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Scripta Nova
REVISTA ELECTRÓNICA DE GEOGRAFÍA Y CIENCIAS SOCIALES
Universidad de Barcelona. ISSN: 1138-9788. Depósito Legal: B. 21.741-98
Vol. VII, núm. 143, 15 de junio de 2003

AMBIENTES TOPOGRÁFICOS DA ESCOLA PÚBLICA. SIGNIFICAÇÕES IMAGINÁRIAS PATRIMONIALISTAS

Evson Malaquias de Moraes Santos
Universidade Federal de Pernambuco, Brasil

Ambientes topográficos da escola pública. Significações imaginárias patrimonialistas (Resumo)

Investigamos as significações imaginárias sociais dos ambientes/locais de duas escolas publicas com a finalidade de compreendermos os usos e sentidos de inclusão e exclusão social efetivados por aqueles que as fazem no cotidiano. Pois, os locais/ambientes não são apenas produtos da racionalização humana, mas criação imaginária do sócio-histórico de determinada cultura de um povo. Os usos desses ambientes por todos aqueles que fazem a escola (professor, direção, alunos e funcionários), aparentemente, demonstram, relações democráticas e cordiais. Mas, o que prevalecem são práticas e sentidos hierarquizados, que definem, em certos momentos, o lugar de cada um. Efetivamos a etnografia durante 1 ano, levando em consideração a gestão da escola: um diretor eleito pela comunidade escolar, e a outra, o diretor foi indicado pela hierarquia da Secretaria de Educação de Pernambuco.

Palavras-chave: ambientes, escolas públicas, imaginário, patrimonialismo patriarcal

Topographical environs of the public school. Imaginary patrimonal significations (Abstract)

We investigated the social imaginary significations of the environs/locales of two public schools for the purpose of understanding the uses and meanings of social inclusion and exclusion on the part of those who constituted part of the daily life there.  This is because these places/environs are not only products of human rationalization, but also the socio-historical imaginary creation of a particular culture of a people.  The uses of these environs by all those who constitute the school community (teacher, director, students, staff) seem to indicate friendly democratic relationships.  But what prevails are hierarchical practices and feelings which tend to define the place of each.  This ethnographic study was conducted over the period of one year, targeting schools where the managers had been selected by different means: in one, a director elected by the community and the other, the director having been appointed by the Secretary of Education of the State of Pernambuco.

Key words:  environs, public schools, imaginary, patriarchal patrimony

A literatura educacional brasileira não se vem dando conta devidamente da importância dos estudos acerca dos ambientes topográficos como locais de significação imaginária*. Quando muito, observa apenas que as reuniões (efetivados em algum local) são feitas em horários inconvenientes e que as direções são impositivas e autoritárias. Por exemplo, Bueno (1987), em seu estudo sobre as APM (Associação de Pais e Mestres), observou que o horário de reunião convocada pela direção é inconveniente para a participação dos pais e, além disso, quando conseguem participar, são tratados asperamente pelos professores, ocasionando afastamentos dos mesmos da APM. Uma das mães comenta a agressividade do diretor da escola: "O seu Wilson não admite reclamações. Ele parece muito santo, mas ele é 'grosso'. (...) Se  a gente reclama ele diz: 'Não estão satisfeitos? Então vão procurar outra escola!" (Bueno, 1987, p.212). Avancine (1990), como os outros pesquisadores (Silva, 1989; Bueno, 1987; Calaça, 1993), observa que o "espaço" na escola só existe para os pais quando de ajuda braçal, mas se transforma em "lugar", hierarquização e cristalização de poder para alguns,  quando os mesmos pretendem decidir o rumo da escola.

Adiantemos que os sentidos inerentes aos ambientes topográficos estudados aqui são entendidos como patrimoniais e patriarcais, o que implica a questão da personalização do poder e apropriação dos espaços públicos pelo interesse privado. Ou seja, as relações interpessoais desenvolvidas nesses ambientes topográficos reportam, hegemonicamente, às relações de pessoalidade e de intimidade (inconvenientes ou não). Veremos mais adiante como essas significações  se materializa e constitui na pessoa do diretor.

Por ambientes topográficos entendemos a materialização da realidade (áreas construídas ou não) e um conjunto de características físicas de um local. Os ambientes topográficos são as coisas e locais “naturalizados” (sala, corredor, rampa, área livre). Recorremos a esta imagem apenas para diferenciar da designação espaço (que tem um sentido mais sociológico). Quando referimos as práticas e sua relação com objetos nos ambientes topográficos, o transformamos em um bem social. Ou seja, ele se “desnaturaliza” e sua existência passa a ser relacional. Devemos incluir aqui, não somente seus aspectos físicos, mas, também, os objetos que o compõem, pois está implícito que o objeto está imerso em um. sistema específico e em um sistema de práticas sociais e históricas. Um não existe sem o outro (Santos, 1999).

Investigamos durante os anos de 1999/2000, numa abordagem etnográfica, duas escolas no cotidiano: uma que vivenciou eleição direta para diretor  (chamaremos de escola Recife 1) e outra que não vivencia eleição direta para diretor  (chamaremos de escola Recife 2). Essas duas escolas situam-se na cidade de Recife, capital de Pernambuco (Brasil). Foram escolhidas essas duas escolas por se encaixarem no critério adotado aqui: a escola mais antiga na eleição direta (13 anos) e a outra por nunca ter tido um diretor eleito e já ter uma longa experiência nessa  função (12 anos). Esperávamos encontrar na escola Recife 1 uma redefinição dessa significação imaginária topográfica.

Quanto ao fazer no cotidiano, chamamos a atenção para o fato de que ele se apresenta sobre dois aspectos: 1) na interação interpessoal (visando apreender os tipos de relações sociais existentes) e 2) na realização de rituais (principalmente, os associados à religião e ao poder político instituído).  Ou seja, a escola é apreendida pela complexidade do imaginário auto-instituinte/instituído e que no cotidiano  só se faz instituindo mapas: o espaço e quase-lugares. Não há representar, dizer e fazer sem estar localizado (no tempo e espaço) - o espaço só é espaço porque há a criação do tempo. Estes mapas só se fazem pela capacidade humana de atribuir sentido ao mundo e às coisas. Ora, o estudo desses mapas possibilitará desvendar as relações e os tipos de força e papéis que cada um deve desempenhar e onde deve desempenhá-los.

A análise do cotidiano se fará pela referencial analítico do patriarcalismo. Ele será analisado e compreendido nos mapas pela categoria analítica da cidadania e do público - fundamentais para a modernidade -, pois  é por onde se observarão as significações do doméstico e das relações de favores, jeitinho e hierarquia, moldando e dando sentido aos mapas das relações sociais. Os espaços e quase-lugares são entendidos aqui, como significações culturais de sociedades e grupos, estabelecidos num tempo histórico concreto.

Os espaços são tomados aqui como locais de estratégias, de lutas e de embates. É o local das ressignificações. É propriamente a ação humana (consciente ou não, intencional ou não) nas coisas, nos objetos, nos ambiente topográficos, ressignificando-os. Os espaços são os locais da liberdade de ação e do conflito, do acordo e da negociação. Eles são os momentos (e tempo) do despreendimento do instituído. Os quase-lugares, entendemos como os locais dos poderes instituídos e hierarquizados, mas não eternos.  Isto porque por maior que seja a significação de ordem, há sempre possibilidade de ressignificação. Os quase-lugares são a naturalização da ordem, do poder instituído.

Além disso, numa sociedade patrimonialista e patriarcal como a nossa, a ausência nítida de fronteira é uma de suas marcas. Os usos dos ambientes escolares são permitidos a alguns e, em determinados momentos, em que o tempo imaginário permita, autoriza terceiros a participarem. Mauss (1999) nos mostra que diversos rituais só podem ser efetivados em lugares apropriados e em tempos certos, além de usos adequados de instrumentos - da mesma forma veremos também isso na escola pública.

Através das pesquisas educacionais brasileiras realizadas em várias federações como as de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Pernambuco, identificamos a instauração dos quase-lugares nas escolas. As assembléias/reuniões das escolas são transformadas em "quase-lugares" (demarcado/hierarquizado), em vez de espaço (disputa, liberdade, movimento). Há poucas condições para estabelecer a livre polêmica construtiva. As reuniões pedagógicas com os pais expressam bem as significações dos locais de reunião: há aqueles que sabem e aqueles que nunca saberão.  Há aqueles que falam (os professores e direção) e há aqueles que, apenas, ouvem (os pais e alunos). Isto foi observado por M. L. Tura em sua pesquisa no Rio de Janeiro. Ela notou que a passividade dos pais diante dos "mestres" era tão grande que: "Os pais ouviam silenciosamente os professores. Muito silenciosamente, tão silenciosamente que por vezes até incomodava" (Tura, 2000, p. 79).

Nas reuniões de Conselho de Classe[1], quase-lugar por excelência, é onde a prepotência, o racismo (à brasileira: alegre) e o machismo do professor afloram: o aluno é levado ao máximo do ridículo, menosprezado e, quando aluna,  ressaltados seus "dotes" sensuais. É no Conselho de Classe onde a nomeação institui as "qualidades" e materializa o "ser" aluno.  Quando se fala de Conselho de Classe fala-se em "uma prática formalizada, num ritual voltado para estigmatização do fracasso do aluno" (Melo, 1991, p. 164).  Uma listagem  de rótulos e apelidos são ditos na reunião, tais como "esse é dorminhoco", "mal comportado", "irresponsável", "cheio de direito", "filão", "jararaquinha", "fujão", "mal nutrido", "é um xarope", "amarelo" e "parece uma lombriga" (Melo, 1991).

Há uma questão que não pode deixar de ser destacada acerca do local da reunião do Conselho de Classe: o seu caráter sagrado (a sala dos professores). Ele é "inviolável" e "intransponível" : em momento e lugar, os estranhos não são autorizados a participar de alguma atividade. Além disso, o local normalmente escolhido é a sala dos professores, a Central de Tecnologia (CT) e a biblioteca. A sala de aula é negligenciada para os rituais de reunião dos professores e direção, o que sugere um local não muito valorizado.

Organizamos a nossa exposição em três momentos (e suas subdivisões): 1) Situaremos as questões teóricas e conceituais (patriarcalismo, cultura, espaço, quase-lugar, tempo) procurando apresentar as bases de interpretação do objeto de pesquisa; 2) aspectos históricos da instituição educacional da cidade de Recife visando situar as permanências e mudanças quanto às significações imaginárias estudadas aqui; 3) os espaços e quase-lugares das escolas Recife 1 e 2 (separadamente): a) Breve história social das escolas; b) os locais físicos e estruturais (e suas temporalidades); c) as significações dos locais de rituais de reuniões.

Patriarcalismo e a cultura doméstico-clientelista

A cultura entende-se, com Geertz (1989), por "teia de significados". Ela é pública "porque o seu significado o é" e sua "ação é simbólica". Portanto, ela tem que ser interpretada: ela não é dada. Cultura é atribuição de sentidos. Mas, também, como diz Laplatine (1988), ela é transmitida de geração a geração: ela se "aprende", ela se "ensina" (o que não nega a interpretação: haverá uma reinterpretação permanente da cultura "dada"). Há uma dimensão cognitiva e, conseqüentemente, se escolhe e se elege o que deve ser lembrado.

A cultura doméstico-clientelista é "produto" de um imaginário que se auto-institui, tomando as relações de dádivas patrimonialistas hierarquizadas como fundadoras da ordem social-histórica estabelecida. Ela se consubstancia pela instrumentalidade,  pela pessoalidade,   e afetividade. As escolas públicas estariam pautadas por este imaginário, o que ocasionaria ambigüidades quanto à instauração da autonomia e da democracia. Ela possibilitaria, na atualidade, a permanência de outras instituições sociais excludentes - o machismo e o racismo - que vivem do imaginário central: o erótico, o lúdico e o afetivo (os alimentos dessa instituição)[2]. Seriam esses componentes do imaginário que dariam a forma e alimentariam as instituições sociais, ao mesmo tempo em que são mantidos "intactos" e valorizados por estas.

Ora, esta cultura doméstico-clientelista está assentada historicamente em significações estatais patrimoniais em que todo o sistema educacional está contaminado. Ela não se apresenta imune às mudanças: o sistema educacional brasileiro (tanto em sua forma legal, função social, estrutura organizacional e quanto aos quase-lugares e espaços) vem sofrendo modificações ao longo do tempo como veremos mais adiante. Como está inserido histórica e socialmente, o sistema carrega suas contradições, suas antinomias em relação às significações patrimoniais e patriarcais: em certos aspectos carrega  os valores modernos (impessoalidade, tempo linear), e em outros, leva consigo toda a sua aura tradicional (pessoalidade, tempo “eterno retorno”).

A cultura doméstico-clientelista se expressa pela dádiva, mas não por qualquer dádiva (da partilha, por exemplo), mas pela do patrimonialismo patriarcal e cristã tradicional (da esmola, da caridade e da pena). Dessa forma, as manifestações do imaginário central, que se consubstanciam pela cultura doméstico-clientelista, só poderiam resultar num poder verticalizado, anticonflito, personalizado e antipúblico.

Por patriarcalismo entendemos que os laços sociais são estabelecidos por dependência, instituindo o "companheirismo" (vínculos e compromisso pessoais), em vez do "estatuto" (das normas impessoais), e que estabelece o poder em seu nome, em nome da tradição. Ora, o patriarcalismo, para sobreviver de forma original, sem máscara, precisa do espaço da "comunidade doméstica", pois é nela que a " 'autoridade' 1) do mais forte e 2) do mais experiente, isto é, dos homens sobre as mulheres e as crianças, dos capazes de portar armas e de trabalhar sobre os incapazes, dos adultos sobre as crianças, dos velhos sobre os jovens" se efetivam (Weber, 1994, p. 245). As relações se estabelecem pelo rigor de piedades pessoais (Weber, 1994, 1999). As relações de vizinhança são de "prestadora de socorro", de dádiva: a "prestação de favor" é a regra prática (Weber, 1994). O "trabalho de favor" pode se desenvolver para formas de laços de dominação patrimonial, com serviço de obrigação pessoal. Na dominação patriarcal a obediência pessoal ao senhor é percebida como sagrada. Esta dominação está pautada pelo "poder fundamental da tradição, da crença na inviolabilidade do 'eterno ontem'" (Weber, 1999).

Há um núcleo comum do patriarcalismo patrimonialista, que nos ajudará na análise das significações imaginárias dessa instituição social na sociedade brasileira e, particularmente, na escola pública. O núcleo comum é a  troca de favores centralizada numa pessoa ou grupo como a essência do vínculo social - o que implica a intimidade, a amizade, o compromisso, a dependência e a personalização. Não existem estas trocas de favores sem esses elementos (a intimidade, a amizade etc) os quais possibilitam que os laços não se rompam, pois são os alimentos da existência e formas de ser do laço social.

Os usos desses ambientes estarão relacionados a esse núcleo comum, pois dependendo da relação que o solicitante tenha com o superior, o momento oportuno, o lugar desejado, o solicitante poderá ou não ter seu objetivo atendido. A circulação de pessoas diversas da comunidade escolar, como se verá mais adiante, não espelha relações democráticas, mas ausência de fronteiras que sinalizam para um imaginário do éden que cria ilusão de que todos são iguais. É o que Barbosa (1999) chama de igualdade moral[3] ao analisar a ideologia de igualdade no Brasil.

Espaço, quase-lugar  e tempo: aproximações

O tempo e o local/ambiente escolar não são neutros, como a arquitetura, também, não. A arquitetura escolar

"é um programa, uma espécie de discurso que institui na sua materialidade um sistema de valores, como os de ordem, disciplina e vigilância, marcos para aprendizagem sensorial e motora e toda uma semiologia que cobre diferentes símbolos estéticos, culturais e também ideológicos” (Escolano, 1998, p. 26).

O local/ambiente-escolar "é um mediador cultural em relação à gênese e formação dos primeiros esquemas cognitivos e motores", ou seja, "uma fonte de experiência e aprendizagem" (Escolano, 1998, p.26).  O local/ambiente não é uma "coisa" objetiva, desprovida de sentido. Pelo contrário, o local/ambiente jamais é neutro, pois ele carrega valores e relações sociais. Reconhecer o "lugar" da escola significa dizer que um local apropriado para se ensinar e aprender e que também há de existir um especialista para que assuma essa responsabilidade. Dependendo do lugar, serão encontrados os materiais e instrumentos adequados para tal uso. A isso podemos dizer que o local escolar é sedentário, fixo e estável: não se consegue ver além de um lugar com sua característica própria: arquitetura especial, espaços adequados (construídos para esse fim ou não) e racionalização do tempo (Escolano e Frago , 1998).

Para o local/ambiente escolar existir, no entanto, recorre-se ao medidor do tempo como mediador simbólico: o relógio. Ora, o relógio marca o ritmo da ação, mede os rituais e ordena o ciclos de existência (Escolano, 1998). Portanto, o relógio cumpre uma função ordenadora do mundo. "A incorporação do relógio aos espaços escolares tem pois, além de um significado cultural, uma clara função pedagógica que se acrescenta às intenções educadoras das estruturas espaciais das instituições" (Escolano, 1998, p. 44). E por ser cultural é também histórico. Este tempo, a do relógio, é essencialmente moderno: linear, seqüencial e deslocado do tempo da natureza. Portanto, o tempo  moderno pode ser um instrumento controlador das ações  e planejador do futuro (racionalizador). Assim, o relógio, as normas e a agenda de alunos servem para educar para uma temporalidade que vai de encontro a uma temporalidade não-moderna.

O tempo é uma instituição imaginária social e não uma entidade “objetiva” e absoluta do imaginário individual.  Como diz Elias (1998), o tempo é algo que se aprende: não tem uma existência puramente objetiva. O ser é disciplinado para lidar com o determinado tempo social estabelecido - não é uma instituição individual, mas social.

"Ora, o tempo não se reduz a uma 'idéia' que surja do nada, por assim dizer, na cabeça dos indivíduos. Ele é também uma instituição cujo caráter varia conforme o estágio de desenvolvimento atingido pelas sociedades. O indivíduo ao crescer, aprende a interpretar os sinais temporais usados em sua sociedade e a orientar sua conduta em função deles " (Elias, 1998, p.15).

O congelamento do tempo é uma das marcas do nosso imaginário - ser e fazer ser. O tempo -progresso, linear e retilíneo, é incorporado, aceito apenas, para a manutenção e criação de uma temporalidade cíclica. Ou seja, a temporalidade moderna  é traduzida nas bases do retorno cíclico do eterno fazer da Casa-Grande (aceita-se a eleição - tempo de disputa- , desde que se tenha controle sobre ela, por exemplo)[4]. Isto quer dizer que temporalidades outras poderão ser resgatadas, reapropriadas para os interesses dessas significações, desde que se mantenham os fundamentos dessas significações. Ao mesmo tempo que partilha desse jogo (dessa troca), "cede" frente a outras significações. Por isso é preciso readaptar e reinterpretar o discurso moderno de impessoalidade, de representação política, para o da pessoalidade e da tradição. A nossa sociedade valoriza, não o desempenho, mas o "tempo de serviço"; não o esforço individual, mas a temporalidade cronológica controlada por seus detentores; não para a rotatividade dos gestores, mas o eterno retorno das funções como propriedade individual. Não a clareza das regras sociais, mas a ambigüidade das mesmas.

Faria Filho e Vago (2001) notam em seus  estudos sobre o tempo e a instituição social educacional que

“os tempos escolares são múltiplos e, tanto quanto a ordenação do espaço, eles fazem parte da ordem social e escolar. Sendo assim, são sempre 'tempos’ pessoais e institucionais, individuais e coletivos, e a busca para delimitá-los, controlá-los, materializando-os em quadros de anos/séries, horários, relógios, campainhas deve ser entendida como um movimento que tem ou  propõe múltiplas trajetórias de institucionalização”(Faria Filho e Vago, 2001, p. 118).

Em outro momento expõe sua noção de tempo escolar. “Os tempos escolares não podem”, argumenta os autores, “nesse sentido, ser desligados de das relações e dos tempos sociais dos quais a escola participa ativamente, seja para construir e reforçar, seja para destruir e desautorizar. Os tempos escolares se revelam e se realizam de fato como tempos sociais” (Faria Filho e Vago, 2001, p.118).

O que pretendemos chamar a atenção aqui é que em nossa sociedade coexistirá com o tempo moderno um tempo semi-tradicional: a ambigüidade do tempo. Estrutura-se com um tempo racionalizado (entrada e saída dos alunos, dia de prova, dia específico para comemorações etc) com outras temporalidades que identificamos como a do Éden (flexibilidade nas prestações de contas, ausência de fronteiras, emocionalidade)[5]. Portanto, o tempo, o espaço e lugar (preferimos chamar de quase-lugar) estão inseridos culturalmente e historicamente, o que significa dizer que cada sociedade institui contra-regras para a instauração das temporalidades e espaços/lugares, independentes das significações imaginárias do capitalismo.

Aspectos históricos da cidade de Recife e de sua Instituição educacional

Neste momento veremos que as significações de patrimonialismo, no Estado Pernambuco, e particularmente em sua capital, Recife, estavam bem mais explícitas do que atualmente. Várias formas de intervenções do mundo privado se faziam sobre o público: 1) professores eram indicados sem concurso público; 2) doações de imóveis do Poder público para setores privados; 3) ausência de compromisso público por parte dos professores; 4) o mundo religioso impondo-se sobre o público no cotidiano escolar. Vejamos com mais detalhes estas questões.

1) Professores eram indicados por políticos para assumirem a função sem concurso até recentemente (atualmente, qualquer pessoa que deseje entrar nos serviços do Estado, tem que se prestar concurso público. Existem as Procuradorias Públicas que têm a função de fazer cumprir as Leis). Como ilustração dessas significações, observamos que desde o Império (1822-1889), as relações de compadrio, de favores eram nas escolas públicas, práticas comuns. O Estado estava a serviço dos interesses privados, filhos de deputados, profissionais liberais, servindo-os na sua formação educacional. Assim, Em 1866, o relatório da Inspeção do Império lamenta e confirma a crítica dos republicanos, o favorecimento de pensionistas gratuitos no Ginásio Pernambucano (GP) a uma pequena elite de políticos, advogados e de fazendeiros. Montenegro expõe: "Não se conformava [João Barbalho] com a excessiva e quase suspeita magnanimidade presidencial autorizando matrícula gratuita a filhos de deputados provinciais, de advogados, de fazendeiros, de senhores de engenho, com prejuízo dos realmente necessitados" (Montenegro, 1979, p.202). No governo do Estado de Pernambuco, de Sérgio Loreto, na década de 20, uma das formas de acesso aos cargos de professor era a indicação política, passando por cima do processo de concurso. Porto (1977) expõe que o Governador conseguiu com a lei estadual 1.727, de 14 de maio, prover os cargos “SEM CONCURSO”. A Congregação do GP se opôs a tal medida, sendo contrária a indicação de um professor, o Sr. Eládio Ramos,  pelo governador. Conta-nos José Porto (1977): “Consultado o Ministério da Justiça – a que estavam afetos os negócios do ensino - a resposta foi categórica: a Congregação estava certa, não se podendo dispensar o concurso”. Mais do que passando por uma lei Federal, o governador garantia regalias com essa lei, pelo Ato 941 de 3 de julho de 1925, ao remunerar professores interinos que receberiam 900 mil réis mensais e iniciariam a lecionar a parti de 1929. Diversos professores do GP, também, na década de 50/60, entraram nesta instituição através de indicações de políticos ou pelos próprios professores catedráticos do quadro desta instituição. Escola da elite pernambucana, era um orgulho ensinar nela. Era uma prática comum ocorrer essa troca simbólica entre aqueles pares. São diversos depoimentos que atestam esses procedimentos. A ex-professora Auridéia Cardoso entrou no GP por indicação do professor Amaro Quintas – conta-nos Geraldo Barroso (1998). Ela relata: "Eu tinha 18 anos, estava jogando voleibol, quando Amaro Quintas me perguntou: 'Você quer ensinar no GP?' (...) no mesmo dia que eu cheguei com o bilhete de Amaro Quintas, já me mandaram entrar numa sala de aula, cheia de meninos". 

2) Além dessas intervenções privadas sobre o Poder Público, outras se faziam: prédios eram doados pelo Poder Público para construção de escolas particulares. Nas relações de compadrismo, Cândido Duarte, utilizava-se desse recurso para conseguir um terreno para construir sua escola Pinto Júnior. Conta-nos Waldemar de Oliveira, em seu livro de memória, que no período entre 1940 a 1947, recebeu uma “vintena de cartas” de seu amigo acima citado. Um dos conteúdos da carta era a solicitação de ajuda para a compra de um terreno. Oliveira (1997) registra que “seu sonho”, de Cândido Duarte, “agora, é um terreno na rua do Hospício, depois de ter sido, um outro, na rua Coelho Lisboa. Ou, talvez, o sítio do Cesário Nobre. Etelvino, ex-governador de Pernambuco, ouvido, acha salgado, o preço. Prefere na rua do Hospício, autoriza que peça 40 metros por 80, afirmando que o Governo lhe quer dar o terreno ‘de qualquer modo’” (Oliveira, 1997, p.204).

3) ausência de compromisso público por parte dos professores em sua responsabilidade de aula era uma outra forma de privatismo. Se no campo das relações pessoais e políticas as relações de proximidade davam as cartas a serem postas na mesa, o mesmo ocorria nas relações profissionais. Diversos recursos eram adotados por professores e funcionários para não cumprirem as suas responsabilidades profissionais (públicas). Até no GP, que tinha a tradição de rigidez e disciplina, era comum ocorrerem alguns tipos de procedimentos, como a falta de assiduidade, sair antes do término da aula e fechar o estabelecimento antes do término das aulas, expedientes adotados, também, por outras escolas. Montenegro (1979) observa que, no período de 1866-1870, no GP, a assiduidade por parte de alguns professores não era muito boa, aumentando as atividades dos repetidores, que residiam na escola, cuja função era substituir os professores em sua ausência. O diretor Geral da Instrução Pública, Francisco de Paula Batista, posicionou-se criticamente acerca da qualidade das aulas do nível secundário devido ao comportamento abusivo dos professores: estes ensinavam a particulares e em sua própria casa, estimulando os alunos apenas receberem os diplomas. Ele diz: "e alguns há, êle (..) que ensinam até de empreitada; recebem de cada estudante certa quantia para cada um dos preparatórios, que quer aprender. Daí não haver estímulo para estudo; mas desejo de aprovação" (Montenegro, 1979, p. 54).  Em 1873, segundo Olívio Montenegro, o regedor do GP, Augusto Carneiro, queria combater abusos de práticas dos professores. Era praxe os professores reduzirem 'a um mínimo de hora o seu tempo de aula, reduzirem às vezes a minutos, a 30, 20 e até 10 minutos, aulas que deviam ser de duas a três horas'" (Montenegro, 1979, p.170).  Os ex-professores do GP, na década de 50/60 do século XX, contam que existiam naquele período falta de assiduidade e malandragem dos professores/funcionários acerca de sua responsabilidade profissional e às vezes a direção agia ilegalmente quanto aos direitos dos professores. A professora Enilda Regina revela ao pesquisador, Geraldo Barroso (1998), rindo em alguns momentos, que

"os próprios professores já faltavam muito mais; no curso noturno muitos alunos abandonavam, faltavam muito. Me lembro assim das perseguições de seu Manoel, que era uma espécie de Chefe da Portaria lá do Ginásio. Ele vinha pra avisar a gente que o Colégio ia fechar (risos). A gente ainda dando aula. Geny se lembrou até que ele até vinha, às vezes, de pijama (risos) (ele morava lá) pra avisar que ia fechar o colégio (risos)".

4) O laicismo das escolas públicas nunca ocorreu em nossa cidade – ou pelo menos plenamente. Aqui, também, se dá uma nova “invasão”  do privado sobre o público. Falar de escola pública em Recife, é falar das significações religiosas em seu cotidiano. Não dá pra falar em escolas públicas no Brasil, e em Recife, sem referirmo-nos à instituição católica. Um aspecto a se observar do nascimento do GP, que se chamava antes de Liceu Provincial, Regimento de 1/09/1825, é que, quando transformado em 14/05/1855, em "um internato de educação pública, e de instrução secundária", denominado GP, aparece em um de seus primeiros artigos: "tenderá a constantemente a formar o coração dos alunos, e a inspirar-lhe o amor da religião e dos bons costumes, pela palavra e pelo exemplo". Por sinal, o seu nascimento "prático" se deu no Convento do Carmo (Montenegro, 1979). Um dos rituais dos alunos do internato, no GP no período de 1855 a 1858, segundo o pesquisador Montenegro (1979), era a oração. Às 5 horas acordavam para orar, das seis às sete e meia, lição com repetidores (auxiliares jovens dos professores), seguindo-se a hora do almoço, das sete e meia às oito. Logo após, aula até uma hora da tarde (Montenegro, 1979). Em 1870, foi reconstruída a Capela do GP, sob a iniciativa do  Pe. Francisco Rochael. Aos domingos e dias santos as missas foram restabelecidas. Os alunos participavam no coral. Era obrigatória a presença na missa dos alunos e funcionários que residiam no GP. Nesse período foram realizados diversos casamentos, no GP, de pessoas importantes da cidade de Recife (Montenegro, 1979). O Estado Novo (1937/1945) reintroduz na Constituição de 1937 a disciplina religião como disciplina obrigatória para os ensinos primários e secundários, com programas, horários e professores próprios. As mulheres assumirão esta tarefa: de catequizar os alunos. A chefe do catequismo era a professora Lourdes Dutra. A importância do ensino religioso pode ser averiguada no seguinte dado: enquanto existiam 227 professoras de Letras, o número de catequistas somava 230 (Cavalcanti, 1986). Uma das novidades do governo nesse período foi a criação do canto orfeônico, que, para seus idealizadores, expressava o espírito do escoteirismo em vez do individualismo. Uma das funções desse canto era publicizar mais a religiosidade cristã e o civismo. Em 1940 existiam 51 conjuntos orfeônicos e 2.200 orfeonistas (Cavalcanti, 1986).

Até o meado do século XX, a educação não era objeto central das políticas públicas. Ela não tinha autonomia frente a outras secretarias. As práticas sociais apresentadas anteriormente sinalizam para isso.  Somente em 1949 haverá uma autonomização da educação com o desmembramento da Secretaria de Estado dos Negócios da Saúde e Educação para Secretaria  de Estado dos Negócios da Saúde e Assistência Social e Secretaria de Estado dos Negócios de Educação e Cultura (Lei N° 458, de 22 de abril de 1949). Isto terá implicações políticas e importância para a educação e para a sociedade Recifense. As escolas normalmente funcionavam em residências rurais (nas Casas Grandes), urbanas e religiosas (conventos e Igrejas). Não havia um espaço definido como adequado para o ensino. Até hoje, muitas escolas públicas (escola Recife 1, por exemplo) tem nessas casas (readaptadas para o ensino) o seu funcionamento. Não é à toa que em vários depoimentos em escolas públicas no Brasil (Codo,1999; Mello, 1987), referência à família é uma constante para representar os laços sociais estabelecidos.

A instituição educacional atual é produto, também, das lutas democráticas travadas contra a ditadura militar (1964-1984). Os movimentos dos alunos e professores defenderam a democracia como forma de gestão e de sua própria natureza. A escola Recife 1 é decorrente desse momento de lutas em defesa de sua autonomia (eleições diretas para diretor de escola). Em vários cartazes, expostos nos murais pela direção, vimos a publicização de que ela, a escola, é democrática e participativa.

Atualmente, o Estado de Pernambuco tem, sob sua responsabilidade, 987 escolas, sendo 720 (1a a 4a. séries) e 790 (5a. a 8a série) – a Secretaria de Educação tomou como cálculo uma mesma escola que lecionasse 1a a 4a  e  5a a 8a. séries. O deslocamento de responsabilidades para o município chegou a desobrigar o Estado em 700 escolas. Em 1995, 1686 escolas estavam sob a sua responsabilidade. Encontramos, atualmente,  560.721 matrículas (1a série a 8a série) no Estado sob sua responsabilidade. Na cidade de Recife, o Estado é responsável por 117.505 matrículas e tem sob sua responsabilidade 278 escolas estaduais (Fonte: Dados brutos do Censo Escolar 2002. Secretaria de Educação – PE. Diretoria Executiva de Informação e Avaliação).

Vimos que a instituição educacional (autonomizada) é recente. O imaginário social em relação ao ambiente topográfico escolar (estrutura e organização do prédio) e sua significação de ordem temporal cronológica (moderna) vieram conviver com outras significações tradicionais (clientelismo, favorecimentos, religiosas, desprestígio do público com as irresponsabilidades dos professores e do poder público). A significação professora-mulher (sob o olhar cristão) será a origem do ensino de “ler e escrever”. Aos Homens couberam os ensinos superiores. Daí, certamente, termos atribuições de sentidos que perduram até hoje, no ensino fundamental.

Estudaremos a seguir a uma breve história social das duas escolas investigadas e os seus espaços e quase-lugares. Conheceremos, na atualidade, as significações topológicas constituídas no cotidiano escolar. Como se verá, ela ainda está presa a essas significações históricas apresentadas anteriormente

Os espaços e os quase-lugares das escolas  

Escola Recife 1:  Breve história social

Antes de introduzirmos as questões topológicas e seus sentidos, percorreremos o estudo das ações dos homens no tempo (daqueles que fazem a escola), tendo em vista que procuraremos compreender  se essas significações sociais alteraram-se no transcorrer da sua história e quais as relações sociais e políticas eram desenvolvidas nessa linha do tempo e sua relação com o momento da pesquisa etnográfica.  Não há espaço e lugar sem a ação do sujeito no tempo. Para preservação dos profissionais que fazem a escola, os identificaremos pelos signos F1, F2 etc (funcionários) e D1, D2 etc (diretores).

Esta escola se situa num bairro de classe média, próximo a supermercado, via de carros e ônibus,  rua com saneamento e a sua frente encontra-se uma pequena praça com uma quadra de futebol de salão (construída recentemente). O prédio da escola foi doado ao Estado por uma família tradicional. O prédio era um casarão antigo pertencente a um antigo engenho. Segundo dados do Projeto Político-pedagógico da escola, os pais dos alunos estão envolvidos em atividades “braçais (pedreiros, eletricistas, lavadeiras, vigilantes, faxineiras, empregadas domésticas, etc), profissões estas, que na maioria não exigem escolarização específica”. De acordo com as informações do Programa Bolsa Escola[6], da Secretaria de Educação e do Governo Federal, 52% dos pais inscritos (118) estão desempregados, 17% são assalariados sem carteira, 17% são biscateiros (não possuem atividades econômicas fixas). Quanto a sua formação educacional, 50% têm apenas a 4a. série completa, 33%  completaram o ensino fundamental (1a a 8a série), 7, 62% terminaram o ensino médio.

Esta escola ingressou na Unidade Executora (autonomia financeira, administrativa e pedagógica da escola. Para alguns estudiosos sua privatização), criou vários conselhos (acompanhamento do PDE, Conselho de Classe, Conselho da Escola) e diversas reuniões (com pais, alunos, festivas, esportivas) e Feira de Conhecimentos. Esta escola já foi premiada pelo Estado de Pernambuco com parceria com a União (Governo Federal) como melhor gestão. O seu quadro de “Recursos Humanos” é bastante extensivo e completo (o que diferencia de muitas escolas públicas do Estado em Recife onde são bastante precárias): 1) direção: 1 diretor, 1 diretor adjunto e uma secretária; 2) técnicos psico-pedagogogos: 1 coordenadora de pedagogia e 1 psicóloga; 3) professores: 36 ;  Coordenador de Biblioteca: 2; Coordenador de Central de Tecnologia: 2; Agentes administrativos: 5; Auxiliares de Serviços Gerais: 4; Cozinheiras: 2.

A escola, quando assumida pelo Estado, foi pintada de azul escuro e cinza, segundo a atual diretora. Conforme a funcionária (F1), que chegou em 1974, nesta escola, para atuar como agente administrativa, "aqui em baixo, só tinha esse pátio, que era área de recreação e mais duas salas". Uma outra funcionária (F2) chegou à escola em 1974, sem esta estar desmembrada, para assumir a função de zeladora.  Segundo ela, no lugar das salas que ficavam próximas ao pátio era somente matagal. Segundo ela, o piso do pátio já era cimentado. Uma outra funcionária (F3) chegou a esta escola em 1982, para se somar aos quadros profissionais. Ela veio lotada na função de "Serviços Gerais". No seu início, a escola possuía um gabinete dentário, que servia aos alunos, principalmente, e, secundariamente, à comunidade. Segundo a funcionária (F2), o gabinete dentário funcionou por uns 18 anos. Esta escola já chegou a ser roubada várias vezes e foi objeto de vandalismo segundo a funcionária (F1). Conta ela que "além de levar a merenda, sujaram muito a escola. Defecaram dentro [dela], estragaram o arquivo, jogaram pastas no chão, rasgaram documento [(...)] atiraram ovo nas paredes". Isto ocorria no final de semana e ninguém via nada. Anos depois, 1991, aproximadamente, roubaram o aparelho de som da escola.

Quando a diretora anterior se retirou da direção, a secretária assumiu esta função - temporariamente. Ela se aposentou, e foi então que surgiu a iniciativa de convocar a eleição direta para diretor. A candidata foi a diretora (D4). Ela não tinha experiência administrativa, era professora de educação física. Ela deu muita ênfase à educação física, valorizando essa disciplina, conta a funcionária (F1). Segundo ela e outras entrevistadas, não havia presenças de políticos na escola. Não ocorriam reuniões ou visitas por parte deles. Com uma exceção, pelo menos, pelo depoimento prestado, a funcionária(F3) foi indicada por político com uma "carta de apresentação". "Ele me arranjou um emprego, né, ele me deu já uma carta de apresentação, assim, já pra eu me apresentar na DERE, e lá me deram a ordem de trabalho". Mas ela critica os políticos. Para ela, quando os políticos "ajudam" é porque é obrigação deles.

Já a diretora atual chegou nesta escola em 1986, como estagiária. Hoje, terminou um curso de especialização em gestão escolar. Em 1996, ela já concorria como vice-diretora na eleição. Ela é defensora de aula de religião na escola e combate as sujeiras no interior da mesma. Ela já organizou mutirão de limpeza. Uma das conquistas da escola, segundo a diretora atual, foi o fim da violência e das drogas. Ela disse que não defende policiamento na escola.

A partir da história da escola, vimos que os ambientes possuem uma história e que ela está relacionada com as práticas de desvalorização dos mesmos (roubos e depredação da escola), com certas disciplinas de caráter doméstico (Práticas do Lar), assistencialismo social (gabinetes dentários)  e com a política clientelista (muito mais acentuada na escola Recife 2). No momento histórico de desvalorização da escola, a diretora atuou  para sua purificação com os mutirões organizados e sua conservação (ela disse em entrevista ao pesquisador que os freqüentadores da escola eram pobres, mas não imundos).

Os locais físicos e estruturais ( e suas temporalidades)

Ver-se-á que os ambientes físicos não são somente físicos, mas imaginários. Nesse sentido, é importante situar as condições topológicas desses ambientes e os respectivos sentidos atribuídos a ele por uma coletividade dada. Por exemplo, a sala dos professores da escola Recife 2 não tem condições de receber uma reunião com os professores por turno, mas, mesmo assim, a fez lá - o que indica a importância dos mesmos na escola. Ora, o que vai determinar o valor de um ambiente não será a medida, os seus espaços físicos, mas as representações que se fazem do ambiente. O conhecimento das condições topológicas e de sua manutenção vai mostrar como as práticas culturais são constituídas por esta temporalidade e, ao mesmo tempo, as suas conseqüências (importância ou desimportância do ambiente atribuído por uma coletividade).

Os ambientes da escola são: 1. a sala da direção; 2. a secretaria; 3. a sala dos professores; 4. a biblioteca; 5. a central de tecnologia (CT); 6. a ante-sala; 7. o depósito de alimento; 8. a cozinha; 9. as salas de aula; 10. o pátio; 11. os banheiros (dos alunos e dos professores), 12. a área livre por trás das salas de aula  e  13. o portão lateral.

Cada local/ambiente, nas escolas investigadas, pode ser modificado a partir do sentido  atribuído a ele. Pode passar de um local de espaço (liberdade, estratégia) para quase-lugar (hierarquizado, distinção) e vice-versa. Depende do momento de humor das autoridades, das atividades festivas desenvolvidas, do tipo de reunião (da pauta e de quem participa). Em princípio, pode-se afirmar que todos os locais da escola são espaços englobados de quase-lugares. É possível circular por todos eles sem maiores problemas. Não há distinção hierárquica explícita neles e entre eles. Há, sim, códigos circunstanciais para ter acesso a eles.  Isto significa dizer que quem detém o capital simbólico pode circular e possibilitar que outros circulem (Bourdieu, 1998).

Poder-se-ia enriquecer a questão que Castoriadis (1991) levanta sobre relação tempo e espaço e não somente da espacialidade. As hierarquias só existem no espaço, porque elas já se encontram aí (o espaço), mas só está aí porque foi possível estar além daí (a autocriação do tempo). Ora, diz Castoriadis, “o tempo não é simplesmente e somente indeterminação, mas aparecimento de determinações, ou melhor, formas-figuras - imagens-eidé outras” – o ambiente  é auto-instituição do tempo (o que não quer dizer determinação) (Castoriadis,1991, p. 226). Daí se pode concluir que o tempo implica o espaço, pois ele é emergência de figuras outras, o que exigiria espaçamento (Castoriadis, 1991). E dizer figuras outras significa dizer não apenas diferente, mas, principalmente, que uma não é determinada por outra, é apenas criada.  Mas ela, ao mesmo tempo, só existe e se faz num tempo e ambiente concreto.

Pode-se afirmar que a ante-sala, a sala da direção, a CT, a secretaria, depósito de alimentos e os banheiros (dos alunos e professores) e sala dos professores são os locais mais bem conservados, limpos e esteticamente valorizados. O seu estado e a arrumação são indicadores de sua importância para seus gestores. Estes ambientes (com exceção dos banheiros e depósitos dos alimentos) são locais de poder: 1. documentos dos alunos (a "vida dos alunos" como comumente um funcionário de secretaria se refere) 2. ambientes de decisão. Quanto aos bens simbólicos presentes, na sala da direção, por exemplo, as diretoras recorrem a diversos símbolos, entre eles, o religioso. Dois quadros com imagem de Jesus Cristo, com característica ocidental (branco, olhos azuis), se encontram lá. Isto fica claro como o catolicismo não pode ser apagado da significação escola (lugar da "razão" e do "progresso"), e que, o republicanismo não foi forte o suficiente para romper com o poder religioso no dia-a-dia[7]. Por sinal, esta escola é riquíssima em práticas religiosas.

Os ambientes que desenvolviam estes rituais religiosos e se recorriam a suas imagens e palavras eram as salas de aula (escola Recife 2), o pátio de entrada da escola (Escola Recife 2), e  as diversas paredes da antesala (escola Recife 1), dos corredores (escola Recife 1), dos murais (ambas escolas), no pátio interno (escola Recife 1). Buscava-se assim, transformar alguns ambientes “profanos” em ambientes sagrados, onde a harmonia e a construção de um imaginário de irmandade prevalecesse (mesmo que isso não se materializasse nas relações sociais desenvolvidas nos momentos de reunião, onde se efetivava as decisões de poder). Este imaginário era de ordem anti-conflito.

Como dissemos anteriormente, o imaginário cristão e seus símbolos permeiam o dia-a-dia da escola. É possível encontrá-los nos rituais de entrada de alunos na escola e em cartazes, desenhos e quadros (com imagens de Cristo e Santa Virgem Maria). O símbolo do doméstico se expressa pela dimensão religiosa e pelo papel da mãe na nossa sociedade - ou pelo menos, para uma parte dessa sociedade. Conseqüentemente, expressa o poder do patriarca: como a mulher-mãe deve ser (bondosa, acolhedora). Nesse sentido, os símbolos religiosos se colocam no campo do “quase-lugar”: definindo o “lugar” da mulher em todos os locais e momentos do ambiente público no cotidiano escolar.

Se a dimensão religiosa cristã está bem presente na escola, também se fará sobre a Mãe. Mensagens em cartazes, homenagens se fazem presentes no dia-a-dia da escola. A mãe, como parte do mundo doméstico, será eleita a virtude mais destacada, mais glorificada nesse universo patriarcal. E não poderia deixar de ser: ser mãe, no imaginário social dessas escolas, é somente doação à família e aos filhos. Ser mãe não é ser mulher - desejante e desejada. É interessante observar isto numa instituição em que o desnudamento do corpo[8] é profundamente criticado pela direção (pelo menos na escola Recife 1). A pureza (as mães) e a impureza (o desnudamento) são formas de manifestação de uma sociedade hierarquizada que não consegue ver a mulher por "inteiro". Ou deve estar à disposição dos homens como objeto de prazer, ou como protetora e símbolo do lar. Como observam DaMatta (2000) e Parker (s/d), há dois tipos de mulheres na sociedade brasileira: uma que pode ser "comida", a concubina (a da rua), e outra que, sob certos momentos e aspectos, não pode ser "comida", porque é esposa e mãe. É esta ambigüidade que possibilita transitar para uma violência contra a mulher quando se considera que esta é uma "vadia", ou vangloriar sua beleza corporal e pular para um outro pólo: pureza da alma e do espírito (ser mãe).

Há um painel grande, de fundo azul, com o desenho de uma criança e uma mulher segurando essa criança, com diversas estrelas cortadas, de papel laminado, dando  a entender que é Jesus Cristo. Está escrito : "Maria,  modelo de todas as mães, ilumina com a luz do teu amor, o sacrifício e a dedicação da nossa querida mãe".  Maria serve como mediação, sendo a "Mãe de todos homens e velando por todos eles" (Parker, C. , 1996). Um outro cartaz diz : "Mãe é uma palavra tão pequena mas tão grande ao mesmo tempo. Mãe é tudo. Mãe é viver, é amor, alegria, sabedoria". De fato, mãe é "tudo". Ela serve para toda a obra. É uma supermulher. Como diz a continuidade do texto:" Mãe é aquela que consola, que ajuda, nas horas mais difíceis, que cuida dos filhos, que ama, dá carinho e não só está junto dos filhos na alegria e tristeza também".

Mensagens de humildade hierárquica cristã são apregoadas em cartaz: "Nada façais por contenda ou por vanglória, mas por humildade. Cada um considere os outros superiores a si mesmo". A humildade é valorizada como uma atitude diante da vida e do ser humano. O espírito de humildade é o que possibilita receber Jesus, pois ele é benevolente e só pensa nos outros. Sendo igual a ele receberemos a Graça divina.

Já na ante-sala, encontra-se o relógio racionalizador das condutas e também mensagens religiosas, em cartazes, disputando com o relógio o seu poder - nesse sentido, convivem harmonicamente. A obrigação de acionar a sirene da escola é da secretaria, mas, às vezes, os alunos (ou professores), tendo o registro do relógio, acionam a sirene. Ou seja, aqueles que estão sobre o controle do tempo assumem o seu funcionamento contra eles próprios. Mas, há algo mais: como não há fronteiras claras e visíveis para todos  nos ambientes da escola, eles assumem a responsabilidades da secretaria, acionando o toque da sirene (por sinal, a precisão do toque da sirene não é o ponto forte das escolas investigadas: normalmente, a sirene toca 4, 6 minutos após o horário marcado para tal) – as reuniões, também, nunca iniciam na hora estabelecida (ocorreu atraso até de 1h30m).

Quanto à freqüência nesses ambientes, expressa-se a ambigüidade da cultura doméstico-clientelista :  não se distinguem claramente quem são seus freqüentadores, dando a entender que a liberdade reina (todos são iguais). Os alunos freqüentam sem constrangimento todos eles (com exceção da sala da direção e dos técnicos-pedagogos, que ficam fechadas). O piso da ante-sala é de cerâmica antiga, sem brilho, de cor avermelhada. Constantemente se encontra limpo. Algumas vezes estava suja quando por ocasião de atividades festivas. Além das conversas e brincadeiras dos alunos nessa área, os alunos a freqüentam para telefonar ou brincar no telefone. A sala da direção estava fechada constantemente, com chave, ou encostada, pela ausência dos membros da direção. Poucas vezes os alunos se encontravam nela por este motivo. Normalmente quem a freqüentava era a diretora/adjunta, secretária, funcionários administrativos e professores. O seu piso estava sempre limpo. Havia poucos papéis no birô. Já na CT, todos freqüentavam: alunos, professores, funcionários administrativos (em menor número) e direção. O piso estava constantemente limpo e asseado. O piso da secretaria, também, estava constantemente limpo. Nos birôs havia poucos papéis e o rádio estava normalmente ligado. Os funcionários ouviam constantemente músicas através de dois rádios a sua disposição. Os depósitos de alimentos também estavam limpos, assim como o chão e a parede. Normalmente quem os freqüentava era a cozinheira, o servente e a direção. Quando dividiam seus espaços com materiais didáticos, os professores entravam nele para pegá-los para sua aula. Os banheiros dos alunos tinham azulejos até a altura de 1,5m, com bacia e pia. Não exalava odor desagradável. A sala dos professores estava sempre arrumada e limpa e era freqüentada principalmente pelos mesmos. Às vezes, os alunos, a educadora de apoio e os funcionários a freqüentavam, sem constrangimento para os professores.

As salas de aula (é verdade que cadeiras novas foram compradas), a área livre, o portão e a biblioteca esteticamente são os menos valorizados. São as áreas mais poluídas. É também verdade que são os alunos os seus principais poluidores. As paredes das salas de aula têm mau acabamento (algumas danificadas), o chão, constantemente sujo, os quadros riscados, de giz e caneta, os combogós, quebrados. O ambiente "cheira" a filme de terror. Na biblioteca havia livros e revistas demais para seu tamanho. Normalmente os livros e jornais estavam espalhados pelas mesas e pelo birô da responsável. O chão estava constantemente sujo. Constantemente, a biblioteca se encontrava aberta nos três turnos e era freqüentada no período de aula. A área externa,  onde os alunos jogavam pião, é a mais suja e degradada. Faz-se  dessa área um depósito de lixo. Os alunos, principalmente, são os que freqüentam este ambiente. O portão é um dos ambientes muito procurado pelos alunos no recreio, pois faz contato com o "mundo externo", através de um buraco que possibilita passar tranqüilamente o braço para o lado externo. É por ele que os alunos conversam e compram seus "dudus" e "pipocas". Os picolés são comprados com a professora - ela deixa de ministrar aula para vender picolés parte do horário da aula que antecede o recreio (nossa forma patrimonialista cristã: a caridade às custas dos alunos). O ambiente que ela vende picolé é o pátio. De forma direta pode-se dizer que os alunos são os agentes diretos e responsáveis pela destruição desses utensílios ambientes.

A cozinha é um local também freqüentado pelos professores e técnicos: é um ambiente social, principalmente quando se desenvolvem atividades festivas ou algum tipo de recepção. Este ambiente não é apenas um local de produção culinária - é o mundo e o poder doméstico no ambiente público. Ela serve para "bater papo", falar assuntos sobre alunos e de filhos, planejamento de trabalho e "descansar". Ou seja, a cozinha não serve apenas para tomar "um café" rapidamente, como pensa Hall (1976), para as organizações burocráticas. Segundo este autor weberiano, este exemplo se localiza num "sistema de normas" estritamente regulado. Ora, na prática, ela é um local de aproximação e confraternização entre os pares da escola. Os alunos também a freqüentam para ajudar em alguma atividade. No dia das mães, quem preparou a refeição foi a pedagoga, passando da sua hora de trabalho.

Pode-se dizer que havia, no cotidiano, uma certa liberdade para freqüentarem esses ambientes anteriormente expostos, e que eram relativamente conservados. Esta conservação indica um grau de preocupação e cuidado da direção com o bem público, pelo menos nesse aspecto.  Já a escola Recife 2 é diferente: todos os ambientes encontrados estão sujos ou seu aspecto é degradado. Mas se verá que esses ambientes, nas duas escolas investigadas, modificariam seu trânsito e sentido, quando de determinadas atividades: se assembléia, reunião de Conselhos de Classe, Conselho Escolar, festas pedagógicas ou não. Nem todos poderiam participar, transitar e "perturbar" (no caso das reuniões). Eles se tornariam "sagrados" e intransponível para alguns. As vestimentas e decorações também seriam outras.

As significações dos locais de rituais de reuniões

Um bom exemplo de um ambiente da escola que modifica seu sentido é a biblioteca. Nos momentos da realização do Conselho de Classe os alunos e outros estranhos a este rito são excluídos dele. Os rituais de reunião de Conselho de Classe são ritos de sacrifícios: os alunos são objetos de sacrifícios para a garantia da ordem e continuidade da ordem patriarcal. São rituais de exclusão de alunos e de caráter machista.

Antes  de mais nada é bom frisar que falar de rito é falar de ordem, pois sua etimologia  significa ordem. Ritus, em latim, está associado a formas gregas a ordem prescrita;  a raiz ar deriva do indo europeu védico (rta, arta) e remete à ordem do cosmo (Riviére, 1997).

As personagens principais dos rituais de reuniões nas escolas são os diretores (incluir aqui não somente a diretora, adjunta e secretária, mas as técnicas)  e professores. Os alunos e os pais são coadjuvantes - apenas legitimam as decisões deles. Quando há conflitos entre a direção e professores, as  personagens principais são os diretores e corpo técnico. Os alunos são muito dependentes das autoridades, precisando de sua proteção sagrada. Nas festas e atividades pedagógicas e esportivas, se unem:  solidarizam-se mutuamente - alunos, professores, técnicos trabalham em conjunto.

Ora, apesar de terem essas reuniões um caráter mais profano que religioso, todos os rituais só existem em lugares específicos (não se faz assembléia ou reunião num banheiro), que têm uma dimensão mais ou menos sagrada (acolhedora, identificatória e que é proibido ao contato humano). Como diz Gusdorf (1980), não existe festa e rito sem lugar. A realidade humana é vivida em algum lugar, em presença. Como dá para ver, o espaço não deve ser visto apenas como uma dimensão  racionalizadora - ela não se limita e restringe à dimensão do pensamento e de sua funcionalidade: há uma qualidade  no espaço mítico. O local/ambiente é uma construção de sentido - não existe local/ambiente independentemente da realidade humana. "Há, pois", destaca o autor, "uma coalescência do homem e do seu contorno. É o homem, sim, que impõe sentido à paisagem, mas também só a paisagem que é que assegura a completa realidade do homem" (Gusdorf, 1980, p. 68). Mas o local, para ser apropriado de fato,  por uma determinada comunidade,  necessitará de um ritual de posse. Sem dúvida, com esse procedimento ritual, transforma-se o local de "caos" em "cosmo". O local  é fechado por materiais visíveis ou imaginários, e ele define quem é estrangeiro ou não, quem pode ou não entrar nesta fronteira demarcatória. Em seu interior, definem-se as hierarquias e lugares.

Os ambientes principais de reunião que aglomeram muitos participantes são a CT, o pátio e a biblioteca. Estes locais normalmente ficam com muitas pessoas quando em atividade recreativa e pedagógica com alunos. Nas reuniões com professores, a CT é o local escolhido e preferido. Às vezes, o ambiente de reunião é a sala dos professores e a biblioteca. Quando faltam professores, a CT é ponto de apoio para colocar as atividades dos alunos, normalmente com filmes didáticos, sob o acompanhamento da responsável da CT. Quando ela não está, a bibliotecária assume essa função.

Um bom exemplo da superioridade das professoras e das assessoras foi a produção do regimento da escola (pelo menos na última reunião que ocorreu para esta finalidade de que se teve a oportunidade de participar). Elas liam diversas passagens do regimento, entre elas, e a aluna apenas observava: não falou um segundo sequer - era uma verdadeira figurante. A única vez que a aluna participou ativamente foi quando ela pegou o texto e ficou olhando, fitando-o. As professoras, em nenhum momento, preocuparam-se em inseri-la na reunião. Conversavam e discutiam entre elas numa mesa da CT, todas ao redor dela, ignorando sua presença. A reunião era bem informal, com saídas dos seus membros e aparições dos membros da direção. Alguns conteúdos tratados pelas professoras foram a "formação da cidadania",  "o tipo de escola que defender", "formar alunos críticos". A professora de História disse que os alunos precisavam aprender a questionar, a exigir direitos e também a ter direitos. Com uma condução dessa, entretanto, será bem difícil atingir estes objetivos. Ao mesmo tempo dessa reunião, outra reunião ocorrera: conflito de professores com a direção. O pesquisador não foi convidado para participar. Eles tinham que "lavar roupa suja" entre si. Esta reunião foi feita na sala dos professores e com  a porta fechada.

Já numa reunião com os pais, as professoras e a direção eram as personagens principais. Dos pais era apenas exigido que participassem mais da escola e acompanhassem as tarefas dos seus filhos. As cadeiras estavam enfileiradas e a direção ficou sobre uma mesa e em frente das cadeiras, em pé. Os pais ficavam normalmente em silêncio e muitos olhavam para o chão. Fora solicitado aos pais que, se existisse alguma reclamação, esta fosse feita antes da entrega dos boletins de notas - única vez que foi possibilitado a intervenção do pai. Logo após se fez a leitura dos "deveres e direitos". Toda a leitura do regimento é entrecortada de observações e exemplos de como os pais e alunos devem ser.[9] No final da reunião foram distribuídos os boletins de notas. Muito tumulto no final da reunião, pois as mães ficaram em pé e ao redor da mesa, onde se localizavam os condutores da reunião, desmanchando a ordem hierarquizadora entre direção e mães. A ambigüidade das relações sociais retorna com vigor.

A diretora chega atrasada e pede desculpas (a reunião estava marcada para iniciar à 16h) ("foi o engarrafamento", diz ela). Há mães que chegam às 17h15m, quase no final da reunião. A diretora apresenta o pesquisador e pede compreensão de todos para colaborar com ele, e inicia a reunião criticando os alunos por estarem "driblando as normas". Solicita a uma professora para ler "os direitos e deveres", porque chegou "agitada". Um outro ponto de pauta é a questão da roupa sensual e bonés dos alunos. Um pai observa a conduta de uma professora  e ela estranha tal observação pois ela se considera exigente profissionalmente. A diretora justifica e vai em defesa da professora, explicando que sua ausência se fez por um período longo por estar de licença prêmio (Esta professora foi a mesma que estirou a língua para o cinegrafista que estava nos auxiliando na pesquisa, quando o mesmo passou perto dela). A professora passa a ser a principal interlocutora, justificando-se. O pai tenta intervir em um momento e não consegue pois ela o interrompe: "Não, eu tou lhe dizendo. Porque as tarefas não são só dever, pergunta e resposta". Há quinze intervenções dos pais (de esclarecimentos, posicionamento crítico, tentativas de iniciar uma intervenções e respondendo a questões) e quatro intervenções de diversas pessoas ao mesmo tempo, inaudíveis em toda a reunião. A diretora intervém 17 vezes e as professoras 20 vezes durante a reunião, sendo o tempo maior de intervenção sem dúvida da direção e das professoras.  Foi medida a quantidade de  palavras nos discursos dos pais e da professora envolvida na crítica levantada inicialmente pelo pai. A professora usou 1.464 palavras (três páginas) e os pais 243 palavras (meia página) - infelizmente nas duas intervenções dos pais não foi possível ouvi-los, transcrevê-las e e, assim, medi-las. Esta impossibilidade do registro dos pais (eles falam baixo) já demonstra uma dimensão importante nas relações sociais entre eles: submissão. Por sinal, em outra reunião de conflitos, os diretores modificam a intensidade da voz: falam mais alto (não se presenciou uma vez sequer isso com os pais em reuniões) para não deixar de demonstrar o poder da autoridade. 

Já quanto às reuniões de Conselhos de Classe (CC), rótulos e comentários excludentes são comuns nessas reuniões (por sinal o pesquisador foi impedido de participar de um desses rituais com argumento de que elas não ficariam à vontade com a presença de um estranho), pois é uma das maneiras de materializar a dádiva (trocas simbólicas) que se impõe sobre determinadas significações patrimonialistas e patriarcais. O ritual do CC é o local de purificação dessas significações para que esta instituição perdure: 1. "Essa menina não faz nada" 2. "[Fulana] é cacete"; 3. "É problema, não quer nada. Não fez nada o ano todo", "mas tem sempre um palavrão na ponta da língua", disse uma outra professora; 4. "Aquela é triste", "é o mosquito", "ela come muito" (4 pães); 5. "É terrível", "é aquele dos brincos"; 6. "Cão é este aqui", "Como é o nome da besta fera? (indagou a educadora de apoio)". Interessante é que a sala de aula não "serve" para realizar estes ritos. Apenas uma vez foi presenciado uma reunião lá, mas foi para preencher um questionário de pesquisa pedagógica.

As piadas ou comentários machistas completam a instauração da realidade mediada pelos xamãs-professores: 1. "Peguei os dois na sala quase afogando o ganso", disse a pedagoga e uma professora retrucou: "São detalhes, [fulana]"; 2. "Só quer saber de peia" - disse a pedagoga sobre uma aluna de 12 anos, grávida. "Se soubéssemos antes desse problema dela. Poderíamos ter visto. Mas ela não tem condições de passar não" - comentou uma professora; 3. "Ainda bem que a turma não pegou no pé dele", "Ele é homossexual (...) o espermatozóide dele deve ter vindo já gay" - disse a pedagoga. "Eu acho que o caso dele é familiar" - comentou uma professora.

Vimos, então, que estes ambientes estão repletos de sentidos e não se resumem à racionalização do espaço, mas são performativos. As significações imaginárias da cultura doméstico-clientelista se fazem aqui: igualdade moral (Barbosa, 1992) como ponte para o Éden, hierarquização dos ambientes - em momentos específicos só alguns têm autorização a circular por ele -, homogeneidade (filas e horários únicos) coexistindo com heterogeneidade (simpatia por "a" ou por "b" ). Recorrências às linguagens classificadoras – normalmente excludentes – são fundamentais para a consecução dos rituais do CC. Pois, é a partir delas que a realidade é instituída oficialmente.

Escola Recife 2:  Breve história social

Esta escola aqui investigada se localiza numa área muito pobre, com muitas moradias de reboco  e pequenas, e, ao seu lado, circulando por todo o muro da escola, um canal de fossa (lixos, fezes) onde alguns porcos se "deliciam" nas águas do esgoto. Há ônibus que passam na frente da escola e existe um pequeno posto da polícia militar a 20 metros de distância. 

A escola Recife 2 tem 3.000 alunos, 65 professores e 22 funcionários. A escola oferecia o 1º e 2º graus e curso de contabilidade. Os dados do Programa Bolsa Escola informam que das 298 famílias inscritas neste Programa, 51,34% estão desempregadas, 22% são assalariados sem carteira e 33% de biscateiros. Quanto à formação educacional, 12% são analfabetas,  46,97%  completaram os estudos da 4a. série, 31,20% terminaram os estudos do ensino fundamental (1a a 8a série), 5,70% têm o segundo grau completo.

Ela foi inaugurada em 1984 com a presença de políticos, conforme as entrevistas dos professores. Uma professora ressaltou que, na inauguração, tinha uma mesa com toalha branca e enfeites, bolo e música. A escola era pintada de tinta a óleo, cor azul e branco. Era considerada "escola modelo", por causa da estrutura do prédio e seus recursos de trabalho: gabinete dentário, marcenaria, laboratório de ciências com seis microscópios eletrônicos e biblioteca (com campanha dos próprios professores). As disciplinas, além da grade atual, com algumas alterações, eram técnicas agrícolas, educação para o lar, serviços laboratoriais para a comunidade. Existia um coordenador de turno por andar para "auxiliar na disciplina". Uma professora (P3) informou que tanto os meninos como as meninas estudavam a disciplina Práticas do Lar. A sala de aula era transformada em uma casa: tinha quartos, cozinha, sala de estar. A professora defende a existência da disciplina prática do lar porque ela acha que os meninos precisam também ajudar em casa. Além dessa disciplina, havia, também, Práticas Industriais. Eram comum, também, atividades religiosas na década de 90. No dia das mães um pároco da igreja freqüentou a escola no período de aula (P3).

As relações na escola, desde sua fundação, estavam pautadas pelo favor, pela prisão do laço social. Os diretores e professores eram julgados a partir da "bondade" ou da "rigidez". A funcionária de serviços gerais disse que havia uma secretária "muiiiiiito boa". Ela explicou o que é uma secretária muito boa: "Não tem secretária que gosta de dar muita ordem? Ela não é muito não, ela faz aquele trabalho dela, da secretaria, muito bem feito, uma educação tremenda". Ela admirava um ex-diretor, que chamaremos de (D1), porque ele "deu o 207 a todo o mundo. Ele tinha muita ligação com o secretário da educação, e ninguém tinha isso aqui. Ele nos ajudou muito". O atual diretor da escola investigada era avaliado como "muito bom. Ele é muito, assim, a gente chega atrasado, ele não liga, ele não fica assim, né [(...)] meu diretor é muito bom demais, a gente diz assim, né, a gente diz assim, 'olhe eu cheguei atrasada porque isso e isso', aí ele, 'tá certo'". Já quando ela falou de uma diretora das fundadoras, ela disse que ela era muito rígida (D2). Esta diretora antecedeu o diretor D1.  Ela "era mais exigente, assim, no horário, eu pego de 1 hora, chegava de 1 hora, tinha de chegar de 1 hora, se chegasse assim 2 horas ela nem queria que entrasse mais, esse já deixa [o diretor atual]". 

Uma funcionária (F1), desde 1986, trabalhava nessa escola na função de "auxiliar de disciplina". Ela tinha 48 anos,  estudou apenas até a 7ª série e tinha chegado na escola através de um deputado estadual (PFL). Ela desenvolvia para vereadores e deputados diversos tipos de atividades que ela designava como "ajuda". Internava necessitados num hospital, os médicos faziam ligação de trompas e além disso, levava os necessitados a um oculista. Até uma taxa de R$ 5,00 do SUS (Sistema Único de Saúde) o vereador pagava. Encaminhava, também, a retirada de título de eleitor e arranjava uma Kombi para transportar o futuro eleitor - contava muito contente a informante por poder "ajudar".  Já um outro professor ingressou na escola desde fevereiro 1981. Na época do governador Marco Maciel a freqüência de políticos na escola era grande, contou um dos entrevistados. Os políticos da oposição não entravam na escola, apenas o da ARENA. Quando eles visitavam a escola as aulas eram interrompidas para conversarem com ele. Um deputado, por exemplo, conseguiu  o “difícil acesso” (acréscimo de 40% no salário dos profissionais da educação por a escola se localizar em um lugar de difícil acesso).  Em março de 1984 uma nova professora (P2) chegava à escola, indicada também por um político, mas só que contratada por prestação de serviço.

Um ex-diretor da escola (D1), no final da década de 80, que tinha conhecimento com um Ministro das Minas e Energia, foi nomeado para diretor da escola investigada. "Ele era uma pessoa tão boa, ele era tão bom que não prestava", expunha a professora.  Conforme o depoimento da professora, para ele, "sempre o professor tinha razão. Sempre o professor podia, a gente podia fazer curso, a gente podia sair pra fazer um trabalho extra-classe e ele sempre deixava. Quando a gente não tinha ônibus ele arranjava. Ele tinha muitas amizades". Ele fazia passeios para as praias (Gaibu, Ponta de Pedra), sítios, cachoeiras com professores e funcionários, no final do ano, nas comemorações do dia do professor. Os passeios eram no dia de Sábado. "Às vezes ele contava o número de pessoas, dava mais do que suportava, ele arranjava outro ônibus [(...)] ele arranjava um patrocinador, um empresário de alguma firma, aí dava uma quantia "x" em dinheiro aí ele pegava e revertia em ajuda alimentícia".

Quando o atual diretor da escola investigada chegou na unidade escolar, em 1994, para participar de uma reunião com a secretária de educação, para assumir a função de diretor, a primeira recepção foi uma bolada das alunas que jogavam queimada. Ele conta que a escola estava quase sob uma "intervenção". No primeiro dia de trabalho, o primeiro professor chegou para trabalhar às 7h30m - a aula inciava às 7h. "Eu fiz uma reunião com os professores, conta ele, e disse 'olha! eu costumo chegar antes da sete pra saber quem está chegando no horário e costumo sair depois das dez pra saber quem está saindo no horário, certo? (...) dia de Sexta-feira, segundo os alunos, praticamente não tinha aula'", completou o atual diretor. Quando ele chegou, a escola estava em reforma. Ela estava “desmontada” porque tinham sido roubados "televisores", "gabinete dentário", 'bancas". "Se demora mais", conclui o diretor, "tinham levado a escola toda". Uma professora disse que, além desses materiais, já foram roubados vídeo, lâmpadas, pratos, copos e merendas. Nessa escola, os professores e funcionários vivenciam o mundo da hierarquia, da  pessoalidade e do afeto desde a sua fundação. Interessante observar que quando se referem a uma "boa administradora" que a escola já teve, a referência é que ela era "rígida" (F1 e P3) e "botava mão na massa" (P3) - a mesma representação que os alunos fazem de seus diretores.  Uma diretora "disciplinadora" e uma que termina sendo "igual" a eles e aos serviçais impressionaram os servidores. É a igualdade moral de que fala Lívia Barbosa. Não é à-toa que se referem ao diretor atual como "uma pessoa muito boa" (P3) e "bom demais"(F1). O julgamento é sempre afetivo e não técnico-profissional (Mello, 1987). Segundo Guiomar Mello há uns estereótipos predominantes no magistério de 1a. a 4a séries: "magistério como troca afetiva, identificada com a relação mulher/mãe com o(a)s filho(a)s, aos (às) quais é preciso dar amor e carinho" (Mello, 1987, p.70). Esta "vocação" é criticada pela  autora, pois a profissão de magistério deixa de ser uma atividade de sustento de vida para ser um "sacerdócio", uma "doação". A autora observa que a dimensão técnica do magistério sempre é relegada a segundo plano pelas professoras - às vezes nem aparece. Aparecem reclamações salariais e aspectos afetivos. Para ela, "o discurso amoroso se coloca como uma estratégia de dissimulação da incapacidade de prever soluções técnicas para problemas que são específicos de aprendizagem" (Mello, 1987, p. 134).

Os locais físicos e estruturais ( e suas temporalidades)

 São diversos os ambientes desta escola aqui investigada: 1. área externa enorme na frente da escola; 2. sala de educadora de apoio; 3. sala de direção; 3. secretaria; 4. pequena área na frente da secretaria; 5.  sala dos professores; 6. área da merenda; 7. cozinha; 8. biblioteca; 9. central de tecnologia; 10. Vinte e uma salas de aula; 11. quadra esportiva; 12. quatro sanitários estudantis (2 femininos e 2 masculinos); 13. dois banheiros de professores (1 feminino e 1 masculino); 14. três rampas.

Sem exceção, todos os ambientes têm uma aparência desagradável - uns mais, outros menos, mas todos têm. A escola é cercada de grades enferrujadas. Na lateral da área externa,  que dá acesso à quadra, há grades. Uma, por completo, e outra por cima do muro. A sala da CT, a cozinha, a direção, a sala dos professores e a sala da educadora de apoio também são gradeadas. A escola está enjaulada. Ela é uma prisão. Portanto, esta escola apresenta bem a significação imaginária: tempo de morte e de enclausuramento.

Observem-se, agora, os dois piores ambientes. Deles, as salas de aulas são as que estão em pior conservação. As paredes riscadas, o piso constantemente sujo com papéis e, o que é pior, com chicletes colados, que, com o tempo, fica manchado, escuro. As cadeiras quebradas em boa parte delas, braços no chão e  um amontoados de cadeiras umas sobre as outras, formando uma "montanha". São três andares com salas de aula. As rampas estão sujas com areia e na parte do banheiro forma-se um lamaçal. O teto do corredor das rampas ameaça cair por causa de vazamentos - há rachaduras e estava fofo. Uma parte da parede, no corredor, um metro aproximadamente, estava sem reboco. Há uma porta, no segundo andar, com um buraco de 50 cm. Apesar do estado assustador das salas de aula, havia um ambiente que ganhava em destruição e péssimo cheiro: os sanitários dos alunos. Durante todo o ano de pesquisa, nunca tentaram consertar. Era impossível entrar neles sem se molhar. Todo o piso estava coberto com água que vazava ininterruptamente. (Não podemos esquecer que a cidade de Recife encontra-se em contenção permanente de gastos d’água). Com a areia no piso, formava-se um lamaçal. Havia 2 metros de altura de azulejos. O sifão da pia estava quebrado, derramando  toda a água da torneira. O forte do banheiro era o mau cheiro. Insuportável. Os trincos dos dois banheiros eram um amontoado de arames.

A sala da direção era pequena e bastante desorganizada. Papéis, caixas, troféus, lampiões, dois birôs, três cadeiras, dois armários, duas prateleiras. O birô do diretor estava sempre tomado por papéis espalhados.  Na parede, um quadro colorido e risonho, enfocando o rosto do diretor e um outro quadro de Jesus Cristo, olhos azuis e cabelo liso (um pouco “galego”) - novamente o símbolos religioso se faz presente: protegendo o ambiente do patriarca. Um ventilador de teto estava sempre a funcionar. Na porta, um quadro que identifica os professores faltosos. Na parede que fica em frente do birô do diretor, havia um quadro com os nomes dos respectivos professores e sua turma, em todos os dias da semana (o diretor afixava os nomes dos professores para que os alunos não perguntassem a ele se o professor viria ou não a escola). O piso tem um "ar" desagradável, manchado, mesmo quando limpo. Nunca se presenciou o piso sendo lavado. Apenas varrido.

A sala da secretaria era enorme. Havia bastante espaço para circular nela. Havia quatro birôs e diversos armários de gaveta. O piso era também desagradável. Não era difícil encontrar papéis no chão. Havia um mimeógrafo a álcool. Num canto da parede fizeram um depósito de coisas velhas. Dois ventiladores de teto funcionavam constantemente. Uma janela estava quebrada.

A sala dos professores era pequena. Havia uma mesa grande para o tamanho do seu ambiente, um ventilador de teto, um armário com diversas portas de 30 cm, para a guarda dos pertences dos professores, uma televisão de 14" colorida com suporte de parede, um sofá  abaixo da janela, um quadro de aviso com diversos informativos gerais. Os dois banheiros dos professores ficavam na entrada da sua sala de descanso. Às vezes, havia vazamento que apresentava um aspecto parecido com o banheiro dos alunos; havia, também, uma bacia, uma pia pequena, uma divisória do banho e uma porta com trinco.

A cozinha tinha um fogão, uma mesa, azulejos e um ventilador; era um ambiente desagradável pelo calor, não só por causa do fogão, mas por ele próprio. O piso também.

A área interna, que dava acesso à cozinha, tinha o piso com muita areia e parte dele, com água, onde havia um vazamento de um bebedouro, próximo ao estacionamento de bicicletas. O piso estava manchado de chicletes. As grades que separavam a quadra estavam enferrujadas. A biblioteca era razoavelmente grande. Oito mesas com quatro cadeiras, diversos cartazes de regras de conduta no ambiente e mensagens religiosas, com poucos livros e revistas. Normalmente a biblioteca estava fechada (segundo a direção, não havia funcionário para mantê-la aberta nos três turnos ininterruptamente).  O piso era igual ao dos outros ambientes.

A área externa era a área de entrada da escola, arborizada, com árvores de 15 metros de altura e vários bancos de cimento, circulando as árvores e na parede. Normalmente o chão estava sujo com papéis, pirulito, pontas de cigarro e muitas folhas das árvores. As funcionárias do serviço geral só varriam uma pequeníssima parte que dava acesso ao seu lado interior (limite da grade interna que dava acesso ao prédio).

A CT era grande, com umas 50 cadeiras, aproximadamente, e uma televisão e vídeo cassete que ficavam em suporte de parede. A CT era usada apenas para distrair alunos sem aula ou que quisessem assistir um filme. Os filmes que veiculavam eram filmes comerciais de "sucesso". A responsável pela CT não era pedagoga, era formada em Educação Física e química. Ela afixava cartazes religiosos, de natal, final de ano, boas vindas a alunos etc. Ajudava também a direção nas atividades festivas (englobados com religiosos). Coube a ela, numa reunião do final de ano, conduzir a oração com todos se dando a mão em um círculo, e, logo após, assumir o papel de DJ, colocando músicas norte-americanas. Constantemente a sala estava fechada, com cadeado, principalmente nos turnos da manhã e da tarde. Ela trabalhava à noite (quando comparecia). Por sinal, a escola era bastante desvalorizada pelos professores: faltavam muito. Nesta escola, por exemplo, os professores durante um semestre  faltaram 442 horas/aula.

Em todos estes ambientes circulavam pessoas as mais diversas. A sala da direção era lotada de alunos que ficavam olhando para o diretor, outros conversavam, outros faziam atividade de classe, ajudavam em alguma atividade a direção (cadastramento e na distribuição de crachás), outros davam cheiro na cabeça dele, outros enfiavam a mão na sua gaveta, sem sua autorização, e tirava o que estava a procura etc. Mesmo em solução de conflito, a quantidade de alunos que entravam para bisbilhotar era grande. Professores e funcionários administrativos constantemente freqüentavam esta sala, ou para conversarem, apenas, rirem, ou para discutir a respeito de problemas. Vendedoras de camisas também a freqüentavam. Era um ambiente bastante tumultuado. O diretor gostava e se sentia bem com os alunos que o amavam. Raríssimas vezes a direção estava fechada com grade e cadeado.

Nas escolas investigadas, a burocracia não é percebida enquanto organização, mas enquanto um poder que é materializado na pessoa do diretor. Ora, do ponto de vista da organização pública, o patriarcalismo se efetiva pela centralização, personalização e intimidade com o poder. Uns mandam, outros obedecem. Uns sabem, outros nunca aprenderão. Há luz em um, e portanto deve conduzir seus cordeiros, há escuridão noutros, e, portanto, precisam da luz dos que já nasceram com ela. Devemos sempre referenciar não o coletivo, mas o que detém o poder personalizado. Não há bem público, mas apenas uso do bem público por uns. Há sol para todos, desde que cada um saiba o seu lugar. Não há cidadãos, mas súditos.

Há, em geral, dois desmembramentos daí: ou o diretor é a melhor pessoa do mundo, o melhor camarada, ou é o pior de todos eles. Esta cilada representacional fundamenta a relação nas escolas investigadas. Os dois diretores investigados contribuem para isso, aceitando esta personalização do poder, a qual é o que DaMatta disse sobre a sociedade brasileira: sobre o fato de criarmos sempre um código de hierarquização, e um deles é que sempre haverá "um dono" sobre uma festa, por exemplo. "Ora", expõe aquele autor, "quando o rito tem um sujeito, ou um dono, é isso que forma o ponto focal da festa e da marcha. É o ponto-chave, o símbolo focal da reunião, o que lhe dá, ao mesmo tempo, um motivo, um sentido e uma unidade" (DaMatta, 1997, p.119). Nada mais lógico que a escola "pública" possa ter um "dono" e ter um "pai". Como disse o  presidente do grêmio livre disse a respeito do diretor da escola que ele, "pra nós do  grêmio, pra todos nós do grêmio, toda a diretoria, é um pai pra gente".

Sem dúvida, o "poder" na escola está centrado no(a) diretor(a). A transformação simbólica da função para a pessoa que a ocupa esta função é o que Holanda (1994) chamou de personalismo: mudam-se as pessoas pensando que estão mudando o sistema, mas é puro engano. Se for carismático ou se conseguir ser sedutor, o diretor levará as glórias; se não conseguir ser esse catalisador, certamente, haverá muitos conflitos na escola, e o diretor terá que recorrer à mão de ferro para dirigir a escola - uma outra faceta dessas significações. Mas normalmente, o jogo do autoritarismo com paternalismo e malandragem é o que predomina.

Já a secretaria também era um entra e sai grande de pessoas: a equipe de direção, os alunos, os professores e, um pouco menos, as mães dos alunos. Era um ambiente de muita conversa, principalmente, sobre suas condições de vida. Pode-se dizer que este ambiente (e a sala dos professores) eram as salas das "lamentações", as salas das "projeções" e "transferências". Mas ria-se muito também.

Uma funcionária da secretaria recebeu o pesquisador com o discurso de um ser oprimido, vítima e triste por causa do salário baixo. Perguntado pelo pesquisador como estava, ela respondeu: "Só falta dinheiro". Perguntou-se como foi a Páscoa e novamente veio a reposta: "Sem dinheiro, mas foi boa (hahaha)". Complementa: "Só faltava vim um aumento aí". O riso emerge nesse reconhecimento de sua situação: tem que se conformar com ela. E ela nada mais é do que uma vítima do sistema - e o que se pode fazer?

O diretor, as alunas e as funcionárias se comportavam intimamente. Uma  forma de manifestação das relações de intimidades numa sociedade da pessoalidade é a publicização de seu universo particular. Nos ambientes do trabalho (numa escola pública) é onde se come, se penteia, se maquia, se fofoca. Apesar de não expressar um "afeto", mas espelhar as relações de intimidade nos espaços públicos, presenciou-se uma funcionária na secretaria se penteando no horário de trabalho. Com um espelho em mãos, e em pé, se olhava e massageava seus cabelos com um pente, enquanto outras pessoas conversavam. Outro dia, na mesma escola, uma aluna entrou na sala do diretor procurando seu crachá, abriu a gaveta dele, pegou-o e se retirou.

A intimidade pode de fato invadir espaços não autorizados. Como o jogo das relações não estabelece limites claramente definidos e simbolicamente sancionados pela coletividade, as possibilidades da emergência  de um carinho para a agressividade é muito grande. Um aluno na área externa se dirigiu em voz alta e tom zombeteiro ao pesquisador, com muita intimidade, tornando-se assim grosseiro. Ele disse: "Ei, irmão, beleza!". Estava  rindo e  estava com um grupo de dez alunos. No mesmo dia, em outro momento, quando estava descendo a rampa da sala 20, alguns alunos gritaram: "É louco, é?" e outros complementaram: "Que porra é isso?". Uns alunos passaram pelo pesquisador e disseram: "Bota aí pra gente ouvir" e "É, É, É", "Parece maluco!". Eles não se preocupavam e nem ligavam se estavam sendo descorteses e inconvenientes.

Uma outra invasão desrespeitosa e inconveniente partiu nesse momento de uma funcionária que chamou o pesquisador. Ela perguntou o que ele estava fazendo com um gravador e falando. Ela disse que não se conteve em seu silêncio. Quando foi explicado o que estava se fazendo, ela disse que o pesquisador "parecia maluco" e insistiu várias vezes para ouvir o que ele tinha gravado, tornando-se muito inconveniente, sem se incomodar com sua indiscrição. Esta mesma funcionária, um outro dia, novamente, foi inconveniente e agressiva. Quando o pesquisador perguntou sobre os membros do grêmio estudantil, ela retrucou: "Não me interesso pela escola”. “A escola tem futuro?”. “O futuro é o dinheiro, rapaz. Sem dinheiro não se faz nada”. “Eu chego aqui, sento e faço meu serviço”. Ela disse, além dessas frases: “ Não sei, nem quero saber”.

Um outro local bastante procurado pelos alunos era a área externa da secretaria. Os alunos ficavam sentados numa pequena janela que separava a secretaria do seu "mundo exterior". Ninguém reclamava. Por sinal, a área externa da secretaria era um local privilegiado dos alunos. Muitos alunos (todos os turnos) ficavam neste ambiente, conversando, apalpando as meninas, rindo alto, conversando. O som era ensurdecedor. O mais impressionante é que ninguém reclamava. Esta área externa fazia fronteiras com a sala dos professores e a direção. Na frente da secretaria estava a rampa que dava acesso ao primeiro andar, local privilegiado dos alunos para ficarem encostados no corrimão e conversando. Nunca se viu alguém reclamando pelo barulho ensurdecedor.

Já os corredores e as rampas eram outros os lugares preferidos dos alunos. Ficavam sentados no corrimão, encostados nele, normalmente em grupos de três ou mais. À entrada das portas, em muitas delas, tinha-se que pedir licença, porque os alunos bloqueavam a passagem, ou com sua simples presença ou sentados em cadeiras. Os alunos também passavam pelo corredor gritando e batendo nas portas.

A área externa era um local bastante freqüentado pelos alunos: conversavam, andavam de bicicleta, de skate, namoravam, corriam, uns sentados, outros em pé, certamente porque faltavam professores. Às vezes havia professores, também, conversando com alunas. Foi o ambiente onde se realizou o culto evangélico (bateria, guitarra, baixo, órgão, um microfone  e um cantor). Pessoas que não eram da escola "invadiam" esta área: sem camisas, descalços, de bermudas (algumas alunas nas entrevistas reclamaram disso).

Como vimos, os locais/ambientes das escolas estão imbricados de sentidos. As ambiguidades nas circulações dos ambientes, sinalizam para as relações sociais instituídas pela invasão do privado sobre o público. As destruições/sujeiras apontam para a desvalorização do bem público por aqueles que  vivenciam-no no seu cotidiano ( e não somente decorrentes das políticas públicas). Quanto aos ambientes valorizados pelos alunos, as rampas, a área externa de secretaria e da frente da escola, sinalizam que o ambiente de estudo em si ( a sala de aula), não são tão importantes quanto esses, e que eles, têm um papel importante de socialização. Todos esses ambientes demonstram a ambigüidade nas relações sociais estabelecidas: a hierarquia não se apresenta claramente, se camufla em relações aparentemente entre “iguais” (intimidades com a direção).

As significações dos locais de rituais de reuniões

Nessa escola foram presenciados poucos rituais de reuniões de atividades pedagógicas (as poucas que ocorreram, o pesquisador não participou de algumas, porque não foi informado e convidado). Seguindo a definição e os ensinamentos de Rivière (1997) sobre ritos, os rituais presenciados foram entradas na escola no turno da manhã, cadastramento de matrícula, Conselho de Classe, comemoração de final de ano e do dia dos professores e festa organizada pelos alunos.

Nos rituais de entrada na escola do turno manhã, o diretor tinha uma certa autoridade sobre os alunos. Quando ele aparecia na área externa e chamava os alunos em fila, os alunos obedeciam e ficavam enfileirados. Ele gritava: "em ordem", e colocava as palmas das mãos sobre sua coxa e ficava em posição ereta. Os alunos automaticamente ficavam nesta posição. Logo após, começava a orar e os alunos o acompanhavam. Quando ele não se encontrava, o controle sobre eles era mais difícil.

Veja-se, em seguida, a reunião do Conselho de Classe.  O machismo imperava na reunião, além das brincadeiras de segundas intenções e de desprezo para com o aluno. Não existia nenhuma tentativa de explicação sobre o "fracasso" escolar dos alunos, diferindo, assim, da outra escola. A única preocupação deles era com a nota, se o aluno estava aprovado ou não. Eles diziam : "Esse passa", "Esse já está reprovado", "Desistente ou reprovado". Analisaram-se duas reuniões de Conselho de Classe: uma do turno noturno e outra do turno da tarde.  Solicitou-se aos professores a autorização para o pesquisador participar na reunião e uma professora observou:  "Desde que não divulgue por aí o que ouvir". O diretor disse que não precisava pedir a solicitação, porque ele já tinha autorizado - mesmo assim  o pesquisador o fez.

Havia trezes professores na sala. O diretor coordenou a reunião. A reunião teve início às 18h30m. Havia pouquíssimos alunos na escola, pois foi realizada no final do ano (12 de dezembro de 1999). A porta ficou aberta sem serem interrompidos por algum aluno. Na medida em que apareceram alunos bisbilhotando, a porta foi fechada por uma professora. O calor aumentou, havia somente um ventilador. A sala era pequena, com uma mesa que tomava boa parte do ambiente.  Os professores estavam ao redor dessa mesa. O diretor, na ponta da mesa. Os quatro professores que não conseguiram ficar ao redor da mesa sentaram num sofá, que ficava encostado na parede. O diretor ficava com uma lista dos alunos e fazendo chamada aluno por aluno e os professores responsáveis por ministrar aulas nessa turma correspondente comunicavam se foi aprovado ou não. Nesse momento os gracejos e observações emergiam. Eram mais homens na reunião. As mulheres eram minoria, com exceção do turno da manhã das séries de 1ª a 4ª.

As classificações e comentários negativos se faziam da mesma forma que a outra escola: 1. "Esse é um enrolão"; 2. "Ele é bem estranho"; 3. "Passou se rastejando"; 4. "Ele é péssimo", "É bagunceiro", "Ele não quer nada"; 5. "Ele é turista", "Ele é dorminhoco"; 6. "Ele vai tirar pau comigo".

Da mesma forma que a outra escola, os comentários e classificações se prendiam ao comportamento. Determinado tipo de "comportamento" não era aceitável. O mau comportamento só existia por parte do aluno. Portanto, existia uma natureza de comportamento que só bastava identificar sua substância, seus elementos, para caraterizar alguém. Dali surgiam não apenas classificações, mas identificações do biotipo, fenotipo de alunos, dos seus conhecimentos extra-escolares. Elas são: 1. "É o cantor"; 2. "Aquela da barriguinha"; 3. "Só comigo?", "Sim", disse o diretor. "Vai arredondar? ", perguntou o diretor. O professor respondeu: "Vai"; "É aquele galeguinho"; "Aquele moreninho".

Mas o que emergia mesmo é a segunda intenção em sexualidade. Disse uma professora: 1. "A aluna cruza as pernas muito mansinho, mostrando partes da perna", e o diretor retrucou: "É por isso que fulano (professor) não viu nada". Todos riram bem à vontade; 2. "[Fulano] só está botando mulher na final"; 3. quando se referiu a uma possível posse de um professor sobre uma aluna, um professor observou: "Quer tomar"; 4. "Vê se o tal de Bráulio (referência ao falo, mas é um nome de um aluno) passou por aí", disse o diretor, e um professor disse que sim, e os outros fizeram "ê, ê, ê".

A crítica ocorre também na reunião, com farpas do diretor sobre alunos e professores. Um, de forma direta, e outro  com ironia. Ele fez um comentário: “Ah! Esse é dorminhoco” – disse o professor de matemática. “Por que ele só dorme na tua aula?” – indagou  o diretor. Outro professor retrucou com ironia: “Dormiu logo na aula de matemática”. Em outra situação ele comenta ironicamente: "“Ele não é desistente?” – perguntou um professor. “Não” – disse o diretor. “Ele está todo o dia na escola”. Todos riram, inclusive o diretor.

Em 14 de dezembro de 1999, ocorreu uma outra reunião de Conselho de Classe, no turno da tarde. O diretor não apresentou o pesquisador na reunião, que ficou aguardando. Estava marcada para iniciar às 13h30m, mas iniciou aproximadamente às 13h59m.  Os professores já se encontravam na sala. A televisão estava ligada no programa da apresentadora Ana Maria Braga (receita culinária) e três estavam assistindo atentamente. A porta estava aberta e havia alguns alunos próximos à sala dos professores. Quatro professores e quatro professoras eram os presentes na reunião no início. A reunião terminou com 13 professores Algumas presentes reclamavam que a reunião se realizava sem um lanche para os mesmos. Ou seja, reinvidicavam a transformação de um ambiente racionalizado em um ambiente acolhedor: doméstico.

Quanto a linguagem que circulava na reunião, era a seguinte: 1. "Gaiato"; 2. "Enrolão todo, mas comigo..."; 3. "[Fulano] é ruim demais"; 4. "fulano é outro safado", "vou dar uma chance para ele ficar na recuperação", disse o diretor; 5. "Esta aí é murrinha, que diferença da outra"; 6. "É péssimo, pelo menos na minha disciplina"; 7. "Ele é bagunceiro"; 8. "Ele é da Paraíba", disse o diretor para um professor e uma professora retrucou: "[Diretor]!!!"; 9. "Fulano veio da Bahia"- falou o diretor, uma professora retrucou: "das macumba".

Novamente o aluno era o centro da atenção quanto ao mau comportamento. Não há observações pedagógicas. Preconceitos regionais também emergiam, quando identificaram a origem dos alunos.

Os professores da tarde também não esqueceram das brincadeiras sobre sexualidade dos alunos e entre eles: 1. "Ela é boa" disse o diretor. Outro complementou: "Muito boa", com segunda intenção; 2. "Eu não sabia que o professor fulano usava tabela", disse o diretor brincando (insinuando) com a escolha homossexual de um professor presente; 3. "Ela era uma excelente aluna, depois que começou a andar com fulana (asseverou uma professora.). Um professor indagou: "Ela vai levar pau?". As professoras riram. Uma professora retrucou: "Ela pode ser reprovada [olhando pra ele], pau pode até ser bom";  4. "Melhorou viu [diretor]. Depois que ela ajeitou-se com um homem, melhorou. O problema dela era falta de homem", disse uma professora.

Como se pode observar acima, as mulheres tomaram iniciativa para fazer suas "segundas intenções" ou diretamente se referir à sexualidade dos alunos. Elas comandaram o senso de humor machista. O padrão da sexualidade apropriada estava centrada no falo.

O sentimento de pena pela situação do aluno se expressava também aqui: 1. "Vou sentir muito, muito bom, mas vai ficar na recuperação"; 2. "Pobrezinho".

E as explicações para as dificuldades dos alunos? Eles apontavam: 1. "Vem bem, vem bem. Mas quando cai é briga em família"; 2. "Ele não é faltoso?", perguntou uma professora. "Eu sei qual é a doença dele. Ele está com uma mulher e um filho que não é dele", falou uma outra.

Novamente os alunos não vão bem por problema pessoal e familiar. A escola novamente tira sua responsabilidade sobre a formação dos alunos. Não ocorreu nas duas reuniões nenhuma referência sobre a responsabilidade dos professores. O problema é deles, dos alunos, porque eles se comportam "mal". O recurso ao afeto no diminutivo ("pobrezinho") não resolve a situação dos alunos. No máximo, acoberta a cumplicidade e mostra a  incapacidade de se olhar no espelho e se sentir co-responsável por essa situação. Fala-se em co-responsáveis e não em culpados, o que é diferente, pois há aspectos, e não são poucos, que decorrem das políticas públicas, que terminam por interferir na unidade educacional.

Consideração final

Independente do processo de escolha de diretor nas escolas investigadas, se eleito ou indicado, podemos afirmar que não há diferenças substanciais quanto aos usos e significações correspondentes aos locais, principalmente no que se diz respeito aos locais de rituais de reuniões. Os estudos microssociais possibilitaram ver estas questões e como a flexibilidade nas relações e os sentido que atribuem essas relações em alguns locais possibilitaram entender a complexidade da reprodução social e sua ressignificação em seu cotidiano.

Precisamos desenvolver estudos mais aprofundados do ponto de vista histórico sobre as significações imaginárias das arquiteturas das escolas, pois  elas são bastante recentes e ainda hoje, as escolas são casas antigas, alugadas, e religiosas a serviço do poder público. Portanto, continuando sua reprodução social.

Mostramos que as significações topográficas das escolas não são apenas mundo “materializado”, naturalizado, mas atribuições  de sentidos que podem se alterar no tempo e local, na ação humana, dispondo de novas funções criadas por “necessidades” sócio-históricas. Particularmente, em nossa sociedade, a redemocratização brasileira, acreditamos, que impulsionou movimentos sociais escolares que se contrapuseram a ditadura militar e em defesa de um ensino de qualidade e pública. Os vínculos afetivos, de ordem patrimonial, somaram-se ao momento histórico vivido e fortaleceram-se, sendo assim, incapaz, de reordenar esta significação de forma radical. Ao nosso ver, o resgate das discussões sobre o bem público é fundamental (sem negar as questões democráticas) para um novo salto dessas significações para apontarmos rupturas mais profundas.

A destruição dos bens móveis e imóveis públicos, principalmente, na escola Recife 2, é um sinal do desapreço por eles, por parte daqueles que fazem a comunidade escolar - e não é somente ausência de recursos financeiros. As significações imaginárias do mundo privado se acham no direito de destruir e invadir outros espaços que dizem respeito ao bem público.

Mas, com o estudo histórico, percebemos que existia uma relação da escola com os políticos patrimonialistas (relações de favores e dependência muito acentuado) na escola Recife 2, que na escola Recife 1, onde as significações de ambigüidades, hierarquias e a capacidade integrativa na gestão estavam bem mais acentuadas na primeira. O que sugere que, os caminhos da democracia, impõem novas significações para os ambiente topográficos e seus usos através das novas formas integrativas da organização. Os ambientes foram ressignificados com o processo eletivo no momento que novos locais foram apropriados e reutilizados para darem conta das novas formas de  incoporação dos sujeitos que fazem parte da comunidade escolar. Os usos da biblioteca (e sua criação) e da Central de Tecnologia (CT) para a efetivação das reuniões com pais e ou entre os profissionais da escola já expressam esse novo tempo que vivia a escola. Freqüentar a escola não se resume aos períodos regulares de aulas, mas em outros dias que possam garantir o bom funcionamento da escola (os mutirões de limpeza, por exemplo).

Como se pode ver, não havia limites, fronteiras que não pudessem ser quebradas, penetradas e compartilhadas mutuamente por todos os que faziam as comunidades (escola Recife 1 e 2). Só havia espaços a serem percorridos. Não havia quase-lugares. Praticamente não houve reuniões pedagógicas na escola Recife 2. Se na escola Recife 1 percebia-se que os alunos não se colocavam autonomamente na reunião, mas estavam presentes, na escola Recife 2 nem isso existia. A mediação dos alunos se fazia diretamente com o diretor e com o Grêmio, que toma o diretor como um "pai". Em nenhuma reunião nesta escola que acompanhamos os alunos participaram, somente das festivas (o pessoal do grêmio) e organizadas por eles. Quando os alunos participaram de atividades, foram organizadas pelo Grêmio Livre. Na festa do final do ano eles foram os únicos que tiveram a possibilidade de compartilhar esta confraternização - os membros do grêmio estudantil eram aqueles que estavam próximos, perto do poder personalizado, e portanto, eram os eleitos para ter esse direito de estar próximo da autoridade. Ora, o grêmio era o Quase-lugar dos alunos: todos sabiam onde estar e do seu papel: "ajudar" a escola e o diretor. O presidente do Grêmio Estudantil disse que esta entidade não podia se envolver em política, mas o vereador convidado que financiou a feijoada da festa de final de ano foi contato deles, segundo informação do diretor da escola. Portanto, o quase-lugar, pode-se dizer que está em todo lugar porque só há espaços a serem percorridos. É o que Santos (1992) diz: é a  nossa cidadania do  hobesianismo social (cada um por si).

Os  estudos dos rituais possibilitaram perceber as definições de papéis de cada "ator": os professores e técnicos têm personagens destacados em detrimento dos usuários (alunos e pais).  E é pelos rituais de reunião do Conselho de Classe que a instituição escola se faz: classificando, hierarquizando e possibilitando, a salvação da escola diante dos problemas enfrentados. É pelo ritual do Conselho de Classe que os professores se libertam de toda a carga de responsabilidade que está sobre suas costas. É ainda onde eles podem ser Deuses plenos. Nesses rituais os problemas são visualizados e diagnosticados unicamente contra os alunos e pelos seus comportamentos. Não vêem os alunos como sujeitos, mas sim como "portadores" de "carência", "falta" de educação, ou seja, os alunos são a expressão máxima das impurezas. Mas não se pode esquecer que, também, as mulheres são objetos de imaginação sexual nas brincadeiras entre os professores. E, o que é mais sério, pelas vozes das próprias professoras (escola Recife 2).

Se a racionalização do tempo/espaço existe na escola pública, ela não prepondera. As trocas simbólicas ocorridas entre os pares legitimam uns e não autorizam outros quanto à circulação nos ambientes - principalmente em momentos especiais: reuniões e assembléias. O tempo racionalizador coexiste com outras temporalidades, o que nos impõe, uma reflexão mais exigente em relação ao discurso de que o mundo da escola é o mundo da racionalização do espaço e do tempo a serviço da lógica do capital. As ambigüidades do tempo e do espaço exigem de nós, estudos que possibilitem um aprofundamento dessas significações para que nos ajudem no entendimento da “realidade” escolar.

O discurso de democracia na escola Recife 1 se desfez (ou fragilizou-se) ao ser verificado que no momento da reunião somente alguns falam (ou são aceitos simbolicamente) como os autorizados a exercer este poder performativo. A reunião com pais e alunos, que deveriam ser espaço (luta, liberdade), transforma-se rapidamente em "quase-lugar (hierarquizado e de submissão). Mas, vimos que havia uma diferença entre as duas escolas: o cuidado da escola Recife 1 e as formas de envolvimentos através de reuniões com alunos e pais demonstram maior complexidade quanto as significações imaginárias dessa escola. Sendo assim, nada mais do que necessário ressignificarmos esses ambientes com vistas a que outros possam constituir sua identidade como pessoas autônomas e críticas. Problematizar os “locais” e “ambientes” das escolas é de fundamental importância para nos livramos da instituição imaginária da ordem que estão inscritas neles – de forma racionalizadora ou nas formas das intimidades e ambigüidades.


Notas

* Excertos da Tese de Doutorado em Sociologia UFPE, denominada “A cultura doméstico-clientelista na escola pública. A ‘alegria’ de ser sensual, autoritário e hierarquizado”.

1. Segundo a diretora da escola Recife 1, o Conselho de Classe tem a função de analisar o desempenho, a freqüência e assiduidade do aluno. Se se entende por desempenho o processo/resultado pelo qual passa o aluno no ensino-aprendizagem, esses Conselhos de Classe não cumprem essa função. Cumprem apenas o controle de freqüência e assiduidade.

2. Este estudo do imaginário central da cultura doméstico-clientelista presente na sociedade brasileira, a partir da escola, de corte patrimonialista e patriarcal, tem o lúdico, o festivo e o erótico como identidades sociais, ocasionando formas ambíguas e amorfas nas práticas e organização institucional que atingem mortalmente o núcleo do imaginário da cidadania moderna: a noção da igualdade, dos direitos e do indivíduo. Afirmar, todavia, que este núcleo alimenta as instituições sociais não é afirmar que a sociedade brasileira é a sociedade do amor e da alegria. Pelo contrário, é um amor essencialmente privatizado e hierarquizado. Ao se fazer referência a este núcleo (o lúdico, o erótico e o afetivo), não se está aludindo à subjetividade individual, mas àquela socialmente instituída/instituinte. A esse respeito, Castoriadis (1991) diz que há uma sublimação da psiquê e que parte dela é "socializada".  Não se pode pensar a subjetividade como um cabide "no qual são pendurados afetos, intenções, relações e significações diferentes, cada uma das quais tem uma existência independente e que, todas juntas, deixam intacto seu 'suporte' comum" (Castoriadis, 1991, p. 357).  Portanto, não há subjetividade pura, desprovida do social-histórico (Costa, 2000). Particularmente nas escolas públicas estaduais da cidade de Recife, o lúdico, afetivo e o erótico apresentam-se em sua forma "pura": alimentam a instituição patrimonialista e patriarcal.

3. Um exemplo entre tantos outros, encontrados nas escolas investigadas,  podemos dar com a importância da alegria, da simpatia, como significação imaginária de brasilidade. Para Barbosa (1992), o brasileiro tem pavor da diferenciação social, pois sua igualdade tem um valor moral muito acentuado. Na escola Recife 1, a pedagoga quando avistou o pesquisador, disse em voz alta, para ser ouvida por todos que estavam próximos, que ele era bonito,  e os pais que estavam fazendo cadastramento começaram a rir.  "É (...) ainda mais vendo homem bonito perto de mim, eu fico toda enrolada", falou a educadora de apoio. Ora, esta intimidade por parte dela com o pesquisador aproxima a todos. Ninguém é superior a outrem, eles são iguais.

4. Investigamos 127 escolas públicas estaduais em Recife quanto ao tempo de serviço na direção de escola. Dessas,  38 escolas (29,92%) já vivenciam eleição direta para diretor e 89 escolas (70,08%) não vivenciam essa experiência. Ora, o que este quadro nos mostra é que, entre as escolas que vivenciam a eleição direta para diretor (39 escolas), 39,47% (15 escolas) estão na faixa de 5 a 12 anos gerindo as unidades - índice relativamente alto, o que é preocupante.  Mas é bom observar que houve um crescimento significativo daquelas que seguiram a forma eletiva de escolha de diretor da faixa de "meses a 4 anos" (23 escolas - 60,53%) de 1996 a 1999. Por outro lado, os diretores que estão gerindo as escolas que não vivenciaram a eleição direta  correspondem a 40,44  % nas faixas de 5 a 14 anos, ou seja, dos 89 diretores, 36 estão nesta faixa. Percebe-se aqui que há verdadeiros especialistas em gestão escolar. É importante registrar, também, quando da entrevista, por telefone, que alguns diretores fizeram comentários acerca dos quesitos perguntados. Por exemplo, uma diretora, quando indagada pela pesquisa se havia Conselho Escolar em sua unidade, respondeu automática e enfaticamente: "Os pais são miseráveis intelectualmente e culturalmente" para participarem de algum Conselho Escolar. Não valia a pena chamá-los à participação. Coincidentemente ou não, esta diretora  já estava há 14 anos dirigindo uma escola do ensino fundamental no DEE Recife 2. Já outras tentaram argumentar, complementando a resposta do questionário por escrito, que tinham sido escolhidas por abaixo-assinado ou por aclamação, querendo, com isto, se distinguir das demais, que tinham sido indicadas por políticos ou pelas DEEs.

5. A lei e a usurpação andam de mãos dadas: uma para glorificar e a outra para “não levar a sério”. É o que Roberto DaMatta irá chamar a atenção: enquanto a lei me servir eu recorro a ela para garantir os “meus direitos”, quando a lei ferir os meus interesses, irei em socorro aos “amigos”. Na escola essa troca simbólica irá ocorrer, entre tantas formas, na falta de assiduidade dos professores: o diretor abona suas faltas, em troca, ele busca “ajudar” a diretora na sua gestão. De 588 faltas, 342 foram justificadas (doença, assembléias dos professores, reunião com superiores) e 246 faltas sem justificativas plausíveis.

6. Programa que pretende manter os alunos na escola já que há um alto grau de abando escolar. Para cada aluno na escola, a União paga R$ 15,00 (quinze reais) a família, e a Prefeitura Municipal de Recife  paga o correspondente a R$ 100,00 (cem reais) por família. Os dados do cadastro deste Programa foram fornecidos pela EMPREL –órgão de informatização da Prefeitura de Recife. Não há dados sociais das famílias e dos alunos da Secretaria Estadual de Educação e das escolas investigadas.

7. Nas Constituições (e suas revisões) a religião vem deixando suas marcas. Segundo Cury (1996), "A constituição [de 1891] vetou a subvenção ou manutenção ou a restrição do exercício de cultos e de crenças. Vetou também o exercício da capacidade eleitoral aos religiosos que prestassem votos solenes de obediência aos seus superiores eclesiásticos. Neste sentido a Constituição se laiciza, repondo a liberdade plena de culto e a separação da igreja e do Estado (...) e finalmente determina a laicidade nos estabelecimentos de ensino mantidos pelos poderes públicos" (p. 75-6). Já na Constituição de 1946 o texto aprovado é o que se segue: " o ensino religioso constitui disciplina dos horários das escolas oficiais, de matrícula facultativa e será ministrado de acordo com a confissão religiosa do aluno, manifestada por ele, se for capaz, ou pelo seu representante legal ou responsável" (Oliveira, 1996, p.166).

8. A dimensão erótica não ocorre apenas em comportamentos e gestos, mas nas vestimentas. É um show de sensualidade. As marcas dos corpos e as suas exibições explícitas são constantes por parte das meninas - principalmente à noite. Não se quer dizer que todas as alunas usem roupas assim - as evangélicas contrabalançam este erotismo. As suas roupas são dessexualizadas, sem cores vivas, saias até o tornozelo, cabelos longos e presos, ausência de pintura no rosto. Se algumas alunas liberam ao máximo a exposição do corpo, outras reprimem o corpo violentamente. Se, no primeiro caso, há a presença do indivíduo (sujeito desejante explícito), no segundo caso está ausente ou submerso. Não se pode esquecer que esta ideologia do erótico no Brasil, no dizer de Richard Parker (s/d), está ancorada em processos sociais e históricos. Ela estrutura o universo sexual do brasileiro, não só nas suas práticas, mas na linguagem e nas festas. Não dá para entender o Brasil, diz Richard Parker, sem recorrer ao mito de Origem (do Éden, do paraíso). Na tradição patriarcal cristã dos brasileiros, "os padrões éticos prescreviam a castidade para a mulher, dentro do lar, os homens encontravam prazer e satisfação sexual na companhia das mulheres da vida" (Azzi, 1987, p. 99). Concluímos daí que havia uma mulher a servir a família e outra para servir os apetites sexuais dos homens. Não é à-toa que esse é um tema constante nas escolas públicas: proibição e conflitos de roupas sensuais na escola (com apoio de algumas mães, alunas e evangélicas).

A exibição do corpo não se dá da mesma forma e intensidade nas duas escolas investigadas. A escola Recife 1 controla e se impõe  mais sobre a exposição do corpo das alunas. É tema de reunião, como se verá em breve. A própria credibilidade da diretora e da direção ajuda nesse controle. A exposição é bem menor. Já quanto à escola Recife 2, a exposição do corpo, é evidente, principalmente, à noite. Enquanto o quadro de professores da escola Recife 2, turnos da tarde e noite, é preponderantemente masculino, na escola Recife 1 é insignificante sua presença.

9. Uma das formas de expressão e manifestação de culto à ordem é através dos cartazes. Saber se comportar, tanto para os alunos, como para as mães e pais,  é uma das práticas vigentes nas escolas. Não há cartazes dizendo como devem se comportar a diretora, os professores e os funcionários. Um cartaz dita como deve ser um aluno: "não brigar", "fazer as tarefas", "ser educado", "saber ouvir e esperar pra falar", "respeitar todos", "passar em todas as provas", "não destruir cadeiras e portas" e "participar e questionar as matérias". Há um outro cartaz que expõe um "contrato didático" que os alunos precisam fazer: "Não vamos perder tempo, estudar com entusiasmo, respeitar um ao outro, fazer as tarefas, não brigar no intervalo, estudar os assuntos dados, manter a sala sempre limpa, vamos defender a nossa turma, ser alegre e saudável, participar das festas, ter recreio após a merenda, não aceitar gentilezas de pessoas estranhas, conservar material escolar". Um outro cartaz sobre a ordem e autoridade expõe: "Respeitem os funcionários da sua escola. 5ª C manhã". Outros divulgam imperativamente: "Não estrague a merenda. 5ª C manhã" e "Mantenham nossa sala limpa. 5ª A manhã". Vimos aqui que predomina um discurso de ordem "unilateral", a ordem é apenas para alguns: os alunos e os pais são os que têm que saber se comportar. Não há referência dessa questão aos servidores públicos e à direção.

 

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© Copyright Evson Malaquias de Moraes Santos, 2003
© Copyright Scripta Nova, 2003

Ficha bibliográfica:
MORAES SANTOS, E. M..
Ambientes topográficos da escola pública. Significações imaginárias patrimonialistas. Scripta Nova. Revista electrónica de geografía y ciencias sociales. Barcelona: Universidad de Barcelona, 15 de junio de 2003, vol. VII, núm. 143, . <http://www.ub.es/geocrit/sn/sn-143.htm> [ISSN: 1138-9788]

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