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Índice de Scripta Nova

Scripta Nova
REVISTA ELECTRÓNICA DE GEOGRAFÍA Y CIENCIAS SOCIALES
Universidad de Barcelona. ISSN: 1138-9788. Depósito Legal: B. 21.741-98
Vol. VI, núm. 119 (129), 1 de agosto de 2002

EL TRABAJO

Número extraordinario dedicado al IV Coloquio Internacional de Geocrítica (Actas del Coloquio)
 

ESTADO, TURISMO E MERCADO DE TRABALHO

Rita de Cássia da Conceição Gomes
Valdenildo Pedro da Silva
Pesquisadores da Base de Pesquisa em Estudos Sócio-Espaciais e Representações Cartográficas do Departamento de Geografia da UFRN/Brasil.

Anieres Barbosa da Silva
Doutorando em Ciências Sociais da UFRN/Brasil.


Estado, turismo e mercado de trabalho (Resumo)

O trabalho proposto, realizado a partir de levantamento de dados secundários e pesquisa bibliográfica, tem por objetivo principal analisar a geração de um novo mercado de trabalho no Rio Grande do Norte vinculado à expansão do setor turístico que vem ocorrendo a partir dos anos de 1980, considerando como fator relevante o papel do Estado, que se expressa através de políticas socioespaciais que foram implementadas especificamente para esse setor. Decorrente de tais políticas, o turismo passou a se constituir em uma das atividades econômicas mais importantes do Estado, não apenas pelas receitas geradas, mas principalmente pelo seu significado para o mercado de trabalho, contribuindo, assim, de forma decisiva para o processo de reprodução social. Entretanto, observamos que atrelada à expansão desse setor, estão sendo produzidas relações contraditórias cujo resultado tem sido uma expressiva informalização do mercado do trabalho associada a uma intensa precarização da força de trabalho.

Palavras-chave: turismo, mercado de trabalho, exclusão social


Government Policies, Tourism and the Labour Market (Abstract)

This paper makes use of secondary data and a literature review to analyse the emergence of a new labour market in Rio Grande do Norte state, Brazil - which is, since the 1980s, related to the growth of tourism - and considers the relevance of government policies in this field. As a result of these policies, tourism now constitutes one of the main economic activities in the state, not only because of the amount of government revenues but mainly for its significance for the labour market. However, attached to tourism expansion, there emerged some contradictory outcomes such as the informalization of the labour market and the worsening of labour conditions.

Key words:  labor market, tourism, social exclusion


O debate sobre o turismo e o mercado de trabalho tem sido intenso e controverso neste limiar do século XXI entre profissionais de turismo, economistas, sociólogos, geógrafos e demais estudiosos dessa temática. Entretanto não podemos excluir da discussão o papel do Estado, uma vez que têm ganhado notoriedade as relações de mediação (e/ou de vinculação das contradições deste) entre os indivíduos e os interesses da reprodução e acumulação das atividades econômicas em pauta.

Ancorando-se nas idéias de Marx e Engels (1986), entendemos que o estado surge da contradição entre o interesse de um indivíduo e o interesse comum a todos os indivíduos. A sociedade se transforma em Estado, um Estado aparentemente divorciado do indivíduo e da comunidade, mas, na realidade, articulado com determinados grupos, que, no moderno Estado Capitalista, representam uma elite econômica: a burguesia. Assim, podemos enunciar que o Estado passa a ser uma forma de organização que esta burguesia necessariamente adota, para fins internos e externos, para garantia mútua de sua propriedade e interesses (Marx e Engels apud Carnoy, 1998, p.78), influindo, portanto, nas medidas estatais, de maneira que o ganho das outras classes sociais seja subjugado aos da classe econômica dominante.

Entrementes entendemos que compete ao Estado moderno a realização de funções básicas para garantir a permanência da unidade territorial e/ou dos anseios, desejos e necessidades da população. Para nós, o Estado continua sendo a única entidade legítima da sociedade estruturada. Ele tem no turismo uma de suas atividades e para ele dirige sua atenção setorial, trazida na política traçada para atender aos requisitos de crescimento do setor (Beni, 1997, p.79).

Nossa investigação coloca-nos, ainda, sob o patrocínio de teóricos que interpretam o turismo como uma das atividades econômicas mais promissoras neste milênio, mas que dispõe, como as outras, de virtudes e pecados. Nessa trajetória, priorizamos e situamos as idéias de Beni (1997), Rodrigues (1997) e Moesch (1998). Ao nosso ver, esses autores teorizaram sobre problemas/questões centrais ou fundamentais, que estão vinculadas ao turismo e às implicações que dele/nele decorrem.

Nessa linha de raciocínio, assim afirmou Beni (1997, p. 85): "a verdadeira integração no turismo e do turismo só se dará quando a visão do planejador e a do governo confluírem para a inadiável necessidade de uma gestão territorial compartilhada e participativa".

Rodrigues (1997, p. 9) diz que

"os efeitos do turismo demandam urgência e seriedade nas pesquisas (...), visando à avaliação da dimensão econômica do fenômeno, tendo em vista sua importância no desenvolvimento com base local, ou seja, voltado para a melhoria da qualidade de vida da população dos lugares e regiões onde novos projetos se encontram em fase de implantação, ou em áreas que sofreram degradações".

Referindo-se às virtudes e pecados do turismo, Moesch (1998, p.79) foi enfática em dizer que "esse fenômeno evoluiu e, cada vez mais, especialistas dedicam seus esforços no sentido de tentar dimensionar o alcance dessa fantástica mola propulsora de benefícios e malefícios, tentando divisar os seus limites".

Essas e outras reflexões teóricas, entremeadas no texto, são balizadoras do diálogo que travamos sobre o Estado, turismo e mercado de trabalho no Rio Grande do Norte, em destaque a seguir.
 

Emergindo um novo cenário

Ao longo do processo histórico de formação de um determinado lugar ou território, aqui entendido como um espaço de relações entre objetos (fixos) e ações interpessoais (fluxos), se estabelecermos um corte temporal, podemos detectar simultâneas e sucessivas divisões do trabalho.

Considerando essa afirmação, que tem por base o pensamento de Santos (2000, p. 144), podemos assinalar que o Rio Grande do Norte, durante o seu processo de construção do território, vivenciou divisões territoriais do trabalho diversas, sendo a agropecuária a atividade mais significativa até a segunda metade do século XX, quando a mineração passou, também, a comandar o processo de produção da área sertaneja do Estado.

Até os anos 80, a atividade terciária no Estado, tanto no que diz respeito ao setor de serviços, como ao comércio, não teve grande expressividade na economia do Rio Grande do Norte. Até esse período, as cidades de Recife (PE) e de Campina Grande (PB) eram os pontos de referência para as demandas comerciais e a prestação de serviços.

Enquanto mercado de trabalho, o setor terciário no Rio Grande do Norte limitava-se praticamente à oferta de empregos ligados ao serviço público, destacando-se as atividades básicas de saúde e de educação e, ainda, o serviço militar, uma vez que, desde a II Guerra Mundial, a cidade do Natal se apresentou como um ponto estratégico-militar. Já em relação ao comércio, a oferta de empregos dava-se por meio de pequenos empreendimentos, merecendo destaque lojas de departamentos, como, por exemplo, as Lojas Brasileiras, as Casas Pernambucanas e as Lojas Americanas.

A partir dos anos 80, o setor terciário no Rio Grande do Norte passou por mudanças significativas, especialmente nos ramos existentes na capital, o que, no nosso entendimento, está atrelado à elevação das receitas geradas e ao número de pessoas ocupadas, refletindo a inserção do Estado no contexto das mudanças vivenciadas pelo sistema capitalista em nível mundial, sendo a reestruturação produtiva a mais expressiva.

Quando falamos em reestruturação produtiva, estamos nos referindo ao conjunto de transformações, que define um novo padrão produtivo, caracterizado pela introdução de novos métodos de gestão e de administração do trabalho e pela introdução de novas tecnologias - produto da reconversão industrial, que nos parece vir acentuando o desemprego estrutural, em nível mundial.

O crescimento do desemprego estrutural, provocado pelo processo de robotização das fábricas, é de um problema ainda não solucionável por parte daqueles que se preocupam com a questão do mercado de trabalho e a reprodução social. O desemprego, provocado pelo avanço da tecnologia, já era algo visualizado por Marx no final do século XIX e logo na primeira metade do século XX foi também estudado e previsto por Keynes, que o denominou de desemprego tecnológico.

Buscando a solução para tal problemática, o capital lança mão, no início do século XX, do modelo produtivo taylorista, seqüenciado, pelos mesmos motivos, pelo moldes de produção fordista.

Nas últimas décadas, o fordismo vem convivendo com novos sistemas de produção. No âmago dessa convivência, emergiu uma intensa crise econômica, passando a exigir das grandes empresas um sistema de produção com maior flexibilidade, de modo que permitisse expandir ou extrair a produção de acordo com as condições de mercado.

Assim, a partir das últimas três décadas do século XX, têm surgido profundas transformações socioeconômicas decorrentes de movimentos marcantes, como, por exemplo, o avanço da reestruturação produtiva, a crescente importância da financeirização da riqueza e a hegemonia da globalização ou mundialização do capital, proporcionando a construção de um novo território mundial.

No contexto dessas transformações econômicas, o mundo do trabalho assume novas configurações, que alteram toda a sua fisionomia, acarretando conseqüências sociais e políticas acentuadas. Além de causar perdas políticas à classe trabalhadora, a reestruturação produtiva tem provocado inúmeros impactos sociais, como: extinção dos postos de trabalho formal; desemprego estrutural; precarização do trabalho, expressa através do subemprego; além de outros que ocorreram através da alteração da legislação social, que tem promovido a desregulamentação e flexibilização do trabalho.

A produção flexível apóia-se na flexibilidade organizacional do trabalho, nas formas de contratação, na qualidade dos produtos e nos padrões de consumo. O aumento da competição e a limitação das margens de lucro impõem contratos de trabalho mais flexíveis, como a subcontratação e a flexibilização dos serviços como forma de escapar dos encargos sociais e dos custos de produção. Nesse cenário de mudanças, verificamos o crescimento rápido das chamadas economias informais, cujo resultado de perversão está expresso através do desemprego, da má remuneração do trabalhador, retrocesso do poder sindical, destruição de antigas habilidades e surgimento de outras, especializadas ou não.

A flexibilização da produção gerou novas formas de trabalho alternativo, que, convivendo lado a lado, permitem aos capitalistas o direito de escolher aquela que lhes oferece melhores condições de lucro. O resultado mais perverso da globalização econômica tem sido o desemprego, que se dá numa escala mundial.

O desemprego tem atuado de maneira direta no processo de questionamento identitário do indivíduo, produzindo uma gama de sentimentos ligados à sensação de inutilidade, à destruição da auto-estima e à desvalorização social.

Tais sentimentos apontam para a necessidade de uma verdadeira alteração no paradigma produtivo, isso porque a acumulação flexível de capital merece profundas diferenciações em relação ao paradigma fordista e, nesse contexto, há uma necessidade de que os excluídos socialmente sejam reintegrados à vida coletiva através do trabalho.

Com o processo de reestruturação produtiva ocorreu um redimensionamento das atividades econômicas, passando a emergir uma nova divisão territorial do trabalho. Assim sendo, a indústria se redistribuiu espacialmente, além de outras atividades que foram surgindo, fazendo aflorar novos processos econômicos. Nesse contexto, vale ressaltar o novo papel que o litoral nordestino passou a desenvolver por meio da atividade turística, proporcionando uma nova dinâmica à região, não apenas do ponto de vista econômico, mas, principalmente, na perspectiva socioespacial.

A maior parte das capitais nordestinas passou a contar com a atividade turística de massa, que vem provocando mudanças, com reflexos não apenas no território, mas, principalmente, na condição de vida da sociedade, quer seja para incluí-la ou para deixá-la à margem do acesso às benesses do turismo. A implementação do planejamento estatal, voltado para a viabilização de projetos turísticos, tem criado e ampliado o mercado de trabalho, gerando, assim, dois momentos específicos: o primeiro expresso através da construção da infra-estrutura básica indispensável ao desenvolvimento da nova atividade, e o segundo relacionado diretamente à implementação de projetos turísticos.
 

O turismo no Rio Grande do Norte

A nosso ver, o marco principal da atividade turística no Rio Grande do Norte se deu a partir da construção da Via Costeira nos idos de 1980, quando o Estado ainda possuía uma posição marginal em relação à atividade turística, já que no Nordeste eram consideradas como principais pólos de destino as cidades de Salvador, Porto Seguro, Fortaleza, Recife e Maceió.
 

Pedaços da história

Antes disso, a preocupação com o turismo ocorria de forma pontual, expressa na construção de um hotel de referência, o Reis Magos durante o governo do Sr. Aloísio Alves, que privilegiou durante a sua gestão as políticas de desenvolvimento de caráter urbano industrial, dado o fato de que até então o estado do Rio Grande do Norte apresentava toda uma dinâmica econômica atrelada ao setor rural.

É a partir desse momento que o poder público começa o despertar para o turismo, visto, então, como uma atividade econômica importante e, por isso, uma excelente alternativa de geração de emprego e renda. Para tal, vários empreendimentos foram realizados, como, por exemplo, a construção da ponte de Igapó, criando-se, assim, as condições necessárias para se viabilizar o fluxo de automóveis que se dirigiam para a praia da Redinha, espaço de lazer importante na época; e também a pavimentação da estrada que ligava Natal à Barreira do Inferno, local de lançamento de foguetes. Desponta nesse contexto a praia de Ponta Negra, que até os dias atuais ainda se constitui num dos mais importantes pontos turísticos da cidade. Todos esses empreendimentos repercutiram diretamente sobre o território. É o início da construção de um novo território, o do turismo. A partir de então, a atividade turística, mesmo ainda incipiente, começava a promover mudanças territoriais e, por conseguinte, sociais, no território de Natal.

Objetivando a divulgação e, portanto, a inserção de Natal na rota do turismo, foi realizado, no ano de 1969, o II Congresso Brasileiro de Turismo em Natal, que contou com 300 participantes, dos vários estados brasileiros. O referido evento foi um momento importante para impulsionar as mudanças na configuração territorial da cidade, despertando nas autoridades e interessados nesse setor a necessidade de se implementarem políticas voltadas para tal fim e, ao mesmo tempo, fez ver aos congressistas presentes as potencialidades turísticas de Natal. Sendo assim, podemos assinalar que esse congresso foi o marco da construção da imagem de Natal para o desenvolvimento do turismo.

O turismo é uma atividade que se desenvolve segundo uma teia de relações, formando um sistema complexo, que envolve vários segmentos públicos e privados da sociedade. Assim, entendemos que o Estado começou a investir no planejamento da atividade turística por entender que esse setor se apresentava como a grande saída para o crescimento econômico do Estado. Com isso, algumas políticas públicas, no decorrer das três últimas décadas do século XX, foram implementadas para viabilizar essa atividade. No caso do Rio Grande do Norte, as políticas públicas estiveram vinculadas às condições de infra-estrutura viária, de hotéis, e ainda à construção e consolidação de alguns atrativos turísticos. O projeto Parque das Dunas-Via Costeira foi a primeira ação intervencionista do Estado, com objetivo de desenvolver o turismo de massa no Rio Grande do Norte, seguido pelo Programa de Ação para o Desenvolvimento do Turismo no Nordeste - PRODETUR/NE -, cujas ações materializadas espacialmente resultam na implementação dos projetos Rota do Sol e Pólo Costa das Dunas.
 

Projeto Parque das Dunas-Via Costeira

O Projeto Parque das Dunas-Via Costeira pode ser apontado como a primeira manifestação do poder público para viabilizar o turismo de massa no Rio Grande do Norte. Esse projeto foi implementado no final dos anos 70, após inúmeras discussões e eventos realizados no Estado, uma vez que se tratava de uma proposta polêmica, tendo em vista que envolvia uma área de cordão dunar que margeava toda a área de praia da cidade do Natal, onde seria construída uma rodovia cortando as dunas, além de hotéis de luxo, mas que era vista pelos empresários como de rico potencial turístico.

Pensando na perspectiva econômica, foi, então, idealizado pelo governo potiguar um megaempreendimento denominado Parque das Dunas–Via Costeira, que ocupou uma área de aproximadamente 8,5 km de costa ligando as praias de Ponta Negra e Areia Preta, no litoral sul de Natal. Essa área até então não era utilizada dentro do processo de urbanização do município, tendo em vista a falta de acesso entre essas duas localidades.

Nortearam o projeto os seguintes objetivos: proteger os sistemas geológicos e geomorfológicos das dunas; conter a ocupação desordenada e predatória da área; impedir o crescimento da favela (bairro de Mãe Luíza) e, ao mesmo tempo, promover a melhoria de suas condições de urbanização; obter o aproveitamento do potencial turístico e de lazer da faixa litorânea; promover a interligação litorânea de Natal (Governo do Estado do Rio Grande do Norte, 1997).

Segundo os objetivos mencionados, é possível perceber que a implementação do projeto dá-se embasado num discurso ambientalista, de caráter preservacionista, discurso que estava em voga em todo o mundo, graças aos resultados das discussões empreendidas na reunião Internacional sobre Meio Ambiente, ocorrida em Estocolmo em 1972, cujo resultado foi o relatório O Nosso Futuro Comum. Por outro lado, também se fazia presente na execução do projeto o autoritarismo do poder público estadual, que ignorava totalmente o governo municipal como gestor do espaço urbano de Natal. É bom lembrar que estávamos ainda, nesse período, sob o comando da ditadura militar, que se instalara no Brasil em 1964.

Apoiado pela Sudene, o projeto Parque das Dunas–Via Costeira trazia na sua essência a proposta de alavancar o turismo de massa no Rio Grande do Norte, considerado como vetor importante para o desenvolvimento local associado à preservação da natureza.

Para tanto, um dos principais objetivos do projeto foi a criação de uma infra-estrutura hoteleira, que, por sua vez, estava inserida no projeto de urbanização turística da área, a qual previa a construção de hotéis de categoria cinco estrelas, com cerca de 400 apartamentos cada um, áreas de belverdere e de acesso à praia e, ainda, a construção de unidades residenciais, bem como de outros equipamentos e serviços complementares, como o Centro de Convenções e a residência oficial do governador do Estado, áreas de camping, colônias de férias, clubes, unidades de saúde, de segurança, e outros. A concessão de incentivos fiscais foi imprescindível para a construção de hotéis e outros empreendimentos ligados ao setor.

Acima da rodovia, principal empreendimento do projeto, já que iria garantir o acesso à área, ficaria o Parque Estadual das Dunas de Natal que, na realidade, se apresentava como o instrumento essencial do discurso preservacionista da época, sendo, portanto, uma das primeiras providências a serem tomadas, uma vez que a criação do parque seria o instrumento minimizador das pressões ambientalistas locais.

No entanto alguns contratempos de ordem natural e, principalmente, políticos, fizeram mudar a proposta original do projeto. Desse modo, foram construídos hotéis de menor porte e, no processo de parcelamento do solo, as irregularidades efetuadas facilitaram a negociação de um maior número de glebas, o que possibilitou um maior adensamento de unidades hoteleiras. Com isso, equipamentos de infra-estrutura e de serviços foram relegados a um plano secundário. A ampliação do número de hotéis pode ser associado, particularmente, ao baixo preço dos terrenos. Alguns hotéis foram construídos em terrenos que custaram apenas US$ 1,25 cada m2, quando, no início dos anos 90, o preço do m2 em Ponta Negra era, em média, US$ 55,00 e, nos bairros da periferia, US$ 8,00. Entretanto, salientamos que esse projeto deu uma nova dinâmica à atividade turística no Rio Grande do Norte, uma vez que, entre 1981, ano da inauguração da via Costeira, e 1991, houve um aumento de 158, 29 por cento do fluxo turístico no Estado.
 

Programa de Ação para o Desenvolvimento do Turismo no Nordeste - PRODETUR- NE

O PRODETUR-NE foi criado em 29 de novembro de 1991, pela portaria número 001, tendo sido uma iniciativa da SUDENE, com apoio da Empresa Brasileira de Turismo - EMBRATUR. Além de todos os Estados nordestinos, também se encontra na área de atuação do PRODETUR-NE o norte do Estado de Minas Gerais, que também faz parte da área de atuação da SUDENE (BENEVIDES, 1997).

Especificamente, o PRODETUR-NE objetiva dinamizar o turismo receptivo estimulando a permanência do turista no Nordeste; induzir novos investimentos na infra-estrutura e gerar emprego e renda, com a exploração direta ou indireta da atividade turística. Ou seja, a geração de emprego não é algo que está definitivamente ligada à atividade turística, mas a outras atividades que com ela tenham alguma relação. Embora a produção de uma infra-estrutura turística seja a meta principal do PRODETUR-NE, a referida política apresentou-se, também, sob forma de uma política urbana, através de preenchimento dessa lacuna, uma vez que muitos centros urbanos não apresentavam condições favoráveis para tal. O PRODETUR-NE está subdividido em cinco grandes subprogramas: Político-institucional, Gestão, Infraestrutura (equipamentos e serviços), Promoção e divulgação, e Pólos e corredores turísticos.

O primeiro subprograma tem como objetivo principal alterar o modus operandi político-institucional relativo à atividade turística na região, buscando diminuir o excesso de burocracia. Além disso, também se propõe corrigir a política de tarifas e preços e pleitear o ingresso do capital estrangeiro no país, facilitando o funcionamento das unidades produtivas.

O segundo procura desenvolver ações voltadas para o planejamento, organização, direção, acompanhamento e avaliação sistemática do PRODETUR-NE. Tais ações estão voltadas para desenvolvimento dos recursos humanos, desenvolvimento organizacional, sistema de informação, preservação do patrimônio turístico e acompanhamento e avaliação do programa.

O terceiro subprograma, isto é, o de infraestrutura, equipamentos e serviços, foi o que demandou até hoje a maior parte de recursos alocados pelo PRODETUR-NE, graças à grande quantidade de obras inseridas nesse subprograma.

O quarto subprograma tem como estratégia básica o marketing integrado, baseado na oferta e demanda e na divulgação da região.

Finalmente, o quinto subprograma diz respeito aos pólos e corredores turísticos, sendo este, o eixo principal sobre o qual está fundamentado o PRODETUR-NE. Esse subprograma tem priorizado os pólos e corredores turísticos, elegendo a planificação de áreas especificamente voltadas para uma maior concentração de investimentos.

As ações do PRODETUR-NE/RN podem ser distribuídas em duas fases distintas. Na primeira desenvolveu-se o Projeto Rota do Sol, compreendendo o trecho do litoral oriental de Touros a Baía Formosa. Entretanto as ações foram concentradas, tendo sido contemplados somente os municípios de Natal, Ceará-Mirim, Extremoz, Parnamirim e Tibau do Sul (figura 1). Na segunda fase, a área contemplada pelo PRODETUR foi novamente a do litoral oriental, ou seja, do município de Pedra Grande até o município de Baía Formosa.

Figura 1


O Projeto Rota do Sol faz parte do PRODETUR-NE I e foi implementado a partir do início dos anos 90. Esse programa tem como objetivo dotar a região de uma infra-estrutura e de serviços, com vistas à implantação de empreendimentos turísticos, bem como a consolidação de pólos turísticos nos diversos estados da região Nordeste do Brasil.

Trata-se de um projeto viário que tem por meta promover a comunicação entre as praias dos municípios localizados no litoral oriental do Estado (figura 1), permitindo o fácil acesso a todos os recantos e belezas desse litoral.

Tal empreendimento teve uma repercussão muito grande no desenvolvimento da atividade turística, de modo que, segundo dados da Secretaria de Turismo do Estado, após a construção da Rota do Sol o fluxo turístico cresceu cerca de 129,14 por cento na década de 80. Esse crescimento exigiu uma expansão da rede hoteleira do Estado, bem como do número de bares e restaurantes.

Após o Projeto Parque das Dunas-Via Costeira, podemos afirmar que o Projeto Rota do Sol foi aquele que provocou o maior impacto, do ponto de vista socioespacial e, de modo específico, na geração de um novo mercado de trabalho, não apenas para aqueles que estavam vinculados à atividade turística, mas também, e principalmente, para toda a população da área envolvida, tendo em vista que os empreendimentos de lazer e entretenimento efetivados, bem como os de infra-estrutura atenderam também às demandas do planejamento urbano-regional da cidade do Natal. Ressaltamos que, num primeiro momento da implementação desse projeto, foi significativo o mercado de trabalho ligado à construção civil e à infra-estrutura básica, como construção de rodovias, saneamento, esgotamento sanitário, pavimentação, afloramento de avenidas e recuperação do patrimônio histórico.

O Projeto Rota do Sol não ficou isolado. Observamos que o Estado passou a ter uma preocupação mais sistematizada com relação à atividade turística, inserindo-a numa nova ótica, que contemplava principalmente as questões de ordem ambiental. Desse modo, o Estado passou a desenvolver ações voltadas para a implantação do manejo do Parque Estadual das Dunas de Natal, a elaboração de planos diretores para os municípios do litoral oriental e a recuperação do patrimônio histórico do Estado, especialmente na cidade do Natal.

Ao longo destes últimos vinte anos, os recursos destinados à política de incentivo à atividade turística no Rio Grande do Norte têm sido justificados, pelas potencialidades turísticas naturais existentes no território norte-rio-grandense, tais como praias, lagos, sol durante quase todo o ano, dunas, e outras, cuja exploração proporcionou o desenvolvimento do Estado, com a geração de empregos e uma melhor distribuição de renda.

O aumento do fluxo turístico e, por conseguinte, da infra-estrutura necessária ao desenvolvimento do turismo tem sido de muita importância para a geração de emprego e renda. Isso porque, além da expansão das atividades já mencionadas, surgiram novos serviços, ampliando, assim, consideravelmente o mercado de trabalho.

Entretanto não podemos deixar de ressaltar que, nessa expansão do mercado de trabalho, tem sido marcante a participação do trabalho informal, que se expressa através de uma intensa jornada de trabalho, sem nenhuma regulamentação legal, e cujos resultados permitem apenas a sobrevivência do trabalho em níveis bastante precários.

O Pólo Costa das Dunas está inserido no Programa de Pólos de Desenvolvimento Integrados de Turismo financiados pelo Banco Mundial e pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento – BIRD -, sendo o Banco do Nordeste do Brasil – BNB - o agente financeiro local. Um dos propósitos do BNB é criar uma estratégia de segmentação mercadológica vinculada à vocação turística local, originando, assim, um corredor turístico que seja capaz de atrair fluxos internacionais de visitantes. Para tal, têm sido estruturadas parcerias com estados, municípios, iniciativa privada e a comunidade local. Além disso, o BNB tem sido o facilitador do processo, via integração dos agentes envolvidos com o turismo, ao mesmo tempo assume a condição de fomentador da visão de produto turístico integrado. Desse modo, além de disponibilizar instrumentos viabilizadores do desenvolvimento nas áreas com potencialidades turísticas, oferece capacitação, promoção de investimentos e estudos econômicos, e, também, financia as atividades integrantes da cadeia produtiva do turismo.

Assim, no Rio Grande do Norte, o Pólo Costa das Dunas apresenta-se como um conjunto de ações para o qual convergem os agentes produtivos, gerando um novo produto turístico, com vistas à consolidação dessa atividade em todo o litoral oriental potiguar.

O projeto Costa das Dunas tem sido apontado pelo poder público como um novo marco para o turismo potiguar. Para os idealizadores e defensores do projeto, essa integração visa atrair e, ao mesmo tempo, ordenar a chegada de investimentos que consolidem a atividade turística no Nordeste, particularmente no Rio Grande do Norte.

Podemos definir como área de implementação de ações do Projeto Costa das Dunas o trecho entre os municípios de Pedra Grande e Baía Formosa (figura 2). Esse trecho se constitui num novo pólo turístico, no qual identificamos o turismo de lazer e o ecoturismo como os produtos prioritários a serem vendidos. Além desses, o turismo de evento cultural, o de negócios e o desportivo também foram apontados como produtos significativos, principalmente na cidade do Natal.

Figura 2

Enquanto espaço turístico competitivo, o Pólo Costa das Dunas ressalta que seja feito um aproveitamento racional de todo o potencial existente na área. Os debates até hoje realizados, apregoam a necessidade de que a atividade turística a ser desenvolvida se caracterize por uma valorização do aspecto econômico, da justiça social e da sustentabilidade ecológica.

Está no discurso oral e escrito que o objetivo maior do Pólo Costa das Dunas é a mudança nos perfis de renda e ocupação da população por ele atingida, direta e indiretamente. Isso porque o pólo envolve um processo interativo entre aqueles que fazem o turismo, sendo essencial que todos estejam sensibilizados para o desenvolvimento do turismo de forma sustentável.

Dentre os investimentos realizados no âmbito da atuação do Pólo Costa das Dunas, podemos ressaltar: ampliação do aeroporto Augusto Severo, obras de esgotamento na Via Costeira, drenagem e pavimentação de avenidas, urbanização da orla de Ponta Negra, implantação de uma unidade de conservação e educação ambiental no Parque das Dunas, ampliação e duplicação de trechos da BR 101, pavimentação de estradas que dão acesso às praias do litoral norte, sinalização turística, desenvolvimento de projeto educacional voltado para a valorização do patrimônio histórico e cultural dos municípios envolvidos, programas de capacitação da mão-de-obra, estruturação, modernização e capacitação de 14 órgãos públicos nos municípios que atuam com o turismo. Além disso, está sendo ampliada a rede hoteleira não apenas no município de Natal, mas em outros municípios, como Touros, São Miguel do Gostoso, dentre outros.

Os investimentos do PRODETUR no Rio Grande do Norte chegam a totalizar, até o momento, cerca de 36,1 milhões de dólares, os quais são empregados em melhorias implementadas através do Pólo Costa das Dunas. Esses números criam uma expectativa, no âmbito da atividade turística, da ocorrência de uma movimentação monetária na ordem de 250 milhões de dólares por ano e um surgimento de 100 mil empregos diretos e indiretos, o que, certamente, faz do turismo, na atualidade, uma das importantes e promissoras atividades econômicas do Estado Potiguar (BNB, 2000). Contudo, indagamos: Em que medida a sociedade norte-rio-grandense tem tido acesso às virtudes desse segmento econômico?

Considerando os pontos aqui mencionados, podemos afirmar que o Rio Grande do Norte, a partir do desenvolvimento da atividade turística, proporcionado principalmente pela intervenção do Estado, assume uma nova função no conjunto das contradições da sociedade emergente, que tem no par dialético trabalho/ócio seus pilares de sustentação.
 

Turismo e geração de emprego

Introduzimos este subtópico pondo em tela a seguinte afirmação de Beni (1998, p. 65): um dos efeitos que o turismo provoca, e que se manifesta de maneira mais constante, é a geração de empregos em regiões que sofrem de excesso de mão-de-obra e, portanto, de desemprego. Isso em parte se verifica na expansão do turismo no Estado do Rio Grande do Norte, mas não podemos perder de vista a máxima marxiana de que a questão do desemprego é, inexoravelmente, perene na sociedade capitalista. As informações e os dados que exporemos em seguida mostram que os empregos ligados ao turismo têm crescido, porém numa trilha contraditória, ou seja, tem-se o emprego formal lado a lado com o informal, na atividade turística.

Como já demos a conhecer anteriormente, nas últimas décadas do século XX, seguindo a tendência nacional, o setor de serviços tem sido aquele que mais cresce no Estado, impulsionando a dinâmica da economia, com destaque para o turismo, especificamente o desenvolvido na área litorânea.

É interessante ressaltar que esse setor tem tomado expressiva relevância em virtude do crescimento das atividades comerciais e de prestação de serviços e a conseqüente contribuição para geração de emprego e renda. Isso ficou comprovado quando analisamos a recente pesquisa anual de serviços do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) de 1998/1999, que revelou um total de 3.740 empresas de serviços no Estado, empregando 37.191 pessoas e gerando uma receita bruta de R$ 973,9 milhões (IBGE, 2002).

Os dados disponíveis sobre o setor de serviços do Estado do Rio Grande do Norte nos informam que, em 2000, os segmentos que mais se destacaram como geradores de emprego e renda foram os subsetores de serviços de alojamentos (hotéis, pousadas, albergues e pensões), alimentação (bares e restaurantes) e agências de viagem e turismo, entretenimento e lazer, e locadoras de veículos. Esses são alguns dos subsetores que integram a complexa atividade turística, que se vem expandindo no Estado, gerando empregos diretos e indiretos, conforme informações constantes na tabela 1.

Na realidade, o que vem ocorrendo nesse setor da economia local, mais recentemente, é a crescente elevação da população ocupada, em decorrência da reestruturação produtiva a que aludimos em páginas anteriores, que vem afetando sobremaneira os demais ramos da economia, com a introdução de novas tecnologias, que têm reduzido mão-de-obra, e também pelo avançado processo de urbanização vivenciado pelo território norte-rio-grandense.
 
 

Tabela 1
Empregos gerados pelos equipamentos turísticos, Rio Grande do Norte - 2000
Atividades/empregos gerados
Natal
Demais municipios
Total
*Grande Natal
Agência de viagem e turismo
2957
85
3040
2963
Empregos Fixos Diretos
476
13
489
477
Empregos Indiretos
2380
65
2445
2385
Empregos Temporários Diretos
101
5
106
101
         
Alimentação
17368
9815
27183
18777
Empregos Fixos Diretos
2859
1532
4391
3075
Empregos Indiretos
14295
7660
21955
15375
Empregos Temporários Diretos
214
623
837
327
         
Entretenimiento e lazer
1829
4740
6569
2809
Empregos Fixos Diretos
300
685
985
447
Empregos Indiretos
1500
3425
4925
2235
Empregos Temporários Diretos
29
630
659
127
         
Meios de hospedagem
22683
9005
31688
24465
Empregos Fixos Diretos
3770
1452
5222
4059
Empregos Indiretos
18850
7260
26110
20295
Empregos Temporários Diretos
63
293
356
111
         
Locadoras de vaículos
797
546
1343
803
Empregos Fixos Diretos
127
91
218
128
Empregos Indiretos
635
455
1090
640
Empregos Temporários Diretos
35
0
35
35
         
Total
45634
24189
69823
49.817
Empregos Fixos Diretos
7532
3773
11305
8.186
Empregos Indiretos
37660
18865
56525
40.930
Empregos Temporários Diretos
442
1551
1993
701
Fonte: Pesquisa de Campo SETUR et. al., 2001.
* Extremoz, Ceará-Mirim, Natal, Macaíba, Parnamirim e São Gonçalo do Amarante.

O discurso que faz a apologia ao turismo aponta o emprego como um dos principais benefícios dessa atividade. Isso é bastante compreensível quando se leva em consideração um território que, historicamente, tem sido marcado por uma distribuição massiva de pobreza e forte concentração de renda. Mas o que os apologistas não alardeiam, em suas expressões, é que o movimento de expansão do capital não pressupõe o pleno emprego.

Isso é evidenciado na atividade turística norte-rio-grandense, pois cresce dia-a-dia o setor informal do turismo, e fica expresso pelo passeio de ambulantes, nos meses de verão, sobretudo em toda a orla marítima, conduzindo sobre ombros ou carrinhos de mão mercadorias diferentes entre si: roupas (maiôs, biquínis, cangas....), redes, bolsas, chapéus de palha e couro, colares, pulseiras artesanais, espetinhos de carne, equipamentos de pesca, relógios e óculos do "Paraguai", algodão doce, ginga com tapioca, sanduíches naturais, bebidas diversas, coco verde, sovertes e picolés... Parece-nos, que as areias das praias do Rio Grande do Norte vêm se transformando, sob os olhares do poder público e da própria iniciativa privada, num verdadeiro mercado a céu aberto, estampando um dos lados perversos, mas também de reprodução social, do turismo no Estado.

Na contramão disso tudo, divulga-se, por meio de dados oficiais, que o emprego formal se tem expandido com a atividade turística, talvez não com a dimensão da informalidade, mas aquele é gerado, sobretudo, pelos meios de hospedagem, alimentação, agências de viagem e locadoras. Sobre isso, externamos que unidades direta e indiretamente envolvidas com o turismo têm gerado empregos diretos, indiretos e temporários. Mas é bom lembrar, que a capacidade de geração de emprego dessas unidades é bastante variável, dado o curto período da temporada turística – dezembro, janeiro e fevereiro -, permitindo a oscilação desse mercado de trabalho, que segue as "altas e baixas temporadas turísticas".

A sazonalidade do emprego em turismo constitui um grande problema, principalmente para o Estado. É nesse sentido que as políticas de turismo têm procurado viabilizar a eliminação da sazonalidade dos fluxos, tendo, assim, a preocupação com a manutenção de um calendário turístico para a cidade. Desse modo, consideramos importante externar os resultados da pesquisa sobre turismo, veiculada no jornal Diário de Natal, em setembro de 2001, a qual aponta o trabalho temporário no turismo como um verdadeiro mito, uma vez que este representa apenas 2,5 por cento do emprego gerado no setor (Kleiber, 2001). Entretanto é bom relembrarmos que o mercado informal faz parte desse novo momento vivenciado pelo capital, que se expressa através da flexibilização do mercado de trabalho em escala global.

Entretanto, no caso do Rio Grande do Norte, além dessa flexibilização, o mercado informal é produto da própria incapacidade de geração de empregos nos setores formais da nossa economia. Como um dos Estados mais pobres do Brasil, o Rio Grande do Norte sempre teve dificuldade de empregar sua força de trabalho, de modo que, em determinados momentos da nossa história, foi expressivo o movimento migratório em busca de emprego e trabalho em direção ao centro-sul.

No entanto, no mercado de trabalho, mesmo com toda a dinamicidade da atividade turística, a demanda tem sido sempre maior que a oferta. E, nesse caso, o resultado tem sido também afetado pela baixa qualificação da força de trabalho, que não pode ser apontada como elemento responsável por tal situação. Na realidade, podemos assimilar que o Rio Grande do Norte, embora tenha apresentado índices satisfatórios de desenvolvimento turístico, ainda não atingiu a sua plenitude nesse aspecto, de modo que possa eliminar a sazonalidade do fluxo, nem mesmo pode atender às demandas da força de trabalho que a cada dia se qualifica para o turismo. Assim, o que estamos presenciando cotidianamente é um processo de precarização da força de trabalho, manifestado por salários irrisórios, que mal reproduz a própria vida dos trabalhadores de verão.

Sem a pretensão de concluirmos essa discussão, dada sua complexidade, podemos afirmar que estamos diante de um "novo" setor econômico, com uma heterogeneidade e dinamicidade sem precedentes, porém de grande perversão. Um setor nebuloso e pouco analisado que não pode ser negligenciado pela academia, em particular pelos que produzem as ciências sociais, e principalmente a Geografia.

A trajetória do setor serviços e, de modo específico, o segmento do turismo, ora nos evidencia a ocupação formal, ora nos apresenta os trilhos e os atalhos da informalidade, da expansão dos autônomos, dos sem-carteira assinada. Mas qual será a nov(a)idade da terciarização da economia e da turistificação dos lugares nesta contemporaneidade? A expansão do emprego ou a proletarização dos serviços? O que sabemos, de imediato, é que estamos diante das incertezas que a reestruturação produtiva tem imposto ao território e, por conseguinte, à sociedade que nele habita e produz.
 

Bibliografia

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© Copyright Rita de Cássia da Conceição Gomes, Valdenildo Pedro da Silva y Anieres Barbosa da Silva, 2002
© Copyright Scripta Nova, 2002
 

Ficha bibliográfica

GOMES, R.de C.; SILVA, V.P. da S.;  SILVA, A. B. da.  Estado, turismo e mercado de trabalho. Scripta Nova, Revista Electrónica de Geografía y Ciencias Sociales, Universidad de Barcelona, vol. VI, nº 119 (129), 2002. [ISSN: 1138-9788]  http://www.ub.es/geocrit/sn/sn119129.htm


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