil (Abstract)

The presented text is part of a research project with the aim of studyng the cultural valuables brought by portuguese immigrants and maintained by them in foreign countries by means of conciliating as association clubs. The portuguese immigrants are organized in different types of associations at a way of rendering pleasant the homesickness and to maintain alive their culture. They pass to descendents, even born in Portugal or in Brazil, their roots without despising the values of the acceptation country. With a general analysis, particular emphasis will be given to the portuguese community rooted in Pelotas, especially that connected to portuguese charity society and first of december portuguese club, both institutions that congregates portugueses and brasilians through health, culture and leisure activities.

Key-words: Immigration/ portuguese immigrants/ cultural values/ association clubs/ descendents/ south of Brazil


Este artigo tem como propósito refletir sobre a imigração portuguesa no que se refere a manutenção dos valores culturais, tendo como ponto de referência as associações. Analisa também sobre as dificuldades de adaptação pelas quais passaram os portugueses em diferentes países de acolhimento, em nosso caso o Brasil.

No Brasil, as condições foram favoráveis à integração, especificamente no sul do Brasil (Rio Grande do Sul), a comunidade portuguesa assumiu um papel de destaque, uma vez que colaborou e colabora para o enriquecimento cultural da região através das manifestações culturais como a gastronomia, as danças, os cantos e outros. Destacamos também em esse artigo o trabalho da Sociedade Portuguesa de Beneficência e do Centro Português 1º de Dezembro. Em este artigo observamos o que representa para os portugueses, o convívio e a representação de suas origens junto as instituições e associações.

A Imigração Portuguesa e o Brasil: principais períodos, lugares de destino e motivos

Portugal sempre foi conhecido como um país com grande tendência à imigração. Historicamente, já nos finais do século XVI, o total de portugueses que deixaram Portugal somava cerca de cento e cinqüenta mil pessoas, e hoje esse número chega a quatro milhões e meio. Ou seja, 31 por cento do total da população que totaliza dez milhões de habitantes. Inúmeros pesquisadores como Arroteia (1985) salienta que é expressivo o número de portugueses que vivem em países estrangeiros obedecendo a determinados ciclos, onde fatores econômicos e sociais foram determinantes.

Os portugueses, por um longo período, migraram preferentemente para os países do continente americano, como o Brasil, Venezuela, Argentina, Estados Unidos e Canadá, pois estes tinham uma política de migração já instituída. Ou seja, tiveram o continente americano como preferência se comparado com a Europa.

Segundo publicação do Memorial do Imigrante (Imigração Portuguesa no Brasil, 1986) a estimativa de entrada de portugueses no Brasil entre 1872 e 1972 é de 1.662.180 pessoas, correspondendo a 31 por cento do total de imigrantes que o Brasil recebeu nesse período.
 

Quadro 1 
 Entradas de imigrantes portugueses no Brasil – 1872 - 1972 
Período Número de pessoas
1872 – 1879 55.027
1880 – 1889 104.690
1890 – 1899 219.353
1900 – 1909 195.585
1910 – 1919 318.481
1920 – 1929 301.915
1930 – 1939 102.743
1940 – 1949 45.604
1950 – 1959 241.579
1960 – 1969 74.129
1070 – 1972 3.073
TOTAL 1.662.180

Fonte: Levy, Maria Stella, O Papel da Migração Internacional na População Brasileira apud Bassanezi, Maria Silvia C.B., Imigrações Internacionais no Brasil, um panorama histórico. NEPO/UNICAMP, p. 7 (in: Imigração Portuguesa no Brasil)
 

O auge da emigração portuguesa para o Brasil ocorreu efetivamente entre 1910 a 1914, conforme podemos observar no quadro 1. No período de 1910 a 1919, entraram no país um total de 318.481 pessoas, logo depois houve um decréscimo devido à crise econômica mundial de 1929, quando a emigração se reduz em todas as partes do mundo.

Convém explicitar que na década de 1920 a população brasileira era constituída de 30 milhões de pessoas, sendo que 1.565.961 eram estrangeiros e de este total, 433.567 eram de origem portuguesa. Os portugueses estavam distibuídos por diferentes regiões brasileiras, especialmente nos estados de Minas Gerais, Bahia, Pernambuco, Pará, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Uma das dificuldades da pesquisa foram que os dados referentes à entrada de portugueses em cada um dos estados brasileiros não estão organizados, o que dificulta uma análise pormenorizada da temática. No entanto, alguns autores como Laytano (1954) in Branco (1991) salientam que no ano de 1940 o estado do Rio Grande do Sul possuía cerca de 6.127 portugueses, localizados principalmente nas cidades de Porto Alegre, Rio Grande, Pelotas e Bagé (1).

Se observamos ainda o quadro 1, nas décadas de 1930 e 1940, houve uma redução no número de imigrantes lusitanos para o Brasil. Essa redução foi devido as oportunidades de trabalho nos países industrializados da Europa. As facilidades de emprego e a proximidade desses países com Portugal favoreciam a decisão de migrar dentro do continente europeu. França foi o país que mais portugueses recebeu em esse período, hoje vivem cerca de um milhão de imigrantes, seguidos de Alemanha, Suíça, Inglaterra, e Luxemburgo.

A partir de 1950, observa-se um aumento expressivo que volta a diminuir vertiginosamente no período seguinte. Não apresentando a partir deste período altos índices de migração, a não ser na década de 70, ou mais especificamente a partir de 1974 com a queda do governo de Salazar. A situação política em Portugal provocou um grande movimento migratório, onde cerca de 100.000 portugueses decidem migrar para o Brasil (1974 a 1977). A Revolução dos Cravos ocasionou a vinda de grupos de famílias em números expressivos, sendo em sua maioria pessoas com boa qualificação profissional e cultural, como empresários, executivos, advogados, economistas, comerciantes e industriais. A faixa de idade estava entre os 30 e 50 anos. Vários grupos eram de Angola e Moçambique, pois estes perderam tudo com os novos regimes estabelecidos nas antigas colônias portuguesas e em Portugal não havia condições de sobrevivência para todos "os retornados"(2).

A par dos diferentes motivos e interesses que levaram muitos portugueses a escolherem este ou aquele país para emigrar, três situações motivaram a vinda de muitos portugueses para o Brasil, segundo Joaquim da C. Leite: "... os que emigravam com a finalidade de obter uma carreira profissional, os que emigravam para adquirir uma poupança e os que emigravam para fugir de uma situação de crise". (1999:15)

No primeiro grupo estavam, na maioria, jovens do sexo masculino, alfabetizados, já com contatos de familiares e amigos e que vinham com o objetivo de se estabelecer. Do segundo grupo faziam parte artesãos, com experiência em alguma profissão; já mais adultos, às vezes casados, e que após algum tempo de trabalho no Brasil voltavam para Portugal.

O terceiro grupo compreendia famílias inteiras, que vinham para o Brasil motivadas pela difícil situação econômica em que se encontravam em Portugal. Casos isolados e situações diferenciadas também ocorriam, como aquelas pessoas que sem garantia nenhuma e de forma precipitada decidiam emigrar. Chegando aos portos brasileiros, contavam com a sorte, no aguardo que alguém os empregasse.

Na região de Pelotas segundo alguns autores (Pombo,1986 e Branco,1991), a vinda de muitos imigrantes portugueses ao longo dos tempos aconteceu devido às "cartas de chamada"(3)., como é o caso da família do Sr. Antonio R. dos Santos (esposa e filha) que, após algum tempo tem um total de 48 pessoas cercanas (Branco,1991).

Quanto à procedência dos imigrantes radicados em Pelotas, a maioria, são do Distrito de Aveiro (Boletim da SEE,1987; Pombo,1986 e Fiss,1988). Aqueles que continuaram a vir para o Brasil na década de 1960, por exemplo, eram em grande parte, profissionais com atividades específicas, empreendedores que abriram seus próprios negócios ou, ainda jovens universitários, que contrários ao regime político português, preferiram abandonar a pátria a ter que ir para as tropas em África, onde as guerras pela independência começavam a surgir.

Convém salientar, ainda, que mesmo sendo provenientes da atividade agrícola, na nova pátria muitos se dedicaram a outras inúmeras atividades além daquelas já mencionadas: carregadores no porto, vendedores ambulantes, sapateiros, trabalhadores em padarias, pescadores, motoristas, carvoeiros, leiteiros e outros. Ressaltamos que, em toda extensão do território brasileiro existe hoje uma grande comunidade de portugueses e de luso-descendentes. Embora não sendo mais o país priorizado pelos lusitanos para emigrar, ainda representa a maior comunidade portuguesa fora de Portugal. Só na cidade de São Paulo vivem em média 200.000 imigrantes portugueses.
 

A saudade, a integração e o desejo de retorno

Sempre que se fala em imigrantes, não se impõe uma referência ao corte dos laços afetivos-emocionais, mas sim à separação espacial. A separação física faz tornar a mente, o coração, os sentimentos, mais intimamente ligados aos valores dos bens deixados na terra natal. A essas separações aparece algo que se diz não haver tradução, que é a palavra "saudade".

Ao lembrar pessoas, lugares, pormenores, objetos têm-se o sentimento do que no passado foi agradável, do que ficou para trás mas que não se quer esquecer. Há quem diga que a saudade é natural ao povo português, pelas suas qualidades amorosas, pelos diferentes motivos de separação que ocasionam longos períodos de ausência. Para alguns, a imigração é vista como uma fase, como algo temporário, onde o regresso embora desejável também é difícil. Segundo Neto (1986), em artigo publicado sobre a emigração portuguesa para França, diz que este é um dos países que tem atualmente, com um grande número de portugueses que expressam o desejo de retorno. Outro estudo o de Afonso salienta que:

"... o que parece commumente partilhado e compreendido é que a permanência na sociedade de acolhimento é temporária; residir em França é sinónimo de um tempo/espaço provisório que visa alcançar objetivos precisos como, por exemplo, a construção de uma casa em Portugal, assegurar uma situação de estabilidade econômica/financeira em Portugal, ... para talvez um dia ... regressar". (http://www.ces.fe.uc.pt/ - 2000). Pode-se dizer que os imigrantes de primeira geração vêem em países como França algumas barreiras para adaptação, diferentemente do que acontece no Brasil. Por outro lado os luso-descendentes têm mais facilidade de integração, principlamente no que se refere ao idioma, pois estão, em sua maioria, integrados ao país de acolhimento, enquanto que os pais preparam para o retorno a Portugal. Para Teixeira, que realizou pesquisa junto à comunidade residente em Toronto-Canadá, os dados referentes à habitação levantados dizem que: "A maioria dos imigrantes portugueses no Canadá (particularmente os açorianos) vem para ficar e isto tem se constituído em incentivo para que os portugueses se integrem na sociedade canadiana"(1999:62).


Ressalta também a importância da família e da igreja para os imigrantes portugueses, especialmente os de primeira geração, demonstrando que estes não se desvinculam das suas origens, dos seus valores, das suas raízes, embora se mantenham firmes no propósito de continuarem no país de acolhimento.

Quanto ao Brasil, mais especificamente a região de Pelotas, sabe-se que a integração foi facilitada não só pelo idioma, mas pelo convívio de familiares e amigos. Exemplos dessa constatação são encontrados em Branco (1991:62) destacando-se alguns depoimentos:

"Integração fácil, fui recebido por conterrâneos que deram apoio na habitação. Havia muita gente recém chegada aqui...". Outro depoimento diz o seguinte: "Não tive problemas, assimilei muito bem, o Rio Grande do Sul é muito parecido com o nosso sistema. ...". Salientamos a importância sócio-econômica do trabalho desenvolvido pelos portugueses na cidade de Pelotas e o quanto estes, na sua maioria, não pretendem deixar de trabalhar no Brasil (Fiss,1988).

O desejo de retorno nos países americanos como Canadá e Brasil é quase nulo se comparado com aqueles que trabalham, na Suíça, Alemanha, Inglaterra, França. Pois, aqueles que vivem, em países europeus, têm, em seu planejamento de vida, o objetivo de retorno a Portugal. É lá que estão construindo a casa dos sonhos, e para lá que mandam as suas economias, é lá que desejam viver depois da aposentadoria. Não são raros os casos em que o pai, o marido, deixa a família em Portugal, emigrando sozinho com o propósito de ficar fora alguns anos, ganhar dinheiro e retornar. Contudo esse tipo de situação já provocou a desunião de famílias que tiveram o marido constituindo outra família no lugar onde está emigrado.

Para aqueles que vieram para o Brasil, com exceções evidentemente, o desejo é de construir seu patrimônio, ter toda a família reunida, mantendo vínculo com parentes em Portugal, mas ir a terra natal de passeio. A importância econômica do imigrante é significativa frente às remessas que estes efetuam, dos onze países registrados no Banco de Portugal. Registra-se o maior índice entre aqueles que mantêm familiares, negócios em Portugal ou estão pensando no retorno após a reforma. Conforme artigo publicado na Revista Portugal (nº 117, p.4), os portugueses fora de Portugal

"assumem-se hoje como a fatia da população portuguesa com a maior capacidade de produção de riqueza, traduzida nas remessas que regularmente enviam para o nosso país, superiores aos fundos comunitários que Portugal recebe da União Européia e muito acima das receitas provenientes do turismo".
Por outro lado, o jornal Lusitano de 02 de dezembro de 2000 noticiou uma redução nas remessas enviadas pelos imigrantes a Portugal, estando essa redução concentrada no mês de agosto. Informações que confirmam a tendência dos imigrantes radicados nesse país de estarem menos interessados no regresso. Para aqueles que pensam em retornar a Portugal, estejam onde estiverem, será que acreditam efetivamente nesse retorno? Para muitos é, e sempre será, uma difícil decisão. Além de outros fatores estão os filhos, que já formaram a sua identidade sócio-cultural no país onde foram criados, ou mesmo onde nasceram. Isso colabora para que os pais vejam na casa que construíram na aldeia portuguesa algo que não sabem como resolver. Como podem os imigrantes suportar todas as dificuldades quer sejam elas emocionais, sociais, culturais e físicas sentidas na nova terra? É neste sentido que aparecem as associações das comunidades portuguesas.

As associações e sua importância nas comunidades: o exemplo do Brasil

Em todo o mundo onde a numerosa comunidade portuguesa se faz presente, está, também, a união em torno da manutenção dos seus valores culturais, da preocupação com a sociabilização e atividades ligadas à área da saúde e da assistência. No Brasil, onde a integração dos portugueses é facilitada pelo idioma, as associações são a identificação ainda maior da sua cultura. É lá que fazem o cozido à portuguesa e oferecem aos amigos. É na associação que se tem o rancho folclórico com as danças da sua região e que procuram transmitir aos filhos. São nas associações que os pais levam os filhos no dia 10 de junho para que saibam melhor quem foi Luis de Camões e para ouvir o hino nacional português. Surgem também o grupo de canto coral com as diversas peças do cancioneiro popular português, entre outros, representando motivos mais do que suficientes para as atividades de congraçamento.

No Brasil, a exemplo de outras comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo, o desejo de manter as tradições, o sentimento de solidariedade, e a saudade, colaboraram para o aparecimento de diversas instituições, quer assistenciais, culturais, econômicas e recreativas. Ainda no período do Brasil Colônia surgiram as Santas Casas de Misericórdia. A primeira foi em Santos em 1543, a seguir foi na Bahia, em 1549 e em 1560 de São Paulo. Essas casas de assistência foram criadas com a finalidade de auxiliar aqueles imigrantes portugueses que se encontravam, na maioria, desempregados e com dificuldades.

A partir da independência do Brasil, os portugueses aqui radicados passaram a sentir a diferença de estar em uma terra não mais pertencente a Portugal, ou seja, na qualidade de imigrantes. Assim, inúmeras entidades de expressão e de caráter genuinamente português começam a existir tanto na área cultural como de assistência e de beneficência.

Em 14 de maio de 1837, no Rio de Janeiro, foi criada a primeira instituição cultural portuguesa no Brasil com o nome de Real Gabinete Português de Leitura, por iniciativa de um grupo de pessoas lideradas por Coelho Lousada, em 1830. Dessa iniciativa decorrem inúmeras outras, sendo que em 1840 o mesmo grupo cria a Beneficência Portuguesa do Rio de Janeiro. Em São Paulo a Sociedade Portuguesa de Beneficência é fundada em 1859 e, no final do século XVIII já existiam 18 organizações desse gênero espalhadas em todo o país.

Desde a independência do Brasil até os dias atuais, o número de associações de origem lusitana tem crescido expressivamente, somando 180 instituições no Brasil, conforme dados da Embaixada de Portugal no Brasil, que cadastradas e identificadas por estado e cidade. O estado de São Paulo por ser o centro do país onde se concentra o maior número de imigrantes de todas as etnias manteve, também, o maior número de portugueses. Com 70 associações em todo o estado e a cidade de São Paulo concentra 30 dos diferentes grupos associativos de imigrantes portugueses.

Por outro lado o estado do Rio de Janeiro possui 62 associações, sendo que 50 se concentram na cidade do Rio de Janeiro. A seguir está o Rio Grande do Sul com 8 associações, o que demonstra possuir um número bem menor de imigrantes portugueses sem que isto diminua o significado para aqueles que delas participam.

As inúmeras atividades a que se destina cada instituição, mostra que, a exemplo de outros organismos do gênero, a Casa de Portugal de São Paulo, fundada em 1935, "tem como principal preocupação apoiar os membros da comunidade e preservar e difundir a cultura portuguesa. Além de possuir uma biblioteca com mais de 20 mil volumes de autores portugueses em diversas áreas do conhecimento, a instituição mantém 15 grupos folclóricos, corais, orquestras e grupos de teatro" (Imigração Portuguesa no Brasil,1999:32).

Quanto aos esportes destacamos por exemplo, os clubes Vasco da Gama (Rio de Janeiro) e a Portuguesa de Desportos (São Paulo) que fazem o orgulho das torcidas lusitanas no Brasil. O Clube Portuguesa de Desportos, fundado em 1921, é o resultado da união de cinco clubes portugueses existentes em São Paulo, possui um estádio para vinte e cinco mil pessoas e um ginásio desportivo para dez mil pessoas. Destacando-se em vários modalidades esportivas entre las o futebol e o hoquei de patins.

Na área comercial, a Câmara Portuguesa de Comércio de São Paulo, inaugurada em 1912, colaborou para que fossem reforçados os intercâmbios nesse campo e para que outras instituições do gênero no país viessem a surgir com propósitos similares. Além do trabalho das diversas etnias que se somaram ao índio, o espírito associativo dos portugueses tem colaborado para a interpretação de uma história que favorece a redução de preconceitos quanto aos fatos históricos que ligam Portugal e Brasil. As associações de luso-descendentes têm trabalhado não só para a manutenção dos valores portugueses, como também para com a assistência, a cultura, e a sociabilização das comunidades em que estão inseridas.

As associações portuguesas no sul do Brasil

Espírito empreendedor, força de vontade e perseverança, não faltaram ao imigrante português que se instalou em território sulista, onde se pode destacar Pinto Martins, Gonçalves Chaves entre tantos outros que colaboraram para o crescimento da região e a formação cultural do povo gaúcho. A vontade de vencer, a dedicação ao trabalho, a necessidade de realização financeira em uma terra estranha são fatores que contribuem para que o tempo se torne reduzido ao congraçamento mais efetivo entre os imigrantes.

Mesmo assim os grupos associativos criados pelos portugueses de primeira geração tem sido a resposta ao desejo da manutenção das raízes lusitanas em solo riograndense, que totalizam 12 grupos, sendo oito informadas pela Embaixada de Portugal no Brasil, que são: Sociedade Portuguesa de Beneficência de Bagé, Bagé; Centro Português 1º de dezembro,Pelotas; Sociedade Portuguesa de Beneficência,Pelotas; Casa de Portugal,Porto Alegre; Instituto Cultural Português, Porto Alegre; Sociedade Portuguesa de Beneficência, Porto Alegre; Centro Português do Rio Grande, Rio Grande; Sociedade Portuguesa de Beneficência, Rio Grande, e mais 4 não citados pela Ambaixada Portuguesa: Clube de Portugal de Passo Fundo; Câmara Luso-Brasileira de Comércio do Rio Grande do Sul de Porto Alegre; Clube de Regatas Vasco da Gama de Porto Alegre e Centro Cultural Português de Ijuí. E por motivos diversos seis associações deixaram de existir e os objetivos das associações portuguesas localizadas no Rio Grande do Sul são sobretudo de caráter assistencial, recreativa, cultural e religiosa.

Para entender o funcionamento das associações realizamos ainda que resumidamente um histórico das Associações de Porto Alegre, Rio Grande, Bagé, Passo Fundo e Ijuí. Analisamos também algumas das associações que desapareceram ao longo da história.

Sociedade portuguesa de beneficência – Porto Alegre

Após a fundação da primeira Beneficência no Rio de Janeiro, em 1840, os portugueses, radicados em solo gaúcho, não poderiam deixar de lado a sua capacidade empreendedora. Estando o Brasil independente de Portugal e não mais podendo criar as Santas Casas, os portugueses tomaram a iniciativa de criar hospitais, em qualquer lugar que existisse uma colônia portuguesa. Em 26 de fevereiro de 1854, graças ao cônsul honorário de Portugal, em Porto Alegre, António Maria do Amaral Ribeiro, iniciou-se o projeto de criação da Beneficência, uma vez que existia na cidade, até a presente data, somente a Santa Casa de Misericórdia.

A concretização da idéia, com a construção do hospital, aconteceu em 2 de fevereiro de 1856, com a compra de uma casa que foi melhorada em 1863. Era necessário continuar o trabalho, pois ainda era pequeno e tornara-se inadequado. Em 1867 é lançada a pedra fundamental para a construção do prédio que abriga a atual Beneficência, situada à rua Independência. Por muitas dificuldades passaram aqueles que levaram à frente a idéia da construção, cuja inauguração ocorreu em 29 de junho de 1870. A Beneficência possuía um cemitério e uma granja onde instalaram uma escola e que aproveitavam para cultivo e criação de gado.

Mesmo com as dificuldades advindas com a implantação de uma nova filosofia social, política e econômica no país, os responsáveis pela instituição buscam o caminho mais adequado para com os imigrantes e o restante da população local.

Sociedade portuguesa de beneficência – Rio Grande

A Beneficência de Rio Grande surge no extremo sul do Brasil por iniciativa de alguns portugueses ali residentes e daqueles que já organizavam a Beneficência de Porto Alegre, pois desejavam estender a ação beneficente a todas as regiões mais povoadas do estado.Foram indicados no ano de 1854 alguns agentes para trabalhar pela concretização da idéia, destacando-se o Sr. José Francisco Duarte. Aos agentes cabia a função de conseguir mais sócios a quem era oferecido o tratamento em suas próprias casas, com as despesas de médico e farmácia por conta da sociedade.

Em 1857, pelo grande número de sócios na cidade e região, resolvem instalar uma enfermaria em Rio Grande pois a matriz, era em Porto Alegre a uma distância de 310 km. No decorrer dos trabalhos surgiram as dificuldades econômicas que colaboram para o desentendimento entre a "agência" de Rio Grande e a Matriz, fazendo com que os associados tomassem a iniciativa de criar uma sociedade independente. Assim, na data de 3 de julho de 1859, é criada a Sociedade Portuguesa de Beneficência da cidade de Rio Grande. Ao longo dos anos a Beneficência atuou com grande afinco no seu propósito não só para com os sócios como para com toda a coletividade. No entanto, hoje a Beneficência está passando por uma fase difícil para a continuidade e manutenção de seus propósitos.

Sociedade portuguesa de beneficência – Bagé

A cidade de Bagé recebeu ao longo do período migratório um contingente um pouco menor de imigrantes portugueses devido, principalmente, a estar afastada do litoral. No entanto, os imigrantes, a exemplo de Pelotas e Rio Grande, iniciaram a caminhada para a construção da sua própria beneficência desligando-se de Porto Alegre. Os principais lutadores pela idéia foram Antonio A. de Morais e Joaquim Duarte Ribeiro que deram início às obras em 07 de junho de 1871 e viram a conclusão do prédio em 1878.

Bagé, pela localização fronteiriça, presenciou um maior número de revoluções onde o período de 1893 a 1894 fez com que o exército ocupasse as dependências do prédio da beneficência. Em 1898 o mesmo é alugado para o exército e somente em 1914 a sociedade consegue retomar o seu patrimônio e concluir algumas obras. Com a redução acentuada da entrada de imigrantes portugueses no Brasil, regiões como Bagé sentiram ainda mais a falta de incentivadores, de comerciantes abastados que colaborassem nesse trabalho.

Passando a sociedade por diversas diretorias e muitas dificuldades, o hospital foi alugado para médicos particulares que não cuidaram do patrimônio devidamente. A partir de 1975 o magnífico prédio deu lugar ao Museu D. Diogo de Souza e a Secretaria de Assistência Social, do município. Contando com 60 sócios e continuando o propósito da manutenção do ideal de seus antepassados, a sociedade tem suas atividades voltadas para o auxílio médico-hospitalar.

Casa de Portugal – Porto Alegre

Pela iniciativa do então cônsul Dr. Antônio José Rodrigues, em 1934, teve início uma associação que objetivava a propagação da música, arte e costumes, favorecendo a união dos portugueses radicados em Porto Alegre através de um programa transmitido pela rádio Difusora que tinha o nome de Hora Portuguesa. Logo o mesmo se conceituou, aumentou o número de sócios dando origem à Casa de Portugal. Em 1948 foi adquirida uma casa com um terreno onde, mais tarde, foi construída a atual sede da instituição (1958).

A partir de 1957 foram criados conselhos com objetivo de alavancar a cultura em diferentes áreas uma vez que já coordenavam o programa "Assim é Portugal" e "Memórias de Portugal". Um dos conselhos chamado de "Conselho dona Leonor" se dedicou à recolha de doações, prática de caridade, realização de chás e festas beneficentes. O conselho Infante Dom Henrique se preocupou com a divulgação das atividades portuguesas através do jornal "Caravela", sendo este a primeira publicação do gênero no estado.

Em 1972 foi adquirido um terreno com quatro hectares para construção da sede campestre, cuja inauguração aconteceu em 18.12.1977, com missa campal celebrada no local. Como resultado da iniciativa e vontade daqueles que deram início a essas atividades surge ainda o Rancho Folclórico. Contando com luso-descendentes e brasileiros, tem sido, além de divulgador da cultura portuguesa, um grupo que representa muito bem o Rio Grande do Sul quando se trata de representações artísticas.

Centro Português – Rio Grande

O Centro Português de Rio Grande, fundado em 31.7.1932, teve como primeiro presidente Joaquim Francisco Marques que deu início, naquela comunidade, juntamente com um grupo de portugueses, ao intercâmbio cultural e incremento às relações entre Brasil e Portugal. Essa associação dispõe de uma sede social no centro da cidade onde funciona a administração e a biblioteca. Também, em ampla área verde foi inaugurada, em 1987, uma sede campestre que compreende salão, bar, cozinha, salas de jogos, salas de diretoria e conselho deliberativo, restaurante e churrasqueiras. A parte cultural está bem representada pelo Rancho Folclórico que tem realizado intenso trabalho no sentido de mostrar as diferentes regiões de Portugal.

Instituto Cultural Português – Porto Alegre

Fundado em 10 de abril de 1979 por iniciativa do Prof. António Filipe Sampaio Neiva Soares, essa instituição tem congregado não só portugueses e descendentes, como também professores e amantes da cultura de diversas etnias, que através de diferentes projetos têm mostrado a integração do povo luso-brasileiro.

De acordo com a publicação de Soares (1988) diversos cursos, seminários, publicações e programas foram editados desde a sua fundação até os dias de hoje. Por exemplo: cursos de arte e cultura portuguesa; publicação da revista Caravelas; exposições, palestras e conferências; diversas publicações; ciclo de debates sobre a poesia do Rio Grande do Sul; projetos diversos; comemorações do cinqüentenário da morte de Fernando Pessoa; programa radiofônico "Presença de Portugal"; jornal Caravela; "O açoriano na formação do Rio Grande do Sul" em congresso nos Açores; realização do "Simpósio Internacional da Presença Portuguesa ao Sul do Brasil", entre outras atividades. É uma instituição que tem participado de diversas iniciativas em conjunto com outros organismos culturais do estado.

Câmara Luso-Brasileira de Comércio do Rio Grande do Sul – Porto Alegre

Com o propósito de aproximar Portugal e o Rio Grande do Sul através das relações comerciais é criada a Câmara Luso-Brasileira de Comércio do Rio Grande do Sul em 13 de dezembro de 1978. Esta tem a finalidade de prestar informações aos brasileiros interessados em atuar em Portugal e na União Européia, indicar endereços de importadores e exportadores portugueses, prestar informações nessa área e, também, validar certificados de origem de produtos exportados do Rio Grande do Sul para Portugal.

Clube de Portugal - Passo Fundo

Esta região não concentrou, nestas últimas décadas, um grande número de imigrantes, a não ser pela descendência natural em função do grande contingente que se espalhou por todo o estado, além de um reduzido grupo oriundo do arquipélago dos Açores. Criada em 3 de janeiro de 1986 e sendo de natureza social, beneficente e cultural, promove reuniões beneficentes, culturais, cívicas, recreativas e esportivas, auxiliando, ainda, na prestação de assistência médica, jurídica e educativa aos associados. Com o apoio da Prefeitura que, em 1987, cedeu a utilização de um terreno pelo período de 20 anos, o Clube passou a construir a sua sede própria.

Centro Cultural Português – Ijuí

Fundada em 05 de janeiro de 1988 é a associação portuguesa mais jovem do estado, de que se tem notícia. Possui uma sede própria onde desenvolve inúmeras atividades objetivando o resgate e valorização da cultura portuguesa.Em 7 de outubro de 1990 foi criado o Rancho Folclórico com o propósito de realizar um trabalho de pesquisa e divulgação do folclore do norte de Portugal e do Arquipélago dos Açores, em que participam 35 pessoas.

Clube de Regatas Vasco da Gama – Porto Alegre

Essa associação se originou do descontentamento de um grupo de portugueses que integravam uma associação de remo de imigrantes alemães. Liderando o grupo o timoneiro José da Costa Dias e três companheiros fundaram o Clube de Regatas Vasco da Gama em 28 de janeiro de 1917. Hoje suas características de atuação não mais se identificam como uma instituição de cultura genuinamente portuguesa.

Associações extintas no Rio Grande do Sul

Gabinete Português de Leitura - Porto Alegre

Com o propósito de divulgar a cultura portuguesa no sul do Brasil, este gabinete fundado em 6 de junho de 1964, desempenhou as atividades a que se propunha durante 10 anos. Contava com uma biblioteca e realizava programações diversas, como cursos, conferências, etc. Não possuindo sede própria, funcionou, por algum tempo, junto à casa de Portugal e, em 1982, por inúmeras dificuldades de continuidade, acaba por se extinguir.

Congresso Português 1º de Dezembro e o Grêmio Republicano Português – Pelotas

O Congresso Português 1º de Dezembro fundado em 1895, tinha como propósito a filantropia e a recreação. Seus associados, na maioria monárquicos, tiveram seus ideais desgastados diante das modificações políticas em seu país. Por outro lado, o Grêmio Republicano surgiu da iniciativa de alguns imigrantes que defendiam os ideais republicanos. Após a proclamação da República em Portugal, em 1910, sofre uma diminuição de entusiasmo na sua propagação ideológica, levando seus sócios à integração com o Congresso Português 1º de Dezembro. Dessa integração resultou a extinção de ambas em favor da criação do Centro Português 1º de Dezembro.

Centro Republicano Português – Porto Alegre

Pouco se sabe sobre esse centro a não ser que teve início em 05 de outubro de 1913 e que sua finalidade básica era a filantropia, onde os portugueses em dificuldade teriam direito a ajuda no caso de doença e receberiam uma passagem de regresso a Portugal, se necessitados.

Desconhece-se a data da extinção e os motivos.

Grêmio Lusitano – Rio Grande

As poucas informações sobre essa instituição só mencionam que a mesma existia no ano de 1936 e que seu objetivo era na área do lazer. Inexistem dados sobre os motivos e datas da extinção.

Câmara Portuguesa de Comércio e Indústria – Rio Grande

Fundada em 12 de agosto de 1934 foi oficializada pelo Governo Português por Decreto nº 26.339, desconhecendo-se detalhes do seu período de duração, data e motivos da extinção.

As associações portuguesas localizadas na cidade de Pelotas

Sociedade Portuguesa de Beneficência

A forma empreendedora com que muitos lusitanos trabalharam em Pelotas colaborou para o desenvolvimento de uma das cidades mais antigas do estado do Rio Grande do Sul, incluindo-se aí o trabalho de assistência. Assim, em 21 de junho de 1857, surge a idéia de criar, em Pelotas, uma agência da Beneficência cujo modelo era a de Porto Alegre. Mesmo a uma distância de 250 km a entidade possuía, na cidade de Pelotas, 254 sócios. Foram responsáveis e incentivadores Francisco Luiz Ribeiro, Manuel Fernandes Lima e José Vieira Pimenta. Este último figura como colaborador em obras significativas da cidade.

Com a colaboração de alguns portugueses e homens de negócios, se deu continuidade ao empreendimento e que logo passou a ter 350 sócios, separando assim da Beneficência de Porto Alegre, em 28 de junho de 1858. Ainda nesse ano a sociedade recebeu, de Isabel de Fontoura Leitão, parte de um terreno onde foram iniciadas as obras do hospital e, em 1871, a mesma senhora fez doação do restante da quadra, o que possibilitou a expansão da obra. A pedra fundamental foi colocada em 13 de fevereiro de 1859 e o edifício inaugurado em 13 de julho de 1861. Como todo lugar lusitano, não poderia faltar a capela que foi igualmente idealizada e construída em 1891.

Ao longo dos diferentes períodos, cada diretoria, a seu tempo, contou com a colaboração dos empreendedores portugueses, sócios ou não, que apoiaram o trabalho, uma vez que toda a comunidade que beneficiaria com tal obra. Durante 143 anos, diversas pessoas somaram esforços para ajudar, como por exemplo as irmãs da congregação da Divina Providência. Melhorias na estrutura do prédio, complemento nas construções (incluindo bloco cirúrgico, maternidade, centro de recuperação etc), equipamentos modernos e pessoal qualificado fazem da Beneficência, atualmente, um hospital com uma área de 14 mil metros quadrados, 550 funcionários e uma disponibilidade de 296 leitos. Possui 254 sócios ativos (sócios com título e pagamentos mensais), 1.708 sócios remidos (sócios com título de pagamento integral), banco de sangue e o plano de Saúde Maior. Este último é oferecido e garantido pela própria Beneficência com um total de 11.500 pessoas, destes são 1 por cento de portugueses natos e 60 por cento são de descendentes.

No decorrer do tempo as instituições luso-brasileiras foram se moldando às novas realidades, o que levou, a exemplo de outros hospitais, a que a Beneficência não ficasse limitada aos pavilhões primitivos, dependendo de doações e do reduzido número de associados. Houve uma profissionalização, fazendo com que aqueles que definem os destinos da instituição pensassem que além de hospital de utilidade pública, sem fins lucrativos e com caráter filantrópico é uma empresa prestadora de serviços na área da saúde. Tem de sobreviver de seu faturamento, não podendo existir para somente dar assistência aos sócios ou acolher necessitados como acontecia com as Beneficências antigamente. Como bem salienta Moraes, presidente do Conselho Deliberativo: "se a Beneficência não tivesse modernizado e evoluído as exigências dos novos tempos, certamente já teriamos fechado suas portas, como vem acontecendo com algumas instituições do país"(2000:6).

Centro Português 1º de Dezembro

O Centro Português 1º de Dezembro surge da união do Congresso Português 1º de Dezembro e do Grêmio Republicano. Considerando que muitos dos sócios pertenciam a ambas as entidades, a idéia da fusão das mesmas não tardou a surgir após a proclamação da república portuguesa (1910-1911). No entanto a primeira reunião somente aconteceu em 9 de março de 1924, com decidida ação dos senhores Álvaro da Silva e Francisco Alves de Carvalho. No decorrer de seis anos se estenderam diversas tratativas até que em 24 de janeiro de 1926 acontece a assembléia geral criando o Centro Português 1º de Dezembro. Em 24 de janeiro de 1930 é inaugurada a sede com dois andares em estilo manuelino, no centro da cidade.

Em paralelo ao desenvolvimento das atividades relativas ao funcionamento do Centro Português 1º de Dezembro, a nova associação definiu, também, sobre a fundação da Caixa de Repatriação e Assistência Social. Essa tinha o propósito da realização de obras sociais mediante a colaboração voluntária, em dinheiro, por parte dos sócios. Com iniciativas empreendedoras por parte das subseqüentes diretorias decidem, em 1966, adquirir às margens do arroio Pelotas uma área de 75 hectares para construção de uma sede campestre. A antiga charqueada (4), pertencente ao comendador José António de Oliveira, foi transformada em uma área de lazer e um núcleo habitacional com o nome de Recanto de Portugal (5).

Em 1976, foi lançado o projeto de construção da sede campestre. Na primeira etapa da construção foram inauguradas as piscinas, o parque infantil, vestiários e canchas desportivas. Em 1983, foi inaugurada a segunda etapa do magnífico prédio onde se encontra o salão principal, camarins, banheiros, sala da Diretoria, sala do Rancho, museu da cultura portuguesa, sala de honra, cozinha, bar e restaurante. Hoje a área de lazer possui várias canchas desportivas, churrasqueiras, duas piscinas e, pela localização privilegiada às margens do arroio Pelotas, uma excelente área de pesca e ancoradouro. Ainda, no mesmo local, o Centro Português mantém a antiga casa da charqueada com um anexo para pequenas recepções que leva o nome de Sede Aníbal Vidal e a capela de Nossa Senhora de Fátima, onde são realizadas as comemorações religiosas.

A sede localizada no centro urbano possui sauna, sala de jogos, secretaria, biblioteca e um amplo salão de festas. A biblioteca é de uso restrito aos sócios, contando com um acervo expressivo sobre a história de Portugal (livros e revistas), e uma extensa bibliografia sobre o Arquipélago dos Açores, com um total de 1.800 volumes. Um dos locais mais utilizado é a sala de jogos, principalmente pelos imigrantes de primeira geração. Estes comparecem no período da tarde para o tradicional "jogo da sueca"(6), atividade que tem proporcionado, além do convívio entre os participantes, muitos títulos aos mesmos, quando de campeonatos realizados entre as comunidades portuguesas do Cone Sul, ou nos torneios internos.

Coloca também a disposição de seus associados sete dos 645 jornais portugueses entre eles: Matozinhos Hoje, Soberania do Povo, Lusitano, A Voz de Azeméis, Transmontano, O Emigrante Mundo Português, A Avezinha – jornal Algarvio, O Jornal da Região de Basto e Falcão do Minho. Ao assinar estes jornais o Centro Português mantêm os imigrantes e seus descendentes informados dos acontecimentos de Portugal. Para divulgar as atividades do Clube e também para manter os associados atualizados sobre a instituição, se publica mensalmente, desde julho de 1994, o jornal "O Farol".

Em 1980 foi criado o coral, que congrega um grande número de pessoas e esteve desativado por algum tempo mas hoje é um dos orgulhos da instituição, uma vez que, pelo menos, 75 por cento do seu repertório são de músicas portuguesas. Também há o Rancho Folclórico adulto e infanto-juvenil, fundado em 1986, além de realizar um importante trabalho cultural em Pelotas, tem como objetivo lembrar a terra natal e transmitir os valores lusitanos aos seus descendentes. Esteve desativado por algum tempo e a partir de 1990 vem trabalhando na demonstração das danças das regiões do Minho, Algarve, Nazaré, Ribatejo, Beira Litoral e Açores.

A comunidade lusitana comemora algumas datas entre elas: 22 de abril (descobrimento do Brasil), 10 de junho (dia de Camões, de Portugal e das Comunidades Portuguesas); 1º de dezembro (Restauração da Independência de Portugal); 13 de maio (festa de Nossa Senhora de Fátima), além de outras datas significativas. Realizam no decorrer do ano diversas festas (do bacalhau, queijos e vinhos, festa fuxico das raparigas, bailes de carnaval, etc), promovem jogos e torneios de diversas modalidades e também promovem seminários sobre a migração portuguesa no Brasil e no mundo. Possui atualmente 2.500 sócios de diferentes etnias, sendo que os portugueses de primeira geração e descendentes correspondem a uma média de 400 sócios, pois é um resultado natural uma vez que a imigração para o Brasil deixou de acontecer desde a década de 1970.

Os imigrantes e as associações em Pelotas

Como forma de melhor elucidar a importância da Sociedade Portuguesa de Beneficência e do Centro Português 1º de Dezembro para os luso-descendentes radicados em Pelotas, foram escolhidas, de forma aleatória, algumas pessoas vinculadas às respectivas instituições para que respondessem algumas questões. Foram entrevistados 11 imigrantes de primeira geração, 4 descendentes e 5 brasileiros com vínculo familiar com os imigrantes e com o clube.

Quando questionados "se pertenciam ao quadro de sócios da Beneficência", cinco pessoas responderam que eram sócios e as demais responderam possuir outros planos de saúde ou ainda não terem tido interesse. Quanto aos "motivos de tomar tal decisão", percebeu-se pelas respostas que se referem ao sentimento de valorizar o que lhes pertence, as respostas mas frequentes foram: "é uma das associações mais importantes...Trata-se de uma instituição que dá uma contribuição muito grande não só para os portugueses como para toda a coletividade"; outra diz o seguinte: "escolhi o Plano Saúde Maior por ser um plano de saúde criado pela Beneficência..." e também "é para preservar o que os portugueses fizeram pela cidade e principalmente para não deixar morrer as raízes portuguesas"

Talvez mais do que sentirem a necessidade de possuírem um plano de saúde, esteja a caracterização portuguesa; é uma casa com identificação do "ser português". A seriedade em não deixar morrer o que foi idealizado e construído pelos antepassados é algo que possui significado. Pensar que nos momentos de sofrimento terá o alento das pessoas com quem mais se identifica, se traduz em conforto, ainda que a saudade se faça sempre presente. Para as demais 9 pessoas do grupo essa questão não foi apresentada.

Com relação ao Centro Português 1º de Dezembro todas as pessoas entrevistadas foram unânimes em falar da manutenção dos valores lusitanos seja ele na gastronomia, nas canções interpretadas pelo coral, nas danças que o rancho apresenta ou no jogo da sueca. De acordo com as respostas dadas, alguns se expressaram quanto ao "porquê da decisão de ser sócio e o que significa pertencer ao Centro Português":

"Tem a leitura dos jornais para ver o que se passa em Portugal, é a segunda casa"

"...o valor que damos a isso é que nos mantêm capazes de continuar o trabalho. Sem associações é difícil de fazer".

"O clube é como se fosse a nossa casa, se faz tudo com amor, com carinho por que é a continuação da nossa vida ...".

"É como se estivesse em Portugal, é o lugar onde se mantém a tradição portuguesa".

"Venho confraternizar com os amigos, jogar a sueca, lembrar as coisas de Portugal".

"Todos os portugueses trabalharam muito para ter o Clube que têm ... custou a crescer mas continua crescendo".

"Faz parte da minha vida, não deixo de participar do Clube e da Beneficência por nada ... não abro mão disso".

"É uma maneira de cultivar as raízes, de me sentir como se estivesse em Portugal e passar essa mensagem para os filhos ... para não deixar morrer".

Observa-se que ser lusitano, compartilhar os mesmos interesses, estar reunidos em um local onde se mantém as raízes portuguesas, ter o ambiente familiar é algo a mais em sua vida; isso tanto para os imigrantes de primeira geração como para os descendentes. Sendo Pelotas, a exemplo de todo o país, uma mescla de etnias, não se pode deixar de considerar as famílias onde, por exemplo, o cônjuge não é português ou mesmo é descendente de outra etnia mas os hábitos mantidos são mais portugueses, como por exemplo: "O pai sempre fazia comentários sobre a sua região em Portugal e sempre nos levava para o clube ... mantive mais as tradições portuguesas do que pomeranas".

"Sinto orgulho de ser português ... é importante que a comunidade saiba quem foram os portugueses, que conheçam a cultura, a gastronomia...".

"Admiro muito os portugueses mais antigos ... o jogo da sueca, a atividade mais tradicional".

"... gosto do ambiente... estou no Rancho desde os 5 anos de idade".

Outros manifestaram interesse pelas raízes de seus antepassados ou de seu cônjuge dizendo: "Aprendi muita coisa, trabalhei muito, me integrei com as outras pessoas e sempre ajudei o meu marido"

"Quando casei não tive problemas de adaptação ... sempre trabalhei junto com meu marido no Clube"

"Me adaptei tão bem que me sinto como se fosse portuguesa".

"Muitas vezes dizem que não temos história ... estar no Centro Português é manter viva as raízes dos avós, dos pais, do marido, das pessoas que nos antecederam ... faço isso com muito orgulho"
 

Aos descendentes foi levantada, ainda, a questão de como se sentiam em relação aos amigos, aos colegas da escola, uma vez que, cantando no coral, dançando no rancho, participando do jogo da sueca, comemorando datas significativas para Portugal, pertencem a um grupo diferenciado entre os jovens pelotenses. Estes por unanimidade expressaram sentir orgulho das suas origens, de poder fazer algo ligado a cultura de seus antepassados. Embora alguns tenham mencionado que ainda existe uma referência negativa na forma como as escolas brasileiras enfocam a história do Brasil em relação a Portugal.
 

Considerações finais

As associações de identidade lusa no estado do Rio Grande do Sul, a exemplo das demais existentes em todo o país, evoluíram e continuam a evoluir na medida em que os tempos mudam, a medida em que os imigrantes de primeira geração e mais abastados desaparecem e os descendentes têm de tomar outras iniciativas para a manutenção dos patrimônios construídos ao longo do tempo.

O avanço da tecnologia, a assimilação de valores que se mesclam às dificuldades individuais e o acúmulo de trabalho ligado às necessidades de sobrevivência familiar, colaboram, muitas vezes, para o distanciamento desses mesmos valores. Por outro lado, existe um interesse e uma necessidade ainda maior de não deixar morrer as origens lusitanas. Mesmo aqueles que constituíram família com cônjuge brasileiro, fazem com que na educação dos filhos esteja presente a cultura portuguesa. Por exemplo, a manutenção dos hábitos alimentares como bacalhau à Gomes de Sá, caldo verde, rabanadas, fatias de Braga, pastéis de Santa Clara, os doces de ovos moles, entre outros, são mantidos entre as famílias luso-descendentes em Pelotas, mas principalmente nas reuniões festivas do Centro Português 1º de Dezembro.

Hoje as associações podem ser consideradas luso-brasileiras pelo expressivo número de sócios descendentes, de brasileiros e de outras etnias que as freqüentam, que fazem parte das diretorias e que trabalham por estas. Não seria possível pensar na manutenção das mesmas se assim não fosse.

Não se pode imaginar que nos clubes se encontrarão, para o jogo da sueca, somente portugueses com sotaque da aldeia e que no coral e no rancho folclórico só fazem parte portugueses natos. Na verdade, esses grupos recebem e assimilam a cultura brasileira, quer pela relação de casamentos, quer pelo trabalho, escola, vizinhos, etc. A integração das diferentes etnias e a evolução é inevitável, não se admitindo mais uma Beneficência ou uma Casa de Portugal socorrendo apenas o imigrante sem saúde, como acontecia no início do século XX, ou um gabinete de leitura somente emprestando livros aos associados. Como afirma António Gomes da Costa ( Rev. Portugal, nº 117:2-3): "vivemos um novo tempo e a maioria das associações vai seguindo o seu percurso, adaptando-se a outros cenários. Nunca dependeram dos governos, nem do orçamento da República, e, por isso, os homens que as servem e dirigem – ontem, hoje em grande parte brasileiros – saberão assegurar-lhes o melhor rumo, sem que para isso seja necessário despoja-las do tônus da portugalidade e esquecer o seu passado e a sua história".
 

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Notas

1. Cidades litorâneas, com exceção de Bagé que está no interior do estado próxima a fronteira com Uruguai.

2. Como eram chamados os portugueses que retornavam das colônias nesse período.

3. Forma como se estabelecia a vinda de pessoas da família e amigos para o Brasil (ex: o tio escrevia uma carta ao sobrinho que por sua vez chamava o irmão e assim sucessivamente).

4. Estabelecimento rural destinado à criação de gado, constituído de grande extensão de campo dividido, por cercas de arame, casa de residência do proprietário, casas de empregados, currais, mangueiras, galpões, lavouras, e outras instalações. Fazenda de criação.

5. Local onde está a sede campestre e núcleo residencial, tendo as ruas do bairro nomes de vilas e cidades de Portugal.

6. Tradicional jogo de cartas realizado entre duas duplas e que se traduz em um dos principais motivos das reuniões entre os portugueses de primeira geração em Pelotas, RS.
 

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