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Scripta Nova
REVISTA ELECTRÓNICA DE GEOGRAFÍA Y CIENCIAS SOCIALES
Universidad de Barcelona. ISSN: 1138-9788. Depósito Legal: B. 21.741-98
Vol. VI, núm. 119 (75), 1 de agosto de 2002

EL TRABAJO

Número extraordinario dedicado al IV Coloquio Internacional de Geocrítica (Actas del Coloquio)
 

MUDANÇAS NO TRABALHO E NO MERCADO DE TRABALHO: TRABALHADORES DO RAMO DE TELECOMUNICAÇÕES NO BRASIL

Benilde Maria Lenzi Motim
UFPR


Mudanças no trabalho e no mercado de trabalho: trabalhadores do ramo de telecomunicações no Brasil. (Resumo)

O processo de reestruturação das telecomunicações iniciou na década de 1980 e aprofundou-se na de 1990, quando ocorreu a privatização do sistema de telefonia fixa, no Brasil. Estas mudanças inserem-se no contexto da mundialização, da flexibilização e das tendências à informatização dos diversos setores da sociedade. O setor de serviços, em especial, os serviços de telefonia e de telecomunicações – básicos para a transmissão de dados e informações – tende a organizar-se para responder à demanda de empresas e demais instituições. Neste artigo (1), enfatizamos as mudanças que ocorreram no trabalho e no mercado de trabalho, durante o processo e após a privatização do setor de telecomunicações. Ainda, como os trabalhadores percebem no seu cotidiano, tais mudanças. A explicação passa também pela discussão do conceito de desfiliação.

Palavras chave: trabalho, mercado de trabalho, telecomunicações, flexibilização


Restructuration in the labor market: workers of telecommunications sector in Brazil (Abstract)

The restructuring process in the Brazilian telecommunication industry began in the eighties and intensified in the nineties, with the privatization of the Brazilian telephone system.These changes belong to the worldwide context of globalization and flexibilization and to the tendency toward computerization in diverse spheres of social activity. The service sector and in particular, telephone and telecommunication services, which are fundamental for the transmission of data and information, tend toward organizational forms that respond to the demands of business and other social institutions. In this paper, I emphasize changes in work and the labor force during the process of privatization of telecommunications. I also look at how workers perceive these changes and their effects on daily life. The concept of "de-affiliation" is central to my explanation.

Key words: work, labor market, telecommunications, flexibilization


As principais mudanças no setor de telecomunicações, tiveram início em meados da década de 80, intensificando-se na de 90, gerando incerteza e insegurança entre seus trabalhadores. Esta reação está ligada ao fato de que, se por um lado, a terceirização e a reestruturação nas empresas de telecomunicações implicaram maior flexibilidade, ampliação dos serviços e diminuição de custos, por outro significaram redução no quadro de funcionários, mediante demissões, planos de demissão e de aposentadoria incentivadas. Combinadas aos processos de terceirização e flexibilização, as mudanças tecnológicas – desenvolvimento e uso combinado de fibras óticas, comunicação via satélite, informática, tecnologia digital e outras tecnologias da informação – que permitem a ampliação da capacidade e rapidez nos serviços de telefonia e transmissão de dados através de redes interativas, foram processos importantes na preparação para a privatização. Nas empresas privatizadas, o processo de demissão tem sido contínuo, desde quando completou-se a carência prevista no acordo de privatização. Entre outras conseqüências, ocorre a precarização das condições de vida e trabalho daqueles que inserem-se ou foram deslocados do setor de telecomunicações.

Estas mudanças fazem parte do contexto de mundialização e seguem tendências de flexibilização e informatização dos diversos setores da sociedade (2). O setor de serviços, em especial, os serviços de telefonia e de telecomunicações, básicos para transmissão de dados e informações, organizam-se especialmente para responder à demanda de empresas transnacionais e do sistema financeiro, que requerem maior agilidade e integração sistêmica. O ramo das telecomunicações é estratégico para o capital. A informação torna-se um bem econômico a ser negociado, implicando maior poder aos países que dominam as novas tecnologias de informática. A população percebe essas tecnologias da informação como um imperativo tecnológico e as privatizações, como um imperativo econômico. Assim, as mudanças passam a ser mais facilmente incorporadas – são naturalizadas, ou são vistas como inexoráveis.

Enfatizamos a seguir, as mudanças que ocorreram no trabalho e no mercado de trabalho, durante o processo e após a privatização do setor de telecomunicações, mais precisamente, das empresas do sistema de telefonia fixa comutada, no Brasil. Ressaltaremos a repercussão das mudanças mencionadas, no cotidiano destes trabalhadores e sua percepção acerca das mesmas, procurando analisar até que ponto o conceito de desfiliação proposto por Castel, pode ser utilizado para explicar a situação dos trabalhadores que foram desligados do setor de telecomunicações.
 

Mudanças no trabalho e no mercado de trabalho

O comportamento do mercado de trabalho, nos anos 90, demonstra uma tendência à supressão de postos de trabalho formal, expansão do trabalho informal, autônomo e de pequenos empreendimentos. Há neste período uma profunda reestruturação no mercado, que leva à flexibilização dos contratos, mediante a utilização do trabalho em tempo parcial, temporário ou subcontratado. No Brasil, neste período, houve um discreto crescimento econômico que não se fez acompanhar do crescimento dos níveis de emprego, principalmente se consideramos o setor industrial. Constata-se uma defasagem significativa da curva que registra os níveis de emprego, em relação àquela que registra o crescimento econômico. Este fenômeno estende-se ao setor de serviços, que passa a incorporar mudanças implementadas em outros setores.

O crescimento econômico, com diminuição dos níveis de emprego, pode ser atribuído, parcialmente, às inovações tecnológicas e organizacionais que ocorreram, mas tais fatores são insuficientes para justificar a magnitude das mudanças no mercado de trabalho. Deve-se considerar também, a abertura do país às importações, o que dificultou a expansão do setor privado nacional, a reestruturação das empresas privadas, a privatização ou extinção de órgãos públicos e a não contratação de novos trabalhadores neste setor, desde o início da década de 90, salvo exceções. Portanto, as mudanças tecnológicas e organizacionais, embora tenham desempenhado papel significativo no aumento das taxas de desemprego nos últimos anos, devem ser vistas como partes em um contexto mais amplo de políticas neoliberais, acompanhadas de um ritmo lento e em alguns momentos, recessivo quanto ao desenvolvimento econômico (3).

Ao passar por processos de expansão e reestruturação, o setor de serviços, nestes últimos dez anos, aponta tendências que redefinem o perfil do seu trabalhador, com novas exigências de trabalho e mutações no caráter do emprego. A reestruturação produtiva no setor de serviços e, especialmente no ramo das telecomunicações, caracteriza-se pela heterogeneidade nas formas de organização do trabalho e suas condições de realização. Inovações tecnológicas e maior controle organizacional, alteraram os requisitos de qualificação dos trabalhadores e a estrutura do emprego no setor.

A aplicação da política neoliberal, implica retraimento do Estado no atendimento das demandas dos serviços públicos. Segundo Perry Anderson, o neoliberalismo mantém "um estado forte, sim, em sua capacidade de romper o poder dos sindicatos e no controle do dinheiro, mas parco em todos os gastos sociais e nas intervenções econômicas" ANDERSON (1995). A estabilidade e controle do próprio mercado por parte dos países, dependem em boa medida, de sua capacidade em acompanhar os avanços tecnológicos, disponibilizar informações ao conjunto da população, bem como regular a ação de corporações transnacionais. Assim, caminham lado a lado, os processos de desnacionalização e de "exclusão" social.

No Brasil, modificações no cenário político e econômico do país a partir dos anos 80 – inflação em alta, baixo investimento de fundos públicos, sucessivos planos econômicos – afetaram o ramo das telecomunicações, dificultando sua expansão em um ritmo mais intenso. Mesmo assim, durante toda a década de 90 a Telebrás foi considerada um dos maiores grupos empresariais. No que se refere ao desenvolvimento industrial, em parceria com universidades e indústrias, desenvolveu diversos produtos que incorporam tecnologia de vanguarda, tais como: centrais de comutação telefônica digital; fibra ótica; sistemas de comunicação de dados e textos, permitindo a interligação de terminais e computadores à rede telefônica.

As privatizações no setor de telecomunicações são processos cujas ações e estratégias, em diferentes países, revelam a opção por modelo de desenvolvimento mais dependente, submisso e desnacionalizador, conforme os governos considerem ou não a capacidade de negociação quanto à modernização tecnológica. Em geral, a terceirização intensa que precede aos processos de privatização, representa um tipo de privatização indireta, ou "privatização periférica", que responde pelo lado soft da privatização – processo gradativo de terceirização que se conecta ao processo de privatização, à medida que a transferência de certas atividades prepara a adoção de modernização tecnológica e organizativa. WALTER (1998).

Na Telepar, hoje Telepar – Brasil Telecom, a terceirização ocorreu exatamente da forma descrita por J. Walter. A reestruturação da empresa tem início na década de 80, intensifica-se na de 90, compreendendo um processo de terceirização em três etapas: uma primeira fase, em que se terceiriza os serviços de apoio; na segunda fase, se terceiriza boa parte dos serviços de rede – desde o projeto, passando pelos serviços de instalação e ampliando-se até os serviços de manutenção; na terceira fase, há uma ampliação e intensificação da terceirização e das demissões, atingindo serviços administrativos, de controle e supervisão técnica. Três meses após a privatização, tiveram início planos de demissão e de aposentadorias incentivadas.

Em maio de 1999 iniciaram-se as demissões, gerando forte impacto sobre os trabalhadores, pois foram 680 em todo o estado do Paraná, sendo que destes, 325 eram da Região Metropolitana de Curitiba e do Litoral. A forma como ocorreram estas demissões e o grande número, num único dia, gerou muita incerteza e insegurança também naqueles que permaneceram empregados. Desde então, as demissões vem ocorrendo de forma mais gradativa.
 

Os trabalhadores e as transformações no setor de telecomunicações

Pesquisas realizadas nos mais diversos ramos têm demonstrado que as conseqüências da reestruturação, para o trabalhador, nem sempre têm sido favoráveis. Entre os trabalhadores que produzem equipamentos para as telecomunicações, por exemplo, constatou-se que houve, com as mudanças tecnológicas e organizacionais implantadas, uma melhoria das condições físicas e psicossociais no ambiente de trabalho por um lado, e por outro, intensificação do trabalho e maiores exigências de responsabilidade, cuidado e atenção ao trabalhar com os equipamentos mais modernos. Exigiu-se também novas competências e habilidades, mas não houve em contrapartida, uma compensação salarial, e os trabalhadores sentem a constante ameaça do desemprego VOLPATO (1999). As novas exigências e a atribuição exagerada de responsabilidades individuais sobre o trabalhador, leva à situações de stress, que parecem apenas substituir o cansaço físico pelo mental.

Tais características são comuns em empresas que passaram por processos de reestruturação e inovação tecnológica, sejam elas do ramo industrial ou de serviços. A reação dos trabalhadores tem sido de medo e perplexidade, frente às dificuldades no ambiente de trabalho, à falta de mobilização e ao enfraquecimento dos sindicatos, ou à falta de perspectivas perante o desemprego. Se permanecem na empresa, após um período de reestruturação com enxugamento dos quadros, sentem que foram poupados naquele momento, mas simultaneamente, sentem-se inseguros em razão da incerteza quanto à sua permanência futura.

A reestruturação implicando terceirização e outras inovações organizacionais, as novas tecnologias e a privatização no ramo das telecomunicações, são processos que se desenvolvem e se complementam. A terceirização representou uma alternativa para alguns poucos trabalhadores qualificados que procuraram estabelecer-se por conta própria, prestando serviços à Telepar. Porém, para a maioria dos trabalhadores envolvidos em serviços de rede, as condições e os contratos de trabalho foram precarizados.

Nos quadros da Telepar, aproximadamente dois anos antes da privatização, foram adotados procedimentos de avaliação entre os pares, o que gerou desconfiança e insegurança, mas parece ter permitido aos administradores, vislumbrar possibilidades de transferência e dispensa de trabalhadores. A elaboração de um Plano de Cargos e Salários, alterando as funções dos trabalhadores parece ter facilitado a intensificação do trabalho e o remanejamento dos mesmos, sem a correspondente compensação salarial.

Para os novos contratados, houve uma tendência à precarização nas relações de trabalho e, para os que aceitaram permanecer, deslocando-se para outros setores da empresa, constatou-se a intensificação do trabalho, redução das gratificações e direitos acordados anteriormente, alterações de função que implicam em maior investimento do trabalhador e dedicação para além da jornada normal de trabalho.

Uma pequena parcela de desempregados da telefonia fixa foi contratada por empresas de telefonia celular, enquanto o restante enfrentou muitas dificuldades de reinserção no mercado, considerando-se as novas exigências de qualificação do trabalhador. Os planos de demissão incentivada e de aposentadoria incentivada, foram instrumento para a redução dos quadros, mas também para exercer pressão sobre os demais trabalhadores, gerando insegurança e tensão no ambiente de trabalho e alterando a sociabilidade na empresa e fora dela. Alguns demitidos passaram para o ramo de pequenos comércios, nem sempre com sucesso. Muitas vezes, inicia-se com estas tentativas, uma sucessão de "eternos recomeços".

A maior parte dos demitidos são do sexo masculino e ocupavam funções Técnico-Operacionais Externas, como cabistas, auxiliares de rede e demais membros das equipes que trabalhavam com instalação, ampliação e manutenção da rede. O número de mulheres demitidas é maior do que o número de homens, nas funções Técnico-Administrativas Internas, como agentes administrativos, atendentes e agentes de serviço, conforme se observa na Tabela 1. Constata-se que a divisão do trabalho segundo o gênero está claramente presente, pois enquanto as mulheres ficam com os serviços de escritório, realizados internamente à empresa, os homens encarregam-se dos serviços externos, mais pesados e perigosos. No momento da demissão, a proporcionalidade se mantém, mas, enquanto parte dos homens encontram recolocação nas empresas terceirizadas, as mulheres tiveram mais dificuldade em manter-se no ramo, pois as funções que exerciam foram em grande parte, extintas.
 
 

Tabela 1
Distribuição dos trabalhadores conforme função, ambiente de trabalho e sexo
Função e Ambiente de Trabalho
Número
%
Feminino
%
Masculino
%
Agente Administrativo
10
3,08%
09
__
01
__
Agente de Serviços
10
3,08%
07
__
03
__
Atendente de Serviços
09
2,77%
08
__
01
__
Outras Funções
71
21,85%
27
8,31%
44
13,54%
Sub-Total – Técn.Adm.Int.
100
30,78%
51
15,69%
49
15,08%
Auxiliar de Redes
10
3,08%
0
__
10
3,08%
Cabista
21
6,46%
0
__
21
6,46%
Outras Funções
52
16%
1
0,31%
51
15,69%
Sub-Total – Técn.Oper.Ext.
83
25,54%
1
0,31%
82
25,23%
Não Informada
142
43,69%
40
12,30%
102
31,38%
Total Geral
325
100%
92
28,31%
233
71,69%
Fonte: Banco de Dados do SINTTEL

Entre os trabalhadores que se desligaram das empresas que foram privatizadas, estão os que conseguiram reinserir-se mediante trabalho nas empresas terceiras e os que não chegaram sequer a afastar-se de suas funções, no início, apenas tiveram alterada a denominação da função, a remuneração e seus chefes e patrões. Os trabalhadores que prestam serviços nas empresas terceirizadas, relatam que teria havido uma perda salarial entre 30 e 70 por cento, conforme a função desempenhada. Nestas empresas, os quadros são enxutos, pois só se contrata o estritamente necessário.

O relato dos trabalhadores desligados das telecomunicações expressa situações de insegurança e até mesmo de "violência" durante os processos de privatização, reestruturação e demissão. Os mesmos queixam-se da forma como se processou a desvalorização do seu trabalho e de sua experiência. Relatam o desrespeito que sentiram quando foram demitidos sem consulta. Utilizam ainda, palavras como: ansiedade, incerteza, medo, tensão, revolta, impotência, pressão, stress, desconfiança e ameaça, para referir-se aos momentos que precederam a privatização e os momentos em que os processos de demissão e aposentadoria "nada voluntários" ocorreram. Para caracterizar a situação em que se viram quando demitidos, perante a família e os amigos e quando reiniciaram a busca por novas colocações, falam de: "falta de chão", individualismo, despreparo, vergonha, ressentimento, incapacidade, instabilidade.

A dificuldade de conseguir novas colocações no mercado de trabalho refere-se principalmente aos seguintes fatores: idade, pois 67,38 por cento dos demitidos tinham entre 40 e 54 anos e 22,46 por cento tinham entre 25 e 39 anos; inadequação entre as vagas ofertadas e a formação, qualificação ou experiência do trabalhador; o trabalho como autônomo no comércio ou nos serviços, requer um grande investimento, que possa sustentar-se por vários meses até oferecer algum retorno e, uma boa avaliação das condições básicas necessárias ao empreendimento. Estes trabalhadores, especialmente os que fizeram acordos e receberam incentivos para sair, não tinham experiências anteriores com empreendimentos deste tipo. Tinham, muitas vezes, apenas a experiência de trabalho no serviço público, que lhes garantia uma carreira e uma série de direitos conquistados no decorrer dos anos de muita luta e organização sindical.

É quando percebemos o contraste entre as condições de trabalho e de vida que tinham estes trabalhadores antes da privatização e a precarização de suas condições de vida e de trabalho hoje, principalmente daqueles que não estão podendo trabalhar, que propomos a utilização do termo "desfiliação" conforme CASTEL (1998). No período anterior, estas categorias de trabalhadores tinham estabilidade e solidariedade, sentiam-se parte de um coletivo, tinham um sindicato combativo e organizado, planos de saúde e um sistema próprio de previdência complementar, além de uma ambiente de trabalho adequado, com treinamentos freqüentes, às vezes, financiados pela empresa, uma carreira definida e salários compatíveis, no período que se segue à privatização, defrontaram-se com o desemprego, transferências internas, precarização das relações de trabalho, competição acirrada, eliminação de benefícios e direitos conquistados, informalização do trabalho e remuneração incerta. Esta situação gera uma grande desmotivação e insegurança, fazendo com que, muitos destes trabalhadores estejam hoje entre os "desempregados por desalento".

Embora o termo "desfiliado" possa soar exagerado, quando aplicado à estas categorias de trabalhadores, pode-se afirmar que o processo de desfiliação está presente, em especial entre aqueles que permaneceram desempregados, vulneráveis e em situação incerta. Foram destituídos de seus referenciais tradicionais, o que trouxe precarização também às suas famílias. Como diz CASTEL (1998, p.17),

Ë impossível separar completamente os "de dentro" e os "de fora" já que há um continuum de posições que se contaminam. O que, ao contrário, parece ser mais provável é uma circularidade entre a zona de vulnerabilidade e a zona de integração: desestabilização, precarização, desemprego, são ameaças que turvam as distinções anteriores e se fazem onipresentes para o conjunto da sociedade."
 

Considerações Finais

As mudanças que se processaram no sistema público de telecomunicações no Brasil confirmam o modo como a produção capitalista requer ampliação contínua das forças produtivas, a introdução de novas tecnologias e estratégias de uma forma institucionalizada, cuja base de legitimação está posta na dupla dependência do novo relacionamento entre Estado e interesses privados.

O ramo das telecomunicações apresenta hoje, forte rotatividade de mão-de-obra, concentrada nos trabalhadores semi-qualificados e com baixa remuneração, enquanto a minoria que domina as novas tecnologias, embora não tenha horários e locais fixos para trabalhar, é bem remunerada, compensando o trabalho intensivo. Esta rotatividade e a contratação de pessoas sem a experiência dos técnicos que foram demitidos ou aposentados, além da dificuldade de encontrar trabalhadores adequadamente preparados para dominar as novas tecnologias, tem se refletido negativamente na qualidade dos serviços de telecomunicações.

Assim, se por um lado houve flexibilização e ampliação dos serviços de telecomunicações, com diminuição dos custos e abertura para concorrência, por outro, há uma tendência de que os trabalhadores mais antigos continuem a perder seus empregos e tenham uma situação mais precária, em termos econômicos e de direitos.
 

Notas

(1) Este artigo apresenta resultados parciais da pesquisa "Trabalhadores terceirizados e demitidos do ramo das telecomunicações: deslocamento e reinserção na década de 1990 e no ano 2000", integrada em pesquisa multidisciplinar desenvolvida no GETS – Grupo de Estudos Trabalho e Sociedade e Rede UNITRABALHO/UFPR.
(2) Para uma análise do processo de mundialização e suas implicações, ver: CHESNAIS, François. A mundialização do capital. São Paulo: Xamã, 1996; Ainda, OLIVEIRA, Francisco de Os direitos do anti-valor. Petrópolis, Vozes, 1998.
(3) Sobre o mercado de trabalho e as transformações recentes, ver POCHMANN, M.; QUADROS, W. Transformações recentes no padrão de emprego regular urbano: uma síntese do panorama nacional e regional. Revista Paranaense de Desenvolvimento, Curitiba, n. 90, jan.-abr. 1997, p. 15-29
 

Referências Bibliográficas

ANDERSON, P. Balanço do neoliberalismo. In: SADER, E.; GENTILI, P. (Org.) Pós Neoliberalismo – as políticas sociais e o estado democrático. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995

BANCO DE DADOS DO SINTTEL.

CHESNAIS, F. A mundialização do capital. São Paulo: Xamã, 1996

OLIVEIRA, F. de Os direitos do anti-valor. Petrópolis: Vozes, 1998

CASTEL, R. As metamorfoses da questão social. Petrópolis, Vozes, 1998

POCHMANN, M; QUADROS, W. Transformações recentes no padrão de emprego regular urbano: uma síntese do panorama nacional e regional. Revista Paranaense de Desenvolvimento. Curitiba, n. 90, jan-abr. 1997, p. 15-29

VOLPATO, M. Trabalho e tecnologia: as percepções dos trabalhadores frente ao processo de inovação – um estudo de caso. (Dissertação) CEFET, 1999

WALTER, J. Privatizaciones y relaciones laborales em la telefonía latinoamericana. Revista Latinoamericana de Estudios del Trabajo, ano 4, n. 8, 1998, p. 89-108
 

*Socióloga, Professora do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal do Paraná, área de Sociologia do Trabalho, Doutora em História/UFPR. (benilde@brturbo.com). A estudante de Ciências Sociais, Neiva Furlin (Bolsista Iniciação Científica PIBIC/CNPq/UFPR) colaborou na pesquisa.
 

© Copyright Benilde Maria Lenzi Motim, 2002
© Copyright Scripta Nova, 2002
 

Ficha bibliográfica

MOTIM, B.M.L. Mudanças no trabalho e no mercado de trabalho: trabalhadores do ramo de telecomunicações no Brasil. Scripta Nova, Revista Electrónica de Geografía y Ciencias Sociales, Universidad de Barcelona, Vol. VI, nº 119 (75), 2002.  [ISSN: 1138-9788]  http://www.ub.es/geocrit/sn/sn119-75.htm


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